Comentários ao Evangelho Solenidade de São Pedro e
São Paulo, Apóstolos (Missa do Dia) – 29 de Junho
Naquele tempo,
13Jesus foi à região de Cesareia de Filipe e ali perguntou aos seus discípulos:
“Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”
14Eles
responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros
ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”.
15Então Jesus
lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?”
16Simão Pedro
respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”.
17Respondendo,
Jesus lhe disse: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser
humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. 18Por isso eu te
digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder
do inferno nunca poderá vencê-la. 19Eu te darei as chaves do Reino dos Céus:
tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que tu desligares
na terra será desligado nos céus”. (Mt 16, 13-19).
Um simples pescador da Betsaida
proclama que o filho de um carpinteiro é realmente o Filho de Deus, por
natureza. Ali é plantado o grão de mostarda, do qual nasceria a Santa Igreja
Católica Apostólica e Romana.
I -
Considerações iniciais
Difícil é encontrar alguém que nunca
tenha comprovado a consonância da sonoridade obtida através de cristais
harmônicos. Basta um simples golpe, em um só deles, para os outros ressoarem em
concomitância. É, até, uma prova para se conhecer a autenticidade destas ou
daquelas taças.
Assim, também, no campo das almas.
Discernimos a que é entranhadamente católica e herética, quando fazemos
"soar" uma simples nota: o amor ao Papado, seja quem for o Papa.
Tornam-se encandescidas as almas fervorosas, indiferentes as tíbias,
indispostas algumas, etc.
Pois esta é a matéria do Evangelho de
hoje. A fim de nos prepararmos para contemplar as perspectivas que ele nos
manifesta, ocorreu-nos reproduzir as considerações transcritas a seguir.
Poderemos, assim, ter uma noção da qualidade do "cristal" de nossa
alma:
"Tudo quanto na Igreja há
de santidade, de autoridade, de virtude sobrenatural, tudo isto, mas
absolutamente tudo sem exceção, nem condição, nem restrição, está subordinado,
condicionado, dependente da união à Cátedra de São Pedro. As instituições mais
sagradas, as obras mais veneráveis, as tradições mais santas, as pessoas mais
conspícuas, tudo enfim que mais genuína e altamente possa exprimir o Catolicismo
e ornar a Igreja de Deus, tudo isto se torna nulo, maldito, estéril, digno do
fogo eterno e da ira de Deus, se separado do Romano Pontífice. Conhecemos a
parábola da videira e dos sarmentos. Nessa parábola, a videira é Nosso Senhor,
os sarmentos são os fiéis.
Mas como Nosso Senhor Se ligou de
modo indissolúvel à Cátedra Romana, pode-se dizer com toda segurança que a
parábola seria verdadeira entendendo- se a videira como a Santa Sé, e os
sarmentos como as várias Dioceses, Paróquias, Ordens Religiosas, instituições
particulares, famílias, povos e pessoas que constituem a Igreja e a
Cristandade.
Isto tudo só será verdadeiramente fecundo na medida em que estiver em íntima, calorosa, incondicional união com a Cátedra de São Pedro.
Isto tudo só será verdadeiramente fecundo na medida em que estiver em íntima, calorosa, incondicional união com a Cátedra de São Pedro.
"‘Incondicional', dissemos, e
com razão. Em moral, não há condicionalismos legítimos. Tudo está subordinado à
grande e essencial condição de servir a Deus. Mas, uma vez que o Santo Padre é
infalível, a união a seu infalível magistério [só] pode ser incondicional.
"Por isto, é sinal de condição
de vigor espiritual, uma extrema susceptibilidade, uma vibratilidade
delicadíssima e vivaz dos fiéis por tudo quanto diga respeito à segurança,
glória e tranqüilidade do Romano Pontífice. Depois do amor a Deus, é este o
mais alto dos amores que a Religião nos ensina. Um e outro amor se confundem
até. Quando Santa Joana d'Arc foi interrogada por seus perseguidores que a
queriam matar, e que para isto procuravam fazê-la cair em algum erro teológico
por meio de perguntas capciosas, ela respondeu: ‘Quanto a Cristo e à Igreja,
para mim são uma só coisa'. E nós podemos dizer: ‘Para nós, entre o Papa e
Jesus Cristo não há diferença'. Tudo o que diga respeito ao Papa diz respeito
direta, íntima, indissoluvelmente, a Jesus Cristo"1.
II - O
Evangelho: "Tu es petrus"
Pergunta de
Jesus e circunstância em que foi feita
13 Ao chegar à
região de Cesareia de Filipe, Jesus fez a seguinte pergunta aos seus discípulos:
“Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?”
A cidade na qual se desenvolve o
Evangelho de hoje havia sido construída pelo tetrarca Filipe que, para angariar
a simpatia do imperador César Augusto, deu-lhe o nome de Cesaréia. Desconhece a
História o exato percurso empreendido pelo Senhor e pelos Apóstolos àquela
altura dos acontecimentos; a hipótese mais provável é a de que tenham
atravessado a via de Damasco a Jerusalém, perto da ponte das Filhas de Jacó. O
território onde nasce o rio Jordão, compreendido entre Julias e Cesaréia, é
rochoso, solitário e acidentado. Foi nessa localidade montanhosa e pétrea que
Herodes, o Grande, erigiu um vistoso templo de mármore branco em homenagem ao
imperador César Augusto. Calcando as pedras da região, e talvez à vista do tal
templo sobre o alto das rochas, foi que se estabeleceu o diálogo durante o qual
se tornaram explícitas para os Apóstolos a natureza divina de Jesus e a
edificação da Santa Igreja.
Convém não esquecermos o quanto a
divina pedagogia de Jesus escolhia os acidentes da natureza sensível para
efeito didático, e assim poderem seus ouvintes ter melhor compreensão das
realidades invisíveis do universo da Fé. A esse respeito, seriam inúmeros os
casos a serem citados, mas basta-nos lembrar o modo pelo qual Ele convocou os
dois irmãos pescadores, Pedro e André: "Segui-me e Eu farei de vós pescadores
de homens" (Mt 4, 19). Não se trata, portanto, de nos basearmos em razões
meramente poéticas para supor que o desenrolar dessa conversa verificou- se
sobre as pedras; há por detrás, um elevado teor simbólico. Ali estavam rochas
que deviam perpetuar- se, e a contemplação dessas criaturas minerais, fruto de
sua onipotência, tornava mais bela a solene profecia da edificação de sua
indestrutível Igreja.
Alguns autores ressaltam outro
importante aspecto: o fato de Jesus ter escolhido uma região pertencente à gentilidade
para manifestar- Se como Filho de Deus e fundar o primado de sua Igreja. Eles
interpretam como sendo um prenúncio da rejeição do reino messiânico, pelos
judeus, e sua definitiva transferência para os gentios.
"Aconteceu que estando a orar,
em particular..." (Lc 9, 18). Conforme nos relata São Lucas, toda a
conversa narrada no Evangelho de hoje realizou- se depois de Jesus ter-Se
recolhido e deixado "perder-Se", com suas faculdades humanas, nas
infinitudes de seu Pai eterno. Utilizou-Se desse meio infalível de ação, a
prece, para conferir raízes e seiva imortais à obra que lançaria.
Segundo a Glosa, "querendo
confirmar seus discípulos na Fé, o Salvador começa por afastar de seus
espíritos as opiniões e os erros que outros poderiam ter infundido neles"
2; ou seja, convidando-os a terem clara consciência dos equívocos da opinião
pública a respeito da identidade dEle, fortificava- lhes as convicções. É
curioso o comentário de São João Crisóstomo sobre o caráter "sumamente
malicioso" 3 do juízo emitido pelos escribas e fariseus a respeito do
Divino Mestre, muito diferente daquele da opinião pública que, apesar de
errôneo, não era movido por nenhuma malícia.
Jesus não pergunta o que pensam os
outros a respeito dEle, mas sim do Filho do Homem, "a fim de sondar a Fé
dos Apóstolos e dar-lhes ocasião de dizer livremente o que sentiam, embora Ele
não ultrapassasse os limites daquilo que poderia lhes sugerir sua santa
Humanidade" 4. Por todos os conhecimentos que Lhe eram próprios, do divino
ao experimental, Jesus sabia quais eram as opiniões que circulavam com relação
à Sua figura, não necessitava, portanto, informar-Se; desejava, isto sim,
levá-los a proclamar a verdade em contestação aos equívocos da opinião pública.
O povo não
considerava Jesus como o Messias
14 Eles
responderam: “Uns dizem que é João Batista; outros, que é Elias; e outros, que
é Jeremias ou algum dos profetas”.
Os Apóstolos tinham exata noção do
juízo que os "homens" de então faziam a propósito do Divino Mestre.
Apesar de todas as evidências, dos milagres, da doutrina nova dotada de
potência, etc., o povo não O considerava como o Messias tão esperado. Jesus
surgia aos olhos de todos como a ressurreição ou o reaparecimento de anteriores
profetas.
Não encontravam nEle a eficaz magnificência do poder político, tão essencial para a realização do mirabolante sonho messiânico que os inebriava. Daí imaginarem-No o Batista ressurrecto, ou Elias, enquanto mais especificamente um precursor, ou até mesmo um Jeremias, lídimo defensor da nação teocrática (cf. 2 Mac 2, 1-12). Vêse claramente neste versículo como o espírito humano é inclinado ao erro e como facilmente se distancia dos verdadeiros prismas da salvação. Mas, pelo menos, aqueles seus contemporâneos ainda discerniam algo de grandioso em Jesus. Seria interessante nos perguntarmos como Ele é visto pela humanidade globalizada, cientificista e relativista de nossos dias.
Não encontravam nEle a eficaz magnificência do poder político, tão essencial para a realização do mirabolante sonho messiânico que os inebriava. Daí imaginarem-No o Batista ressurrecto, ou Elias, enquanto mais especificamente um precursor, ou até mesmo um Jeremias, lídimo defensor da nação teocrática (cf. 2 Mac 2, 1-12). Vêse claramente neste versículo como o espírito humano é inclinado ao erro e como facilmente se distancia dos verdadeiros prismas da salvação. Mas, pelo menos, aqueles seus contemporâneos ainda discerniam algo de grandioso em Jesus. Seria interessante nos perguntarmos como Ele é visto pela humanidade globalizada, cientificista e relativista de nossos dias.
Pedro O reconhece
como Filho de Deus
15 Perguntou-lhes
de novo: “E vós, quem dizeis que Eu sou?”
Bem sublinha São João Crisóstomo a
essência desta segunda pergunta 5. Sem refutar os erros de apreciação dos
outros, Jesus quer ouvir dos próprios lábios de seus mais íntimos o juízo que
dEle fazem. Para lhes tornar fácil a proclamação de Sua divindade, não usa aqui
o título humilde de Filho do Homem.
16 Tomando a
palavra, Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo”.
Pedro falava como intérprete da
opinião de todos, por ser o mais fervoroso e o principal 6, embora não fosse a
primeira vez que Jesus era reconhecido como Filho de Deus. Já Natanael (cf. Jo
1, 49), os Apóstolos após a tempestade no mar de Tiberíades (cf. Mt 14, 33) e o
próprio Pedro (cf. Jo 6, 69) haviam externado essa convicção.
Sola fides! Aqui não há elemento
algum emocional ou sensível, como em circunstâncias anteriores. Em meio às
rochas frias de um ambiente ecológico, longe de acontecimentos arrebatadores e
da agitação das turbas ou das ondas, só a voz da Fé se faz ouvir.
"Certíssimo argumento é que
Pedro chamou a Cristo de Filho de Deus por natureza, quando O contrapôs a João,
a Elias, a Jeremias e aos profetas, os quais foram - claro está - filhos de
Deus por adoção" 7. Ademais, como comenta o mesmo Maldonado, Pedro dá a
Deus o título de "vivo" para distingui- Lo dos deuses pagãos que são
substâncias mortas. E, por fim, o artigo - como sói acontecer na língua grega -
antecedendo o substantivo "filho", designa "filho único"
segundo a natureza, e não um entre vários.
A ciência humana
não tem força para atingir a união hipostática
17 Jesus
disse-lhe em resposta: “És feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne
nem o sangue que to revelou, mas o meu Pai que está no Céu”.
Ao felicitar seu Apóstolo, Jesus
avalia a afirmação de Pedro a respeito de sua filiação e, portanto, de sua
natureza divina e consubstancialidade com o Pai. Sobre este particular são
unânimes os comentaristas. Era um costume judaico indicar a filiação da pessoa
para ressaltar sua importância; neste caso concreto havia a intenção de
manifestar o quanto "Cristo é tão naturalmente o Filho de Deus como Pedro
é filho de Jonas, quer dizer, da mesma substância daquele que o
engendrou"8.
As palavras de Pedro não são fruto de
um raciocínio com base num simples conhecimento experimental. Não haviam sido
poucas as curas logo após as quais os beneficiados conferiam com exclamações ao
Salvador o título de "Filho de Davi" (cf. Mt 15, 22; Mc 10, 47,
etc.), conhecido como um dos indicativos do Messias. Os próprios demônios, ao
se encontrarem com Ele, proclamavam-No "o Santo de Deus" (Lc 4, 34),
"o Filho de Deus" (Lc 4, 41), "Filho do Altíssimo" (Lc 8,
28; Mc 5, 7). Ele mesmo declarara ser "dono do sábado" (Mt 12, 8), e
após a multiplicação dos pães a multidão queria aclamá-Lo "Rei" (Jo
6, 15). Assim como estas, muitas outras passagens poderiam facilmente nos
indicar as profundas impressões produzidas por Jesus sobre seus discípulos9.
Porém, em nenhuma ocasião anterior Pedro recebeu tal elogio saído dos lábios do
Salvador. Nesta passagem, ele "é feliz porque teve o mérito de elevar seu
olhar além do que é humano e, sem deter-se no que provinha da carne e do
sangue, contemplou o Filho de Deus por um efeito da revelação divina e foi
julgado digno de ser o primeiro a reconhecer a Divindade de Cristo"10.
Portanto, a afirmação de Pedro se
realizou com base num discernimento penetrante, luzidio e abarcativo da
natureza divina do Filho de Deus. A ciência, a genialidade ou qualquer outro
dom humano não têm força suficiente para atingir os páramos da união
hipostática realizada no Verbo Encarnado. É indispensável ser revelada pelo
próprio Deus e aceita pelo homem. Mas o homem sem Fé aferra-se às suas próprias
idéias, tradições e estudos, rejeitando, às vezes, as provas mais evidentes,
como o são os milagres. Para este, Jesus não passa - e quando muito - de um
sábio ou de um profeta. Haverá também aqueles que não O verão senão como
"o filho do carpinteiro" (Mt 13, 55).
Essa é a nossa Fé ensinada pela
Igreja, revelada pelo próprio Deus, anunciada pelo Filho, o enviado do Pai, e
confirmada pelo Espírito Santo, enviado pelo Pai e pelo Filho. As verdades da
Fé não são fruto de sistemas filosóficos, nem da elaboração de grandes sábios.
Jesus edifica
Sua Igreja sobre Pedro
18 Também Eu
te digo: “tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as
portas do inferno nada poderão contra ela”.
Foi indispensável e excelente ter
afirmado Orígenes inspiradamente: "Nosso Senhor não precisa se é contra a
pedra sobre a qual Cristo construiu sua Igreja ou se é contra a própria Igreja,
construída sobre a pedra, que as portas do inferno não prevalecerão. Mas é
evidente que elas não prevalecerão nem contra a pedra nem contra
Igreja"11. Sim, porque para destruir essa pedra, ou seja, o Vigário de
Jesus Cristo na Terra, muitos esforços e diligências de um considerável número
de hereges têm sido empregados, na tentativa de abalar o sagrado edifício da
Igreja a partir de seu fundamento, o qual é a alegria, consolo e triunfo dos
verdadeiros católicos. Nesse "edificarei" se encontra o real anúncio
do Reino de Jesus. O grande e divino desígnio começa a se delinear nesse nome,
até então nunca usado: "minha Igreja".
O plano de Jesus é proclamado sobre
as rochas de Cesaréia, pelo próprio Filho de Deus, que Se apresenta como um
divino arquiteto a erigir esse edifício indestrutível, grandioso e santíssimo,
a sociedade espiritual, constituída por homens: militante na Terra, padecente
no Purgatório, triunfante no Céu. O conjunto de todos aqueles que se unem
debaixo da mesma Fé, nesta Terra, chama-se Igreja. Desta, o fundamento é Pedro
e todos os seus sucessores, os romanos pontífices, pois, caso contrário, não
perduraria a existência do edifício. Eis um ponto vital de nossa Fé: "o
fato da Igreja estar edificada sobre o próprio Pedro" que aliás - "é
admitido por todos os autores antigos, excepto os hereges"12.
Um só corpo e
um só espírito em torno do Sucessor de Pedro
"Há na Igreja muitas pessoas
constituídas em autoridade, às quais devemos estar unidos pela obediência. No
entanto, toda essa variedade precisa reduzir- se a um prelado primeiro e
supremo, em quem principalmente se concentre o principado universal sobre
todos. Deve reduzir-se não só a Deus e a Cristo, mas também a Seu vigário; e
isto não por estatuto humano, mas por estatuto divino, mediante o qual Cristo
constituiu São Pedro príncipe dos Apóstolos, estabelecidos estes, por sua vez,
como príncipes na Terra. E Cristo fez isso convenientissimamente, por assim o
exigirem a ordem da justiça universal, a unidade da Igreja e a estabilidade,
tanto dessa ordem, quanto dessa unidade" 13.
O "Tu es Petrus ..." será
aplicado a todos os escolhidos em conclave para se sentarem na Cátedra da
Infalibilidade. Assim, morreu Pedro, mas não o Papa; e é em torno dele que a
Igreja mantém a sua unidade.
"Fácil é a prova que confirma a
Fé e compendia a verdade. O Senhor fala a São Pedro e lhe diz: ‘Eu te digo que
tu és Pedro' (Mt 16, 18). E noutro lugar, depois de Sua ressurreição:
‘Apascenta minhas ovelhas' (Jo 21, 17). Somente sobre ele edifica Sua Igreja, e
o encarrega de apascentar seu rebanho. E embora confira igual poder a todos os
Apóstolos e lhes diga: ‘Como meu Pai Me enviou, assim Eu vos envio' (Jo 20,
21), sem embargo, para manifestar a unidade, estabeleceu uma Cátedra, e com sua
autoridade dispôs que a origem dessa unidade se fundamentasse em um. Por certo,
todos os Apóstolos eram o mesmo que Pedro, adornados com a mesma participação
de honra e poder; mas o princípio dimana da autoridade, e a Pedro foi dado o
Primado para demonstrar que uma é a Igreja de Cristo e uma a Cátedra. Todos são
pastores, mas há um só rebanho apascentado por todos os Apóstolos de comum
acordo [...].
"Pode ter Fé quem não crê nessa
unidade da Igreja? Pode pensar que se encontra dentro da Igreja quem se opõe e
resiste à Igreja, quem abandona a Cátedra de Pedro, sobre a qual ela está
fundada? São Paulo também ensina o mesmo, e manifesta o mistério da unidade, ao
dizer: ‘Há um só corpo e um só espírito, como também só uma esperança, a de
vossa vocação. Só um Senhor, uma Fé, um batismo, um Deus' (Ef 4, 4-6)" 14.
Jurisdição
plena, suprema e universal
Se lermos os Atos dos Apóstolos,
encontraremos Pedro exercendo esse supremo poder, ao falar em primeiro lugar
nas reuniões dos Apóstolos, ao propor o que se deve fazer, inaugurando a missão
apostólica, encerrando discussões com sua palavra, etc. E assim se têm
perpetuado, ao longo de dois milênios, a jurisdição e o magistério dos Papas.
Todo sucessor de Pedro possui
verdadeira jurisdição, pois tem o poder de promulgar leis, julgar e impor
penas, de forma direta, em matéria espiritual, e indireta, no campo temporal,
sempre que se apresente como necessária para obter bens espirituais. Essa
jurisdição é plena: não há poder na Igreja que não resida no Papa. É universal,
ou seja, todos os membros da Igreja (fiéis, sacerdotes e bispos) a ele estão
submetidos. É, ademais, suprema: o Papa acima de todos, e ninguém acima dele.
Até mesmo os Concílios Ecumênicos não podem se realizar sem ser por ele
convocados e presididos.
Os próprios estatutos conciliares não
o obrigam, tendo ele o poder de mudá-los ou de derrogá-los.
Magistério
infalível
Outro tanto se pode afirmar sobre uma
análoga e grande função de Pedro e de seus sucessores: o supremo Magistério
que, como coluna que sustenta a Igreja, não pode equivocar-se. O Papa é
infalível ao falar ex cathedra, ou seja, enquanto doutor de todos os cristãos,
ao definir com autoridade apostólica doutrinas sobre Fé e moral, que devem ser
admitidas por toda a Igreja universal.
Aí está o motivo pelo qual "as
portas do inferno" não poderão se sobrepor a um edifício construído sobre
a pedra que é Pedro.
"Doce
Cristo na Terra"
19 “Dar-te-ei
as chaves do Reino do Céu; tudo o que ligares na Terra ficará ligado no Céu e
tudo o que desligares na Terra será desligado no Céu”.
Cristo retornaria ao Pai, deixando
nas mãos de Pedro as chaves de Sua Igreja. "Quem tem o uso legítimo e
exclusivo das chaves de uma casa ou de uma cidade, este é o administrador, o
intendente supremo que recebeu os poderes de seu senhor. A Igreja é o reino dos
Céus neste mundo; a Igreja Triunfante será o reino definitivo e eterno dos
Céus, prolongamento desta mesma Igreja da Terra, já purificada de toda
impureza. Pedro terá poder de abrir e fechar a entrada nesta Igreja temporal e,
conseqüentemente, na eterna" 15.
A cabeça desse corpo místico sempre
será Cristo Jesus. Durante a História da humanidade, Ele será o chefe
invisível, mas deixa entre nós um Pedro acessível, o "doce Cristo na
Terra" - segundo expressão usada por Santa Catarina de Sena -, a quem
todos devemos amar como bom pai, obedecer até às suas mais leves insinuações e
conselhos, honrar como a um supremo monarca, rei de reis.
III - Nasce
uma obra indestrutível
É de pasmar o desenrolar desse
acontecimento histórico ocorrido na "região de Cesaréia de Filipe".
Um simples pescador da Betsaida proclama que o filho de um carpinteiro é
realmente Filho de Deus, por natureza. Este, em seguida, anuncia que edificará
uma obra indestrutível e deixará em mãos de seu administrador, com plenos
poderes de jurisdição e magistério, "as chaves do Reino do Céu". O
ambiente que os cerca é pobre, árido mas com certa grandeza.
Ali é plantado "o grão de mostarda", do qual nasceriam as igrejas, as catedrais, as cerimônias, os vitrais, as universidades, os hospitais, os mártires, os confessores, as virgens, os doutores, os santos, enfim, a Santa Igreja Católica Apostólica e Romana.
Ali é plantado "o grão de mostarda", do qual nasceriam as igrejas, as catedrais, as cerimônias, os vitrais, as universidades, os hospitais, os mártires, os confessores, as virgens, os doutores, os santos, enfim, a Santa Igreja Católica Apostólica e Romana.
Passaram-se dois milênios e, depois
de tantas e catastróficas procelas, inabalável continua essa "nau de
Pedro", tendo Cristo, com poder absoluto, em seu centro. Nenhuma outra
instituição resistiu à corrupção produzida pelos desvios morais ou pela
perversão da razão e do egoísmo humano. Só a Igreja soube enfrentar as teorias
caóticas, opondo-lhes a verdade eterna; arrefecer o egoísmo, a violência e a
volúpia, utilizando as armas da caridade, justiça e santidade; pervadir e
reformar os poderes despóticos e materialistas deste mundo, com a solene e
desarmada influência de uma sábia, serena e maternal autoridade. Não podiam
mãos meramente humanas erigir tão portentosa obra, só mesmo a virtude do
próprio Deus seria capaz de conferir santidade e elevar à glória eterna homens
concebidos no pecado.
1 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. A Guerra
e o Corpo Místico, em "O Legionário", de 16/4/1944.
2 AQUINO, São Tomás de. Catena Aurea.
3 CRISÓSTOMO, São João. Homilia 54
sobre o Evangelho de São Mateos, § 1.
4 MALDONADO, SJ, P. Juan de. Comentario a los cuatro Evangelios. Madri: BAC, 1950, v. I, p. 579.
4 MALDONADO, SJ, P. Juan de. Comentario a los cuatro Evangelios. Madri: BAC, 1950, v. I, p. 579.
5 Cf. CRISÓSTOMO. Op. cit. § 1.
6 Cf. CRISÓSTOMO. Idem ibidem.
7 MALDONADO, Op. cit. p. 580.
8 CRISÓSTOMO. Op. Cit. § 3.
9 Ver seu poder de perdoar os pecados,
em Mt 9, 6; sua superioridade sobre o Templo, em Mt 12, 6; a suspeita sobre sua
messianidade, em Mt 12, 23; etc.
10 HILÁRIO DE POITIERS, Santo, in
Evangelium Matthaei Commentarius, c. XVI.
11 Apud AQUINO. Catena Aurea.
12 MALDONADO. Op. cit. p. 584.
13 BUENAVENTURA, San. La perfección
evangélica, c. 4 a. 3 concl. in Obras de San Buenaventura. Madri: BAC, 1949, t.
6, p. 309.
14 CIPRIANO, San. De unitate ecclessia,
§ 4.
15 GOMÁ Y TOMÁS, Dr. D. Isidro. El
Evangelio Explicado. Barcelona: Ediciones Acervo, 1967, v. II, p. 38.
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