Continuação dos comentários ao Evangelho – XXVI Domingo do Tempo Comum – Ano B
Gravidade do pecado de escândalo
O escândalo, segundo São Tomás,
consiste em pronunciar palavras ou realizar ações próprias a expor alguém à
ruína espiritual, na medida em que elas o arrastam ao pecado.8 Significa dar
más sugestões, conselhos ou exemplos que chocam aquele a quem deveríamos, pelo
contrário, edificar, fazendo com que suas forças espirituais depereçam.
Trata-se de um pecado
gravíssimo e cheio de malícia, que prejudica tanto quem o recebe quanto quem o
comete. Ao primeiro, porque a falta cometida em decorrência do escândalo
furta-lhe a vida da graça de Deus na alma. Ao segundo, por fazer o mesmo papel
do demônio — perder almas —, acrescido do gosto em arruinar a inocência alheia.
Nesse sentido pode-se afirmar tratar-se de um pecado satânico.
Com a agravante, ainda, de ser
muito difícil reparar um escândalo: pois, uma vez cometido, não basta a
Confissão, mas é necessária a reparação. É fácil tomar um copo d’água e jogá-lo
ao chão; mas, será o mesmo recolher o líquido depois? E, a partir de um
escândalo moral, os pecados podem se multiplicar, avolumar-se como uma bola de
neve, perpetuando-se em sucessivas faltas decorrentes umas das outras. Como
reparar todas elas? Portanto, ai dos escandalosos...!
O mundo hoje está pervadido,
encharcado e transbordante de escândalo por todos os cantos. São escândalos nas
modas, nas conversas, nos modos de ser; são escândalos na televisão, na
internet, nos cinemas; são escândalos nos jornais, nas revistas, no
relacionamento social. Onde não há escândalo e a inocência não vai sendo
tragada pela voragem da impureza e da desonestidade? Qual será, pois, a reação
de Nosso Senhor a essa avalanche de pecados de dimensões inauditas?
Prejuízo da própria consciência
43 “Se tua mão te leva a pecar, corta-a! É melhor entrar na Vida sem uma
das mãos, do que, tendo as duas, ir para o inferno, para o fogo que nunca se
apaga. 45 Se teu pé te leva a pecar, corta-o! É melhor entrar na Vida sem um
dos pés, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno. 47a Se teu olho te leva
a pecar, arranca-o!”.
A grandes males, radicais
medidas!
Se Nosso Senhor condenou o
escândalo dado ao próximo, nestes versículos fustigará também o prejuízo da
própria consciência quando não evitamos o pecado. Se grave é atentar contra a
obra de Deus na alma de outrem, não será menos condenável fazer o mesmo com a
própria alma, pois a caridade começa consigo.
As recomendações de Nosso
Senhor — cortar a mão, cortar o pé, arrancar o olho — devem ser entendidas
literalmente? Responde São João Crisóstomo, Doutor da Igreja: “Em tudo isto,
não se refere o Senhor, nem de longe, aos membros do corpo”.9
É preciso amar acima de tudo a
Deus e ter, em consequência, verdadeiro ódio ao pecado. Isso supõe romper
radicalmente com tudo quanto a ele conduz. No Horto das Oliveiras, Jesus
aconselhou: “Vigiai e orai para não cairdes em tentação” (Mt 26, 41). Não basta
apenas rezar; é necessário também vigiar, ou seja, afastar-se das
circunstâncias nas quais se costuma pecar.
Como podemos obter forças para vencer o vício?
Se a pessoa cedeu várias vezes
em alguma tentação e debilitou-se nesse ponto, a única solução é se afastar
para sempre dessa ocasião de modo categórico. Para vencer, por exemplo, o vício
da embriaguez, torna-se indispensável abster-se de todo resquício de álcool,
pois, por qualquer deslize, se pode recair.
Da mesma forma, devemos cortar
irremissivelmente tudo quanto constitui para nós ocasião próxima de pecado,
como faríamos se um membro doente comprometesse seriamente a saúde de todo o
organismo. Poderá ser uma má amizade, pois “nada há de mais pernicioso que uma
má companhia. Aquilo que não se consegue pela violência, obtém-se muitas vezes
por meio da amizade, tanto para o bem quanto para o mal”.10 Mas poderá ser
também um mau livro, um vídeo inconveniente ou, tantas vezes, o acesso à
internet que leva a pecar.
Ora, ao mesmo tempo que
aconselha a fuga das ocasiões próximas, tendo presente a fraqueza humana, Nosso
Senhor adverte, apontando a consequência do pecado: a condenação eterna no
inferno, “onde o verme deles não morre e o fogo nunca se apaga”. Essa
radicalidade na virtude pressupõe termos os olhos postos na eternidade e sempre
presente a máxima da Escritura: “Em todas as tuas obras, medita nos teus
novíssimos e não pecarás eternamente” (Ecl 7, 40).
O local onde o “fogo não se apaga”
“É melhor entrar no Reino de Deus com um olho só, do que, tendo os dois,
ser jogado no inferno, 48 onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga”.
Hoje, muitos ousam negar a
existência do inferno. Seria tão cômodo para a consciência se tal fosse
verdade... Porém, os Evangelhos transcrevem quinze referências de Nosso Senhor
ao inferno. Ele existe sem dúvida e, a respeito de seus tormentos, o Divino
Redentor nos fornece aqui uma noção fundamental: a existência de um verme
roedor que não morre.
Como acontece com o fogo,
numerosas são as interpretações dos autores sobre o significado deste “verme”,
abrangendo tanto o sentido literal quanto o simbólico. Ora, esses diversos
comentários não se excluem, pois a terrível realidade do inferno por certo
supera toda imaginação!
Interessa, contudo, salientar aqui
a identificação do “verme” com o remorso da consciência que jamais abandona o
condenado. Pois um dos piores tormentos para ele é saber que violou os
Mandamentos de Deus e o castigo é irremediável; que perdeu o prêmio eterno por
tão pouco: uma ilusão fugaz, um prazer momentâneo... Em contraposição, o justo
gozará da perfeita felicidade, da superior alegria proporcionada pela paz de
consciência.
A fim de não cairmos nessa
região de tormentos, lembremo-nos do versículo do Salmo Responsorial que
suplica: “Preservai o vosso servo do orgulho: que não domine sobre mim!”. No
inferno, não nos iludamos, são mais numerosos os condenados por causa do
orgulho do que por outros pecados. Não há praticamente pecado algum que não
tenha raiz neste defeito. O orgulho é a fonte de todo pecado!
Continua no próximo post
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