Comentário ao Evangelho – 28º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 22, 1-14
Implacabilidade da própria consciência do pecador
12b “Mas o homem nada respondeu”.
“O homem nada
respondeu”, porque o Juízo de Deus é justíssimo e irrecorrível. Pergunta, a
esse propósito, Santo Afonso Maria de Ligório: “Que responderá o pecador em
presença de Jesus Cristo? Ou melhor, que poderá responder ao ver-se culpado de
tantos crimes? Calar-se-á confuso, como se calava o homem referido no Evangelho
de São Mateus, encontrado sem o traje de bodas: ‘Ele não abriu os lábios’. Seus
próprios pecados taparam-lhe a boca [...] Concluamos, portanto, com toda razão,
que a alma ré de pecado, ao sair da vida e antes de ouvir a sentença,
condena-se ela mesma ao inferno”.16
Com efeito,
ensina-nos a Doutrina Católica que na hora do Juízo particular a própria
consciência acusa a pessoa: “É pela recusa da graça nesta vida que cada um já
se julga a si mesmo, recebe de acordo com suas obras e pode até condenar-se
para a eternidade ao recusar o Espírito de amor”.17
A sentença de Deus é
uma confirmação do julgamento feito pela própria consciência. Em suas pregações
a respeito do dia do Juízo, Santo Antonio Maria Claret comenta: “Postar-se-ão
diante do réu pecador todos os seus pecados, provando-lhe e convencendo-o que
são de fato dele, e confundindo-o com esse conhecimento. [...] Cada um dos
pecados cometidos se mostrará ali como numa tela, com toda
a sua gravidade, não de maneira confusa, mas com toda a clareza [...]. Oh!
consciência, consciência! Quem não treme ante tua espantosa acusação?”.18
13 Então o rei disse aos que serviam: ‘Amarrai os pés e
as mãos desse homem e jogai-o fora, na escuridão! Ali haverá choro e ranger de
dentes’”.
Transparecem mais
ainda, neste trecho do Evangelho, a majestosa grandeza e a implacável justiça
divina. O homem que estava sem veste nupcial é jogado nas trevas exteriores, as
quais figuram, segundo expressão de São Gregório Magno, a “noite eterna da
condenação”.19
Na hora em que o rei
entrar no banquete — ou seja, na hora do Juízo —, quem estiver em estado de
pecado mortal será lançado no fogo do inferno, de mãos e pés amarrados; e ali
haverá choro e ranger de dentes por toda a eternidade.
Nem todos aceitam o convite
14 “Porque muitos são chamados, e poucos são escolhidos”.
Todos são chamados a
fazer parte do banquete espiritual e receber o Rei eterno com a veste própria
da festa nupcial. Pois “Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao
conhecimento da verdade” (I Tim 2, 4), ensina o Apóstolo. Entretanto, poucos
são os escolhidos.
Nosso Senhor morreu
na Cruz para abrir a todos os homens as portas do Reino dos Céus. Mas,
infelizmente, nem todos aceitam o convite.
III – Esperança no Reino de Maria
O chamado feito por
Jesus nesta rica parábola continua ecoando hoje nas encruzilhadas dos caminhos,
para os bons e para os maus, conclamando a uma atitude de retidão e vigilância.
Porém, jamais poderemos estar com a alma inteiramente pronta na expectativa da
grande festa que vai se dar sem praticarmos a virtude teologal da Esperança,
tão importante quanto as da caridade e da fé.
Nascemos para a
eternidade e devemos ter os olhos postos nesse último objetivo que é o Céu.
Mas, o homem vive no tempo. Deus, então, para alimentar nossa Esperança nesta
vida nos coloca diante de perspectivas mais ou menos próximas, que remetem
depois para a eternidade.
De fato, hoje a
Providência quer que vivamos em função da esperança do banquete para o qual
Deus vem atraindo insistentemente a humanidade: o triunfo do Imaculado Coração
de Maria predito em Fátima.
Como será possível
transformar nossa atual quadra histórica, tão afastada de Deus, no esplendor do
Reino de Maria em que, segundo o grande São Luís Maria Grignion de Montfort,
“as almas respirarão Maria como o corpo respira o ar?”.20 Sem dúvida, pela
oração e pela penitência, tão reiteradas vezes pedidas por Nossa Senhora, há de
se operar uma verdadeira mudança dos corações.
Todavia, não devemos
imaginar que tal renovação possa se efetuar num ato instantâneo, mas sim
processivamente, por onde, quer as almas inocentes, quer aquelas que recebem, por
especial graça, a restauração da inocência perdida, vão aos poucos constituindo
uma nova era.
Assim como por
ocasião da festa do casamento do Filho de Deus com a humanidade, em relação ao
banquete do Reino de Maria não podemos alegar as ocupações que nos prendem ao
mundo. E muito menos agredir a quem no-lo anuncia, neste caso, a própria
Santíssima Virgem, que em Fátima nos chamou a seguir seus caminhos. Temos de
aceitar essa solicitação que, mais do que um simples convite, é uma imposição,
porque vem de Alguém infinitamente superior a qualquer rei da Antiguidade, o
próprio Deus.
Estejamos sempre
atentos à Palavra de Deus que nos convida ao banquete, e prestemos ouvidos à
voz da consciência a nos advertir interiormente, a fim de não mancharmos a bela
veste nupcial da vida da graça, para podermos entrar no festim eterno da visão
beatífica onde, juntamente com Maria Santíssima, o próprio Deus será a nossa
recompensa demasiadamente grande (cf. Gn 15,1).
1 BENTO XVI. Jesus de
Nazaré – Do batismo no Jordão à Transfiguração. São Paulo: Planeta, 2007, p.58.
2 LÉON-DUFOUR, SJ,
Xavier. Vocabulario de Teología Bíblica. Barcelona: Herder, 1965, p.570. Ver,
no mesmo sentido: SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica, III, q.42, a.3, resp.
3 SÃO GREGÓRIO MAGNO,
Homiliarum in Evangelia. 38, c.3.
4 FILLION, Louis-Claude. La Sainte Bible commentée. Paris: Letouzey et Ané, 1912, t.VII, p.143-144.
5 GOMA Y TOMÁS, Isidro. El Evangelio explicado.
Barcelona: Rafael Casulleras, 1930, v.IV, p.47.
6 Cf. SANTO
AGOSTINHO. De Civitate Dei, l.XIV, c.28.
7 SÃO REMÍGIO, apud
SÃO TOMÁS DE AQUINO. Catena Aurea – Expositio in Matthaeum. c.22, l.1.
8 ORBE, SJ, Antonio. Parábolas Evangélicas en San
Ireneo. Madrid: BAC, 1972, v.II, p.282.
9 GOMÁ Y TOMÁS, op. cit., p.48.
10 SANTO HILÁRIO. Commentarius in
Matthaeum, 22, c.7
11 SÃO JERÔNIMO, apud
SÃO TOMÁS DE AQUINO, Catena Aurea, ibidem.
12 Idem, ibidem.
13 SÃO GREGÓRIO
MAGNO, op. cit., 38, c.9.
14 MALDONADO, SJ, Juan de. Comentarios a los cuatro
Evangelios – San Mateo. Madrid: BAC, 1960, v.I, p.765766.
15 SÃO GREGÓRIO
MAGNO, op. cit., 38, c.7.
16 SANTO AFONSO MARIA
DE LIGÓRIO. Obras Ascéticas. Madrid: BAC, 1954, v.II, p.648-649.
17 CIC 679. S
18 ANTO ANTÔNIO MARIA
CLARET. Sermones de
Misión. Barcelona: Librería Religiosa, 1864, v.II, p.47.
19 SÃO GREGÓRIO
MAGNO, op. cit., 38, c.13.
SÃO LUÍS GRIGNION DE
MONTFORT. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, n.217.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Escreva seus comentarios e sugerencias