Comentários ao Evangelho 24º Domingo do Tempo Comum – Ano C - Lc
15, 1-32
"Naquele tempo, 1 os publicanos e pecadores aproximavam-se de
Jesus para O escutar. 2 Os fariseus, porém, e os mestres da Lei criticavam
Jesus. ‘Este homem acolhe os pecadores e faz refeição com eles'. 3 Então Jesus
contou-lhes esta parábola: 4 ‘Se um de vós tem cem ovelhas e perde uma,
não deixa as noventa e nove no deserto, e vai atrás daquela que se perdeu, até
encontrá-la? 5 Quando a encontra, coloca-a nos ombros com alegria, 6 e,
chegando a casa, reúne os amigos e vizinhos, e diz: ‘Alegrai-vos comigo! Encontrei
a minha ovelha que estava perdida!'. 7 Eu vos digo: Assim haverá no céu mais
alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove
justos que não precisam de conversão. 8 E se uma mulher tem dez moedas de prata
e perde uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e a procura cuidadosamente,
até encontrá--la? 9 Quando a encontra, reúne as amigas e vizinhas, e diz:
‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a moeda que tinha perdido!'. 10 Por isso, eu vos
digo, haverá alegria entre os Anjos de Deus por um só pecador que se converte'.
11 E Jesus continuou: ‘Um homem tinha dois filhos. 12 O filho mais novo disse
ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança que me cabe'. E o pai dividiu os bens
entre eles. 13 Poucos dias depois, o filho mais novo juntou o que era seu e
partiu para um lugar distante. E ali esbanjou tudo numa vida desenfreada. 14
Quando tinha gasto tudo o que possuía, houve uma grande fome naquela região, e
ele começou a passar necessidade. 15 Então foi pedir trabalho a um homem do
lugar, que o mandou para seu campo cuidar dos porcos. 16 O rapaz queria
matar a fome com a comida que os porcos comiam, mas nem isto lhe davam. 17
Então caiu em si e disse: ‘Quantos empregados do meu pai têm pão com fartura, e
eu aqui, morrendo de fome. 18 Vou-me embora, vou voltar para meu pai e
dizer-lhe: Pai, pequei contra Deus e contra ti; 19 já não mereço ser chamado
teu filho. Trata-me como a um dos teus empregados'. 20 Então ele partiu e
voltou para seu pai. Quando ainda estava longe, seu pai o avistou e sentiu compaixão.
Correu-lhe ao encontro, abraçou-o e cobriu-o de beijos. 21 O filho, então, lhe
disse: ‘Pai, pequei contra Deus e contra ti. Já não mereço ser chamado teu
filho'. 22 Mas o pai disse aos empregados: ‘Trazei depressa a melhor túnica
para vestir meu filho. E colocai um anel no seu dedo e sandálias nos pés. 23
Trazei um novilho gordo e matai- -o. Vamos fazer um banquete. 24 Porque este
meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado'. E
começaram a festa. 25 O filho mais velho estava no campo. Ao voltar, já perto
de casa, ouviu música e barulho de dança. 26 Então chamou um dos criados e
perguntou o que estava acontecendo. 27 O criado respondeu: ‘É teu irmão que
voltou. Teu pai matou um novilho gordo, porque o recuperou com saúde'. 28 Mas
ele ficou com raiva e não queria entrar. O pai, saindo, insistia com ele. 29
Ele, porém, respondeu ao pai: ‘Eu trabalho para ti há tantos anos, jamais
desobedeci a qualquer ordem tua. E tu nunca me deste um cabrito para eu
festejar com meus amigos. 30 Quando chegou esse teu filho, que esbanjou
teus bens com prostitutas, matas para ele o novilho cevado'. 31 Então o pai lhe
disse: ‘Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. 32 Mas era
preciso festejar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e tornou a
viver; estava perdido, e foi encontrado'" (Lc 15, 1-32).
Face às objeções farisaicas, Nosso Senhor traduz em parábolas seu
encanto em perdoar os homens, cumulando-os de misericórdia. E, ao mesmo tempo,
mostra como nem todos aceitam o convite para se beneficiar das riquezas
desse perdão redentor.
Mons. João Scognamiglio Clá
Dias, EP
I - Uma concepção errada da
justiça e da misericórdia
Os homens costumam julgar as atitudes
alheias, em geral, com o seguinte critério: Agiu bem? Merece prêmio e estima.
Agiu mal? Merece castigo e repulsa. Tal mentalidade, além de conspurcar a
pureza de intenção das boas obras, levando a pessoa a fazer o bem pelo simples
interesse de receber uma recompensa, cria na alma condições favoráveis ao
desenvolvimento de toda sorte de vícios, semeados pelo amor-próprio ferido,
tais como a vingança, o ressentimento e o rancor. No relacionamento com Deus,
em consequência, muitos se baseiam na mesma concepção e O imaginam como um
intransigente legislador, a quem a menor infração encoleriza e faz desfechar
sobre o faltoso, de imediato, o merecido castigo. Ainda de acordo com esse
critério, a benevolência divina apenas incide, em forma de bênçãos, consolações
e demais favores sobrenaturais, sobre aqueles que, tendo cumprido de modo
exímio os Mandamentos, merecem ser recompensados.
Ora, essa visão da perfeição infinita de
Deus é muito deformada, pois Lhe atribui uma justiça conforme os limitados
critérios humanos e ignora sua misericórdia. E tal atributo é n'Ele tão
vigoroso que chega a vencer a própria justiça. Uma prova da insuperável força
de sua compaixão são as palavras dirigidas aos nossos primeiros pais, logo após
o pecado original: antes de sentenciar os sofrimentos aos quais a
natureza humana estaria sujeita na terra de exílio, Ele lhes prometeu a
vinda de um Salvador, nascido da descendência de Adão (cf. Gn 3, 15). Mal o
homem havia pecado, o Senhor garantiu-lhe o perdão. Por isso, poderíamos
parafrasear a afirmação de São João e dizer que, no "fiat!" de Maria
Santíssima, o perdão de Deus se fez carne e habitou entre nós (cf. Jo 1, 14).
Durante sua vida mortal, Jesus manifestou
com largueza o desejo de salvar, acolhendo com indulgência os pecadores
arrependidos que a Ele acorriam, confiantes de ali encontrar o perdão.
Entretanto, a mesma misericórdia que tanto atraía uns, despertava acirrada
indignação em outros...
II - A misericórdia posta em
parábolas
"Naquele tempo, 1 os publicanos e
pecadores aproximavam-se de Jesus para O escutar. 2 Os fariseus, porém, e os
mestres da Lei criticavam Jesus. ‘Este homem acolhe os pecadores e faz refeição
com eles'".
Para entendermos a fundo o motivo de tal
objeção, basta considerar que os fariseus e mestres da Lei exemplificam de modo
cabal a mentalidade deformada à qual nos referimos. Para eles "Deus
é, sobretudo, Lei; julgam-se em relação jurídica com Deus e, sob este aspecto,
quites com Ele",1 comenta o Papa Bento XVI. Era também segundo o mesmo
critério que avaliavam os outros, discriminando como pecadores - e,
enquanto tais, objeto da ira divina e do desprezo dos homens - todos os judeus
negligentes no cumprimento das prescrições legais relativas à pureza
ritual ou alimentar. Na mesma categoria incluíam os publicanos, pois, além de
colaborarem com o domínio pagão exercido por Roma, muitas vezes eram desonestos
ao arrecadar os impostos, cometendo extorsões em benefício próprio. Todavia, o
principal alvo de repulsa eram os pagãos, devido à errônea ideia, muito
difundida entre os judeus, de que a eleição divina do povo hebreu era sinônimo
da condenação eterna de todas as outras nações. Desta forma, se para os
israelitas não observantes da Lei e para os cobradores de impostos havia ainda
uma longínqua possibilidade de salvação, caso se arrependessem e se
reconciliassem com Deus, tal hipótese não se aplicava a um estrangeiro, pelo
simples fato de não ser beneficiário das promessas feitas aos patriarcas.
Nada poderia contundir de modo tão veemente
essa mentalidade quanto o modo de Nosso Senhor proceder. A cura do servo do
centurião romano (cf. Lc 7, 1-10; Mt 8, 5-13), a pecadora perdoada na casa de
Simão, o fariseu (cf. Lc 7, 36-50), e a incorporação de um coletor de impostos
ao Colégio Apostólico, com o chamamento de Levi (cf. Mt 9, 9-17; Mc 2, 13-22;
Lc 5, 27-39), são alguns exemplos de atitudes escandalizantes para os
fariseus, a cujos ouvidos soavam como blasfêmias as palavras: "Não vim
chamar os justos, mas sim os pecadores" (Lc 5, 32). Por esta razão, a todo
momento procuravam mostrar sua ferrenha oposição a Ele, conforme nos narra o
início do Evangelho deste domingo.2
No entanto, como Jesus desejava salvar a
todos - inclusive os fariseus e mestres da Lei -, sua resposta a tais objeções
foi uma tríade de parábolas, registradas por São Lucas à maneira de um mesmo
argumento apresentado sucessivamente, sob diferentes invólucros. Em cada uma
delas, Nosso Senhor visava não só incentivar os pecadores que O ouviam a
confiarem no perdão, como também convencer os opositores acerca da necessidade
da misericórdia, sem a qual ninguém pode se salvar.
A ovelha desgarrada
3 "Então Jesus contou-lhes esta parábola:
4 ‘Se um de vós tem cem ovelhas e perde uma, não deixa as noventa e nove no
deserto, e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la?'".
O pastor e o rebanho, realidades tão
comuns na sociedade judaica daquela época, adquirem nesta parábola seu mais
elevado simbolismo. Embora tal imagem já houvesse sido utilizada no Antigo
Testamento para representar o zelo de Deus por seu povo (cf. Ez 34), sua força
de expressividade é sublimada pelos detalhes acrescentados pelo Divino Mestre,
a fim de fazê-la significar o mistério da Redenção.
Em primeiro lugar, ao mencionar a
quantidade exata de ovelhas, Nosso Senhor "refere-se a toda a multidão de
criaturas racionais que Lhe estão subordinadas, porque o número cem, composto
de dez dezenas, é perfeito. Mas destas, perdeu-se uma, que é o gênero
humano",3 explica São Cirilo. Na vida cotidiana o pastor toma-se de aflição
ao notar a falta de uma ovelha e, deixando de lado o rebanho, não mede
esforços para recuperar a desgarrada, nela concentrando toda a sua atenção.
Análoga é a atitude de Deus na Redenção: ao Se encarnar, o Filho deixou no
Céu "inumeráveis rebanhos de Anjos, Arcanjos, Dominações, Potestades,
Tronos",4 para, na Terra, resgatar a humanidade, perdida pelo pecado.
A alegria do pastor ao
encontrar a ovelha
5 "Quando a encontra, coloca-a nos ombros
com alegria, 6 e, chegando a casa, reúne os amigos e vizinhos, e diz:
‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a minha ovelha que estava perdida!'".
Além de não castigar a tresmalhada quando
a encontra, o pastor a trata com extremo carinho e a carrega aos ombros, com um
cuidado que ele não teve com nenhuma das ovelhas obedientes. Tal desvelo
representa os afagos do perdão restaurador de Deus destinado aos pecadores
arrependidos: ao invés de puni-los pelas ofensas recebidas e assim satisfazer
os clamores da justiça, Ele prefere manifestar sua onipotência atendendo
aos apelos da misericórdia. É o infinito desejo de salvar, que suplanta
inclusive a maldade humana, como aponta São Gregório Magno:
"Separamo-nos d'Ele, mas Ele não Se separa de nós. [...] Demos as costas
ao nosso Criador, e Ele ainda nos tolera; afastamo-nos d'Ele com soberba, mas
Ele nos chama com suma benignidade e, podendo nos castigar, ainda promete
prêmios para que voltemos".5
Contudo, nossa primeira atenção, ao
considerar esta parábola, deve se centrar na efusiva alegria do pastor ao
recuperar a ovelha, convidando outros a regozijarem-se com ele. É este o
principal pormenor da narração, com o qual Nosso Senhor quer significar o
agrado de Deus ao encontrar uma alma dócil à ação da graça e, apesar de se ter
desviado das sendas da virtude, abandona-se aos cuidados do Bom Pastor e se
deixa reconduzir por Ele. Tal flexibilidade é a única exigência para perdoar e
restaurar o pecador. Com isso a alma é tomada pela felicidade de se ver
novamente em ordem com Deus e em paz com sua consciência, dando-Lhe a
alegria de poder manifestar sua misericórdia. E, por conseguinte,
participarão desse contentamento todos aqueles que O amam de verdade.
7 "Eu vos digo: Assim haverá no céu mais
alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove justos que
não precisam de conversão".
O pecador e os noventa e nove justos
simbolizam, segundo alguns, a humanidade e os Anjos, pois apenas estes últimos
são "justos que não precisam de conversão". Ao ressaltar a
desproporção entre uns e outros, o Mestre nos dá um precioso ensinamento acerca
da superioridade numérica do mundo angélico, o qual "excede o
restrito campo de nossos números físicos".6 Por outro lado, vê-se a força
do perdão: seus efeitos repercutem entre os Anjos, causando--lhes maior
júbilo do que sua própria perseverança. É um incentivo para nunca nos
desesperarmos quando percebermos, arrependidos, que nos afastamos do
rebanho, seguindo nossas más inclinações. No Sacramento da Penitência, o
próprio Jesus nos aguarda, disposto a nos levar aos ombros com todas as nossas misérias.
Um exemplo para o público
feminino
8 "E se uma mulher tem dez moedas de
prata e perde uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e a procura
cuidadosamente, até encontrá-la?. 9 Quando a encontra, reúne as amigas e
vizinhas, e diz: ‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a moeda que tinha perdido!'. 10
Por isso, eu vos digo, haverá alegria entre os Anjos de Deus por um só
pecador que se converte".
Sem dúvida, considerável era o contingente
feminino no público presente à pregação de Nosso Senhor. Por isso, Ele compõe
uma segunda parábola, adaptando o enredo anterior a uma situação na qual a
protagonista é uma dona de casa, responsável pela administração das economias
domésticas, segundo os costumes judaicos. Empregando tais energias para reaver
a moeda perdida, esta mulher é apresentada por Jesus como imagem do incansável
empenho de Deus em fazer com que "todos os homens se salvem e cheguem ao
pleno conhecimento da verdade" (I Tim 2, 4). Tendo sofrido a Paixão e
Morte na Cruz para redimir a humanidade, Cristo ama a cada um de nós
individualmente. Uma alma, mesmo que pareça insignificante ao lado dos
inesgotáveis tesouros de sua onipotência, é uma "moedinha" de valor
infinito, porque vale o preço de seu Preciosíssimo Sangue. Mais uma vez, o
Salvador salienta o júbilo causado entre os Anjos pela conversão de "um só
pecador".
Narradas pelo Divino Mestre, tais cenas
corriqueiras da vida pastoril e doméstica tornam mais acessível à nossa
compreensão o sublime mistério do amor de um Deus que, fazendo-Se homem,
"veio procurar e salvar o que estava perdido" (Lc 19, 10).
III - A parábola do Pai
perfeito
A semelhança de um bom vinho, cujo
cambiante sabor surpreende o paladar a cada degustação, de modo que nunca seus
apreciadores podem afirmar que o conhecem completamente, a terceira
parábola contada por Nosso Senhor nesta ocasião possui tal riqueza de ensinamento
que sempre traz novos aspectos a serem considerados. É o célebre drama do filho
pródigo, uma das mais belas páginas das Sagradas Escrituras. Tendo já sido
abordada neste ciclo litúrgico, por ocasião da Quaresma,7 hoje ela nos é apresentada
uma vez mais, a partir de outra perspectiva.
O pai entrega os bens
11 "E Jesus continuou: ‘Um homem tinha
dois filhos. 12 O filho mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança
que me cabe'. E o pai dividiu os bens entre eles'".
O pai, sem dúvida, foi tomado por um
profundo desgosto ao receber o pedido do filho menor. Além de denunciar a intenção do jovem de abandonar
a casa paterna - pois só neste caso se fazia a repartição da herança antes da
morte do pai 8 -, a solicitação confirmava suas apreensões a respeito
daquele filho, em cuja alma já discernira o tumultuar das paixões desordenadas.
Com dor, previu os caminhos tortuosos pelos quais o jovem se embrenharia;
entretanto, percebendo ser impossível fazê-lo desistir de seus intentos, não
tomou nenhuma atitude para impedi-lo e entregou-lhe sua parte da fortuna.
É exatamente como Deus age conosco: concede-nos em abundância suas graças e
dons, apesar de conhecer, em sua onisciência, o mau uso que poderemos
fazer desses bens, quer valorizando-os pouco, quer negligenciando-os
ou até mesmo usando-os para pecar.
Paciência: um dos nomes da
misericórdia
13 "Poucos dias depois, o filho mais novo
juntou o que era seu e partiu para um lugar distante. E ali esbanjou tudo numa
vida desenfreada".
O filho trocou a inocência do lar pela
vida devassa. Expressiva imagem de todos os batizados que, desprezando a
condição de filhos de Deus, abandonam o estado de graça ao cometer uma falta
grave! Esbanjando o tesouro sobrenatural entregue pelo Pai celeste, preferem o
prazer fugaz do pecado à felicidade do convívio com Deus e Maria
Santíssima, na eternidade.
Por sua vez, em nenhum momento o pai se
esqueceu do jovem e, sem jamais perder as esperanças de reencontrá-lo, continuamente
elevava ao Céu aflitas orações por sua conversão. Com igual indulgência
Deus reage conosco quando O ofendemos e, em sua bondade, nunca nos
desampara, mesmo quando nos afastamos d'Ele com o pecado. Refletindo sobre esta
clemência, escreve Santo Afonso de Ligório: "Se tivésseis insultado
um homem como insultastes a Deus, ainda que fosse vosso melhor amigo ou ainda
vosso próprio pai, não teria ele outra resposta senão vingar-se. Quando
ofendias a Deus, poderia ter-vos castigado no mesmo instante; tornastes a
ofendê-Lo e, ao invés de castigar-vos, devolveu-vos bem por mal, conservou-vos
a vida, rodeou-vos de todos os seus cuidados providenciais, fingiu não ver os
pecados, na expectativa de que vos emendásseis e cessásseis de
injuriá-Lo".9 Por conseguinte, enquanto as duas parábolas precedentes
ressaltam a iniciativa de Deus na conversão dos homens, esta ilustra outro
aspecto da misericórdia d'Ele, o qual se cifra na paciência em esperar que
"o pecador caia em si, e possa perdoá-lo e salvá-lo".10
Na extrema decadência,
lembrança da bondade do pai
14 "Quando tinha gasto tudo o que
possuía, houve uma grande fome naquela região, e ele começou a passar
necessidade. 15 Então foi pedir trabalho a um homem do lugar, que o mandou para
seu campo cuidar dos porcos. 16 O rapaz queria matar a fome com a comida que os
porcos comiam, mas nem isto lhe davam".
O jovem, outrora abastado, tornou-se um
indigente faminto, cuja situação desesperadora o fez aceitar o humilde trabalho
de guardador de porcos. É um símbolo da completa miséria à qual o pecado mortal
reduz a alma, arrancando-lhe todos os méritos e tornando-a merecedora do
inferno, realidade tão mais terrível que a do filho pródigo. "Não há
catástrofe nem calamidade pública ou privada que possa ser comparada à
ruína causada na alma por um só pecado mortal. É como um
desmoronamento instantâneo de nossa vida sobrenatural, um verdadeiro
suicídio da alma em relação à vida da graça".11 Não é raro, porém, Deus
permitir que o pecador caia neste ínfimo estado para então fazer nascer em sua
alma as saudades da inocência perdida.
17 "Então caiu em si e disse: ‘Quantos
empregados do meu pai têm pão com fartura, e eu aqui, morrendo de fome. 18
Vou-me embora, vou voltar para meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra Deus e
contra ti; 19 já não mereço ser chamado teu filho. Trata-me como a um dos teus
empregados'".
Só então, em meio às amargas frustrações
do pecado, o jovem começou a refletir, contrastando a penúria em que se
encontrava com a abundância da casa paterna. Veio-lhe à recordação a bondade e
o afeto de seu pai, o maior bem perdido com a vida desregrada que levara.
Suas palavras deixam transparecer essa disposição de alma, pois se referem não
a um simples retorno ao lar, mas a um desejo de pôr-se novamente sob tal
amparo: "Vou voltar para meu pai".
No entanto, jamais teria ele decidido
abandonar o pecado se não houvesse a ação da graça em sua alma, pois é
impossível ao homem converter-se movido apenas pela própria força de vontade,
conforme sublinha Santo Agostinho: "Ninguém se arrependeria de seu pecado
se não houvesse um chamado de Deus".12
A inesperada acolhida
20 "Então ele partiu e voltou para seu
pai. Quando ainda estava longe, seu pai o avistou e sentiu compaixão.
Correu-lhe ao encontro, abraçou-o e cobriu-o de beijos".
É bem provável que o pai tenha sentido
acenderem-se, muitas vezes, suas esperanças quanto à volta do filho.
Dirigia-se, então, a um local de onde podia divisar os caminhos da região e ali
passava longos períodos rezando, numa confiante espera... Até o dia em que
"o avistou e sentiu compaixão". O jovem, maltrapilho e com a
fisionomia desfigurada pela vida de pecado, estava bem mudado em relação à
última vez que o pai o vira. Muito mais profunda, todavia, era sua
transformação interior. Saíra de casa orgulhoso e julgando-se
autossuficiente; retornava humilde, consciente da própria fraqueza e confiante
na bondade do pai. Tendo corrido ao seu encontro, o pai logo constatou tal
câmbio e, vencendo toda a repugnância que a aparência miserável do filho lhe
causava, não hesitou em manifestar-lhe com profusão seu afeto.
Esta enternecedora cena narrada por Jesus
representa, de maneira eloquente, a acolhida do Pai celeste às almas
arrependidas, que não é senão uma vigorosa manifestação de seu amor infinito.
"Com quanta ternura Deus abraça o pecador que se converte! [...] É o Pai
que, ao retornar o filho perdido, sai a seu encontro, abraça-o, beija-o e, ao
recebê-lo, não pode conter a alegria que o embarga. [...] Mal o pecador se
arrepende, lhe são perdoados seus pecados e [Deus] deles se esquece, como se
nunca O tivesse ofendido", 13 ressalta Santo Afonso de Ligório.
Alegria pelo retorno do filho
21 "O filho, então, lhe disse: ‘Pai,
pequei contra Deus e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho'. 22 Mas o
pai disse aos empregados: ‘Trazei depressa a melhor túnica para vestir meu
filho. E colocai um anel no seu dedo e sandálias nos pés. 23 Trazei um novilho
gordo e matai-o. Vamos fazer um banquete. 24 Porque este meu filho estava morto
e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado'. E começaram a
festa".
A boa disposição de alma com que o jovem
se apresentava, reconhecendo com humildade seu erro, era suficiente para o
coração paterno transbordar de contentamento e tomar providências para uma
grande comemoração. Acentuando pela terceira vez a alegria de Deus
ao perdoar - personificado aqui pelo pai -, Nosso Senhor também ensina
neste trecho quanto o verdadeiro arrependimento pode conceder à alma um grau
maior de graça do que o perdido com o pecado,14 pois o filho jamais fora
honrado com uma festa de tal porte quando vivera em casa, antes de
perverter-se.
Ainda nesta passagem, nossa atenção se volta
para um pequeno detalhe: qual a procedência do traje que o pai manda trazer
para vestir o filho, em substituição dos andrajos com os quais se cobria, uma
vez que o jovem reunira "tudo o que era seu" antes de partir? Talvez
tenha sido retirado dos pertences do filho mais velho... Nesse caso,
aplicar-se-ia a afirmação do Mestre: "Ao que tem, se lhe dará; e ao
que não tem, se lhe tirará até o que tem" (Mc 4, 25). Nota-se, pois, que
embora o caçula estivesse na miséria, possuía algo que havia muito o primogênito
deixara de ter, um bem inestimável: o amor pelo pai. Os próximos versículos
oferecem dados elucidativos que confirmam tal hipótese.
Um filho sem amor pelo pai
25 "O filho mais velho estava no campo.
Ao voltar, já perto de casa, ouviu música e barulho de dança. 26 Então chamou
um dos criados e perguntou o que estava acontecendo. 27 O criado respondeu: ‘É
teu irmão que voltou. Teu pai matou um novilho gordo, porque o
recuperou com saúde'. 28a Mas ele ficou com raiva e não queria
entrar".
Seria compreensível que, num primeiro
momento, o impacto da festa suscitasse certa indignação no filho mais velho,
por lhe trazer à lembrança a ingratidão do irmão para com o pai e o
profundo desgosto que este sofrera por causa disso. Não obstante, ao se inteirar
do júbilo em que ele agora se encontrava pelo regresso deste irmão, tal
sentimento deveria ser logo controlado e, demonstrando uma
consonância afetiva com o pai, teria entrado de imediato para a festa.
Bem outra, entretanto, foi sua reação. O
que a teria motivado? Sob um prisma humano, o primogênito agira com maior
astúcia que o outro, permanecendo no lar enquanto o irmão se lançava nos riscos
do mundo. Em uma cômoda situação, com todas as necessidades materiais
garantidas, servia o pai por interesse, vivendo em casa mais como um hóspede do
que como um filho. Sua obediência à autoridade paterna se originava em motivos
de conveniência e não no afeto filial. Apesar de estar fisicamente próximo
ao pai, encontrava-se dele separado pelas gélidas distâncias da indiferença.
Tal disposição de alma é indicada por Nosso Senhor ao dizer que o jovem
"estava no campo", ou seja, dedicado "às obras terrenas,
longe da graça do Espírito Santo, alheio aos desígnios de seu pai",15
explica São Jerônimo.
Conjecturas sobre a atitude do
primogênito
Sendo tal seu desamor, é provável ter ele
ficado em casa devido a certa ambição de apropriar-se do restante da fortuna do progenitor, quando
este viesse a falecer. E, enquanto o mais novo fugira do olhar paterno, indo
dissipar seus bens num "lugar distante", o primogênito, sob a
aparência de uma conduta correta, também fazia mau uso dos bens de família,
tentando dissimular ao pai os caminhos tortuosos nos quais andava. O
acesso de raiva com o retorno do irmão não terá sido, portanto, a manifestação
de uma consciência pesada e de uma alma amargurada pelas frustrações do pecado,
consumindo-se de inveja ao ver o outro gozando das alegrias do perdão? E não
terá sua cólera aumentado ainda mais ao pensar que a reintegração do irmão
ao núcleo familiar impediria a realização de sua cobiça, implicando numa nova
divisão de bens entre os dois herdeiros?
Por isso, embora a interpretação clássica
desta parábola considere os dois filhos como imagem do povo judeu e dos
gentios,16 respectivamente, há uma dimensão de significado muito mais
ampla em ambas as figuras. O caçula é o pecador público, o qual não esconde
seus desregramentos e, para amortecer a consciência, procura esquecer-se
de Deus, afastando-se de tudo o que possa reavivá-Lo na lembrança. O
primogênito é o pecador oculto, com a fisionomia tranquila e atitudes
exteriores conformes à virtude, parecendo justo aos olhos dos homens; por
dentro, porém, está cheio de hipocrisia e iniquidade (cf. Mt 23, 28).
28b "O pai, saindo, insistia com ele. 29
Ele, porém, respondeu ao pai: ‘Eu trabalho para ti há tantos anos, jamais
desobedeci a qualquer ordem tua. E tu nunca me deste um cabrito para eu
festejar com meus amigos. 30 Quando chegou esse teu filho, que esbanjou teus
bens com prostitutas, matas para ele o novilho cevado'".
Esta insolente resposta confirma não se
trata de uma revolta contra os desvarios do irmão, mas sim contra a benevolente
acolhida do pai. Julgando-se digno de recompensa e o outro merecedor de
castigo, sentia-se injustiçado ao ver a bondade paterna agir de modo diferente,
não só perdoando ao faltoso, como também dando-lhe mostras de extremo
afeto. É a reação característica daqueles que nunca experimentaram os
efeitos do perdão e não conseguem compreender a misericórdia com a qual os
outros são tratados. A este filho invejoso, caberia ao pai responder com as
palavras postas por Jesus nos lábios do dono da vinha ao dirigir-se aos
operários inconformados com o generoso pagamento feito aos trabalhadores da
última hora: "Porventura vês com maus olhos que eu seja bom?" (Mt 20,
15). O pai, contudo, até esta desrespeitosa acusação refuta com benignidade.
Aviso aos que rejeitam a misericórdia
31 "Então o pai lhe disse: ‘Filho, tu
estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. 32 Mas era preciso festejar e
alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava
perdido, e foi encontrado'".
Aparece aqui um novo matiz da bondade
paterna: esclarecendo o real motivo da festa - não se tratava de uma homenagem
aos vícios de quem fora até então esbanjador, e, sim, uma comemoração de
seu retorno -, o pai "não leva em consideração o que o filho afirma a
respeito de não ter faltado a nenhuma de suas ordens. Ele não confirma ser
verdade o que este dissera, mas trata de acalmar sua ira por outro caminho:
‘Filho, tu estás sempre comigo'".17 Dessa forma, prova ter conhecimento
das vias estranhas à virtude em que o filho andava e, ao mesmo tempo, lhe
demonstra o quanto também era ele objeto de sua paciência misericordiosa, pois
suportava tal hipocrisia e desamor no dia a dia, na confiante espera de uma
regeneração.
Finalizando a parábola, Jesus repreendia
tacitamente os fariseus e mestres da Lei, apontando a necessidade de sempre
ajustar os próprios critérios de acordo com a ação de Deus, nunca
analisando o atuar divino segundo a tacanha visualização humana. E, nas
entrelinhas da narrativa dava-lhes um aviso, a eles e a todos os que se
fecham ao perdão: "Conheço vossos pecados desde toda a eternidade, e
desejo perdoar-vos, assim como perdoo a estes que a Mim recorrem.
Entretanto, vós vos recusais receber a minha compaixão e vos revoltais ao ver
outros beneficiados por ela. Agindo desse modo colocais em risco vossa
salvação, porque aos que rejeitam a misericórdia nesta vida está reservada
minha justiça na eternidade".
IV - Conclusão
A sequência de parábolas apresentada no
Evangelho deste 24º Domingo do Tempo Comum surge diante de nós como um prisma
através do qual a História da Salvação ganha um colorido especial. Para
resgatar a humanidade perdida pelo pecado, o Bom Pastor assumiu nossa
natureza, morreu na Cruz, e de seu lado aberto pela lança fez nascer a Igreja,
autêntico redil de Cristo, no qual os homens são introduzidos pelas águas do
Batismo, conferindo-lhes ainda a superior dignidade de se tornarem filhos de
Deus. Dóceis à graça, os homens produziram frutos à altura de sua condição
de herdeiros do Céu, construindo uma civilização alicerçada nos ensinamentos do
Evangelho.
Sem embargo, com o passar do tempo a
humanidade começou a menosprezar essa filiação divina e foi-se afastando do Pai
celeste. Em nossos dias, muitos são os que vivem como se Ele não existisse.
Entregando-se ao pecado, dissiparam os tesouros que lhes haviam sido confiados
com a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo ao mundo e caminharam de desvario em
desvario. Se traçássemos um paralelo entre a humanidade atual e o filho
pródigo, com tristeza veríamos não estar ela muito distante do estágio no qual,
reduzido à completa miséria, o jovem quis se alimentar com as bolotas dos
porcos. Permitindo que os homens caiam nos horrores de um mundo contrário à
virtude, Deus espera pacientemente o momento exato para lhes conceder as luzes
de sua misericórdia, através de uma ação do Espírito Santo. Tal ação lhes fará
ver com clareza seu deplorável estado e lhes suscitará as saudades das
maravilhas da graça, abandonadas já há tantos séculos.
Os símbolos, porém, sempre claudicam em
relação à realidade, e a fé nos faz crer que o futuro dos homens superará em
muito o desfecho da parábola, sobretudo por causa de um elemento. Na narração,
não aparece uma figura que na História tem papel fundamental: Maria Santíssima,
a quem Deus constituiu Advogada e Refúgio dos pecadores, Mãe dos homens. Quando
a humanidade pródiga começar a empreender o caminho de volta, essa Mãe virá ao
seu encontro e a receberá com incomensurável bondade. Bastará então que Lhe
seja dirigida a súplica humilde e confiante: "Pecamos contra Deus e contra
Vós; já não merecemos ser chamados vossos filhos. Tratai-nos como se fôssemos
servos". Ela mesma intercederá, então, junto a seu Filho, levando-Lhe o
pedido de clemência. Nesse momento em que os homens se apresentarem diante do
trono da Divina Misericórdia, colocando-se na condição de escravos da Sabedoria
Eterna e Encarnada, pelas mãos de Maria, estará concedido o perdão restaurador.
E assim como o pai festejou o jovem
arrependido, Deus tratará como filhos prediletos a estes que se entregarem sem
reservas, e promoverá a comemoração inaugural de um novo regime de graças
no plano da salvação: o Reino de Maria, era histórica da misericórdia,
constituída por almas que, reconhecendo-se pecadoras, se terão deixado
transformar pela força do perdão.
1BENTO
XVI. Jesús de Nazaret. Primera parte. Desde el Bautismo a la Transfiguración.
Bogotá: Planeta, 2007, p.252-253.
2 O
espírito objetante de que os fariseus davam mostras em diversas circunstâncias
fica insinuado no original grego. O tempo verbal empregado por São Lucas é o
imperfeito διεγόγγυζον, indicando continuidade de ação. Não se tratava de um
ato, mas de uma constante atitude de crítica.
3SÃO
CIRILO, apud SÃO TOMÁS DE AQUINO. Catena Aurea. In Lucam, c.XV, v.1-7.
4SANTO
AMBRÓSIO. Tratado sobre el Evangelio de San Lucas. L.VII, n.210. In: Obras. Madrid:
BAC, 1966, v.I, p.456.
5SÃO
GREGÓRIO MAGNO. Homiliæ in Evangelia. L.II,
hom.14, n.17. In: Obras. Madrid: BAC, 1958, p.722.
6
DIONÍSIO AREOPAGITA. La Jerarquía Celeste. C.XIV, 321 A. In: Obras Completas.
Madrid: BAC, 1990, p.175.
7 Cf.
CLÁ DIAS, EP, João Scognamiglio. O Filho Pródigo: Justiça e Misericórdia. In:
Arautos do Evangelho. São Paulo. N.27 (Mar., 2004); p.6-11; Comentário ao
Evangelho do IV Domingo da Quaresma – Ano C. In: O inédito sobre os Evangelhos.
Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2012, v.V, p.223-234.
8 Cf.
SÁENZ, SJ, Alfredo. Las Parábolas del Evangelio según los Padres de la Iglesia.
La misericordia de Dios. 2.ed. Guadalajara: APC, 2001, p.160-161.
9 SANTO
AFONSO MARIA DE LIGÓRIO. Obras Ascéticas. Madrid: BAC, 1954, t.II, p.697.
10Idem,
p.698.
11 ROYO
MARÍN, OP, Antonio. Teología de la salvación. 3.ed. Madrid: BAC, 1965, p.68-69.
12
SANTO AGOSTINHO. Epistolæ ad Romanos inchoata expositio, n.9. In: Obras.
Madrid: BAC, 1959, v.XVIII, p.76.
13
SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, op. cit., p.699-700.
14 Cf.
SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. III, q.89, a.2.
15SÃO
JERÔNIMO. Epistola ad Damasum XXI, 28. In: Cartas. Madrid: BAC, 1962, v.I,
p.143.
16 Cf.
SÃO BEDA. In Lucæ Evangelium. L.IV, c.XV: ML 92, 526; SÃO JERÔNIMO, op. cit.,
27, p.142-149; SANTO AGOSTINHO. Sermo CXXXVI, n.8. In: Obras. Madrid: BAC,
1952, v.X, p.520-521; SANTO AMBRÓSIO, op. cit., p.470-472.
17 SÃO
JERÔNIMO, op. cit., 34, p.146.
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