"O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido num campo
que, quando um homem o acha, esconde-o e, cheio de alegria pelo achado, vai e
vende tudo o que tem e compra aquele campo."
Os detalhes secundários
são omitidos pelo Evangelista. Terão, ou não, sido tratados pelo Divino Mestre?
Não temos como o saber. Porém, pode-se imaginar o quanto a exposição de Jesus
deve ter sido atraentíssima, pelo fato dEle discorrer sobre os temas através de
Sua humanidade e, pari passu, ir iluminando, bem dispondo e auxiliando, pela
graça e por Seu poder divino, o fundo da alma de cada um ali presente.
Mateus tem um objetivo
concreto em mente. Por isso sintetiza a parábola nos seus elementos essenciais,
deixando de lado, por exemplo, a indicação de como foi descoberto o tal
tesouro. Conhecemos nós episódios havidos na História, a propósito de
descobertas deslumbrantes nessa linha.
Por isso, fica ao
encargo de nossa imaginação ambientá-la, completando os pormenores. O homem
esconde novamente o tesouro. De uma perspectiva moral, procede bem, não se
apropriando das riquezas encontradas. E, ao mesmo tempo, mostra-se prudente não
deixando à vista aquelas preciosidades, para evitar as tentações que alguém pudesse
ter ao deparar-se com elas.
"Não é necessário
adequar este dado [o fato de esconder o tesouro] ao significado da parábola,
porque, segundo minha teoria, não é parte dela, senão ornato".7
Maldonado discorre sobre
este ponto em particular com muito e sábio critério, glosando considerações
feitas por São Jerônimo e São Beda.
Parece-nos curioso que
os autores concentrem seus comentários sobre o homem que encontra o tesouro,
mas sejam displicentes em considerar o terreno onde estava ele escondido.
Seja-nos permitido fazer
uma aplicação a esse propósito.
Olhando para os
primeiros tempos da Igreja, vemos quanto custou aos judeus e pagãos convertidos
"comprar o terreno" no qual se escondia o tesouro da Salvação. A
renúncia exigida era total: família, bens, reputação e até a própria vida. Quão
bem procederam, entretanto, os que então abraçaram a Fé Católica! A humanidade
atual, qual dos dois papéis representa: o do homem que deseja comprar, ou o do
que quer vender? Infelizmente, a quase totalidade dos fatos nos inclina à
segunda hipótese. Muitos de nós, hoje em dia, caímos na insensatez de não mais
nos importarmos com esse tesouro de nossa Fé, que tanto custou aos nossos
antepassados, e pelo qual o Salvador derramou todo o Seu Preciosíssimo Sangue
no Calvário. Por quão miserável preço vendemos, alguns de nós, esse tão elevado
tesouro, tal como fez Esaú com sua primogenitura, ao trocá-la por um mísero
prato de lentilhas! Hoje, mais do que nunca, multiplicam- se as
"lentilhas" da sensualidade, da corrupção, do prazer ilícito, da
ambição, etc.
Aqui também poderia
estar incluída a figura do religioso que se deixa arrastar pelos afazeres concretos
e vai se olvidando do "tesouro" pelo qual tudo abandonou em seu
primitivo fervor.
Essa plenitude de
alegria do homem da parábola deve nos acompanhar a vida inteira, sem
interrupção, por ser um dos efeitos da verdadeira Fé. A virtude é um dom gratuito;
não se compra. Entretanto, sua posse contínua e crescente custa esforços de
ascese, piedade e fervor. É preciso "vendermos" todas as nossas
paixões, caprichos, manias, vícios, sentimentalismos, etc., em síntese, toda a
nossa maldade. É o melhor "negócio" que se possa fazer nesta Terra.
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