Comentários ao Evangelho XXIII
Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 14, 25-33
“Naquele tempo, 25
grandes multidões acompanhavam Jesus. Voltando-Se, Ele lhes disse: 26 ‘Se
alguém vem a Mim, mas não se desapega de seu pai e de sua mãe, sua mulher e
seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser
meu discípulo. 27 Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de Mim, não
pode ser Meu discípulo. 28 Com efeito: qual de vós, querendo construir uma
torre, não se senta primeiro e calcula os gastos, para ver se tem o suficiente
para terminar? Caso contrário 29 ele vai lançar o alicerce e não será capaz de
acabar. E todos os que virem isso começarão a caçoar, dizendo: 30 ‘Este homem
começou a construir e não foi capaz de acabar!’ 31 Ou ainda: Qual o rei que ao
sair para guerrear com outro, não se senta primeiro e examina bem se com dez
mil homens poderá enfrentar o outro que marcha contra ele com vinte mil? 32 Se
ele vê que não pode, enquanto o outro rei ainda está longe, envia mensageiros
para negociar as condições de paz. 33 Do mesmo modo, portanto, qualquer um de
vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser Meu discípulo!’” (Lc 14,
25-33).
Amarras e lastros na vida espiritual
Em junho de 1783, os irmãos
Joseph-Michel e Jacques-Étienne Montgolfier, filhos de um fabricante de papel
de Lyon, conseguiram fazer voar, perante os assombrados olhos dos seus
conterrâneos, um grande balão feito de linho, com 32 metros de circunferência.
Cheio de ar quente fornecido pela combustão de palha seca, a aparatosa invenção
elevou-se várias centenas de metros acima do solo e percorreu em dez minutos
uma distância de dois a três quilômetros. Três meses depois, repetiram com
êxito sua experiência no Parque de Versalhes, diante de Luís XVI, Maria
Antonieta e toda a corte da França.
Desde então, foi muito
aperfeiçoada a técnica de fabricação dos aeróstatos, mas o princípio de seu
funcionamento — baseado numa das mais elementares leis da Física — continua
inalterado: sendo mais leve, o ar quente tende a subir. Enquanto está sendo
enchido de ar, o balão fica preso ao solo por amarras. Em certo momento, são
elas soltas e o engenho inicia sua ascensão, sendo então preciso ir liberando
lastros gradativamente para ele poder atingir uma altura maior.
Esta é uma bela imagem da
elevação das almas a Deus. “Aquecidas” pela prática das virtudes, especialmente
da caridade, iniciam elas a subida espiritual e começam a “voar”. Costuma
haver, porém, em consequência do pecado, amarras que as prendem à terra e
lastros que dificultam seu itinerário rumo à perfeição. É imperioso, portanto,
cortar aquelas e alijar estes, para o espírito humano poder elevar-se ao
transcendente e ao eterno. À semelhança de nosso corpo, padecem as almas dos
danosos efeitos de uma espécie de lei da gravidade espiritual por onde nos
sentimos atraídos para o mais baixo, o mais trivial, o que nos exige menos
esforço.
Até para as pessoas consagradas
existem amarras e lastros, por vezes mais difíceis de soltar do que os dos
simples fiéis. Se os religiosos não corresponderem ao convite da graça para
viver num patamar mais elevado, poderão sentir uma como que vertigem por onde
tenderão a se apegar com especial veemência ao que é terreno.
Para ajudar a vencer esses
entraves nas instituições religiosas, tem o Espírito Santo suscitado, ao longo
dos tempos, as mais diversas formas de espiritualidade que intensificam o
desapego dos bens passageiros. Algumas nos causam espanto por sua radicalidade.
Por exemplo, a Ordem dos Clérigos Regulares Teatinos vive de esmolas, como
tantas outras, mas seus membros não podem pedi-las: devem esperar que elas lhes
sejam oferecidas espontaneamente!1
Em vista dessa nossa má
tendência, Cristo nos ensina serem indispensáveis a renúncia e a abnegação,
para sermos verdadeiros discípulos Seus.
Odiar o pai e a mãe?
“Naquele tempo, 25 grandes multidões acompanhavam Jesus.
Voltando-Se, Ele lhes disse:”.
No início de Sua pregação,
apenas alguns iam atrás do Divino Mestre, mas, em pouco tempo, o número dos
Seus seguidores foi crescendo até formar um público considerável. A esta altura
do Evangelho de São Lucas, quando Ele Se encaminha pela última vez a Jerusalém,
já se pode dizer que “grandes multidões acompanhavam Jesus”.
Entretanto, nem todos poderiam
ser chamados propriamente Seus discípulos. Como sublinha o Cardeal Gomá,
aquelas multidões seguiam Nosso Senhor “movidas talvez por pensamentos
demasiado humanos, pressagiando quiçá a glória temporal do Reino Messiânico”.2
Foi esse o motivo que levou
Jesus a voltar-Se para eles a fim de ensinar-lhes — e também a nós — o
verdadeiro significado do Reino dos Céus e as condições para alcançá-lo.
Jesus deve ser amado com um amor perfeitíssimo
26 “Se alguém vem a Mim, mas não se desapega de seu pai e
de sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs, e até da sua
própria vida, não pode ser Meu discípulo”.
Continua no próximo post
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