Tríduo Pascal

sexta-feira, 7 de março de 2014

Evangelho 1º Domingo da Quaresma - Mt 4, 1 -11 - Ano A - 2014

Continuação dos comentários ao Evangelho 1º Domingo da Quaresma - Ano A -Mt 4, 1 - 11
Com o diabo não se conversa
4 Mas Jesus respondeu: “Está escrito: ‘Não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”.
Tomando uma atitude radical, Ele cortou a conversa com o demônio. Como podemos comprovar nesta e nas tentações seguintes, suas respostas são taxativas, dadas com a nítida intenção de encerrar o colóquio. Além disso, o argumento utilizado por Jesus baseia-se na autoridade da Escritura, contra a qual não há recurso. Ao evocar as palavras do Deuteronômio, “não só de pão vive o homem” (8, 3), Ele como que afirmava: “Não só de pão, mas também de pão”. Reconhece a necessidade do alimento e até do dinheiro, porém, ensina que devem ser utilizados com a primeira atenção posta em Deus. Seu divino exemplo é de desprendimento das coisas concretas.
Outra lição que daí decorre diz respeito ao modo de proceder de Jesus em face de uma necessidade pessoal. Aquilo que o demônio queria que realizasse em proveito próprio, ao converter as pedras em pão, Ele o faz depois, em favor de terceiros, nas Bodas de Caná, ao converter a água em vinho (cf. Jo 2, 1-11), e multiplicando pães e peixes ao longo da vida pública (cf. Mt 14, 15-21; Mc 6, 30-44; Lc 9, 10-17; Jo 6, 1-13). Sua conduta é perfeita, pois precisamos dar aos Outros aquilo que o maligno sugere que obtenhamos para nós mesmos, e fazer-lhes o bem que gostaríamos de receber.
Movido por sua característica pertinácia, o anjo mau não desiste e faz nova proposta.
A quimera de uma religião sem cruz
Então o diabo levou Jesus à Cidade Santa, colocou-O sobre a parte mais alta do Templo, 6 e Lhe disse: “Se és Filho de Deus, lança-Te daqui abaixo! Porque está escrito: ‘Deus dará ordens aos seus Anjos a teu respeito, e eles Te levarão nas mãos, para que não tropeces em alguma pedra”. Jesus lhe respondeu: “Também está escrito: ‘Não tentarás o Senhor teu Deus!”
Ðiscutem os autores se o demônio foi caminhando com o Divino Mestre até a parte mais alta do Templo ou se usou de suas faculdades angélicas para conduzi-Lo até lá.7 Grande parte deles sustenta que O levou pelos ares, para dar-Lhe a sensação de que tinha muito poder. Insensatez, pois o tentador não sabia que Jesus Cristo, enquanto Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, o criara e lhe outorgara a capacidade de realizar este prodígio. “Levava Cristo como se Ele estivesse obrigado, sem dar-se conta de que ia voluntariamente”.8 No alto do Templo o diálogo continua, e como Nosso Senhor silenciou satanás na primeira tentação valendo-Se da Escritura, ele agora contra-ataca, com inteligência, utilizando a mesma arma. Seu argumento consiste em alegar a proteção que Deus Lhe daria se Ele Se lançasse do pináculo do edifício sagrado. Não obstante, “as falsas flechas do diabo, tiradas das Escrituras, são quebradas por Cristo com os escudos verdadeiros das próprias Escrituras”.9
Nesta tentação o demônio propunha uma caricatura da Religião verdadeira, excluindo o papel da dor, do sacrifício e do caminho autêntico para a santidade. Uma religião baseada no fabuloso, no portento e no prodígio, porque, do principal local de culto de Israel desceria de forma fulgurante o Messias, muito diferente do varão crucificado que Nosso Senhor estava destinado a ser, por amor à humanidade pecadora. A resposta admite dois sentidos, para confundir o diabo e dar a conversa, mais uma vez, por concluida: “Não me tentes porque Eu sou Deus” ou “Eu não posso fazer isto, porque seria tentar a Deus”. Nós, porém, podemos interpretá-la como um ensinamento a respeito da resignação que deve caracterizar o nosso relacionamento com Jesus. E lícito pedirmos milagres e até manifestações grandiosas, mas cientes de que se não formos atendidos a nossa fé tem de permanecer intacta.
O príncipe das trevas sempre tira o que promete
Novamente, o diabo levou Jesus para um monte muito alto.
Mostrou-Lhe todos os reinos do mundo e sua glória, 9 Lhe disse: “Eu Te darei tudo isso, se Te ajoelhares diante de mim, para me adorar”, ‘° Jesus lhe disse: “Vai-te embora, satanás, porque está escrito: ‘Adorarás ao Senhor teu Deus e somente a Ele prestarás culto”. Então o diabo O deixou, E os Anjos se aproximaram e serviram a Jesus.
Apesar de ter sido vencido duas vezes, o demônio deseja chegar ao último ponto: ser adorado por Nosso Senhor, o que suporia uma negação do culto a Deus. Para isto ele oferece o domínio temporal que — sempre cobiçado ao longo da História —levou muitos homens a seguir os ídolos, abandonando o verdadeiro Deus. No entanto, com uma resposta que não prima pela diplomacia, Jesus, em primeiro lugar, expulsa o príncipe das trevas e, depois, ainda sublinha que apenas ao Senhor — ou seja, a Ele mesmo — é devido o culto que o maldito pretendia desviar para si.

Grande é o contraste entre Adão e Nosso Senhor Jesus Cristo. O primeiro deu ouvidos à recomendação da serpente, transmitida por Eva, e comeu o fruto, perdendo aquilo que o demônio prometera: “sereis como Deus” (Gn 3, 5). Pois com o pecado a vida divina se extinguiu em sua alma, enquanto se tivesse correspondido ao mandado do Senhor receberia um acréscimo de felicidade, manteria o estado de graça e teria feito notável progresso na vida espiritual. Portanto, aquilo que o tentador fingia querer dar foi justamente o que lhe roubou. A Nosso Senhor ele ofereceu o serviço dos Anjos e todos os tesouros da Terra, coisas que era incapaz de conceder, mas que foram entregues a Jesus-Homem junto com a realeza sobre toda a humanidade e sobre a ordem da criação, por ter vencido satanás e ter abraçado os tormentos do Calvário. Eis um princípio que deve nortear constantemente a nossa vida, até a hora da morte: nunca podemos dialogar com o demônio, criatura maldita que sempre tira aquilo que promete. Devemos encerrar qualquer conversa com ele logo no início, com o apoio da Palavra de Deus, à imitação de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Continua no próximo post.

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