21 Começou a dizer-lhes: “Hoje se cumpriu este passo da Escritura que acabais de ouvir”.
Anteriormente ao trecho seleccionado para a Liturgia deste domingo, São Lucas relata a atuação do Divino Mestre na sinagoga de Nazaré, nesse dia de sábado. Depois das orações e da leitura de uma passagem da Torá, Jesus foi convidado a comentar um trecho de um dos profetas e, tendo aceitado, entregaram-Lhe o rolo de Isaías. Ao abri-lo, quando já estava no estrado, encontrou-se com as previsões messiânicas (61, 1ss). No Evangelho, sobre as palavras de Jesus, consta apenas essa frase (v. 21), mas, evidentemente, seu discurso foi muito mais extenso e rico em doutrina, como indica a afirmação contida no versículo seguinte: “E todos davam testemunho em seu favor, e admiravam-se das palavras de graça que saíam da sua boca”.
Sobre seu conteúdo nada se sabe, a não ser por revelações privadas, mas bem podemos imaginar quanto se tornava patente a realização plena daquelas profecias feitas havia tantos séculos. Ademais, a voz de Jesus, seu porte, seus gestos e atitudes deviam deixar transparecer a grandeza de sua missão redentora. Numa harmoniosa conjugação de extremos opostos, com uma insuperável ternura e um domínio todo feito de senhorio, por instantes dissolveu os mais sólidos preconceitos da platéia a seu respeito. Estava diante deles Aquele varão previsto pelas Escrituras, o suave e doce Salvador.
O Grande Milagre de Deus se realizava naquela sinagoga, e bem maior do que os efetuados em Cafarnaum.
Jesus insinua a messianidade
Entretanto, não é de crer que Jesus tenha feito uma revelação sobre sua messianidade de forma inteiramente explícita; caso contrário, bem se poderia deduzir quais reações teriam tido aqueles nazarenos atravessados por sentimentos de inveja. Ainda mais se considerarmos que conheciam suas origens familiares e ocupações laborais anteriores. Porém, seu objetivo, tal como nos ensina Maldonado, era o seguinte:
“A intenção de Jesus era comunicar-lhes que Ele era o verdadeiro Messias tão esperado por eles. Para isso lhes mostra ser Ele o homem do qual falara o profeta. Parece haver aqui uma espécie de repreensão implícita, como se dissesse: ‘Como esperais com tanto desejo o Messias e, tendo-O diante dos olhos, não quereis recebê-Lo? Para que procurá-Lo nos profetas se não quereis entender os próprios profetas, cujas leituras vos são feitas, nem as profecias que se cumprem à vossa vista?’” (2).
Todos podiam colher os benefícios
Fillion, com sua grande capacidade exegética e certos rasgos literários, faz-nos reviver a cena: “Lida essa passagem pausada e claramente, Jesus enrolou o pergaminho e o entregou ao encarregado. Sentou-se depois na cadeira do leitor, indicando desse modo sua disposição de falar para explicar o texto sagrado. Solene era o momento, e São Lucas o dá a entender admiravelmente, mostrando-nos fixos em Jesus todos os olhares. Impressionados de antemão, seus ouvintes perguntavam-se o que iria dizer, sobre um texto tão notável, aquele jovem cuja reputação de pregador e taumaturgo lhes tinha chegado, primeiro de Jerusalém e depois de Cafarnaum, embora até então Ele tivesse Se apresentado na pequena aldeia apenas sob as aparências de um modesto e pacífico artesão. Com que eloquência e piedade não deve ter comentado esse magnífico tema! Como gostaríamos de conhecer todo o seu discurso! Mas o Evangelista não nos conservou a não ser seu curtíssimo exórdio: ‘Hoje se cumpriu este passo da Escritura que acabais de ouvir’. Isto significava: ‘Eu mesmo sou o Messias redentor e consolador anunciado por Isaías’. Estava, pois, aberto ‘o ano de graça da parte do Senhor’, e todos podiam colher superabundantes benefícios” (3).
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