Continuação dos comentários ao Evangelho 22º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 16, 21-27
Pergunta feita com divina didática
Depois de ter
convivido alguns anos com os Apóstolos, durante os quais atestara sua divindade
por meio de inumeráveis milagres, pergunta-lhes Jesus: “No dizer do povo, quem
é o Filho do Homem?” (Mt 16, 13). Embora soubesse a resposta desde toda a
eternidade, desejava formar seus discípulos, fazendo-os deduzir por si mesmos o
cumprimento das profecias a respeito do Messias.
A essa pergunta, cada
qual relata o que ouvira dizer. Para alguns, seria Ele João Batista
ressuscitado, como suspeitara até o próprio Herodes. Hipótese, aliás, absurda,
pois muitos haviam testemunhado o encontro de Jesus com o Batista, às margens
do Jordão. Julgavam outros ser Elias, conforme a crença muito arraigada entre
os judeus, de uma vinda do Tesbita precedendo o Messias. Outros, enfim,
opinavam tratar-se de Jeremias ou algum dos numerosos profetas enviados pelo
Senhor ao povo eleito. De qualquer forma, vê-se pelo teor das respostas ser Ele
considerado um homem extraordinário pelos judeus, dos maiores que Israel jamais
conhecera.
Em seguida, o Divino
Mestre inquire o parecer dos Apóstolos, visando fazer partir deles próprios o
reconhecimento da sua divindade e vincando assim sua separação do resto do povo
hebreu descrente. O próprio tom da pergunta — “E vós, quem dizeis que Eu sou?
(Mt 16, 15) — convida-os a formarem “uma opinião mais elevada a respeito d’Ele,
sem se rebaixarem a seguir o julgamento da multidão”.2
Essa divina didática
deu ocasião à proclamação de Fé de Pedro, representando todos os Apóstolos, de
maneira a aprofundar neles a convicção de ser Jesus, de fato, o Messias
prometido. Precisavam eles ter essa certeza bem arraigada na alma, à vista das
provações que deveriam enfrentar em breve.
O prêmio da proclamação de Fé feita por Pedro
Ao afirmar ser Nosso
Senhor o Filho de Deus vivo (cf. Mt 16, 16), recebeu Simão, o filho de Jonas,
esta admirável resposta: “Não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas
meu Pai que está nos Céus” (Mt 16, 17). Pois é impossível ao homem, por si,
chegar ao conhecimento do maravilhoso mistério da união hipostática.
O prêmio dessa
proclamação de Fé foi a solene consagração recebida: “Tu és Pedro, e sobre esta
pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra
ela” (Mt 16, 18). Ficou assim constituído Príncipe dos Apóstolos, o Chefe e a
pedra basilar da Igreja de Cristo.
É esse mesmo Pedro, o
único Papa nomeado diretamente por Cristo, quem vai protagonizar o episódio do
Evangelho hoje comentado.
II – Anúncio da Paixão e reação dos Apóstolos
“Naquele tempo 21
Jesus começou a mostrar a seus discípulos que devia ir a Jerusalém e sofrer
muito da parte dos anciãos, dos sumos sacerdotes e dos mestres da Lei, e que
devia ser morto e ressuscitar no terceiro dia”.
Aproximava-se a
Páscoa. Conviviam os apóstolos havia alguns anos com um Taumaturgo
extraordinário que ensinava uma doutrina nova, oposta às ideias correntes tanto
nos povos pagãos quanto entre a maior parte dos judeus, e em tudo manifestava
uma superioridade ao mesmo tempo atraente e intrigante, cercada de misteriosa
aura.
Com o tempo, foram os
olhos dos discípulos gradualmente se abrindo, à medida que se aprofundavam no
conhecimento e cresciam na admiração ao Mestre, até o dia em que a graça lhes
mostrou tratar-se do próprio Deus encarnado. Provavelmente essa realidade foi
se tornando clara para cada um em distintas ocasiões, de modo talvez
relacionado com a respectiva luz primordial.3 Ora tal milagre, ora tal palavra
ou tal gesto de Jesus representava para este ou aquele a gota que fazia o coração
transbordar de amor.
A proclamação de
Pedro, bem podemos conjecturar, viera acompanhada de inusitadas graças
sensíveis, criando entre os discípulos um ambiente de muita alegria e
consolação espiritual, fazendo-os compreender o sublime momento que viviam. E
Nosso Senhor aproveita a oportunidade para anunciar-lhes de modo explícito a
sua Paixão: em Jerusalém Ele sofreria muito “da parte dos anciãos, dos sumos
sacerdotes e dos mestres da Lei”, seria morto, mas ressuscitaria ao terceiro
dia.
Continua no próximo post
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