CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA
O retorno de Jesus a Betânia (vv.
1-16)
Para
tornar bem claro quem era o enfermo em questão, São João o apresenta como sendo
o irmão de Marta e Maria. Ressalta a figura desta última por se tratar de uma
pessoa muito conhecida e comentada em toda Israel, devido à sua impressionante
conversão e seu belíssimo ato de arrependimento em casa de Simão, o fariseu
(3). É interessante notar o acerto do nome “Lázaro” que significa: “ajudado”,
ou, “Deus socorreu”.
Fazia
muito que Jesus pregava na região da Peréia, à distância de uma jornada de
Betânia. Com enorme solicitude e carinho por Lázaro, tal qual costumam ser as
irmãs quando de boa índole, Marta e Maria enviam um mensageiro para avisá-lo do
estado de saúde do irmão.
Transparece
na atitude de ambas um profundo espírito de fé na onipotência do Salvador e, ao
mesmo tempo, uma nobre e fraternal dedicação. Tanto mais que a mensagem não era
só informativa mas, com enorme polidez, ela continha uma súplica. A fórmula
empregada nada tem a ver com a lógica argumentação do centurião romano para
obter a cura de seu servo; mais se aproxima ela, em sua essência, da atitude da
Virgem Maria nas Bodas de Caná: “Senhor, aquele que amas está doente” (v. 3).
Segundo Santo Agostinho, esta simples frase contém uma profunda verdade de fé:
Deus jamais abandona aquele a quem ama. Elas não imploram nem pedem
explicitamente a cura, quer pudesse ser ela operada de perto, ou de longe;
era-Lhe suficiente conhecer o estado de seu amado para, por um simples desejo
seu, tornar efetivo o milagre.
E
realmente assim teria sido se Jesus não tivesse querido se aproveitar do
pretexto da morte de seu amigo “para a glória de Deus, a fim de que o Filho do
Homem seja glorificado” (v. 4), conforme Ele próprio o afirma.
Grande
perplexidade devem ter tido ambas, ao receberem a resposta do Senhor, dois dias
depois do falecimento de Lázaro: “Esta doença não é de morte...” (v. 4). Maior
aflição ainda deveuse ao fato de Jesus não se ter movido para se encontrar com
o amigo nem com suas irmãs.
Essa é
bem a provação pela qual passam as almas aflitas que imploram a intervenção de
Deus e julgam não serem atendidas, devido à demora ou a uma aparente inércia da
parte do Céu. Quão benfazeja é esta passagem para nos convencer a jamais
descrermos da onipotência da oração perfeita! Quando Deus tarda em intervir é
por razões mais altas e porque certamente nos dará com superabundância. E aí
está o procedimento de Jesus para com aqueles aos quais ama: “Jesus amava
Marta, sua irmã Maria e Lázaro” (v. 5). O grande amor de Jesus àquela família
tornava ainda mais incompreensível sua como que indiferença, pois, “tendo
ouvido que Lázaro estava doente, ficou ainda dois dias no lugar onde se
encontrava” (v. 6).
Que
grande vôo de espírito era necessário para seguir o Divino Mestre diante da
incompreensibilidade de suas atitudes! Nenhum dos dois lados chegava a atinar
com o alcance da meta política do Salvador. As irmãs deviam estar desmontadas
em suas esperanças, acompanhando do lado de fora do sepulcro a lenta mas
progressiva decomposição do corpo de seu irmão. Os Apóstolos, por sua vez, não
podiam entender o porquê da ida de Nosso Senhor à Judéia. Já havia curado
tantos necessitados à distância, qual a razão de penetrar numa terra onde era
perseguido de morte? E só por causa de um enfermo? “Mestre, ainda há pouco os
judeus Te quiseram apedrejar, e Tu vais novamente para lá?” (v. 8), diziam eles.
Não seria melhor operar o milagre à distância?
A
perspectiva psicossocial na qual os discípulos procuravam delinear a figura do
Messias era essencialmente diferente da realidade que se desenrolava diante dos
olhos de todos. Neles se encontrava uma constante do espírito humano, a de
querer reduzir as ações de Deus às proporções de nossa mentalidade e até mesmo
de nossos desejos, sentimentos e emoções. Ora, os princípios pelos quais Deus
se move sempre são infinitamente superiores aos atinentes às meras criaturas,
por isso nada melhor do que nos abandonarmos aos desígnios e ao beneplácito de
sua vontade, nunc et semper.
Segundo
nossos critérios, talvez fosse preferível que Jesus expusesse seu plano com
total clareza aos Apóstolos para assim retornarem à Judéia com maior confiança,
paz e decisão. Pelo contrário, Jesus lhes responde com uma parábola: durante as
doze horas do dia, pode-se caminhar sem tropeço, diz Nosso Senhor, bem ao
contrário das outras doze da noite. Tratava-se de uma afirmação óbvia, mas
trazendo em suas entrelinhas algum significado mais profundo, ou seja, não
havia chegado ainda o momento de sua Paixão, portanto não era de se temer
nenhum mal. Assim, de forma didática e suave, ia instruindo os Apóstolos sobre
os passos a serem dados, exercitando-os na plena confiança que deveriam devotar
a seu Divino Mestre.
Continua no próximo post
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