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sábado, 30 de julho de 2011

Pela Eucaristia passamos a ser outros Cristos

Alimento espiritual e material
Não é exagero julgar que o alimento material foi criado para o desenvolvimento e sustento orgânico do homem, com vistas também a servir de símbolo para a instituição da Eucaristia. Há, entretanto, uma distinção entre o alimento material e o espiritual. O primeiro produz em nós seus efeitos, convertendo-se em substância de nosso organismo, ao ser por ele assimilado. Com o segundo se passa exatamente o contrário: nós somos assumidos por ele, como diz Santo Agostinho, “o qual narra ter como que ouvido a voz de Cristo lhe dizendo: Não serás tu que Me mudarás em ti, como fazes com o alimento da tua carne, mas és tu que te transformarás em Mim” (1). “A virtude própria deste alimento divino é uma força de união que nos vincula ao Corpo do Salvador e nos faz seus membros, a fim de que nos transformemos naquilo que recebemos” (2).
Pela Eucaristia passamos a ser outros Cristos
Pela Eucaristia, participamos não só da própria vida de Jesus como também de todo o tesouro de seu Sagrado Coração, dos méritos de sua oração, sacrifício, etc. Essa realidade mística arranca surtos de entusiasmo das almas dos bem-aventurados: “Para vir ao mundo a fim de nos redimir, Deus Se fez homem.
Quando tu vais ao altar e O recebes, és tu que te transformas n’Ele. E se dissesse que te fazes Cristo, não mentiria” (3).
Por outro lado, ao comungarmos, passamos a ser parte de Cristo: “Quando comungas, passas a ser membro do Corpo de Cristo; assim como a mão é parte do corpo, vive e se sustenta dele, assim fazes parte de Cristo, vives e te sustentas d’Ele, incorporando- te pela comunhão em Cristo, como o membro no corpo” (4).
Ora, se a Eucaristia, por assim dizer, transforma-nos em Cristo, nossa vida moral também será participativa da santidade de Jesus. Não é sem fundamento que se afirma: “Christianus alter Christus” (5), pois, realmente, pelo Batismo passamos a ser outros Cristos, e a Eucaristia vai paulatinamente reproduzindo em nós os mesmos sentimentos e virtudes próprias ao Homem-Deus. Com o tempo, e pela assídua freqüência a esse Sacramento, pensaremos, amaremos e agiremos tal como Ele próprio. Nossa caridade, humildade, obediência e demais virtudes serão semelhantes às d’Ele.
Antídoto contra o pecado e fortaleza para a luta
Além disso, a Eucaristia é um grande antídoto contra o pecado, pois, segundo São Tomás de Aquino, além de nos conferir a graça, ela — que contém o Autor da graça, Cristo Jesus — aumenta em nós a caridade; diminui a concupiscência; por conseguinte, aumenta a devoção, perdoa os pecados veniais; etc. (6).
Esse Sacramento produz seus frutos, na alma que o recebe, “ex opere operato” (7). Entretanto, seus efeitos podem ser excelentes em maior ou menor grau, dependendo das disposições com as quais é recebido. Se a preparação interior for ótima, melhor será seu aproveitamento.
O rompimento e renúncia explícita a tudo quanto possa inclinar-nos ao pecado constitui condição essencial para obtermos a plenitude das graças conferidas pela Comunhão Eucarística.
Por outro lado, não devo me perturbar por causa de minhas debilidades e imperfeições, pois elas não me impedem de me aproximar da Sagrada Mesa, mas, pelo contrário, o Pão Vivo me dará fortaleza para a luta. Quer se trate de um vaidoso, um arrogante, um preguiçoso ou um tíbio, na Eucaristia ele encontrará a inspiração e a energia para trilhar o bom caminho.
Aliás, em nossa vida espiritual não são poucos os combates que devemos enfrentar contra o demônio, o mundo e a carne: “Requer-se a fortaleza do espírito para resistir a semelhantes dificuldades, do mesmo modo como o homem supera e repele, pela fortaleza corporal, os obstáculos materiais” (8).
Ora, onde buscar esse fortalecimento senão na Eucaristia?

1) Suma Teológica III, q. 73 a.3 ad 2.
2) CIC, n. 2.837.
Obras del Beato Avila
t. 2, p. 921.
3) Serm. 58, en la oct. del Corp., in, BAC, Madrid,
4) Id. p. 922.
5) “O cristão é um outro Cristo”.
1 a 6.
6) Cfr. Suma Teológica, III, q. 79, art.
7) “Operando por si mesmo”.8) Suma Teológica, II-II, q. 123.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Joio e trigo

Continuação dos comentários de Mons João sobre o joio e o trigo.
26 Tendo crescido a erva e dado fruto, apareceu então o joio.
Comenta São João Crisóstomo (7) este versículo, dizendo que assim costumam agir os hereges, ou seja, no princípio ocultam suas doutrinas e intenções, mas, quando se vêem apoiados, aí se declaram como tais. Também assim se desenvolve nossa vida espiritual. Como já vimos, no início temos o “fervor de noviço” a nos inundar de consolação; todavia, quando se reduz a sensibilidade, deparamo-nos com o joio da concupiscência existente em nosso interior.
27 Chegando os servos do pai de família, disseram-lhe: Senhor, porventura não semeaste tu boa semente no teu campo? Donde veio, pois, o joio? 28 Ele respondeu-lhes: Foi um inimigo que fez isto. Os servos disseram-lhe: Queres que vamos e o arranquemos?
Há um certo momento em nossa existência no qual a inclinação para o mal, em nós e nos outros, nos espanta, e não raramente desejamos extirpá-la ato contínuo. Nascem então em nossa consciência múltiplos “por quês”. Jesus, na simplicidade comovedora de sua pregação, imagina um diálogo ingênuo entre os servos e o senhor, procurando ressaltar a perplexidade impaciente e aflita de uns, e a sábia calma do outro.
Os servos querem um mundo sem a menor mancha, sem pecado, feito somente de bons. Este foi, aliás, o erro defendido pelos donatistas (séc. IV). Ora, isto só se realizará no Céu, segundo ensinam o Antigo Testamento e São João Evangelista. Nesta terra, o bem e o mal caminham juntos.
29 Ele respondeu-lhes: Não, para que talvez não suceda que, arrancando o joio, arranqueis juntamente com ele o trigo. 30 Deixai-os crescer juntos até à ceifa, e no tempo da ceifa direi aos ceifeiros: Colhei primeiramente o joio, e atai-o em molhos para o queimar; o trigo, porém, recolhei-o no meu celeiro”.
Possuindo um robusto discernimento dos espíritos e serenidade de temperamento, o senhor da parábola pondera sobre a conveniência de deixarem a separação para a época da colheita.
Muitos são os autores que comentam esta passagem, mostrando não só a impossibilidade de se eliminar todo o mal deste mundo, como também a conveniência de sua coexistência com o bem. Pelos maus, são exercitados os bons, dirão uns; muitas ocasiões de sofrimentos, paciência e caridade, etc., são proporcionadas pelos maus aos bons, afirmarão outros.
Em realidade, transparece aqui a grande misericórdia de Deus, não permitindo que as criaturas se precipitem sobre o pecador logo após o pecado, mas concedendo-lhe a oportunidade de se arrepender e obter o perdão.
Eis o ponto central do Evangelho de hoje: “Não arranqueis a cizânia”. Por que o Senhor não deseja que seja arrancada a cizânia? O zelo dos servos é exagerado, uma vez que é impossível desarraigar da lei ordinária todos os vícios e paixões (8).
III – A PARÁBOLA DO GRÃO DE MOSTARDA
31 Propôs-lhes outra parábola, dizendo: “O Reino dos Céus é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. 32 É a menor de todas as sementes, mas, depois de ter crescido, é maior que todas as hortaliças e chega a tornar-se uma árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar nos seus ramos”.



Os ouvintes desta parábola conheciam bem a denominada Sinapis nigra em botânica, vulgarmente chamada mostarda (Mustum ardens), característica por sua minúscula semente que, entretanto, ao ser plantada, produz um viçoso arbusto sempre verde. Não é raro acontecer de um exegeta, por pura curiosidade, cultivá-la em seu jardim e arrancá-la depois de um ou dois anos, pelo receio de sua vigorosa fecundidade. É erva muito comum na Palestina, sobretudo nas regiões de maior calor, chegando a atingir três a quatro metros de altura, de modo que as aves fazem ninhos em suas ramagens.
Quiçá Deus tenha criado a mostarda principalmente para servir de elemento para esta bela pará
O crescimento é um elemento essencial no ensinamento desta parábola. O Reino de Deus e o apostolado são quase imperceptíveis em seu começo, mas ao longo do tempo sua expansão será incalculável, sobretudo pela desproporção entre a escassez dos meios e a grandeza dos efeitos.
Quando um bebê é levado à pia batismal e ali é tocado pelas águas da graça, Deus o santifica. Anos mais tarde algumas dessas tenras e delicadas crianças serão gigantes na fé, e não há quem não conheça um São João Bosco, ou uma Santa Teresinha do Menino Jesus, por exemplo. Árvores frondosíssimas, nascidas de cerimônia tão simples... Seguindo o conselho de São Jerônimo, comparemos as máximas evangélicas com as sentenças dos grandes sistemas filosóficos, ou até mesmo com as grandes descobertas científicas dos dias de hoje. Nada mais oposto em termos de simplicidade e complexidade. Entretanto, é só dar tempo ao tempo para comprovarmos os efeitos diversos.

Conclusão
Foi de fácil assimilação para os Apóstolos a parábola da mostarda, entretanto, a do joio deixou-os muito intrigados. Por isso quiseram saber seu exato significado.
O Divino Mestre insiste na questão do fim do mundo e do Juízo final, importante Novíssimo, cuja meditação nos ajuda a evitar o pecado.
No seu todo, a passagem deste evangelho acentua o quanto devemos crer na força de expansão e de penetração da Igreja, enquanto insiste também na necessidade da vigilância — sobretudo nas horas de diminuição da sensibilidade — quer quanto a nós individualmente, quer no tocante à opinião pública.
Com olhos de fé, esperança e caridade, pensemos no período final do acontecer humano e preparemo-nos para o dia da grande ceifa, dentro de uma plena santidade de vida, costumes e relações sociais, de tal modo que, quando chegar a hora, possamos “resplandecer como o Sol no Reino do Pai”.