CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM Lc 11, 1-13 - Ano C - 2013
O pão nosso
de cada dia dá-nos hoje;
Muitos autores do passado, em especial os Padres da Igreja,
consideravam ser esta petição relativa à Eucaristia; hoje, porém, sem negar
essa interpretação, admite-se ser ela mais especialmente voltada para se obter
o alimento material.
4 perdoa-nos os nossos
pecados, pois também nós perdoamos a todos os que nos ofendem; e não nos deixes
cair em tentação.”
Comentando este versículo, São João Crisóstomo nos põe diante
de uma situação inegável: “Conhecendo nós isto, devemos dar graças a nossos
devedores, porque são para nós (se sabemos conhecê-lo assim) a causa de nosso
maior perdão, e dando pouco, alcançamos muito; porque nós temos muitas e
grandes dívidas para com Deus, e estaríamos perdidos se Ele nos pedisse uma
pequena parte delas” (5).
Sobre as tentações, pondera Orígenes: “Deus não quer impor o
bem, Ele quer seres livres... Para alguma coisa a tentação serve. Todos, com
exceção de Deus, ignoram o que nossa alma recebeu de Deus, até nós mesmos. Mas
a tentação o manifesta, para nos ensinar a conhecer-nos e, com isso,
descobrir-nos na miséria e nos obrigar a dar graças pelos bens que a tentação
nos manifestou” (6).
O AMIGO
INOPORTUNO
Retrocedamos dois mil anos de História, e analisemos de perto
uma caravana avançando pelo deserto, sobre asnos ou camelos, em pleno dia
ensolarado de tórrido verão. Poeira, sede, calor e cansaço são os companheiros
a cada passo, tornando muito penosos os translados. Esta era uma das razões
pelas quais os orientais muitas vezes preferiam os deslocamentos noturnos,
invertendo o período do sono.
Esta era uma das razões pelas quais os orientais muitas vezes
preferiam os deslocamentos noturnos, invertendo o período do sono.
Pelo contrário, o inverno oferece condições mais agradáveis
para viagens diurnas: o sol aquece suavemente, o desgaste físico é menor e a
necessidade de água não tão frequente. A parábola de hoje se verifica numa
noite de verão.
Aqueles tempos possuíam costumes bem mais simplificados em
relação aos atuais e, sem aviso prévio, um amigo podia se apresentar à porta a
qualquer hora do dia ou da noite. Caso a visita se desse durante o horário do
sono, bastava estender uma esteira num canto da sala, que o hóspede ficaria
muito contente. Se sua fome fosse considerável, sobretudo no caso de não haver
jantado, alguns pães com azeite de oliva e especiarias, eram suficientes para
torná-lo alegre e satisfazer-lhe o apetite.
As casas não eram grandes e nem com muitos cômodos. Em geral,
toda a família se deitava na própria sala de visitas, cuja porta dava acesso
direto à rua. Não imaginemos uma sequência de camas, mas sim esteiras ou
tapetes estendidos ao solo, com leves colchas. Portanto uns golpes à porta, ainda
quando suaves, facilmente despertavam quem junto a ela dormia.
É de dentro dessa moldura que devemos assistir à cena narrada
pelo Salvador.
5 Disse-lhes mais: “Se
algum de vós tiver um amigo, e for ter com ele à meia-noite para lhe dizer:
Amigo, empresta-me três pães, 6 porque um meu amigo acaba de chegar à minha
casa de uma viagem e não tenho nada que lhe dar;
Jesus sempre se apoia em fatos comuns e frequentes da vida
quotidiana para fazer entender aos seus ouvintes as profundas verdades da Fé.
Portanto, o caso contido nestes versículos 5 a 8 provavelmente já se havia dado
com vários dos circunstantes.
Devido à inteira organicidade do modo de ser daquela
civilização, as pessoas procuravam aproveitar a luz do dia para seus afazeres
e, quanto ao repouso, utilizavam para dormir as horas que iam desde o declínio
ao nascer do sol. Por volta das nove da noite, o silêncio penetrava em todos os
lares, chegando ao auge no período de meia-noite às três horas da madrugada. O
“amigo” dessa parábola chega justamente na hora mais incômoda: é muito tarde
para deitar- se e terrivelmente cedo para acordar. Mas, o inconveniente maior
desse acontecimento estava no fato de não ter sobrado pão na despensa do
anfitrião e a essas alturas não era mais possível matar um animal para levá-lo
às brasas... A única saída era recorrer às reservas do vizinho.
O vilarejo inteiro se encontra submerso em profundo sono mas,
logo às primeiras batidas, o dono da casa desperta e, sem se mover de sua
esteira, ouve a demanda. Tratava-se de conceder três pães para quem estava à
porta. Sobre o porquê de serem três, várias hipóteses tecem os autores, procurando
atribuir sentidos simbólicos a este número. Na realidade, segundo os costumes
da época, os pães tinham um tal tamanho que três faziam uma refeição normal de
um adulto.
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