Tríduo Pascal

segunda-feira, 10 de março de 2014

Evangelho 2º domingo da Quaresma - Mt 17, 1-9 - Ano A

Comentário ao Evangelho – II domingo da Quaresma – Mt 17, 1-9 – Ano A – 2014
Seis dias depois, tomou Jesus consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e levou-os à parte a um monte alto, e transfigurou-Se diante deles. O Seu rosto ficou refulgente como o Sol, e as Suas vestes tornaram-se luminosas de brancas que estavam. Eis que lhes apareceram Moisés e Elias falando com Ele. Pedro, tomando a palavra, disse a Jesus: “Senhor, que bom é nós estarmos aqui; se queres, farei aqui três tendas, uma para Ti, uma para Moisés, e outra para Elias.” Estando ele ainda a falar, eis que uma nuvem resplandecente os envolveu; e saiu da nuvem uma voz que dizia: “Este é o meu Filho muito amado em quem pus toda a minha complacência; ouvi-O”. Ouvindo isto, os discípulos caíram de bruços, e tiveram grande medo. Porém, Jesus aproximou-Se deles, tocou-os e disse-lhes: “Levantai-vos, não temais”. Eles, então, levantando os olhos, não viram ninguém, exceto Jesus. Quando desciam do monte, Jesus fez-lhes a seguinte proibição: “Não digais a ninguém o que vistes, até que o Filho do Homem ressuscite dos mortos” (Mt 17, 1-9).
Como será a felicidade eterna?
A Transfiguração foi para os discípulos um antegozo do Céu e uma imensa consolação para enfrentar as futuras provações da Paixão e Morte de Jesus. Também todo batizado recebe consolações, como estímulo a perseverar no serviço de Deus.
A imensa felicidade do Paraíso celeste
São Paulo declara aos Coríntios ter sido arrebatado ao Céu em certo momento de sua vida, e lá ter ouvido palavras impossíveis de ser transmitidas e menos ainda de poder explicá-las: “... foi arrebatado ao paraíso; e ouviu palavras inefáveis que não é lícito [ou possível] a um homem repetir” (2 Cor 12, 4).
De fato, para os místicos torna-se difícil externar suas experiências interiores, e daí bem podemos compreender o quanto faltaram a São Paulo os termos de comparação para relatar o que com ele se passara, pois, segundo o que ele mesmo havia dito anteriormente: “nem o olho viu, nem o ouvido ouviu, nem jamais passou pelo pensamento do homem o que Deus preparou para aqueles que O amam” (1 Cor 2, 9). Essa é a maravilha que nos aguarda no momento de ingressarmos na vida eterna. E esse deve ter sido um considerável motivo para São Paulo perseverar até a hora de seu martírio, apesar de ter ele visto então apenas reflexos do Absoluto que hoje contempla face a face.
Consideremos em profundidade — até onde pode alcançar nossa inteligência fortalecida pela fé — qual será a essência de nossa felicidade quando ingressarmos na visão beatífica.
Visão beatífica e conhecimento de Deus através das criaturas
Segundo São Tomás de Aquino, todos os seres criados por Deus poderiam ter sido superiores, com exceção de três: a humanidade de Cristo, por estar unida hipostaticamente à pessoa do Filho; a Virgem Santíssima, por ser Mãe de Deus; e a visão beatífica, por se tratar de visão do próprio Deus 1. São Paulo afirma ser imperfeito nosso conhecimento nas atuais circunstâncias, mas “quando vier o que é perfeito, o que é imperfeito será abolido” (1 Cor 13, 10). E torna ainda mais clara essa idéia utilizando-se desta comparação: “Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança, discorria como criança. Mas, quando me tornei homem, dei de mão às coisas que eram de criança. Nós agora vemos como que por um espelho, obscuramente, mas então veremos face a face” (1 Cor 13, 11-12).
Tão rico foi o universo teológico recebido por São Paulo diretamente do próprio Cristo Jesus que, às vezes, teses de preciosa substância ficam involucradas em meio de outros temas, ao longo de suas epístolas. Esta, em concreto, é uma delas. De fato, nosso conhecimento é imperfeito, pois, quer seja no campo natural da pura inteligência, ou no sobrenatural, mediante a virtude da fé, e inclusive no da profecia, tem uma nota comum: a elaboração subseqüente realizada com base nos conceitos criados e com o esforço da abstração.
Pelo contrário, ao vermos Deus face a face, a fé redundará em visão e, portanto, se evanescerá com todo o conhecimento abstrativo.
Agora vemos como que por um espelho...” ou seja, por meio de um instrumento; conhecemos a Deus só “porque as coisas invisíveis dEle, depois da criação do mundo, compreendendo-se pelas coisas feitas, tornaram-se visíveis” (Rm 1, 20). E é a partir desse contato direto com as criaturas que elaboramos outros motivos e princípios através da própria fé, utilizando conceitos criados. Por isso é obscuro nosso conhecimento e, portanto, imperfeito. Porém, quando chegar o fim, teremos um conhecimento imediato, claro e total de Deus, se bem que não possamos conhecê-Lo totalmente.
A felicidade do ser inteligente: o exercício de suas faculdades
Talvez entendamos ainda melhor essa questão se seguirmos o pensamento de São Tomás de Aquino 2. Segundo o Doutor Angélico, o desejo de felicidade do ser inteligente leva-o a buscar sua própria perfeição, exercitando suas mais elevadas faculdades. Isto se verifica até quanto aos próprios sentidos, e por isso podemos constatar que o olho se regozija ao ver, e o paladar, ao saborear. E em conseqüência constitui um tormento a inatividade forçada dos mesmos.

Ora, a felicidade do ser inteligente também se verifica no exercício de suas faculdades e tornar-se-á ele tanto mais feliz quanto mais nobres sejam essas faculdades e mais formoso e elevado o objeto sobre o qual se exerçam. Não há dúvida de que, naturalmente falando, nada há de mais excelente no homem do que sua inteligência e nada pode superar a suprema verdade que é o próprio Deus. É, portanto, na inesgotável e sempre renovada visão beatífica que o homem encontra a plenitude da felicidade, extensiva a todas as suas apetências legítimas, como, por exemplo, o desejo de governar: “e reinarão com Ele ...” (Ap 20, 6); ou a necessidade dos bens: “Todos os bens me vieram juntamente com ela, e inumeráveis obras pelas suas mãos” (Sb 7, 11). “O que é presentemente para nós uma tribulação momentânea e ligeira, prepara-nos um peso eterno de glória para além de toda a medida” (2 Cor 4, 17).
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