Comentário
ao Evangelho – 4º Domingo do Advento - Ano A – 2013 – Mt 1, 18-24
Mons.
João Scognamiglio Clá Dias, EP
Evangelho
- Mt 1, 18-24
18 “A origem de Jesus Cristo foi assim:
Maria, sua Mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos,
Ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo. 19 José, seu marido, era justo
e, não querendo denunciá-La, resolveu abandonar Maria em segredo. 20 Enquanto
José pensava nisso, eis que o anjo do Senhor apareceu-lhe, em sonho, e lhe
disse: ‘José, filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa,
porque Ela concebeu pela ação do Espírito Santo. 21 Ela dará à luz um filho, e
tu lhe darás o nome de Jesus, pois Ele vai salvar o seu povo dos seus pecados’.
22 Tudo isso aconteceu para se cumprir o que o Senhor havia dito pelo profeta:
23 ‘Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo
nome de Emanuel, o que significa: Deus está conosco’. 24 Quando acordou, José
fez conforme o anjo do Senhor havia mandado e aceitou sua esposa” (Mt 1,
18-24).
Dois
silêncios que mudaram a História
Duas
criaturas puramente humanas intervêm no mais grandioso acontecimento da
História: a Encarnação do Verbo. Diante do silêncio de Maria face à realização
n’Ela desse sublime Mistério, São José atravessa uma provação terrível e
lancinante. E pratica, também em silêncio, um dos maiores atos de virtude
jamais realizados sobre a Terra.
Dois silêncios se
entrecruzam
Com
breves e inspiradas palavras, narra-nos São Mateus o mais grandioso
acontecimento da História, a Encarnação do Verbo, e os episódios subsequentes.
À
primeira vista, a singela descrição do Evangelista pode-nos causar a impressão
de que tudo transcorreu de modo suave e aprazível, não havendo lugar para
qualquer sofrimento e menos ainda para a terrível provação que levou São José à
extrema decisão de “abandonar Maria em segredo”.
Tanto
nesta passagem do Evangelho quanto na de São Lucas que, com igual simplicidade,
narra a Anunciação do anjo a Maria (cf. Lc 1, 26-38), deparamo-nos com
realidades situadas no mais alto plano da Criação, acessíveis à nossa
inteligência somente pela luz da Fé, que nos faz vislumbrar os grandes
mistérios da graça e da glória.
Conforme
revela o anjo, Maria será Mãe por obra do Espírito Santo, sem concurso humano.
Precisamente por esse motivo, dir-se-ia ser São José na Sagrada Família um mero
complemento destinado a fazer o papel de pai apenas para efeitos civis e de
opinião pública. Sua função seria, então, quiçá dispensável, no plano da
Encarnação do Verbo e, portanto, na Redenção do gênero humano.
Sem
embargo, uma consideração mais aprofundada do Evangelho proposto para este 4º
Domingo do Advento nos revelará atraentes verdades a respeito deste varão
incomparável, pai adotivo de Jesus e esposo da Virgem Imaculada.
Após a Encarnação, Maria
guarda silêncio
18 “A origem de Jesus Cristo foi assim:
Maria, sua Mãe, estava prometida em casamento a José e, antes de viverem
juntos, Ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo”.
De
acordo com o direito judaico da época, o matrimônio entre israelitas era
constituído por dois atos distintos aos quais poderíamos chamar de esponsais e
núpcias.
Antes
do casamento, os pais dos nubentes redigiam o contrato matrimonial, onde
constavam os bens que cada parte entregaria para formar o patrimônio da nova
família. Bem estabelecido esse ponto, realizava-se uma cerimônia, diante de
testemunhas, na qual o noivo entregava simbolicamente à noiva um objeto de
valor. Com esse gesto ficava selado o compromisso, tornando-se os contraentes
marido e mulher, pois os esponsais judaicos “constituíam verdadeiro contrato
matrimonial”.1
Embora
a partir desse momento fosse permitido ao casal morar sob o mesmo teto, era
costume esperar até as núpcias, que seriam celebradas algum tempo depois,
durante as quais o esposo conduzia solenemente a esposa à sua casa, entre
festas e manifestações de júbilo.
Assim,
ao afirmar que Maria “estava prometida em casamento a José e, antes de viverem
juntos, Ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo”, o Evangelista situa o
momento da Encarnação do Verbo no período posterior à cerimônia do compromisso,
mas antes de Maria ir habitar na casa do esposo.
É
nesse intervalo que a Mãe de Deus, acompanhada por José, empreende a viagem à
casa de sua prima. Ainda não eram visíveis os sinais da gravidez de Maria; e
quando Isabel glorificou-Lhe a maternidade divina, proclamando-A
bem-aventurada, falou sob inspiração do Espírito Santo.
A
solene saudação da prima não perturbou nem surpreendeu a Virgem Maria; mas,
exímia na prática da humildade, esforça-Se em elevar a atenção até Deus,
proclamando no Magnificat as grandes maravilhas feitas n’Ela pelo Altíssimo.
Nada diz da aparição do Arcanjo Gabriel, nem sequer anuncia a maior novidade de
todos os tempos: a chegada do Redentor!
Pareceria
compreensível que Ela convidasse parentes e amigos para se unirem em orações de
preparação e de ação de graças, durante os nove meses de espera do nascimento
do Messias. Entretanto, Maria guarda completo silêncio sobre aquele mistério
inefável, até com o próprio esposo, pois nenhuma ordem recebera de Deus em
sentido contrário. Revela, assim, uma excelsa submissão e docilidade aos
desígnios da Providência.
O esposo de Nossa Senhora
era justo
19ª “José, seu marido, era justo...”.
São
José era justo, frisa o Evangelista. E diante dessa Virgem que lhe fora dada
como esposa, cuja virtude deixou surpresos até os anjos,2 tomou uma atitude
humilde e admirativa.
Pode-se
conjecturar que, à medida que melhor A ia conhecendo, crescia seu enlevo por
Ela. Percebia a indignidade de qualquer homem, por mais virtuoso que fosse,
para ser esposo daquela Virgem angelicalmente pura, que não padecia da fames
peccati, a inclinação para o mal presente em todos os seres humanos.
Certamente,
admirava-se de ver como tudo Ela fazia de maneira perfeita: desde um simples
movimento de mão ou um rápido olhar, até a forma de pronunciar as palavras com
o mais harmonioso dos timbres de voz; o modo incomparavelmente afável de
acolher os outros ou o recolhimento com que rezava. A cada dia devia aumentar
sua convicção de estar em total desproporção com aquela Virgem Santíssima que a
Providência lhe outorgara por esposa.
Ora,
alguns meses depois, quando São José foi buscar Nossa Senhora na casa de Santa
Isabel, eram visíveis os sinais da gestação do Menino Jesus. Contudo, Ela nada
lhe disse... E ele nada perguntou...
Uma
coisa era certa: como afirma um famoso mariólogo, “ele bem sabia como era
admirável a virtude de Maria, e, apesar da evidência exterior dos fatos, não
conseguia acreditar ser Ela culpada”.3
A
santidade da Virgem Maria era inquestionável e afastava qualquer suspeita da
mente do Santo Patriarca. Todavia, também evidente e inexplicável era a
realidade. Compreendeu, então, que se deparava com um mistério e, não
diminuindo em nada sua admiração pela Virgem das Virgens, aceitou sem reparos
os desígnios divinos que não alcançava a entender. A virtude ímpar de sua
Esposa falava mais alto do que aquela situação incompreensível, como canta com
inspiradas palavras São João Crisóstomo: “Ó inestimável louvor de Maria! Acreditava
São José mais na castidade de sua Esposa do que naquilo que seus olhos viam,
mais na graça que na natureza: percebia claramente que Ela era Mãe, e não podia
crer que fosse adúltera; julgou ser mais possível uma mulher conceber sem
concurso de varão do que Maria poder pecar”.4
Não
há dúvida de que São José, diante do mistério da milagrosa Encarnação do Verbo,
proclama um verdadeiro “fiat!”. Pois, sem deixar-se levar por uma visualização
humana, e confiando inteiramente na virtude da Mãe de Deus, põe-se docilmente
nas mãos da Providência: “Faça-se aquilo que Vós quereis, embora eu não chegue
a compreendê-lo!”.
Continua no próximo post
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