Tríduo Pascal

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Evangelho XIX Domingo do Tempo Comum - Ano B - Jo 6, 41-51

Continuação dos comentários ao Evangelho do XIX Domingo do Tempo Comum - Ano B - Jo 6, 41-51
O alimento favorece a união dos que o partilham
A alimentação, além da finalidade imediata de manter a vida do homem, tem também um importante papel social: o de unir as pessoas. Por exemplo, é em torno da mesa que a família se reúne diariamente e põe em comum, não só os alimentos, mas também os sentimentos, os ideais, o modo de ser e até os problemas caseiros. É à mesa que se desenvolve a conversa e os pais têm uma das melhores ocasiões de ir formando o espírito dos filhos.
O fato de se sentarem todos juntos para fazer a refeição estabelece um especial traço de união entre os membros de uma família, de um grupo de amigos ou de uma comunidade religiosa, que vai além das simples iguarias para valores mais altos. O alimento possui algo que favorece a união daqueles que o partilham. Os vínculos familiares, sociais ou religiosos se fortalecem e a verdadeira amizade se consolida.
É também em torno da mesa que se realizam as comemorações dos pequenos ou grandes acontecimentos da vida.
A morte entrou pelo mau uso do alimento
Mesmo no Paraíso Terrestre, onde o homem tinha os instintos perfeitamente ordenados, é de supor que, se não tivesse havido pecado e a vida se desenvolvesse normalmente, também seria em torno do ato da nutrição que transcorreriam os melhores momentos do convívio social e familiar.
E como o maior dom de Deus à humanidade seria dado sob a forma de alimento, foi através de um elemento nutriente que o Criador quis pôr à prova nossos primeiros pais, para depois conceder-lhes tão alta dádiva: “Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim; mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, porque no dia em que dele comeres, morrerás indubitavelmente” (Gn 2, 16-17). É esta a forma característica do agir de Deus. Pede uma pequena renúncia para depois dar, em recompensa, uma infinitude.

Pelo ato de comer o fruto proibido, entrou a morte no mundo; por meio do “Pão descido do Céu”, nos foi restituída a Vida: “Quem comer deste pão viverá eternamente” (Jo 6, 51). O primeiro pecado foi cometido pelo abuso de um alimento, e a salvação eterna nos vem através de outro. A Eucaristia se apresenta como uma resposta, da parte de Deus, ao pecado original, dando aos filhos de Adão infinitamente mais do que haviam perdido: é o próprio Deus que Se oferece em alimento ao homem. Não há possibilidade de um dar-se maior do que na Eucaristia: “E o Pão que Eu darei é a Minha carne para a salvação do mundo” (Jo 6, 51b).
Com tais pressupostos, melhor meditaremos neste trecho do Evangelho, aumentando nosso amor e reconhecimento ao Divino Redentor, pelo imenso dom da Eucaristia.
II – Eucaristia e vida eterna
Naquele tempo, 41 os judeus começaram a murmurar a respeito de Jesus, porque havia dito: “Eu sou o pão que desceu do céu”. 42 Eles comentavam: “Não é este Jesus o filho de José? Não conhecemos seu pai e sua mãe? Como pode então dizer que desceu do céu?” 43 Jesus respondeu: “Não murmureis entre vós.
Estas palavras de Jesus foram pronunciadas na sinagoga de Cafarnaum. No dia anterior, havia Ele operado o prodígio da multiplicação dos pães, figura do milagre muitíssimo mais portentoso da Eucaristia. Maravilhada, a multidão fora ao seu encalço até encontrá-Lo nessa cidade. Porém, interpelado por eles, Jesus censura-lhes seu pouco espírito de fé e sua mentalidade materialista: “Vós Me procurais, não porque vistes milagres, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que dura até à vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará” (Jo 6, 26-27).
Ao multiplicar os pães e os peixes, Cristo provara seu poder sobre a matéria, preparando assim o povo para crer na Eucaristia. No entanto, o coração dos Seus ouvintes se endureceu e, diante do anúncio de tão grande dom, duvidaram, aferrando-se às realidades visíveis e concretas. Jesus, para eles, continuava sendo “o filho de José”. E nem a crença, então muito difundida em Israel, de que o Messias viria trazer um novo maná, contribuiu para lhes abrir os olhos e o coração, diante da multiplicação dos pães.
Somente Deus pode mover as almas rumo à perfeição
44 Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrai. E eu o ressuscitarei no último dia.
Nesta frase tão simples encerra-se um valioso princípio teológico que deve nortear a atividade pastoral dos sacerdotes, assim como o apostolado dos leigos. Todo o bem que possamos fazer se origina numa iniciativa de Deus.
Quantas vezes, em nossa atuação, julgamos ter feito grandes obras, formulado ideias acertadas, falado de forma atraente, escrito palavras sublimes... Tudo isso vem de Deus. Nossa ação produziu algum resultado? Houve almas que se afervoraram, mudaram de vida, abandonaram as vias do pecado? Foi a graça de Deus que agiu nelas e as moveu a aceitarem bem o que foi dito ou feito.
Nosso Senhor usa o termo “ninguém”, o qual não dá margem a exceção. “Ninguém pode vir a Mim se o Pai não o atrair”. O próprio Jesus, o Homem-Deus, tendo embora todo o poder, nos dá um divino exemplo de humildade, atribuindo ao Pai a iniciativa do bem que Ele faz. Inclusive em nossa vida espiritual, todo e qualquer movimento de nossa alma rumo à perfeição se deve a uma ação da graça. É sempre Deus que toma a iniciativa de nos atrair.
Discutem alguns sobre o papel do livre-arbítrio nesta atração sobrenatural exercida por Deus, alegando que o termo “atrair” implica em certa violência. São Tomás responde com sua lógica característica a esta objeção, explicando que pode haver diversas formas de atração, sem violência nem constrangimento. Pode-se atrair alguém por meio de um artifício da inteligência. Mas Deus também pode nos aproximar dEle pelo encanto, pela beleza de Sua majestade.1
De modo semelhante, o padre Manuel de Tuya destaca o papel da liberdade humana perante a ação da graça: “Deus traz as almas à Fé em Cristo: quando Ele quer, infalivelmente, irresistivelmente, embora de um modo tão maravilhoso que elas vêm também livremente; esse aspecto de liberdade, no homem, se destaca especialmente no versículo 45b”.2
No mesmo sentido se pronuncia Santo Agostinho, com o voo próprio de sua inteligência privilegiada, ao comentar com palavras inflamadas esta mesma passagem: “Não disse: ‘Se não o guiar’, mas sim ‘se não o atrair’. Esta violência é feita ao coração, não à carne. De que te admiras? Crê e vens; ama e és atraído. Não penses que se trata de uma violência rabugenta e depreciativa; é doce, suave; o que atrai é a própria suavidade. Quando a ovelha tem fome, não a atraímos mostrando-lhe erva? Ela não é empurrada corporalmente, mas subjugada pelo desejo. Vem tu a Cristo desse modo”.3

E por que quem atrai a alma é o Pai e quem ressuscita o corpo no último dia é o Filho? São João Crisóstomo esclarece a questão: “O Pai atrai, mas Ele [Jesus] ressuscita. Não porque separe Suas obras do Pai — como poderia ser! — mas sim porque demonstra que o poder de ambos é igual”.4
Continua

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