Continuação dos comentários ao Evangelho XIX Domingo Tempo Comum Ano C 2013
Necessidade
da vigilância
39 Sabei que, se o pai
de família soubesse a hora em que viria o ladrão, vigiaria sem dúvida e não
deixaria arrombar a sua casa.
Este versículo não traz nenhuma dificuldade de interpretação,
pois todo ladrão busca uma ocasião fácil para sua ação e não deseja ser
percebido. Em face desta prerrogativa, o dono da casa, sabendo a hora em que se
daria o roubo, estaria à espreita para impedi-lo. Assim também nós, pervadidos da
certeza de que o Juiz Supremo virá, mas não sabendo em que momento, devemos estar
vigilantes ininterruptamente para não sermos apanhados de surpresa à sua chegada.
40 Vós, pois, estai
preparados porque, na hora que menos pensais, virá o Filho do Homem.
Os servidores vigilantes nos proporcionam o conhecimento do
prêmio imerecido que nos aguarda se, tal como o fizeram eles, procedermos
também nós, amando sem limites o Senhor, e se em razão desse amor guardarmos
sua palavra e observarmos os seus mandamentos. Ao retornar o Salvador, Ele nos servirá.
Por outro lado, o mestre vigilante nos incita a sermos cuidadosos em evitar
nosso encontro com o Senhor numa circunstância desfavorável, por falta de
vigilância. São dois conselhos harmônicos e fundamentais.
O Senhor virá. É absolutamente certa sua vinda. Por isso:
“Vós, pois, estai preparados porque, na hora que menos pensais, virá o Filho do
Homem”. Poderá ser, portanto, num dia inesperado; numa idade na qual nada havia
para temer, quando os grandes planos se multiplicavam, e, quiçá, as inclinações
já se lançavam nos prazeres, realizações, negócios...
Nada melhor para obter uma incansável, robusta e contínua vigilância
do que recorrermos à Mãe de Misericórdia. E se ainda assim viermos a falhar,
Ela nos obterá o perdão de nossas misérias.
A parábola do
administrador fiel
Nos versículos finais (41-48), respondendo a uma pergunta de
Pedro que desejava saber se a parábola era exclusivamente para eles ou para
todos, o Divino Mestre elabora uma outra, a do “administrador fiel e prudente”.
Torna-se patente o caráter universal de seu ensinamento e, portanto, o quanto
se aplica a qualquer um de nós. Basta considerar de perto a incerteza sobre a
hora de nossa morte, para nos darmos conta da enorme importância da virtude da
vigilância.
Obrigações de
quem tem autoridade sobre outros
Ao fazer uso da imagem do administrador, procura Ele
representar aqueles que têm alguma autoridade ou poder sobre outros. A
aplicação incidia diretamente sobre Pedro e os Apóstolos, que receberiam em
suas mãos a instituição da Igreja, e também abrangeria os pais, tutores, etc.
Nestes versículos, o prisma continua sendo o da vigilância,
mas agora com outra nota característica: a da prudente fidelidade. A
primeiríssima obrigação do administrador é a de não se apropriar de nenhum dos
bens que o senhor lhe confiou e por isso não procurar seu prazer, sua glória e
sua vontade, mas sim o puro interesse de seu senhor. Em segundo lugar, deve ser
prudente, discernindo com senso de hierarquia como distribuir os trabalhos em
proporção aos talentos e às forças de cada um. Ademais, deverá prover às
necessidades de todos, oferecendo-lhes os meios, instruções, sustento, etc.,
para o desempenho das respectivas funções.
Procedendo com esse amor à perfeição, a autoridade, ao
encontrar-se com seu senhor, além da bem-aventurança, receberá a administração
de todas as suas posses.
O castigo do
administrador infiel
Quanto ao administrador infiel, também com traços irreais, o
Divino Mestre busca delinear a principal causa de seus delitos: o esquecimento de
que possui um senhor e que este retornará, ou então, convencer-se de que seu
amo não voltará tão cedo. Daí os maus tratos, a injustiça, o abandonar-se à
gula e às desordens. Este também será surpreendido pelo senhor e por ele será
castigado com a separação eterna...
A seguir trata da proporcionalidade dos castigos, mostrando
como, por justiça, “a todo aquele a quem muito foi dado, muito lhe será
exigido” (v. 48). É nisto, mais especialmente, que se concentra a resposta oferecida
pelo Mestre a São Pedro, cuja substância a quase todos os santos faz temer e
tremer. Quantos deles não buscaram uma via penitencial, pela consideração
destas divinas palavras!
Sobre esta passagem, comenta o Cardeal Gomá: “Como na outra vida não há igualdade de
prêmios, da mesma forma não há igualdade de castigos, diz São Basílio. Serão
condenados às chamas todos os que as tiverem merecido, uns, porém, as sofrerão
de modo mais intenso do que outros; todos serão roídos pelo verme
inextinguível, mas este será mais forte ou mais indolente. Por isso, diz
Teofilato, os sábios e doutores, os quais deveriam ter agido de acordo com sua
doutrina e dela tirado incentivo para os demais, serão atormentados com maior
rigor. Este pensamento deveria nos fazer tremer, se Deus nos favoreceu com dons
de privilégio no conhecimento de sua vontade, ou nos concedeu graças
extraordinárias, ou nos conferiu poderes para comunicar aos outros a sua
vontade” (15).
Que esta Liturgia
de hoje nos compenetre a fundo da grande necessidade de sermos diligentes na
preparação de nosso encontro com o Senhor, o qual poderá dar-se no momento
menos esperado. Que usemos bem de nosso tempo, palavras e ações. Em síntese,
que sejamos sempre santos.
1) Santo Agostinho, De moribus Ecclesiae,
c. 24.
2) Cf. Suma Teológica II – II q. 47 a .9.
3) São Bernardo, Sermo XI in Psalmum XC,
§ 1.
4) São Bernardo, ibidem.
5) Consejos
y recuerdos, n. 37.
6) Pe.
Alonso Rodríguez, Ejercicio de perfección y virtudes cristianas, p. 2ª tr. 4 c.
18.
7) Apud São Tomás de Aquino, Catena
Áurea.
8) Idem, ibidem.
9) São Cirilo de Jerusalém, apud São
Tomás de Aquino, Catena Áurea.
10) Pe. Juan
de Maldonado SI, Comentarios a los cuatro Evangelios, BAC, Madrid, 1951, v. II,
pp. 597-598.
11) Idem, ibidem, pp. 597-598.
12) São João Crisóstomo, In Matthaeum
hom. 26.
13) Pe. Juan
de Maldonado, SI, op. cit. p. 600.
14) Idem,
ibidem, p. 603.
15) Isidro
Gomá y Tomás, El Evangelio explicado, Ediciones Acervo, Barcelona, 1967, v. II,
p. 194.