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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Comentários Evangelho Mc 8, 27-33

Comentários de Mons João Clá Dias Mc 8, 29-30 
29 Então perguntou-lhes: “E vós quem dizeis que Eu sou?” Pedro respondeu: “Tu és o Cristo”.
E por que Jesus lhes faz essa pergunta?
Jamais por mera curiosidade, pois, enquanto Verbo Eterno, Ele tudo sabia ab initio. Tornar explícito, aos olhos dos Apóstolos, o ridículo dos conceitos gerais a seu respeito, trazia uma enorme vantagem, como sublinha São João Crisóstomo (1), pois os obrigava a se destacarem do mundo e alçarem vôo às mais elevadas camadas do pensamento: à visão sobrenatural. Tanto mais que poucos meses restavam a Jesus para formá-los, antes de subir ao Pai, e era de fundamental importância tornar-lhes explícita a exata noção de quem era Aquele que os havia transformado em pescadores de homens. Por isso, pergunta aos Apóstolos: “E vós, quem dizeis que Eu sou?”
Pedro responderá em nome próprio, e não de todos, como afirmam certos autores. Esse detalhe se tornará patente através dos outros Evangelhos. Marcos omite alguns detalhes importantes, como o elogio feito por Jesus à declaração de Pedro, antes de constituí-lo como pedra fundamental de sua Igreja (cf. Mt 16, 17-19).
Quem comenta com precisão esta passagem é o Cardeal Goma: “Pedro se adianta à resposta dos outros, talvez por tê-los notado vacilantes na opinião a respeito de Jesus. A graça de Deus ilumina seu entendimento, e seu modo de ser impetuoso, ajudado por essa mesma graça, o faz ser o primei ro a proclamar a fé. Noutra ocasião, também tinha sido ele o único a elevar sua voz para falar de Jesus: ‘Respondeu Simão Pedro, e disse...’ (cf. Jo 6, 67-69).
“A definição que Pedro dá de Jesus é plena, precisa, enérgica: Tu és o Cristo, o Messias em pessoa, prometido aos judeus e ardentemente esperado por eles. Mais: Tu és o Filho de Deus! Não, como eram designados os santos, no sentido de uma relação moral de santidade ou por uma filiação adotiva, mas sim o Filho único de Deus, pela natureza divina, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Se o Apóstolo não tivesse entendido assim, não teria necessitado uma especial revelação de Deus. O que com imprecisão tinham insinuado os Apóstolos em outras ocasiões (cf. Mt 14, 33; Jo 1, 49) é afirmado por Pedro de forma clara e categórica. O Pai de Jesus é Deus vivo: vivo porque é vida essencial que essencialmente gera desde toda a eternidade um Filho vivo. Vivo por oposição às divindades mortas do paganismo.”
Jesus proíbe divulgar que Ele era o Messias
30 Então Jesus ordenou-lhes severamente que não dissessem isto d’Ele a ninguém. 
Em seguida a essa belíssima proclamação de fé realizada por Pedro, os três primeiros Evangelhos registram uma formal e categórica proibição de Jesus aos Apóstolos, de nada contarem a ninguém. Essa ordem de guardar silêncio não havia sido a primeira. Com certa freqüência, era imposta também a certos doentes ou possessos por Ele curados.
De um lado, até então não havia chegado o momento de divulgar revelações que o público ainda não estava suficientemente preparado para compreender. Os erros a propósito da figura do Messias eram substanciais e por demais naturalistas. Por muito menos, o povo já quisera proclamá-Lo Rei (cf. Jo 6,15), com todas as graves e inconvenientes conseqüências políticas que daí decorreriam. Quiçá, neste caso, não seria Ele preso e morto pelos próprios romanos? Ademais, bem poderia acontecer que os fariseus e o sinédrio se aproveitassem dessa circunstância para antecipar a execução de seu plano deicida.
Os próprios Apóstolos só estiveram preparados para pregar com toda eficácia sobre o Cristo, Deus e Homem verdadeiro, depois da descida do Espírito Santo sobre eles. Antes disso, os mesmos equívocos sobre a messianidade assumidos por todo o povo eleito eram compartilhados por eles e, por isso mesmo, muito provavelmente, em seu apostolado apresentariam de maneira defectiva a figura de Jesus. Assim, dado ser o mistério da Encarnação, por sua própria substância, tão insuperavelmente elevado, só mesmo o próprio Verbo de Deus poderia pregá-lo com a devida dignidade. Segundo decretos eternos, a divindade de Jesus devia estar selada pelo Preciosíssimo Sangue do Filho de Deus.

De outro lado, se essa revelação tivesse sido pública, a fé do povo, provavelmente débil, não resistiria à fortíssima prova da Paixão, tal qual se deu com os Apóstolos. Pregar sobre a divindade de um Homem que em breve seria crucificado entre dois ladrões não parecia ser fácil tarefa.
Texto extraído Revista Arautos set 2006