Tríduo Pascal

domingo, 3 de novembro de 2013

Evangelho XXXII Domingo do Tempo Comum – Ano C – 2013 - Lc 20, 27-38

Comentários ao Evangelho 32º Domingo do Tempo Comum – Ano C – 2013 - Lc 20, 27-38

Mons. João Scognamiglio Clá Dias, E.P .

Evangelho Lc 20, 27-38

27 Aproximaram-se depois alguns saduceus, que negam a ressurreição, e fizeram-Lhe a seguinte pergunta: “Mestre, Moisés deixou-nos escrito: ‘Se morrer o irmão de algum homem, tendo mulher, e não deixar filhos, case-se com ela o seu irmão, para dar descendência ao irmão.’ Ora, havia sete irmãos. O primeiro casou, e morreu sem filhos.
30Casou também o segundo com a viúva, e morreu sem filhos. Casou depois com ela o terceiro. E assim sucessivamente todos os sete; e morreram sem deixar filhos. Morreu enfim também a mulher. Na ressurreição, de qual deles será ela mulher, pois que o foi de todos os sete?”
34Jesus disse-lhes: “Os filhos deste mundo casam e são dados em casamento, mas os que forem julgados dignos do mundo futuro e da ressurreição dos mortos, não desposarão mulheres, nem as mulheres homens, porque não poderão jamais morrer; porquanto são semelhantes aos anjos e são filhos de Deus, visto serem filhos da ressurreição. Que os mortos hajam de ressuscitar, o mostrou também Moisés no episódio da sarça, quando chamou ao Senhor o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, e o Deus de Jacó. 38 Ora Deus não é Deus de mortos, mas de vivos, porque para ele todos são vivos” (Lc 20, 27-38).
A Ressurreição dos corpos
Afirma o Apóstolo que Jesus ressuscitou como “primícias dos que morrem” (1 Cor 15, 20). São Paulo não perde nenhuma oportunidade para acentuar a importância da ressurreição final com vistas a animar aos coríntios por ele batizados a continuarem firmes na fé, como também no trabalho apostólico. Segundo ele, sem essa fé, a tendência seria adotar-se um sistema de vida epicurista, relativista e libertino, conforme a expressão de Isaías: “Comamos e bebamos porque amanhã morreremos” (22, 13).
No capítulo 15 de sua Primeira Epístola aos Coríntios, depois de denominar de “insensato” a quem se põe o problema de como e em que condições ressuscitam os mortos, ele procura esclarecer de forma muito simples e acessível a revelação sobre a identidade substancial dos corpos nesta vida terrestre e os readquiridos após o Juízo Final, apesar das enormes diferenças de propriedade e aspecto entre o morto e o ressurrecto.
A comparação é retirada da natureza vegetal. Desta, Paulo faz uma aproximação entre a morte do grão ao ser semeado, sua posterior germinação e frutificação, com o nosso retorno à vida, no dia do Juízo. “Assim também será a ressurreição dos mortos. Semeia-se na corrupção, ressuscita-se na incorrupção. Semeia-se na ignomínia, ressuscita-se glorioso. Semeia-se na debilidade, ressuscita-se na força. Semeia-se um corpo natural, ressuscitará um corpo espiritual” (1 Cor 15, 42-44).
Nosso corpo participa dos prêmios e castigos da alma
Mais de um milênio após essa proclamação de Paulo, o Doutor Angélico nos deixaria uma rica e profunda doutrina sobre a essência dessa revelação. Sempre levando em conta estar a alma unida ao corpo como forma e matéria, e “como a alma é a mesma especificamente, parece que deve ter também a mesma matéria específica. Logo, será o mesmo corpo antes e depois da ressurreição. E assim, será preciso que esteja composto de carne e ossos, e de outras partes da mesma classe” 1.
Nosso corpo ressuscitará porque Deus assim quis e determinou, como também por ser parte integrante de nós mesmos, merecendo os prêmios ou castigos conforme caibam à nossa alma na medida em que tenha participado dos méritos ou das iniqüidades da mesma. Por isso, “entre os bons e os maus permanecerá uma diferença fundamentada no que pertence pessoalmente a cada um. […] e como a alma merece, pelos seus atos pessoais, ser elevada à glória da visão de Deus ou ser excluída pela culpa da ordenação para tal glória, segue-se, como conseqüência, que todo corpo se conformará segundo a dignidade da alma” 2.
Os corpos dos justos se revestirão de glória
A morte não é senão um sono prolongado (cf. Jo 11, 11), e os cemitérios, vastos dormitórios. Os que repousam no pó da terra despertarão, uns para a felicidade eterna, outros para as trevas e castigo também eternos (cf. Dn 12, 2). Os bons, já no acordar, terão seus corpos em claridade. “Pela claridade da alma elevada à visão de Deus, o corpo, unido à alma, alcançará algo mais. Pois estará totalmente sujeito a ela pelo efeito da virtude divina, não só enquanto ser, mas também enquanto ações e paixões, movimentos e qualidades corpóreas. Portanto, assim como a alma se encherá de certa claridade espiritual, ao gozar da visão divina, também, por certa redundância desta no corpo, se revestirá este, à sua maneira, da claridade da glória”. 3
Ademais, os corpos dos bons, no próprio instante da ressurreição, gozarão da agilidade. “A alma, que unida a seu fim último gozará da visão divina, experimentará o cumprimento total de seu desejo em tudo. E como o corpo se move conforme o desejo da alma, resultará que o corpo obedecerá absolutamente à indicação do espírito. Por isso os corpos que terão os bemaventurados ressuscitados serão ágeis. E isto é o que diz o Apóstolo no mesmo lugar (1 Cor 15, 43): Semeado na fraqueza ressuscita vigoroso. Pois experimentamos a fraqueza corporal porque o corpo se sente incapaz de responder aos desejos da alma nas ações e movimentos que lhe impõe; fraqueza que, então, desaparecerá totalmente pela virtude que sobeja no corpo ao estar a alma unida a Deus. Por isso, na Sabedoria (3,7) se diz também dos justos que correrão como centelhas na palha, não porque tenham que moverse necessariamente, pois tendo a Deus de nada precisam, mas para demonstrar seu poder” 4.
O corpo glorioso se levantará da poeira da terra, espiritualizado, dotado de sutileza. “A alma que goza de Deus se unirá perfeitissimamente a Ele e participará de Sua bondade em grau sumo, conforme sua própria medida; e de igual modo o corpo, pois este se sujeitará perfeitamente à alma” 5.
A impassibilidade dos corpos gloriosos não permitirá a existência de nenhum defeito, dor ou mal. “A alma que goza de Deus terá tudo em ordem à remoção de todo mal, porque onde está o Sumo Bem não cabe mal algum. Logo, também o corpo, aperfeiçoado pela alma e em proporção a ela, será imune de todo mal, não só atual, mas inclusive do mal possível. Do atual, porque em ambos nem haverá corrupção, nem deformidade, nem defeito nenhum. Do possível, porque nada poderão sofrer que lhes perturbe. E por isso serão impassíveis. Mas esta impassibilidade não excluirá neles as paixões essencialmente sensíveis, porque usarão dos sentidos para gozar daquilo que não repugna o estado de incorrupção” 6.
Ressurreição dos condenados
Os maus também ressuscitarão íntegros. “As almas dos condenados têm efetivamente natureza boa, que foi criada por Deus; mas terão a vontade desordenada e afastada do próprio fim. Portanto, seus corpos, no que se refere à natureza, serão reparados e íntegros, pois ressuscitarão na idade perfeita, com todos os seus membros e sem nenhum defeito, nem corrupção que tivesse ocasionado uma falha da natureza ou enfermidade” 7.
As almas dos maus, ao ressuscitarem seus corpos, estarão sujeitas a estes; diferentemente da situação dos bem-aventurados, serão elas carnais e não espirituais. “Como sua alma estará voluntariamente separada de Deus e privada de seu próprio fim, seus corpos não serão espirituais, ou seja, sujeitos totalmente ao espírito, senão que sua alma será carnal pelo afeto” 8.
Nem de longe experimentarão a agilidade dos corpos gloriosos. Muito pelo contrário, serão de certo modo sujeitos à lei da gravidade. “Tais corpos não serão ágeis, nem obedientes à alma, sem dificuldade, mas serão graves e pesados, de certo modo insuportáveis à alma, tais quais são as mesmas almas que se afastaram de Deus pela desobediência” 9.
Serão ainda mais sujeitos às dores e ao sofrimento do que o somos nós nesta vida terrena mas, sem nunca em nada se corromper, além das respectivas almas serem “atormentadas pela privação total do desejo natural da bem-aventurança” 10.
E pelo fato de estar a alma excluída da luz do conhecimento divino, seus corpos serão “opacos e tenebrosos” 11.
Sobre esses desgraçados, triunfará a morte. Ressuscitarão para ser lançados na morte eterna. A eles não se aplicarão as palavras de Isaías (25, 8) e Oséias (13, 14) citadas pelo Apóstolo “A morte foi tragada pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (1 Cor 15, 55).
Continua...

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