Tríduo Pascal

sábado, 21 de janeiro de 2012

Evangelho Mt 4, 12-23

Continuação Evangelho (Mt 4, 12-23).

Depois, deixando Nazaré, foi habitar em Cafarnaum, situada junto do mar, nos confins de Zabulon e Neftali [...]

A propósito desse versículo, o próprio Maldonado chegou a equivocarse, julgando haver duas Galileias. Ao expor sua observação, o Revmo. Pe. Luis María Jiménez Font, S.J., com muita precisão desfaz o engano em nota ao pé da página, nestes termos:

O autor [Maldonado] faz uma distinção desnecessária. Não havia mais que uma Galileia, governada por Herodes. Cristo Se retirou a Cafarnaum, onde podia viver sem perigo, porque estava na fronteira da tetrarquia de Filipo”4.

Como claramente se deduz, foi por motivos ocasionais que Jesus “Se retirou” para Cafarnaum. Entretanto, pode-se afirmar, com segurança, que nada se passava na vida do Salvador sem ter grandes razões como causa. De imediato, percebe-se não ser útil para a vida pública a manifestação de Sua divindade, na cidade de Nazaré. Jesus a escolheu para as décadas de Sua fase oculta, devido a Seu recolhimento, paz, pequenas proporções geográficas e população restrita. Não era, porém, própria para a difusão em grande escala da semente da Boa Nova. Ademais, “ninguém é profeta em sua própria pátria”, conforme Ele mesmo repetiria aos Seus concidadãos, basta ver o modo como foi expulso daquela cidade.

Um motivo mais sobrenatural levou Jesus a tomar este caminho: “Começa Jesus a evangelizar as regiões por onde tivera início a defecção de Israel. Demonstra com isso Sua misericórdia e sabedoria, levando o remédio onde mais grave era o mal, servindo-Se de uma cidade populosa, mas incrédula e preocupada só com os negócios humanos, para que dali se irradiasse a pregação do Reino de Deus. Quis, assim, significar que quem mais necessita de remédio são os enfermos, não os sãos; e que nunca devemos resistir a nenhum apostolado sob pretexto de que o campo não está preparado para receber nosso trabalho” 5.

O povo que jazia nas trevas viu uma grande luz

Cumprindo-se o que tinha sido anunciado pelo profeta Isaías, quando disse: “Terra de Zabulão e terra de Neftali, terra que confina com o mar, país além do Jordão, Galileia dos gentios! Este povo, que jazia nas trevas, viu uma grande luz, e uma luz levantou-se para os que jaziam na sombra da morte.”

A citação de Isaías feita por São Mateus nestes versículos é retirada do texto hebraico e por isso não são transcritas algumas palavras como constam em nossas traduções mais correntes:

“No tempo passado foi levemente combatida a terra de Zabulon, e a terra de Neftali, e no tempo futuro serão cobertas de glória a costa do mar, além-Jordão, a Galileia das nações. Este povo, que andava nas trevas, viu uma grande luz; aos que habitavam na
região da sombra da morte nasceu-lhes o dia” (Is 9, 1-2).

Trata-se de uma belíssima profecia que se cumpre ao estabelecer-Se o Senhor em Cafarnaum. De fato, segundo nos é descrito pelo segundo livro dos Reis (15, 29), Teglatfalasar, rei dos Assírios, invadiu várias regiões, entre as quais as terras de Zabulon e Neftali, ou seja, a porção citada nesses versículos de Mateus. Isto se deu por um castigo de Deus. Foi assim devastada a Galileia e tomada pelos gentios, e daí seu nome: “Galileia dos Gentios”, localizada na zona limítrofe da Síria e da Fenícia, coalhada de pagãos.

Essa era a principal razão de se terem constituído seus habitantes em objeto de desprezo da parte do resto da nação, pois grande era a infiltração de gentios arameus, itureus, fenícios e gregos, que inevitavelmente se mesclavam com os judeus de raça,
conforme vem narrado no primeiro livro dos Macabeus (5, 15): “E toda a Galiléia estava cheia de estrangeiros, com o fim de nos perderem”. Tratava-se, como já dissemos, de uma região rica em comércio e por isso atraente para os vários povos.

Ora, torna-se compreensível o quanto se corromperam as doutrinas e os bons costumes religiosos do povo eleito naquelas paragens, devido à forte e diversificada influência pagã, bem como o motivo pelo qual ele “andava nas trevas” e na “sombra da morte”.

“Estavam os gentios sentados na região da sombra da morte — diz Crisóstomo — porque não tinham sequer uma partícula de luz divina que os iluminasse. Os judeus, que faziam as obras da lei, mas não conheciam a justiça do Evangelho, estavam nas
trevas. Todas elas são dissipadas pela ‘grande luz’ do Messias. Não pode haver luz mais intensa e fixa, porque Jesus é a luz substancial: ‘Eu sou a luz do mundo’ (Jo 8, 12). Não desconfiemos jamais de sua eficácia para chegar ao fundo dos espíritos mais cobertos de trevas pela infidelidade, pela heresia, pela ignorância, pela indiferença; e façamo-nos sempre, por nossa pregação e nossas obras, filhos dessa luz e colaboradores de sua ação iluminativa” 6.

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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Jesus Se retira para a Galiléia

Tendo Jesus ouvido dizer que João fora preso, retirou-Se para a Galiléia.

“São João Batista foi entregue ao tetrarca Herodes Antipas pelos escribas e fariseus, como insinua o mesmo Cristo mais adiante (Mt 17, 12). É esta a razão pela qual Cristo foge para a Galiléia, apesar de esta província estar sob o domínio de Herodes, inimigo do Batista. Os fariseus da Judéia ficavam muito incomodados — como adverte São João (4, 1) — pelo fato de os discípulos de Jesus serem mais numerosos que os do Batista, e teriam aproveitado, sem dúvida, qualquer ocasião favorável que se lhes apresentasse, para pôr também Cristo nas mãos de Herodes” 1 

Como podemos comprovar, pelos Evangelhos, Jesus era conduzido pelo Espírito e, por um sopro dEle, se retira para a Galiléia. Não por temer o martírio, mas por não haver ainda chegado Sua hora.

É o próprio Espírito Santo que nos inspira sabiamente a escolher os tempos e os lugares. Ele é quem nos ensina quando devemos fugir das perseguições ou afrontá-las, em quais momentos temos obrigação de falar ou de calar, de manifestar-nos a todos ou de nos recolher. Se fôssemos inteiramente flexíveis aos sopros da graçado Espírito Santo, maravilhas sairiam de nossas mãos para a glória de Deus e da Santa Igreja, o bem dos outros e a santificação de nossas almas.

Infelizmente, com raras exceções, a humanidade se move, ao longo da História, muito mais pelo interesse pessoal, pela ambição, pela inveja, pelo amor próprio, pela vaidade, pelo prazer, em uma palavra, pelo pecado.

Quão grande desperdício de dons, virtudes e graças, do qual se prestará contas diante do Juízo de Deus!
Jesus, muito pelo contrário, retira-se para a Galiléia a fim de ali começar Sua vida pública, com Suas primeiras pregações, confirmadas por prodigiosos e profusos milagres, ilustradas por insuperáveis parábolas. Ali estabeleceu o centro de Sua missão.

Oh feliz Galiléia! Tomara soubesses tirar todo o proveito de tão excelsa circunstância! Oh odienta Jerusalém, oh maldosa Judéia, vós perseguis o precursor e perdeis os benefícios da presença do Salvador. Justamente debaixo desse prisma é que se cifra a minha verdadeira felicidade, corresponder com perfeição aos toques da graça ou rejeitá-los. Eu devo temer a Jesus que passa e não retorna...

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1) La Sagrada Escritura — Texto y comentario por Professores de la Compañía de Jesús. Madrid: BAC, 1961, pp. 49-50.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Evangelho Jo 1, 39

…“Rabi (que quer dizer Mestre), onde habitas?” 39 Jesus disse-lhes: “Vinde ver”.Foram, viram onde habitava e ficaram com Ele aquele dia. Era então quase a hora décima.

A cortesia de Jesus é insuperável, pois poderia indicar-lhes o caminho e marcar-lhes um encontro para o dia seguinte. Pelo contrário, convida-os a segui-Lo, ou seja, já os aceita como discípulos.

Assim procedeu Jesus, conforme nos ensina São Cirilo, “para ensinarnos primeiro que nas coisas boas não é louvável atrasar-se, porque o adiamento de algo bom é sempre um prejuízo.E, depois, para mostrar que não basta inteirar-se de qual é a casa, isto é, a Igreja fundada por Cristo, mas é necessário ir a ela com fé e observar com ânimo fervoroso o que nela se faz”.
Quem nos dera conhecer o conteúdo daquele sagrado convívio! “Que belo dia passaram! Que bela noite! Edifiquemos, pois, em nosso coração uma casa digna, na qual o Senhor venha habitar e nos instruir” — exclamou Santo Agostinho.

A nós também dirige Jesus esse convite cheio de benquerença. E assim procederá até o último minuto da História. Como é possível opor-Lhe resistência?

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Evangelho Jo 1, 35-37

35 No dia seguinte, João lá estava novamente com dois dos seus discípulos. 36 Vendo Jesus que passava, disse: “Eis o Cordeiro de Deus”.37 Ouvindo as suas palavras, os dois discípulos seguiram Jesus.

Desde toda a eternidade, Jesus vira esses dois discípulos e os amara; agora, com seus olhos humanos e sem Se deixar perceber, o Salvador os contempla de soslaio. Ele sempre quis atraí-los, mas, seguindo uma zelosa diplomacia, deixou a cargo de quem os formara tomar a iniciativa de encaminhá-los.

De sua parte, Jesus não faz senão oferecer ao Precursor um pequeno pretexto, ou seja, passa diante de seus olhos. O Batista demonstra uma vez mais sua total devoção ao Salvador, pois aproveita imediatamente a oportunidade. Ele teme que Jesus passe e não volte!

Quantas vezes esse mesmo Jesus se apresenta ao longo da caminhada de nossa vida! Ora é uma inspiração, ou um bom anseio pervadido de consolação, às vezes até uma dor de consciência e um arrependimento, ou exemplos de virtude ou de maldade aos quais assistimos... Sim, Jesus nos aparece de mil modos, e eis aqui o grande modelo diante de nós nesse Evangelho. Devemos ser ávidos dessas ocasiões para discernirmos as divinas insinuações de Jesus.

Fiéis aos ensinamentos de seu mestre, no entusiasmo pela figura do Cordeiro tão bem apresentada ao longo de enlevantes conversas e pre gações, os dois discípulos resolveram segui-Lo. Conforme explica Frei Manuel de Tuya, “seguir alguém”, “ir atrás de”, era sinônimo, nos meios rabínicos, de ir à sua escola, ser seu discípulo. Portanto, seguiram-No nos dois sentidos da palavra, ou seja, fisicamente e com o intuito de passarem a ser seus discípulos.

Quantas vocações ficaram abandonadas pelos caminhos da História pelo fato de não reagirem como esses dois! Quantas perdições!

Da sua parte, Maldonado, com base em vários Padres da Igreja, ressalta a importância da pregação. Nesse versículo, Jesus colhe os primeiros frutos do rico plantio de João.

domingo, 15 de janeiro de 2012

38 Jesus, voltando-Se para trás evendo que O seguiam, disse-lhes:“Que buscais?” Eles disseram-Lhe: “Rabi (que quer dizer Mestre),onde habitas?”

Jesus nunca deixa de vir ao nosso encontro e jamais se nega a encorajar-nos nas vias do bem. Tão afetuosa e paternalé sua atitude com os dois que chega a nos comover. Ambos manifestam uma inocente ansiedade de dirigir-se a Jesus; entretanto, por respeito ou temor reverencial, não ousam abordá-Lo. Segundo a boa educação de todos os tempos, cabe a quem tem autoridade iniciar a conversa, e Jesus o faz com suma bondade, porque discerne o fundo do desejo de ambos e coloca-os à vontade.

“Rabi” é o título que Lhe conferem, e assim demonstram quanto anseiam por aprender sua doutrina. Em seguida Lhe fazem uma pergunta: “Onde moras?” Comenta Alcuíno a este respeito: “Não querem se beneficiar do magistério de forma passageira, e por isso Lhe perguntam onde vive para que, de futuro, possam ouvir suas palavras em segredo, visitá-Lo muitas vezes e instruir-se muito melhor” (12).

O Evangelho é perene e, por isso, também a nós Jesus pergunta: “Que buscais?” Ou seja, o que procuramos nos lugares freqüentados por nós, em nossas companhias, amizades, ações, etc.? Buscamos a glória de Deus e de sua Santa Igreja? Será o Reino dos Céus, a edificação dos outros, nossa salvação, nossa santificação? Ou, pelo contrário, será nossa vanglória, nosso amor próprio, nossa sensualidade, nossos prazeres? É possível que nós não Lhe queiramos responder agora, porém, no dia do Juízo — particular e final —, deveremos prestar-Lhe contas exatas, diante dos Anjos e dos homens.

Imitemos os dois discípulos, e perguntemos a Jesus onde vive Ele atualmente. Imaginemos qual seria sua resposta. Certamente não O encontraremos nos espetáculos imorais, nem nas disputas vaidosas, etc. Antes de tudo, Jesus vive no Céu, como no tabernáculo, mas também no coração dos inocentes, de todos os que se mantêm na graça de Deus e fogem do pecado. Nós bem o sabemos...