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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Evangelho XXXI Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 19, 1-10

Comentários ao Evangelho 31º Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 19, 1-10
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
Evangelho Lc 19, 1-10
Naquele tempo, 1 Jesus tinha entrado em Jericó e estava atravessando a cidade. 2 Havia ali um homem chamado Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos e muito rico. 3 Zaqueu procurava ver quem era Jesus, mas não conseguia porque era muito baixo. 4 Então, ele correu à frente e subiu numa figueira para ver Jesus, que devia passar por ali. 5 Quando Jesus chegou ao lugar, olhou para cima e disse: ‘Zaqueu, desce depressa! Hoje Eu devo ficar na tua casa’. 6 Ele desceu depressa, e recebeu Jesus com alegria. 7 Ao ver isso, todos começaram a murmurar, dizendo: ‘Ele foi hospedar-Se na casa de um pecador!’. 8 Zaqueu ficou de pé, e disse ao Senhor: ‘Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres e, se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais’. 9 Jesus lhe disse: ‘Hoje a salvação entrou nesta casa, porque também este homem é um filho de Abraão. 10 Com efeito, o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido’” (Lc 19, 1-10).
O homem tem necessidade de admirar
O final do século XIX acompanhou assombrado o ingente esforço de uma menina norte-americana que marcaria a História. Acometida de grave doença aos 18 meses de idade, Helen Adams Keller (1880-1968) perdeu completamente a visão e a audição. Ficou, assim, reduzida a um triste isolamento, sem possibilidade de conhecer o exterior, a não ser pelo tato, olfato e paladar.
Essa trágica e silenciosa noite de sua mente poderia ter se perpetuado por toda a vida, se não fosse o providencial encontro com uma genial educadora, Anne Mansfield Sullivan, que conseguiu ensinar-lhe a linguagem das mãos, o alfabeto braile e, por fim, a falar fluentemente.
Depois de indizíveis dificuldades, Helen chegou a dominar o francês e o alemão, com boa pronúncia. Cursou faculdade, percorreu o mundo dando palestras e escreveu livros. Anos a fio, ela desenvolveu um quase inacreditável labor, impelida pela ânsia de se relacionar com os outros, movimento natural de todo ser humano, dotado de instinto de sociabilidade.
Ora, assim como pelo heliotropismo as plantas crescem à procura da luz, também as almas necessitam abrir-se à contemplação das criaturas para, a partir delas, subir até o Criador.
Não foi diferente com Helen Keller, a qual crivava a sua mestra com perguntas como estas: O que faz o sol ser quente? Onde estava eu antes de vir para minha mãe? Os passarinhos e os pintos saem do ovo: de onde vem o ovo? Quem fez Deus? Onde está Deus? A senhora já viu Deus?1
Estas são questões que revelam como a alma aspira inelutavelmente chegar à Causa Primeira de tudo, a partir das causas segundas. Pois há em nós uma inata tendência para Deus — que, por analogia, poderíamos chamar de teotropismo — a qual nos leva a fazer correlações, transcendendo da escala natural à sobrenatural. Nesse sentido, ensina São Tomás: “permanece no homem, ao conhecer o efeito, o desejo de saber que este efeito tem uma causa e de saber o que é a causa. Esse desejo é de admiração e causa a inquirição”.2
Ora, como tudo quanto há no universo espelha em alguma medida o Criador, o movimento ordenado da alma é deixar-se atrair pelos reflexos de verdade, beleza e bem, presentes nas criaturas.
Assim, todos devemos procurar tornar nossa alma muito propensa à admiração, de forma a, deparando-nos com algo que é elevado, santo, nobre ou simplesmente reto, nos encantarmos e remontarmos à Causa suprema. E, com toda a evidência, essa admiração cabe, sobretudo, em relação ao Homem-Deus, à sua Mãe Santíssima e à Santa Igreja.
Um publicano chamado Zaqueu
Naquele tempo,1 Jesus tinha entrado em Jericó e estava atravessando a cidade”.
Nosso Senhor Se dirige a Jerusalém para sofrer a Paixão. Ainda pouco antes de chegar a Jericó, o tinha anunciado aos seus discípulos pela terceira vez, mas eles “nada compreenderam de tudo isso: o sentido da palavra lhes ficava encoberto e eles não entendiam o que lhes era dito” (Lc 18, 34).
Pelo contrário, os seguidores de Jesus, entre eles os próprios Apóstolos, julgavam estar Ele a caminho da Cidade Santa para fazer um grande milagre, pelo qual Israel seria libertado do jugo romano.
É nesse clima de expectativa e otimismo que o Divino Mestre vai ser recebido em Jericó.
Ódio dos judeus pelos publicanos
2“Havia ali um homem chamado Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos e muito rico”.
Inteligentes, sagazes e dotados de forte senso organizativo, os romanos instituíram como cobradores de impostos, em Israel, funcionários judeus. Por conhecerem melhor seus conterrâneos, estavam estes em condições de garantir maior receita para os cofres de César, apesar de um quase inevitável desvio de recursos, pois quem se prestava a exercer essa função, naquelas circunstâncias, não costumava primar pela retidão de alma.
Naturalmente, os judeus que aceitavam tal encargo eram considerados traidores e “cofautores da dominação romana”,3 sendo odiados por toda a sociedade hebraica. O próprio nome da função — publicano — despertava repulsa.
Ora, precisamente o chefe dos cobradores de impostos da região, Zaqueu, homem muito rico, será o protagonista desta cena evangélica. Comandar o grêmio mais detestado pelos seus patrícios equivalia a ser considerado ladrão entre os ladrões, ou seja, líder daqueles que faziam fortuna à custa da exploração do povo. Podemos, portanto, bem conjecturar o quanto era ele objeto de desprezo.
Semente de salvação
3a“Zaqueu procurava ver quem era Jesus, ...”
Não obstante, aquele publicano vai mostrar nesta passagem do Evangelho um fundo de alma muito bom.
Movido certamente pela graça, manifestava-se desejoso de ver o Divino Mestre e até, se possível, Lhe dirigir a palavra. Sentia, sem dúvida, a consciência pesada, mas ao mesmo tempo desabrochava em seu interior uma crescente admiração por Jesus. Como bem aponta São Cirilo, “germinava nele uma semente de salvação”.4
Donde vinha a um homem dessa profissão um tão vivo desejo?”, pergunta-se o padre Duquesne. “Ah! Seu coração devia estar agitado por numerosos movimentos os quais, sem dúvida, ele mesmo não conseguia distinguir bem. Esse desejo, que procedia do alto, não era sem um princípio de fé, e não podia deixar de ser acompanhado de estima, de respeito e de amor ao Salvador”.5
Continua no próximo post

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