Tríduo Pascal

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Evangelho 9º Domingo do Tempo Comum — Lc 7, 1-10 — Ano C 2013

Comentários ao Evangelho  9º Domingo do Tempo Comum  Lc 7, 1-10 — Ano C 2013
Fé na divindade Jesus
3 O oficial ouviu falar de Jesus e enviou alguns anciãos dos judeus, para pedirem que Jesus viesse salvar seu empregado.
A fama de Nosso Senhor corria “por todos os lugares da circunvizinhança” (Le 4, 37), escreve o Evangelista, logo após a narração da cura de um possesso em Cafarnaum. E a notícia chegou também aos ouvidos do centurião. Certamente, entre os relatos acerca d’Aquele homem extraordinário, contaram-lhe os numerosos milagres operados em benefício dos enfermos. Foi o suficiente para o oficial encher-se de confiança: aquele Mestre dos judeus poderia restabelecer a saúde de seu empregado! Nesse instante, sem o saber, deu seu primeiro assentimento à graça da fé na divindade de Jesus, crendo de imediato na onipotência d’Ele, como sublinha Santo Ambrósio: “Conjecturou que Cristo dava a saúde aos homens não com poder de homem, mas de Deus”.6
Talvez por considerar-se indigno de ser atendido por um homem célebre entre os próprios judeus — os quais procuravam manifestar de modo categórico sua eleição divina e, como consequência desta, sua superioridade em relação aos gentios —, o centurião pediu aos anciãos da cidade que apresentassem sua súplica a Jesus, em favor de seu servo.
Atraído pelo Deus verdadeiro
4Chegando onde Jesus estava, pediram-lhe com insistência: “O oficial merece que lhe faças este favo porque ele estima o nosso povo. Ele até nos construiu uma sinagoga.
Um oficial romano geralmente era bem abastado, pois, além da remuneração própria ao cargo, cabia-lhe a maior parte dos despojos obtidos na guerra. A largueza de posses do centurião de Cafarnaum é comprovada pelo fato de ter construído uma sinagoga, gesto que propiciou o sentimento de gratidão do povo pelo benfeitor da religião, dada a importância dedicada ao culto por todo israelita.
Os anciãos não hesitaram, então, em interceder por ele junto ao Mestre. No entanto, pelo modo de apresentar o pedido, podemos perceber como os ensinamentos de Nosso Senhor ainda não lhes haviam penetrado a mentalidade, pois dizem que o centurião “merece” o milagre por estimar o povo judeu e ter-lhe feito um benefício. Portanto, estavam convencidos de que Deus favorecia quem, através de atitudes exteriores, se mostrava digno de ser por Ele agraciado, dentro da antiga lei da mera reciprocidade. O milagre se lhes afigurava mais como uma recompensa do que como uma misericórdia divina, e o Salvador lhes mostrará quão equivocada era tal concepção.
De outro lado, vemos quanto esse oficial se mostrava simpático à religião verdadeira, sendo provavelmente “um daqueles pagãos aos quais já não satisfaziam os mitos politeístas, cuja fome religiosa não se saciava com a sabedoria dos filósofos e que, por conseguinte, simpatizava com o monoteísmo judaico e com a moral que dele derivava. Era temente a Deus, professava a fé no Deus único, participava do culto judaico, mas ainda não havia passado definitivamente ao judaísmo. Todavia, buscava a salvação de Deus. Manifestava sua fé no Deus único, seu amor e seu temor a Deus no amor ao povo de Deus e na solicitude pela sinagoga que ele mesmo havia edificado. Seus sentimentos se expressavam em obras”.7
De fato, a abertura dos gentios em relação ao judaísmo era fenômeno frequente nesse período histórico em que diversos povos se encontravam aglutinados sob o jugo de Roma. Tal situação favorecia as relações entre judeus e gentios, trazendo como consequência que um considerável contingente de pagãos vivia à maneira judaica, adotando muitos costumes hebreus, como descreve Flávio Josefo: “Vários outros povos também há muito tempo ficaram tão impressionados pela nossa piedade, que não há cidade grega, nem bárbaros, onde não se deixe de trabalhar no sétimo dia, onde não se acendam lâmpadas e onde não se façam jejuns”.8
Encontrando-se em circunstâncias de tal modo oportunas, boa parte dos judeus não hesitava em fazer proselitismo, seguindo o conselho do velho Tobias: “Se Ele vos dispersou entre os povos que não O conhecem, foi para que publiqueis as suas maravilhas e lhes façais reconhecer que não há outro Deus onipotente senão Ele” (Th 13, 4). No parecer de Fillion, o centurião era um dos chamados “prosélitos da porta”, ou seja, “chegado até o umbral dessa religião superior, na qual não se entrava definitivamente senão com a condição de fazer-se circuncidar e praticar integralmente a Lei de Moisés”.9
Eficácia da mediação e da humildade
Então Jesus pôs-se a caminho com eles.
Nosso Senhor toma a iniciativa de ir até a casa do oficial, expressando desse modo, seu agrado diante de atitude tão confiante. Repete-se, no caso, uma peculiaridade que já havia movido Jesus a realizar outros milagres, como a cura da sogra de Pedro (cf. Lc 4, 38-39), ou o restabelecimento e perdão dos pecados do paralítico descido pela abertura de um teto (cf. Mc 2, 3-5): o Salvador não exige dos enfermos a manifestação do desejo de serem curados, bastando-Lhe a fé dos intercessores.
6b Porém, quando já estava perto da casa, o oficial mandou alguns amigos dizerem a Jesus: “Senhor, não te incomodes, pois não sou digno dc que entres em minha casa. 7a Nem mesmo me achei digno de ir pessoalmente a teu encontro”.
O oficial sabia ser proibido na Lei de Moisés que um judeu entrasse nas casas dos pagãos, sob pena de tornar-se impuro quem o fizesse. Preocupado com os ritos de purificação aos quais obrigaria a passar o Mestre, após visitá-lo, e, sobretudo, por julgar que tal condescendência sobrepujava em muito sua indignidade de pagão, enviou-Lhe uma mensagem com o objetivo de poupá-Lo de tal constrangimento.

Cabe-nos aqui analisar essa atitude de humildade: contrastando com o conceito positivo que os anciãos e todo o povo da cidade tinham a respeito de sua pessoa, o centurião dá provas de uma equilibrada apreciação de seus próprios predicados, declarando sua pequenez diante da grandeza de Cristo. Sem dúvida, essa atitude submissa da parte de um personagem cujo poderio inspirava temor causou considerável impressão na multidão.
6) SANTO AMBROSIO, apud SÃO TOMÁS DE AQUINO. Catena Aurea. In Lucam, c.VII, v.1-10.
7) STÖGER, Alois. El Nuevo Testamento y su mensaje. El Evangelio según San Lucas. Barcelona: Herder, 1970, v.111-i, p.200.
8) FLAVIO JOSEFO. História dos Hebreus. Contra Apio. L.II, c.9.
9) FILLION, Los milagros de Jesucristo, op. cit., p.295.

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