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sábado, 6 de dezembro de 2014

III DOMINGO DO ADVENTO (DOMINGO GAUDETE) – ANO B – Jo I, 6-8. I 9-28

COMENTÁRIOS AO EVANGELHO III DOMINGO DO ADVENTO (DOMINGO GAUDETE) – ANO B – Jo I, 6-8. I 9-28
6 Surgiu um homem enviado por Deus; seu nome era João. Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à Fé por meio dele. 8 Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz.
19 Este foi o testemunho de João, quando os judeus enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para perguntar: “Quem és tu?” 20 João confessou e não negou. Confessou: “Eu não sou o Messias”. 21 Eles perguntaram: “Quem és, então? És tu Elias?” João respondeu: “Não sou”. Eles perguntaram: “Es o Profeta?” Ele respondeu: “Não”. 22 Perguntaram então: “Quem és, afinal? Temos que levar uma resposta para aqueles que nos enviaram. O que dizes de ti mesmo?” 23 João declarou: “Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor” — conforme disse o profeta Isaías. 24 Ora, os que tinham sido enviados pertenciam aos fariseus 25 e perguntaram: “Por que então andas batizando, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” 26 João respondeu: “Eu batizo com água; mas no meio de vós está Aquele que vós não conheceis, 27 que vem depois de mim. Eu não mereço desamarrar a correia de suas sandálias”. 28 Isso aconteceu em Betânia, além do Jordão, onde João estava batizando (Jo I, 6-8. I 9-28).
O SALVADOR: DOS BONS ALEGRIA E DESCONCERTO DOS RUINS
A alegria suscitada pelo iminente nascimento do Redentor é para todos, sem distinção, ou só para aqueles que abrem o coração ao seu amor transformante?
I - ALEGRIA ANTE A IMINENTE VINDA DO SALVADOR
A Igreja, sendo uma instituição divina fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo, que é a Cabeça deste Corpo Místico, possui a própria sabedoria d’Ele e tudo faz com conta, peso e medida. Assim, ela dispõe dois domingos do ano que, em meio à penitência, trazem a alegria: o 39 Domingo do Advento, chamado Domingo Gaudete, e o 49 Domingo da Qua resma, denominado Domingo Lætare.
O primeiro recebe este nome da palavra inicial da Antífona da entrada, extraída da Epístola de São Paulo, Apóstolo, aos Filipenses: “Gaudete in Domino semper: iterum dico, gaudete. Dominus enim prope est — Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto” (4, 4-5).
A perspectiva do término diminui o sofrimento
A experiência de todos aqueles que convivem com pessoas atingidas por qualquer sofrimento, físico ou moral, comprova que este se torna muito mais difícil de suportar pelo fato de elas não saberem quando será o seu término. Ao se receber agarantia de que a dor cessará em determinado momento, grande parte do tormento desaparece. Da mesma forma, sabe-se por estudos científicos que a alegria é causa do prolongamento de nossa existência e, pelo contrário, quando nos deixamos abater pela tristeza a vida se encurta.
Algo análogo se verifica na Liturgia deste Domingo Gaudete — a mais significativa de todo o Advento —, cujo principal objetivo é dar a cada um a vigorosa esperança de que, por fim, nosso Redentor está prestes a nascer e ajudar-nos a compreender com maior profundidade o Vinde, Senhor Jesus!, repetido ao longo destas quatro semanas. Hoje transpomos o marco da ascensão penitencial e somos cumulados de alegria na perspectiva da vinda do Esperado de todas as Nações, que quase comemoramos antecipadamente. Em vista disso, a Igreja celebra este domingo com júbilo, flores, instrumentos musicais e paramentos róseos, implorando na Oração do Dia: “dai chegarmos às alegrias da salvação e celebrá-las sempre com intenso júbilo na solene Liturgia”.’
A voz que clama no deserto, contemplada no Evangelho de São João, pede que aplainemos “o caminho do Senhor”, mudemos de mentalidade e nos enchamos do seu espírito. Mas a Igreja quer que o façamos em meio à alegria, pois saímos de uma situação ruim, melhoramos e o progresso só pode ser motivo de regozijo. São Tomás2 explica que a alegria é fruto do amor e, portanto, quem ama tem alegria. A caridade, por sua vez, leva a pessoa a ter um grande desejo de possuir aquilo que a enleva, e nós estamos na expectativa da vinda de alguém que é o Ser por excelência, o próprio Deus Encarnado, O nosso Redentor.
Resta saber se há alguma condição para se obter esta alegria, inseparável da vinda d’Ele, ou se ela se destina a todos, sem quaisquer exigências. A resposta nos é dada pelo Evangelho.
II - O CONTRASTE ENTRE A ALEGRIA DOS BONS E O DESCONCERTO DOS MAUS
São João escreveu seu Evangelho na última década do século I, tempo já marcado pela presença de gnósticos, ebionitas e judaizantes na Igreja nascente, que tentaram deformar a focalização verdadeira a respeito do Antigo Testamento e até mesmo a Revelação trazida por Nosso Senhor Jesus Cristo, sobretudo pela negação de sua personalidade divina. Embora procurassem mostrar-se cristãos, na realidade, queriam perverter os outros com suas ideias e fazer proselitismo do mal.
O Evangelista começa com muita lógica seu relato, por um prólogo no qual afirma de maneira categórica — como alguém que conviveu com o Filho de Deus Encarnado — que Nosso Senhor é inteiramente Homem e inteiramente Deus, e apresenta uma testemunha que confirma esta doutrina, com um argumento de autoridade.
O súbito surgimento de um proteta eliâtico
6 Surgiu um homem enviado por Deus; seu nome era João.
Esta testemunha é São João Batista. Em todo Israel daquele tempo não havia homem com maior prestígio do que ele. Dotado de uma personalidade de peso, contra a qual ninguém era capaz de se levantar, era tido em grande conta, a ponto de não poder ser posto em dúvida. Assim, sua autoridade ratifica as ousadíssimas afirmações cristológicas feitas pelo Discípulo Amado, na abertura deste Evangelho. E, por isso, o Precursor já é citado ainda antes da conclusão do prólogo, no versículo 18.
“Surgiu” é um termo semelhante ao empregado pela Escritura na descrição do inopinado aparecimento de Elias (cf. Edo 48, 1), dando ideia de que não se sabia quem era João, nem de onde vinha. O profeta surge de repente, suscitado por Deus, e o faz de forma sui generis. Veste-se de pele de camelo e se alimenta de gafanhotos e mel silvestre.
A súbita entrada em cena de São João Batista e a sua pregação fizeram dele uma figura convulsionante na sociedade judaica, que abalou o país de alto a baixo, mobilizou a população, produziu verdadeiro tremor nas consciências e suscitou perplexidade e interrogação no fundo das almas, a propósito de sua identidade. Inspirado pelo Espírito Santo, ele não foi exercer sua missão em Jerusalém, mas escolheu as margens do rio Jordão, onde a ascendência dos mestres da Lei, dos fariseus e das demais autoridades judaicas era menos efetiva, além de ser local de passagem das caravanas. E, permanecendo ali por longo tempo, seus ensinamentos foram se espalhando por toda a nação eleita.
Muitos teciam comentários a seu respeito, e logo circularam diferentes hipóteses sobre a figura do Precursor. Uns diziam que era o Messias, impressionados pelas qualidades destehomem de Deus; outros, baseando-se nas profecias que mencionavam a volta de Elias, viam nele o grande profeta que tinha retornado de seu misterioso retiro; por fim, havia quem acreditasse ser o Profeta que haveria de vir (cf. Dt 18, 15).
Deus ama e institui as mediações
7 Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz. para que todos chegassem à Fé por meio dele.  não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz.
Nestes dois versículos, o Evangelista sublinha que São João Batista não era a luz, e sim testemunha de um outro. Podemos imaginar o Precursor como um homem que vivia emocionado, à espera de quem ele anunciava.

Aqui vemos quanto a Providência ama o princípio de mediação e envia intercessores para orientar o povo no rumo das graças que Ela quer derramar. Ensina o Doutor Angélico: “Alguns homens são ordenados por Deus, de modo especial; e não apenas dão testemunho de Deus naturalmente, pelo fato de existirem, mas também espiritualmente, por suas boas obras. Daí decorre que todos os santos varões são testemunhas de Deus, pois por suas boas obras Deus Se faz glorioso entre os homens [...]. No entanto, aqueles que não só participam dos próprios dons de Deus em si mesmos, agindo bem pela graça de Deus, mas os difundem a outros, falando, mobilizando e exortando, são mais especialmente testemunhas de Deus. [...] João, então, veio ‘para dar testemunho’, para difundir junto a outros os dons de Deus e anunciar seu louvor”.3 Tais homens servem de instrumento e, em certo sentido, de pretexto para a comunicação dessas graças, pois a Providência as concede em função do que eles dizem, fazem ou apontam. Para uns, de forma suficiente, para outros, superabundante; para uns, de forma cooperante, para outros, eficaz, mas a todos dá a graça através do mediador que Ela constitui, a fim de que as pessoas se convertam.
Continua no próximo post

domingo, 30 de novembro de 2014

Comentário ao Evangelho – II Domingo do Advento - Ano B - Mc 1, 1-8

Conclusão dos comentários ao Evangelho – II Domingo do Advento
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
III – Uma entrega que prepara a alma para O natal
O tempo litúrgico do Advento nos leva a participar de algum modo dos anseios de todos quantos no Antigo Testamento aguardaram com fidelidade a vinda do Messias, e a viver o clima de grandiosa expectativa alentado pelo Precursor.
Necessidade de “conversão incessante”
Passaram-se dois mil anos desse acontecimento histórico, mas para Deus não há ontem nem amanhã, mas apenas um eterno “hoje”. Como dos israelitas cativos na Babilônia, ou dos judeus da época de Jesus, Ele espera de nós a conversão.
Não desejando que ninguém se perca, o Criador usa de paciência para conosco enquanto espera nos encontrar numa “vida pura e sem mancha, e em paz” (II Pd 3, 14), como afirma São Pedro na segunda leitura de hoje. Para isso, Deus nos convida, por assim dizer, a cada hora, cada minuto, cada segundo, a nos emendarmos de nossos desvios e imperfeições.
À primeira conversão deve seguir-se uma conversão incessante. Não basta dizer: “Sou cristão. Já me converti!”. Ou, como o jovem rico do Evangelho: “Tudo isso eu tenho observado desde a minha juventude” (Mc 10, 20). Ou quiçá: “Confessei-me e passei do estado de pecado mortal para o estado de graça”. É preciso que a cada dia cresça nosso amor.
Portanto, por muito que alguém progrida nas vias da virtude, sempre haverá pontos nos quais é possível melhorar. Nosso Senhor nos convida a estarmos com os olhos constantemente postos no plus ultra, no “duc in altum” (Lc 5, 4), isto é, ousando sempre lançar as redes mais longe, com o coração transbordante de grandes desejos para a máxima glória de Deus.
Solução ao alcance de qualquer um de nós
Analisando as coisas sob esse prisma, cabe perguntar: não teremos nós algo concreto a entregar a Jesus antes de comemorarmos mais uma vez, neste ano, o seu nascimento na gruta de Belém? Talvez o rompimento de uma amizade inconveniente ou perigosa, por cuja causa nos afastamos d’Ele, ou quiçá a renúncia ao desmedido apego a um determinado bem, ou alguma situação, que frequentemente acaba por nos conduzir ao pecado. A Liturgia nos inspira hoje a depor aos pés da Virgem Mãe qualquer defeito capaz de nos impedir de receber com ardente devoção o Menino Deus.
Não temos obrigação de, neste Advento, nos esforçarmos para acondicionar da melhor forma possível a “gruta” da nossa alma, a fim de Jesus não encontrar nela um ambiente mais frio e inóspito que o da Gruta de Belém? Examinemo-nos cuidadosamente para saber a quantas andamos nesse sentido. Haverá sem dúvida falhas a sanar em nosso procedimento. Quais? E desvios a retificar em nossa vida. Quais?
Se, feito esse balanço, o resultado nos for desfavorável e não sentirmos ânimo suficiente para corrigir esses defeitos, a solução está ao alcance de qualquer um de nós: recorrer com filial confiança a Nossa Senhora, Refúgio dos Pecadores. Ela nos obterá de seu Divino Filho graças para uma completa vitória sobre todas nossas falhas e desvios. Pois Jesus Cristo — que quis permanecer cativo durante nove meses em seu seio puríssimo, dependendo d’Ela em todas as coisas, e A coroou como Rainha do Céu e da Terra — não deixará de atender as súplicas por Ela feitas em favor de seus devotos.
1SÃO TOMÁS DE AQUINO. Opúsculos y Cuestiones selectas. Madrid: BAC, 2008, v.V, p. 156.
2 Idem, ibidem.
3 MONSABRÉ, OP, JacquesMarie-Louis. Retraites Pascales. 6.ed. Paris: P. Lethielleux, 1905, p.25-26.
4 MONSABRÉ, OP, JacquesMarie-Louis. Exposition du Dogme Catholique. Carême 1876. 9.ed. Paris: Aux Bureaux de l’année dominicaine, 1892, p.205-206.
5 Conhecido como o Segundo Isaías, distinto do que anunciara os castigos.
6 SÃO JUSTINO, apud FILLION, Louis-Claude. La Sainte Bible commentée. Paris: Letouzey et Ané, 1912, t.VII, p.195. 7
7 Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA. Historia Eclesiástica. Madrid: BAC, 1973, v.I, p.194.
8 CABALLERO, SJ, José. Introducción del traductor. In: MALDONADO, SJ, Juan de. Comentarios a los cuatro Evangelios – San Marcos y San Lucas. Madrid: BAC, 1951, v.II, p.3.
9 Cf. EUSÉBIO DE CESAREIA, op. cit., p.88.
10 Cf. FILLION, op. cit., p.194. Idem, p.197.
11 Não parece supérfluo esclarecer que à frase de Isaías reproduzida pelos quatro Evangelistas — “Preparai no deserto o caminho do Senhor, aplainai na solidão a estrada de vosso Deus” (Is 40, 3) — São Marcos acrescenta algumas palavras de Malaquias (3, 1) e do Êxodo (23, 20). Encontram-se elas também em São Mateus (11, 10) e em São Lucas (1, 76; 7, 27).
12 Cf. BENTO XVI. Jesus de Nazaré – Primeira parte: Do Batismo do Jordão à Transfiguração. São Paulo: Planeta, 2007, p.31.
13 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conferência inédita, 17/11/1972.
14 BEATO COLUMBA MARMION. Jesus Cristo nos seus mistérios – Conferências espirituais. 2.ed. Lisboa: Ora & Labora, 1951, p.122.
15 BENTO XVI, op. cit., p.31.
16 CORRÊA DE OLIVEIRA, op. cit.
17 Idem, ibidem.