CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 27º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A
III - NÓS TAMBÉM SOMOS VINHA DO SENHOR
Os comentários sobre
este Evangelho ficariam incompletos se limitássemos a sua aplicação àqueles que
planejaram a morte de Cristo, ou mesmo à humanidade em seu conjunto. Na
parábola dos vinhateiros homicidas cumpre encontrarmos uma lição para cada um
de nós, pois as palavras de Nosso Senhor ecoam para os homens de todas as
épocas históricas. Com efeito, a vinha de que fala a Liturgia pode ser considerada
a alma de todo católico, a quem Deus ama com predileção, a ponto de lhe dirigir
a pergunta: “O que poderia Eu ter feito a mais por minha vinha e não fiz?”.
Os dotes que
recebemos, desde o ser, a inteligência, a vontade, a sensibilidade, a vocação específica,
tudo nos é entregue pelo Senhor da vinha. Dentre estes favores, nenhum é digno
de maior apreço que a vida divina, como ensina São Rábano Mauro: “Em sentido
moral, a cada um se entrega sua vinha para que a cultive, ao ser-lhe administrado
o Sacramento do Batismo, a fim de que trabalhe por meio dele. E-lhe enviado um
servo, outro e um terceiro, quando a Lei, o Salmo e a profecia falam, e em virtude
de cujos ensinamentos deve-se agir bem. Mas o enviado é morto e lançado fora,
se despreza a sua pregação ou, o que é pior, se blasfema contra ele. Mata o
herdeiro que traz em si todo aquele que ultraja o Filho de Deus e ofende o
Espírito de sua graça. Uma vez perdido o mau cultivador, a vinha é entregue a outro,
como acontece com o dom da graça, que o soberbo menospreza e o humilde recolhe”.8
Deus vela sempre por
nós e, ao longo dos anos, nos trata com muito mais carinho, vigilância e amor
do que qualquer vinhateiro no que se refere à sua plantação. Ele vai preparando
as circunstâncias, atendendo, colocando anteparos para que os obstáculos não
nos façam cair. Em troca, o que espera de nós? Que sejamos uma videira que dê o
fruto excelente das obras de perfeição, do qual saia depois o bom vinho da
santidade. Por isso virá cobrar os frutos. Cabe-nos trabalhar para produzi-los,
conscientes de que tudo quanto possuímos tem sua origem n’Ele. Até mesmo a
força para praticar a virtude nos é incutida por Deus, como um dom que nos
permite adquirir méritos com vistas à nossa eterna salvação.
Um oportuno exame de consciência
Como cuido, então,
desta vinha que sou eu? Zelo por ela com todo o esmero e restituo a Deus o que
Lhe pertence? Estou constantemente com a atenção posta nas realidades sobre naturais,
com desejo de beneficiar o próximo, compenetrado de que fui chamado a dar
glória a Deus e reparar o Sapiencial e Imaculado Coração de Maria dos inúmeros
pecados que hoje se cometem? Estou atento à chegada dos empregados do Dono da vinha?
Uma palavra dita do púlpito, um conselho de alguém que busca a minha
santificação, uma admoestação da consciência... Mais ainda, os rogos de Nossa
Senhora e o amparo do meu Anjo da Guarda. O que eu faço a esses empregados?
Apedrejo-os, bato neles e os mato, sufocando sua voz? Pois se não quero de modo
algum entregar a Deus o que é d’Ele e uso de seus dons para o meu gozo pessoal
ou, pior, para ofendê-Lo, estou, no fundo, batendo, apedrejando, matando os empregados,
e até o Filho do Divino Dono. E indispensável precaver-me, porque o Reino dos Céus
que recebi no dia de meu Batismo poderá ser-me retirado e dado a outros.
Quanta matéria para
um exame de consciência! Como me encontro agora? Diante destas palavras, qual é
a minha reação? Estou me esquivando, desvio a atenção ou coloco-me diante da obrigação
de prestar contas pela vinha que sou eu? Se a consciência me acusar, devo
lembrar-me do ensinamento de São Paulo, na segunda leitura: “Não vos inquieteis
com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em orações e
súplicas, acompanhadas de ação de graças. E a paz de Deus, que ultrapassa todo
o entendimento, guardará os vossos corações e pensamento em Cristo Jesus” (Fi
4, 6-7). Graças à maternal intercessão de Maria Santíssima tudo tem solução,
desde que eu reconheça que procedi mal e preciso mudar de vida. Peçamos a Nossa
Senhora, então, misericórdia e forças para nos emendarmos e aderirmos com
entusiasmo à vontade do Dono da vinha.
1) Cf. GALLEGO, Epifanio. El movimiento profético.
Isaías. In: GONZÁLEZ, Angel et al. Comentarios a la
Biblia Litúrgica.Antiguo Testamento. 4.ed. Madrid-Barcelona-Estella: Paulinas;
PPC; Regina; Verbo Divino, 1990, p.615-616.
2) SÃO JOÃO CRISÓSTOMO. Homilía LXVIII, n.J. In: Obras. Homilías sobre el Evangelio de San Mateo (46-90). 2.ed.
Madrid: BAC, 2007, vII, p.387.
3) SÃO JERÔNIMO. Comentario a Mateo. L.III (16,13-22,40),
c.21, n.51. In: Obras Completas. Comentario a Mateo y otros escritos. Madrid: BAC, 2002, v.11, p.299.
4) AUTOR INCERTO. Opus imperfectum in Matthæum.
Homilia XL, c.21: MG 56, 854.
5) SÃO JERÔNIMO, op. cit., p.299.
6) Idem, p.301.
7) SAO JOAO CRISÓSTOMO, op. cit., n.2, p.390-391.
8) SÃO RÁBANO MAURO. Commentarionim in Matthæum.
L.VI, c.21: ML 107, 1053.