"Nosso Senhor, já quando menino, dava idéia de uma capacidade única, de alguém que ia conquistar o mundo. Por exemplo, na discussão d’Ele com os doutores, no Templo, mas, sobretudo, quando começou a vida pública, Ele deve ter causado um verdadeiro estupor, uma verdadeira admiração. Nosso Senhor era um homem que tinha poder sobre o vento, sobre os mares, sobre a doença, sobre o pão, sobre o peixe, sobre os demônios, etc. Portanto, era um homem feito para tomar conta de tudo. E os judeus pensavam: “Este homem, em certo momento, com os poderes que tem, levanta um exército e dá um golpe! Primeiro, nos separamos dos romanos e, depois, nos tornamos o primeiro povo da Terra.”
É por isso que o Evangelho de hoje narra:
Naquele tempo, enquanto Jesus subia para Jerusalém, ele tomou os doze discípulos à parte e, durante a caminhada, disse-lhes:18”Eis que estamos subindo para Jerusalém,…”[i]
Eles imaginavam que estavam indo para Jerusalém naquele momento para ser dado o golpe que seria um grande passo para a restauração política de Israel. A tal ponto que é nesta hora que a mãe de Tiago e João pede a colocação de seus filhos no reino.
E nós, que estamos nesta via, devemos nos lembrar desse sinal tão extraordinário que está diante de nós: a cruz. E não é só a cruz no que diz respeito ao sofrimento físico, mas é a cruz no que diz respeito à rejeição dos outros. E mais: é a rejeição dos bons, a rejeição dos iguais, a rejeição dos que são irmãos. Se Nosso Senhor Jesus Cristo tivesse sido crucificado como o foi, mas com o apoio inteiro da opinião pública, tendo sido morto por alguns bandidos, Ele teria morrido consolado. O grande drama d’Ele, o grande cálice foi a rejeição de toda a opinião pública. É terrível, custa sangue, mas é o que prepara depois a glória da ressurreição.
A mãe dos filhos de Zebedeu aproximou-se de Jesus com seus filhos e ajoelhou-se com a intenção de fazer um pedido. Jesus perguntou: “O que tu queres?” Ela respondeu: manda que estes meus dois filhos se sentem, no teu reio, um à tua direita e outro à tua esquerda”. Jesus, então, respondeu-lhes: “Não sabeis o que estais pedindo. Por acaso podeis beber o cálice que eu vou beber?" Eles responderam: “Podemos”.
É o que Nosso Senhor nos pergunta na liturgia de hoje: “Por acaso podeis beber o cálice que eu vou beber?” E nós devemos responder o que São João e São Tiago não responderam: “Desde que vós nos assistais com vossas forças, podemos, porque sem essas forças nós não conseguimos nada. Se Deus se afasta de nós, não fazemos mais nada!”.
Então, é preciso pedir forças para aceitar este cálice e beber dele. Mas, para beber deste cálice, é preciso que nós estejamos muito próximos de Deus, ou seja, que Deus esteja muito próximo de nós, porque só aí temos forças.
Quando os outros dez discípulos ouviram isso, ficaram irritados contra os dois irmãos. Jesus, porém, chamou-os e disse: “Vós sabeis que os chefes das nações têm poder sobre elas e os grandes as oprimem. Entre vós não deverá ser assim. Quem quiser tornar-se grande, torne-se vosso servidor; quem quiser ser o primeiro, seja vosso servo”.
Portanto, beber do cálice significa compreender que seguimos a Nosso Senhor não para receber apoio, nem aplausos, nem a sustentação no nosso instinto de sociabilidade; nós estamos aqui para servir.
“Pois o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate em favor de muitos”.
E nós devemos compreender que não viemos para receber louvores, gratidão, entusiasmo, aplauso, aprovação ou apoio, nós viemos para servir. E devemos rejeitar a idéia de que todos devem reconhecer aquilo que somos ou possuímos, pois isto é secundário. O que importa é ter oportunidade de servir, de fazer o bem, de ajudar os outros, sem o menor desejo de retribuição.
Onde está o sucesso humano? O sucesso humano está no cálice. Mas nem sempre esse sucesso humano se faz nesta Terra, é muito raro. O sucesso humano se faz post mortem e, portanto, a pessoa não realiza o esplendor daquilo que ela julga que vai obter na Terra. Ela terá o esplendor no Céu, que depois desce também sobre a Terra; mas o primeiro esplendor a ser conquistado é o Céu.
Portanto, nós precisamos pedir, nesta liturgia, a graça de beber do cálice do qual Nosso Senhor bebeu.
[i] Todas as citações bíblicas foram extraídas de “Liturgia Diária”, Paulus, março de 2006. Trecho adaptado para a linguagem escrita, sem revisão e conhecimento do autor.