Continuação dos comentários ao Evangelho XXVIII Domingo do Tempo Comum
Jesus o ama e faz-lhe um convite: “Vem e segue-Me”
18 Jesus disse: “Por que me chamas de bom? Só Deus é bom, e mais
ninguém.
Esta resposta causa
perplexidade à primeira vista, mas logo se compreendem as divinas razões que
levaram Nosso Senhor a dá-la.
Não visava o Messias
repreendê-lo, mas sim chamar sua atenção para esta realidade: só Deus é a
Bondade e, portanto, bondade absoluta só há em Deus. Santo Efrém ensina a este
respeito que Cristo “recusa o título de ‘bom’, dado por um homem, para indicar
que Ele tinha essa bondade adquirida do Pai, por natureza e geração, que não a
tinha simplesmente de nome”.7
Ao chamá-Lo de “Bom Mestre”, o
jovem rico mostrava ver principalmente o lado humano do Messias: sua
inteligência, capacidade e sabedoria naturais. Ora, Jesus quer que ele O
considere não só como homem, mas sobretudo como Deus. E por isso o interpela:
“Por que Me chamas bom?”.
Com essa pergunta, o convida a
dar um passo a mais, como quem diz: “Estás vendo só o meu lado humano,
contempla também o divino. No fundo, sem te dar conta, estás Me atribuindo uma
divindade que de fato tenho, porque sou Deus. Mas toma consciência disto,
compreende esta realidade com clareza e, compreendendo, ama-a ainda mais”.
Este convite é suave e
altamente didático, como afirma o padre Duquesne: “Jesus apenas insinua-lhe que
ele não tem a Seu respeito a noção inteira que deveria ter; e, dizendo-lhe que
tal título convém somente a Deus, leva-o a entender que deveria considerar como
Filho de Deus Aquele a quem ele o dá, e não como um mestre simplesmente
humano”.8
19Tu conheces os mandamentos: não matarás; não cometerás adultério; não
roubarás; não levantarás falso testemunho; não prejudicarás ninguém; honra teu
pai e tua mãe!” 20Ele respondeu: “Mestre, tudo isso tenho observado desde a
minha juventude”.
Nova mostra da divindade de
Jesus nos dá este versículo. Ele não pergunta ao jovem se conhece os
Mandamentos, mas o afirma com certeza. A quem agora via com Seus olhos humanos,
já conhecia, enquanto Deus, desde toda a eternidade. E sabia que ele praticava
a virtude, observando a Lei.
21Jesus olhou para ele com amor, e disse: “Só uma coisa te falta: vai,
vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e
segue-me!”
Cristo olhou-o com amor e
fez-lhe o mesmo convite que fizera aos Apóstolos: “Vem e segue-Me”. Comenta
Fillion: “Portanto, estava Jesus disposto a admitir esse jovem entre os Seus
discípulos íntimos, com os quais, seguindo-O por toda parte e em companhia do
melhor e mais santo dos mestres, poderia adquirir sem tardança a perfeição pela
qual conseguiria facilmente o Céu”.9 E Maldonado corrobora essa opinião: “Que
entende Cristo por ‘vem e segue-Me’? A palavra ‘vem’ parece exprimir, mais do
que a simples imitação, o seguimento material: convida-o a fazer parte de seus
Apóstolos e familiares”.10
Àquele homem, que praticava os
Mandamentos, havia Deus reservado desde toda a eternidade a altíssima vocação
de seguir Jesus. Para cumpri-la, era-lhe pedida uma renúncia: “Vai, vende tudo
o que tens e dá-o aos pobres”; e oferecida uma recompensa infinita: “terás um
tesouro no Céu”. Cabia-lhe responder a esse chamado com inteira alegria e
prontidão, como haviam feito Simão, Levi e tantos outros.
A causa mais profunda da recusa
22Mas quando ele ouviu isso, ficou abatido e foi embora cheio de
tristeza, porque era muito rico.
Entretanto, o mesmo que chegara
correndo e se ajoelhara sôfrego diante de Nosso Senhor, retirou-se triste e
“abatido”, porque “possuía muitos bens” e preferiu conservá-los a seguir sua
vocação, desprezando o “tesouro no Céu” que o próprio Messias lhe oferecera.
Fato inédito, pois os Evangelistas não narram recusa semelhante a esta.
Não pensemos, entretanto, ter
sido o apego às riquezas a principal causa de sua defecção. O jovem rico
praticara os Mandamentos desde sua infância, mas não na perfeição.
Negligenciara, sobretudo, o primeiro e mais fundamental: “Amarás o Senhor teu
Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças” (Dt
6, 5). Como bem observa o conhecido biblista M. J. Lagrange, os preceitos
mencionados a ele por Nosso Senhor “bem podem ser observados sem heroísmo. Se
Jesus lhe tivesse perguntado se amava a Deus de todo o coração, teria ficado
bem mais incomodado”.11
O grande pecado desse homem não
foi, portanto, de avareza, mas sim de orgulho. Ao ser convidado a seguir Nosso
Senhor e sentir em si a própria debilidade e insuficiência, deveria ter dito:
“Senhor, não tenho forças para seguir-vos. Tenho apego a minhas riquezas e,
sobretudo, falta-me amor exclusivo por Vós”.
Perante esse ato de humildade, Jesus lhe teria
dado graças superabundantes para corresponder ao chamado. E bem poderíamos ter
hoje no Calendário Romano uma festa dedicada ao jovem rico, que se tornou pobre
para adquirir uma riqueza muito maior: o décimo terceiro Apóstolo!
Entretanto, faltou-lhe
reconhecer que, se praticava os Mandamentos, não era por suas próprias forças,
mas pela graça divina. E que, portanto, sem o auxílio da graça, não conseguiria
desprezar as riquezas e seguir Jesus.
III – Só os pobres de espírito entrarão no reino dos céus
Continua no próximo post
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