Tríduo Pascal

sábado, 18 de outubro de 2014

Evangelho XXX Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 22,34-40

Comentários ao Evangelho XXX Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 22,34-40
Naquele tempo, os fariseus ouviram dizer que Jesus tinha feito calar os saduceus. Então eles se reuniram em grupo, e um deles perguntou a Jesus, para experimentá-lo: ”Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?” Jesus respondeu: “ ‘Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento!’ Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: ‘Amarás ao teu próximo como a ti mesmo’. Toda a Lei e os profetas dependem desses dois mandamentos”  Mt 22,34-40
A sabedoria humana contra a Sabedoria divina!
A questão apresentada pelo fariseu a Jesus sai de lábios trabalhados pela sabedoria humana para ouvidos plenos de Sabedoria divina. O doutor da Lei não pergunta para conhecer a verdade, mas sim para tentá-Lo. A resposta de Jesus é simples e ao mesmo tempo grandiosa: o amor a Deus!
I – A virtude do amor
Os fundamentos do amor são muito mais profundos do que geralmente se imagina. Sendo ele um peso que arrasta aqueles que se amam — segundo afirma Santo Agostinho1 — produz um vigoroso desejo de presença e união, exteriorizado no abraço como melhor símbolo.
Ora, tudo quanto existe tem sua fonte na onipotência divina, inclusive o amor, cujo princípio é eterno e procede do Pai e do Filho. Ambos, ao Se amarem, originam essa tendência com tão extraordinária força que dela procede uma Terceira Pessoa. Assim como o amor produz em nós uma inclinação em relação ao ser amado, Pai e Filho, seres infinitamente amáveis, amam Seu próprio Ser Divino. Aí está a origem do Amor, enquanto Pessoa procedente da união entre Pai e Filho.
O Gênesis, ao narrar a grande obra da Criação, descreve como Deus contemplava a realização de cada dia e atribuía um valor respectivo à obra saída de Seu poder, pois o grau de perfeição de cada ser sempre é infundido por Seu amor, e na proporção deste.
A virtude mais importante para a salvação
Já no Evangelho, verifica-se quanto o Filho de Deus louva a fé do centurião (cf. Lc 7, 9) e da cananéia (cf. Mt 15, 28), premiando-a com milagres. Mais adiante, Cristo exalta a fé de Pedro, declarando proceder esta de uma revelação feita pelo Pai, e por isso proclama-o bem-aventurado (cf. Mt 16, 17). Entretanto, Jesus nos fala também de uma virtude que é, por si só, capaz de perdoar um enorme número de pecados, chegando a defender publicamente uma pecadora contra aqueles que a acusavam: “Porque muito amou” (Lc 7, 47). Ora, não podemos nos esquecer de como o Senhor conhece o valor e o prêmio de cada ato de virtude. Devemos, portanto, face à salvação eterna, compreender como é mais importante amar do que praticar a fé.
Jesus, supremo modelo de amor
Para se atingir o mais alto grau de perfeição dessa virtude é indispensável admirá-la em Cristo Jesus e imitá-Lo.
O amor do Filho de Deus, é todo especial, por se desenvolver dentro de um prisma sobrenatural e ter por objeto o Ser Supremo. Há, portanto, uma notável diferença entre Ele e nós. No Verbo Encarnado, o amor divino e o humano, pela união hipostática, se reúnem numa só Pessoa. Quanto a nós, “o amor de Deus se derramou em nossos corações por virtude do Espírito Santo” (Rm 5, 5); ou seja, ele nos é dado. Para poder alcançá-lo, devemos pedi-lo.
Apesar desta diferença, Jesus é o nosso insuperável modelo, pois é impossível encontrar nEle qualquer sombra de interesse que não seja a glória do Pai. Assim também deve ser o nosso amor. E, se bem que em Jesus nunca tenha havido fé — pois, desde o primeiro instante de Sua existência, a alma dEle esteve na visão beatífica — em nós, essa virtude deve estar sempre acompanhada de um caloroso amor, o mais semelhante possível ao de Jesus.
A fé do cristão e a fé dos demônios
Comentando a primeira epístola de São João, assim se exprime Santo Agostinho: “‘Porque também os demônios crêem e tremem’, como diz a Escritura (Tg 2, 19). Que mais puderam os demônios crer do que dizer: ‘Sabemos quem és, o Filho de Deus’ (Mc 1, 24)? O que disseram os demônios, disse-o também Pedro. [...] Assim, pois, Pedro diz: ‘Tu és Cristo, o Filho de Deus vivo’ (Mt 16, 16). Dizem também os demônios: ‘Sabemos que és o Filho de Deus e o Santo de Deus’. Pedro diz o mesmo que dizem os demônios. O mesmo quanto às palavras, muito diferente quanto ao espírito.
“E como consta que Pedro dizia isso por amor? Porque a fé do cristão está sempre acompanhada de amor, mas a fé do demônio não tem amor. De que modo é sem amor? Pedro dizia isso para abraçar Cristo, enquanto os demônios o diziam para Cristo afastar-Se deles. Porque antes de dizer ‘sabemos quem és, o Filho de Deus’, haviam dito: ‘Que tens Tu conosco, Jesus de Nazaré? Vieste perder-nos antes do tempo?’ (Mc 1, 24). Uma coisa, pois, é confessar Cristo com intenção de abraçá-Lo, e outra muito diferente é confessar Cristo com propósito de apartá-Lo de si.

“Logo, claro está que quando, nesta passagem, João diz: ‘Aquele que crê’, quer dizer uma fé peculiar, não aquela que muitos têm. Portanto, irmãos, que nenhum herege venha dizer-nos: ‘Nós também cremos’. Pois justamente por este motivo vos apresentei o exemplo dos demônios, a fim de que não vos alegreis com as palavras dos que crêem, mas examineis as obras dos que vivem”.2
Continua

terça-feira, 14 de outubro de 2014

EVANGELHO DO XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 22, 15-21

CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO 29º DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 22, 15-21
O ensinamento de Jesus sobre a harmonia entre a ordem espiritual e a temporal
As coisas de Deus e as coisas da terra não devem ser antagônicas. Pelo contrário, entre elas deve haver colaboração. Na harmonia entre ambas as esferas, a temporal e a espiritual, está o segredo do progresso. E a História nos mostra que nada pode haver de mais excelente do que seguir o conselho de Nosso Senhor: “Buscai, pois, o reino de Deus e sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo” (Lc 12, 31).
Seja dito de passagem, nessa conjugação e colaboração entre o espiritual e o temporal é que, segundo o seu carisma, esforçam-se os Arautos do Evangelho: em atuar procurando a “consecratio mundi”, a sacralização da ordem temporal, enquanto leigos, e sendo filhos amorosos da Igreja, fiéis ao Papa, como instrumentos da Nova Evangelização.
Harmonia dentro de nós
Pode-se dizer que há uma espécie de convívio entre as duas esferas dentro do homem, uma vez que temos para conosco deveres referentes à nossa vida espiritual e às necessidades de nosso corpo. A tal respeito, comenta São Tomás de Aquino na Catena Aurea:
“Também podemos entender essa passagem [do Evangelho] no sentido moral, porque devemos dar ao corpo algumas coisas, como o tributo a César, isto é, o necessário; mas tudo o que corresponde à natureza das almas, isto é, o que se refere à virtude, devemos oferecer ao Senhor. Os que ensinam a lei de modo exagerado e ordenam que não cuidemos em absoluto das coisas devidas ao corpo .... são fariseus, que proíbem pagar o tributo a César; e os que dizem que devemos conceder ao corpo mais do que devemos, são herodianos. Nosso Salvador quer que a virtude não seja desprezada, quando prestamos atenção demasiada ao corpo; nem que seja oprimida a natureza, quando nos dedicamos com excesso à prática da virtude.”
Concluamos, seguindo o conselho de Santo Agostinho: se nos preocupamos com as moedas nas quais está gravada a efígie de César, muito mais devemos nos preocupar com nossas almas, nas quais Deus gravou sua própria imagem. Se a perda de um bem terreno nos entristece, muito mais nos deve contristar o causar dano à nossa alma pelo pecado.
1) Vida de Nuestro Señor Jesucristo, t. 4, p. 90

2) Id. ib.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

EVANGELHO DO XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 22, 15-21

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO 29º DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - Mt 22, 15-21
O modo de ação do mal
“Reuniram-se então os fariseus para deliberar entre si sobre a maneira de surpreender Jesus nas suas próprias palavras.
Nesse episódio, merece igualmente nossa atenção a maneira de agirem os maus.
Quando deseja armar ciladas aos bons, o mal, antes de apresentar-se de forma declarada, costuma preparar sua ação por um longo processo. Assim agiram os fariseus com Nosso Senhor. Inicialmente usaram a astúcia da serpente para, depois, se insurgir contra Ele de forma pública e agressiva. Aqui vemo-los no decurso da primeira operação, desejando surpreender Jesus em flagrante, a fim de lançarem contra Ele a opinião pública.
Em nossa própria vida privada, quantas e quantas vezes da mesma maneira não somos nós surpreendidos pelo mesmo método farisaico, utilizado pelo mal para perseguir os que se esforçam em seguir os passos de Jesus? Imitemos a sabedoria do Divino Mestre, não nos deixemos surpreender...
A respeito das tais táticas farisaicas, consta mais este detalhe no Evangelho:
16a“Enviaram seus discípulos com os herodianos...”
É outra demonstração de sua maldosa astúcia: escolheram alguns jovens, alunos de escolas rabínicas, para causar a impressão de autenticidade, como se tivessem real interesse em aprender. E os instruíram a se aproximar do Divino Mestre com demonstrações de respeito. Sobre esse particular, comenta o acatado exegeta L.- CL. Fillion:
“Por isso, no princípio evitaram apresentar-se em pessoa, temerosos de excitar sua desconfiança. Enviaram alguns de seus jovens talmudim ou discípulos, os quais, com candura aparente, vieram propor-Lhe um caso de consciência, esperando que o resolvesse de modo que ficasse numa situação muito difícil” 1.
No mesmo versículo 16, outro dado chama a atenção: “Enviaram seus discípulos com os herodianos...”.
Mesmo quando estão em campos opostos, é incrível a capacidade dos maus de se unirem contra o Bem. Os fariseus anelavam a independência e supremacia de Israel, e odiavam os romanos; os herodianos apoiavam a família de Herodes, que recebeu seu poder dos romanos.
Assim, embora encarniçados adversários, fariseus e herodianos encontram-se irmanados neste episódio, em busca de um fim comum: o deicídio.
Da astúcia da serpente faz parte a adulação insidiosa:
16b “Mestre, sabemos que és verdadeiro e ensinas o caminho de Deus em toda a verdade, sem te preocupares com ninguém, porque não olhas para a aparência dos homens”.
Com tais palavras, os fariseus condenam-se eles mesmos. Com efeito, não eram sinceros e viviam preocupados com a opinião alheia a respeito de si próprios, só cuidando das aparências.
17 “Dize-nos, pois, o que te parece: É permitido ou não pagar o imposto a César?”
Se Jesus optasse pela obrigação moral de pagar o imposto exigido pelos romanos, prontas já estavam as tubas dos adversários para sublevar os israelitas contra Ele, pois não era admissível um Messias que se manifestasse a favor da submissão ao estrangeiro gentio. De outro lado, se Jesus negasse a liceidade do tributo, seria denunciado às autoridades romanas, que por certo o condenariam à morte.
Aqui fica claro o papel dos herodianos nesse episódio. “Como adeptos do governo de Roma, seriam acusadores e testemunhas, se a resposta de Jesus lhes parecesse contrária aos interesses do Império”, comenta o já mencionado Fillion 2.
Jesus inverte os papéis
Na sequência do episódio evangélico, Nosso Senhor quiçá haja surpreendido seus adversários pela veemência da resposta:
“Jesus, percebendo a sua malícia, respondeu: Por que me tentais, hipócritas?”.
Que grande diferença entre os métodos empregados respectivamente pelo mal e pelo bem! Os fariseus adulam para perder, Jesus increpa para salvar.
Não podiam os fariseus se queixar por receberem essa severa recriminação. Jesus, a Sabedoria Eterna e Encarnada, respondia em primeiro lugar à intenção oculta deles: tentar com hipocrisia. “Não lhes responde suavemente”, comenta São João Crisóstomo, “de acordo com as palavras pacíficas que Lhe haviam dirigido, mas com aspereza, segundo suas más intenções; porque Deus responde aos pensamentos e não às palavras” (apud Catena Aurea). E os desmascarava diante do público. Jesus continuou:
“Mostrai-me a moeda com que se paga o imposto! Apresentaram-lhe um denário”.
Os romanos permitiam que moedas de cobre fossem cunhadas pelas autoridades do povo local. Nelas eram impressas figuras tiradas dos reinos vegetal e animal. O denário, entretanto, moeda de prata para uso em todo o Império, era monopólio de Roma. Com ele se pagava o imposto e tinha gravada a efígie do imperador, cingida de uma coroa de louros, com esta inscrição: “Tibério César, sublime filho do divino Augusto”.
Ao fazer os fariseus lhe mostrarem uma dessas moedas, Jesus acabava de inverter os papéis. Deixava evidente que, embora em teoria rejeitassem o imperador como senhor do país, na prática o aceitavam, utilizando-se de seu dinheiro. Eles, de seu lado, perceberam para onde caminharia a resposta. Contudo, em sua maldade e cegueira, iludiam-se, esperando ainda uma possível falha de Nosso Senhor. Podemos imaginar a atmosfera de suspense formada nesse instante:
“Perguntou Jesus: De quem é esta imagem e esta inscrição?”.
Método de suprema sabedoria em responder: obrigar o adversário a tirar a conclusão da própria afirmação que fez. Os inquiridos passaram a ser os fariseus:
“De César, responderam-lhe. Disse-lhes então Jesus: Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.”
Eis a resposta que se gravou para sempre nos céus da História. Quem utilizava o dinheiro de César, que lhe pagasse o imposto devido, ainda mais tendo em vista os benefícios proporcionados à Palestina pela administração romana.

Em se tratando de uma nação essencialmente teocrática, como era a judaica, compreende-se a perplexidade na qual muitos podiam se encontrar. Porém, havia uma situação de fato da qual não se podia prescindir.
Continua no próximo post