O Tempo do Advento compõe-se de quatro semanas, representando os séculos e milênios que esperou a humanidade pela vinda do Redentor. Nesse período, tudo na Liturgia se reveste de austeridade — omite-se o Glória, os paramentos são roxos e as flores não enfeitam mais o interior dos templos — para lembrar “nossa condição de peregrinos, ancorados ainda na esperança”, como afirma o famoso liturgista Manuel Garrido.6
A causa de estar dedicado o Evangelho deste primeiro domingo à segunda vinda de Nosso Senhor é assim explicada por Dom Maurice Landrieux, Bispo de Dijon: “A Igreja nos fala do fim do mundo, isto é, dos Novíssimos, para recordar-nos o sentido da vida, desapegar-nos do pecado e encorajar-nos à prática do bem. Deus nos criou para a vida eterna. Não temos morada permanente nesta terra: aqui estamos de passagem, a caminho do Céu”.7
Daí que, já no início da Celebração Eucarística, a Igreja faça esta oração: “Concedei aos Vossos fiéis o ardente desejo de possuir o Reino Celeste. Para que acorrendo com as nossas boas obras ao encontro do Cristo, que vem, sejamos reunidos à Sua direita na comunidade dos justos”.
Assim, nesta abertura de ano litúrgico, temos duas preparações: uma para comemorar dignamente o nascimento de Jesus em Belém; outra, para o grandioso ato de encerramento da História humana, que é o Juízo Final. Pois “a lembrança da última vinda de Nosso Senhor, inspirando-nos um salutar pavor que nos afasta do pecado e nos conduz ao bem, prepara-nos também para celebrar santamente a primeira vinda”.8
Na segunda e terceira semanas são considerados aspectos do Precursor; e na última a Liturgia trata de uma preparação mais direta para o nascimento do Redentor, considerando toda a espera e as orações de Nossa Senhora, dos patriarcas, dos profetas, como fatores que aceleraram a vinda do Messias à terra.
Jesus anuncia Sua Segunda vinda
25“Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas.Na terra as nações ficarão angustiadas com pavor do barulho do mar e das ondas. Os homens vão desmaiar de medo, só de pensar no que vai
acontecer ao mundo porque as forças do céu serão abaladas”.
São João Crisóstomo faz uma interessante consideração sobre estes versículos, ao dizer que Nosso Senhor indica aqui uma série de sinais prenunciadores do fim do mundo enquanto, em outras passagens, afirma que este virá num momento inesperado (cf. Mt 24, 42).9
Para explicar esta aparente contradição, levanta o Crisóstomo a hipótese de que nos últimos tempos haverá guerras e perseguições, mas em certo momento tudo entrará numa aparente tranquilidade em meio à desordem do pecado. Os bons ficarão reduzidos a presenciar impotentes todo tipo de abominações. Quando, porém, parecer evidente a todos o triunfo geral e definitivo do mal, dando a ideia de que Deus não existe, o Juiz Supremo Se apresentará inesperadamente para julgar os vivos e os mortos.10
Santo Agostinho, de sua parte, comenta que os fenômenos da natureza descritos nestes versículos “devem ser entendidos como se referindo à Igreja, pois esta é o sol, a lua e as estrelas; ela tem sido chamada de formosa como a lua, eleita como o sol, e não brilhará nessa época, devido à furiosa perseguição”.11
“Então eles verão o Filho do Homem vindo sobre uma nuvem com grande poder e glória.
Vejamos a bela relação que faz o Pe. Julien Thiriet entre este versículo e a primeira vinda do Senhor: “Eles verão o Filho do Homem vindo com grande poder e majestade. Ou seja, com força invencível, para confundir e castigar Seus inimigos, mas também com uma glória resplandecente, uma majestade divina, para recompensar e coroar Seus eleitos. Assim, depois de ter aparecido sob uma forma humilde e desprezível na Sua primeira vinda — ‘aniquilou-se a Si mesmo, assumindo a condição de escravo’ (Fl 2, 7) —, aparecerá na última vinda como poderoso Rei e soberano Senhor do Céu e da terra. Todos os homens verão em Seu Corpo as gloriosas cicatrizes de Suas chagas, e os pecadores, conforme disse o profeta Zacarias, reconhecerão Aquele que transpassaram”.12
O fato de Cristo vir sobre uma nuvem é relacionado pelo mesmo autor com o dia de Sua Ascensão: “As nuvens que Lhe serviram de carro triunfal para subir ao Céu, diz Orígenes, servir-Lhe-ão de trono quando Ele descer para julgar a terra”.13
Mais circunstanciado é o comentário de Santo Agostinho, que considera duas possíveis interpretações para esse pormenor:
“Pode-se entender isso em dois sentidos. Ele poderá vir à Igreja como sobre uma nuvem, como não cessa de vir agora, conforme diz a Escritura: ‘Vereis doravante o Filho do Homem sentar-Se à direita do Todo-Poderoso, e voltar sobre as nuvens do céu’ (Mt 26, 64). Mas virá então com grande poder e majestade, porque manifestará mais nos santos Seu poder e majestade divina, pois aumentou-lhes a fortaleza para não sucumbirem na perseguição. Pode-se entender também que venha em Seu Corpo, que está sentado à direita do Pai, no qual morreu, ressuscitou e subiu ao Céu, conforme está escrito nos Atos dos Apóstolos: ‘Dizendo isso, elevou-Se da terra à vista deles e uma nuvem O ocultou aos seus olhos’. E ali mesmo disseram os Anjos: ‘Voltará do mesmo modo que O vistes subir ao Céu’ (At 1, 9.11). Temos, pois, motivos para crer que virá, não só em Seu Corpo, mas também sobre uma nuvem; virá como Se foi, e ao ir-Se uma nuvem O ocultou. É difícil julgar qual dos dois sentidos é o melhor”.14
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