Em suas invectivas ao povo israelita, os profetas do Antigo Testamento eram instrumentos da misericórdia de Deus: seu objetivo era chamar o povo à conversão. De igual forma procederam os Papas ao longo dos séculos.
Há dois funestíssimos erros, que não raramente lavram entre os católicos e que, com extraordinária oportunidade, devem ser desmascarados na Semana Santa. Como frequentemente ocorre, esses erros não provêm propriamente de premissas falsas, mas de premissas incompletas. É uma visão parcial e estreita das coisas, que os provoca. E só uma meditação acurada, feita à luz de considerações naturais ou de argumentos inspirados em motivos sobrenaturais, pode pôr à luz o mau germe que neles se oculta.
Ineficiência da Igreja diante da crise?
O primeiro desses erros consiste em acoimar de ineficiente a ação da Igreja, para a solução da crise contemporânea. [...] E [dizem] que, portanto, é preciso apelar para uma outra organização, que, ela sim, salvará a civilização católica.
Argumentemos. E argumentemos só com a infalível autoridade dos Pontífices. Porque se para algum católico um argumento inspirado nas palavras dos Papas não for suficientemente convincente, é melhor que esse católico estude bem o seu Catecismo, antes de tentar “salvar a civilização”.
Diz o Santo Padre Leão XIII, e, depois dele, todos os Pontífices o têm repetido, [...] que essa crise moral gerou crises econômicas, sociais ou políticas. E só quando ela for resolvida, serão resolvidos os problemas relacionados com as finanças, a organização política e a vida social dos povos contemporâneos.
Por outro lado, a solução desse problema moral só pode estar na ação da Igreja, porque só o Catolicismo, armado de seus recursos sobrenaturais e naturais, tem o dom maravilhoso de produzir nas almas os frutos de virtude indispensáveis para que floresça a civilização católica.
O que acabamos de dizer é diretamente extraído das Encíclicas. Basta abri-las, para encontrar o que afirmamos. Como consequência, de duas uma: ou os Papas estão errados, ou devemos reconhecer que só o Catolicismo salvará o mundo da crise em que está mergulhado. Portanto, é inútil discutir se, no país A ou no país B, os católicos agiram ou não agiram bem. [...]
Se é verdade que só a Igreja pode remediar os males contemporâneos, é só nas fileiras da Igreja que devemos procurar lutar pela eliminação desses males. Pouco nos importa que outros não cumpram o seu dever. Cumpramos o nosso. E, depois de termos feito todo o possível — a palavra “todo” significa tudo, mas absolutamente tudo, e não apenas “um pouco” ou “muito” — resignemo-nos diante da avalanche que vem. Porque, ainda que pereça o mundo inteiro, ainda que a própria Igreja seja devastada pelos lobos da heresia, ela é imortal. Nadará sobre as águas revoltas do dilúvio. E é de dentro de seu seio sagrado que sairão depois da tempestade, como Noé da Arca, os homens que hão de fundar a civilização de amanhã.
Duas lições, para duas mentalidades erradas
Mas é aí que não querem chegar certos católicos. Como os [apóstolos antes de Pentecostes], eles só compreendem Cristo sobre um trono de glória. Eles só Lhe são fiéis nos dias parecidos com o Domingo de Ramos, quando a multidão O aclama e cobre o seu caminho com suas vestes. Porque, para eles, Cristo deve ser um Rei terreno. Deve dominar o mundo constantemente. E se, por algum tempo, a impiedade dos homens O reduzirem de Rei a Crucificado, de Soberano a Vítima, não mais querem saber d’Ele. [...]
No entanto, Cristo quis passar por todos os opróbrios, todos os vexames, todas as humilhações, mostrando que a História da Igreja também teria seus Calvários, suas humilhações, suas derrotas. E que muito mais meritória era e é a fidelidade no Gólgota do que no Tabor.
Foi para ensinar a gente assim que Nosso Senhor se submeteu a todas as humilhações, no Calvário. Entretanto, foi para ensinar gente diferente que Ele quis a glória do Domingo de Ramos.
Há gente de uma mentalidade detestável, que acha absolutamente natural que Cristo sofra, que a Igreja seja vexada, humilhada, perseguida. Gente comodista, “cujus Deus venter est” — “que têm por Deus o seu próprio ventre”, e que pensa que, como a Igreja deve imitar a Cristo, é natural que todos os [seus inimigos] se atirem contra ela e a façam sofrer. É a Paixão de Cristo que se repete, dizem eles. E enquanto essa Paixão se repete, eles levam sua vida farta e cômoda, nas orgias, nas imundícies, na exacerbação de todos os sentidos e na prática de todos os pecados.
Para gente como esta é que foi feito o látego com que foram expulsos os vendilhões do Templo.
Devemos estar sempre com a Igreja
Não é verdade que devamos cruzar os braços ante as investidas dos inimigos da Igreja. Não é verdade que devamos dormir enquanto se renova a Paixão. O próprio Cristo recomendou que seus Apóstolos orassem e vigiassem. E se devemos aceitar os sofrimentos da Igreja com a resignação com que Nossa Senhora aceitou os padecimentos de seu Filho, não é menos exato que será um motivo de [reprovação] para nós, se nos portarmos ante as dores do Salvador com a sonolência, a indiferença e a covardia de discípulos infiéis.
A verdade é esta: devemos estar sempre com a Igreja, “porque só ela tem palavras de vida eterna”. Se ela é atacada, lutemos por ela. Mas lutemos como mártires, até a efusão de nosso sangue, até o emprego de nosso último recurso de energia e de inteligência. Se, apesar disto tudo, ela continuar a ser oprimida, soframos com ela, como São João Evangelista aos pés da Cruz. E estejamos certos de que, neste mundo ou no outro, Jesus misericordioso não nos negará o esplêndido prêmio de assistirmos à sua glória divina e suprema.
O Legionário Plinio Correa de Oliveira
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