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sexta-feira, 4 de abril de 2014

Evangelho - Domingo de Ramos da Paixão do Senhor - Ano A

Comentários ao Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Evangelho da Procissão  Mt 21, 1-11
1Naquele tempo, 1Jesus e seus discípulos aproximaram-se de Jerusalém e chegaram a Betfagé, no monte das Oliveiras. Então Jesus enviou dois discípulos, 2dizendo-lhes: Ide até o povoado que está ali na frente, e logo encontrareis uma jumenta amarrada, e com ela um jumentinho. Desamarrai-a e trazei-os a mim! 3Se alguém vos disser alguma coisa, direis: O Senhor precisa deles, mas logo os devolverá’”.
4Isso aconteceu para se cumprir o que foi dito pelo profeta: 5Dizei à filha de Sião: Eis que o teu rei vem a ti, manso e montado num jumento, num jumentinho, num potro de jumenta.
6Então os discípulos foram e fizeram como Jesus lhes havia mandado. 7Trouxeram a jumenta e o jumentinho e puseram sobre eles suas vestes, e Jesus montou. 8A numerosa multidão estendeu suas vestes pelo caminho, enquanto outros cortavam ramos das árvores, e os espalhavam pelo caminho. 9As multidões que iam na frente de Jesus e os que o seguiam, gritavam: Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor! Hosana no mais alto dos céus!
10Quando Jesus entrou em Jerusalém a cidade inteira se agitou, e diziam: Quem é este homem? 11E as multidões respondiam: Este é o profeta Jesus, de Nazaré da Galileia. 
Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, segundo São Mateus - Mt 27, 11-54
 Naquele tempo, Jesus foi posto diante de Pôncio Pilatos, e este o interrogou: “Tu és o rei dos judeus?” Jesus declarou: “É como dizes”, e nada respondeu, quando foi acusado pelos sumos sacerdotes e anciãos. Então Pilatos perguntou: “Não estás ouvindo de quanta coisa eles Te acusam?” Mas Jesus não respondeu uma só palavra, e o governador ficou muito impressionado. Na festa da Páscoa, o governador costumava soltar o prisioneiro que a multidão quisesse. Naquela ocasião, tinham um prisioneiro famoso, chamado Barrabás. Então Pilatos perguntou à multidão reunida: “Quem vós quereis que eu solte: Barrabás, ou Jesus, a quem chamam de Cristo?” Pilatos bem sabia que eles haviam entregado Jesus por inveja. Enquanto Pilatos estava sentado no tribunal, sua mulher mandou dizer a ele: “Não te envolvas com esse justo! Porque esta noite, em sonho, sofri muito por causa dele”. Porém, os sumos sacerdotes e os anciãos convenceram as multidões para que pedissem Barrabás e que fizessem Jesus morrer. O governador tornou a perguntar: “Qual dos dois quereis que eu solte?” Eles gritaram: “BARRABÁS”. Pilatos perguntou: “Que farei com Jesus, que chamam de Cristo?” Todos gritaram: “SEJA CRUCIFICADO!” Pilatos falou: “Mas, que mal ele fez?” Eles, porém, gritaram com mais força: “SEJA CRUCIFICADO!” Pilatos viu que nada conseguia e que poderia haver uma revolta. Então mandou trazer água, lavou as mãos diante da multidão, e disse: “Eu não sou responsável pelo sangue dete homem. Este é um problema vosso!” O povo todo respondeu: QUE O SANGUE DELE CAIA SOBRE NÓS E SOBRE OS NOSSOS FILHOS”. Então Pilatos soltou Barrabás, mandou flagelar Jesus, e entregou-o para ser crucificado. Em seguida, os soldados de Pilatos levaram Jesus ao palácio do governador, e reuniram toda a tropa ao palácio do governador, e reuniram toda a tropa em volta dele. Tiraram sua roupa e o vestiram com um manto vermelho; depois teceram uma coroa de espinhos, puseram a coroa em sua cabeça, e uma vara em sua mão direita. Então se ajoelharam diante de Jesus e zombaram, dizendo: “SALVE, REI DOS JUDEUS!” Cuspiram nele e, pegando uma vara, bateram na sua cabeça. Depois de zombar dele, tiraram-lhe o manto vermelho e, de novo, o vestiram com suas próprias roupas. Daí o levaram para crucificar. Quando saiam, encontraram um homem chamado Simão, da cidade de Cirene, e o obrigaram a carregar a cruz de Jesus. E chegaram a um lugar chamado Gólgota, que quer dizer “lugar da caveira”. Ali deram vinho misturado com fel para Jesus beber. Ele provou, mas não quis beber. Depois de o crucificarem, fizeram um sorteio, repartindo entre si as suas vestes. E ficaram ali sentados, montando guarda. Acima da cabeça de Jesus puseram o motivo da sua condenação: “Este é Jesus, o Rei dos Judeus.” Com ele também crucificaram dois ladrões, um à direita e outro à esquerda de Jesus. As pessoas que passavam por ali oa insultavam, balançando a cabeça e dizendo: “TU QUE IAS DESTRUIR O TEMPLO E CONSTRUÍ-LO DE NOVO EM TRÊS DIAS, SALVA-TE A TI MESMO! SE ÉS O FILHO DE DEUS, DESCE DA CRUZ!” Do mesmo modo, os sumos sacerdotes, junto com os mestres da Lei e os anciãos, também zombavam de Jesus: “A OUTROS SALVOU… A SI MESMO NÃO PODE SALVAR! É REI DE ISRAEL… DESÇA AGORA DA CRUZ! E ACREDITAREMOS NELE. CONFIOU EM DEUS; QUE O LIVRE AGORA, SE É QUE DEUS O AMA! JÁ QUE ELE DISSE: EU SOU O FILHO DE DEUS”. Do mesmo modo, também os dois ladrões que foram crucificados com Jesus, o insultavam. Desde o meio-dia até as três  horas da tarde, houve escuridão sobre toda terra. Pelas três horas da tarde, Jesus deu um forte grito: “Eli, Eli, lamá sabactâni?”, que quer dizer: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Alguns dos que ali estavam, ouvindo-o, disseram: “ELE ESTÁ CHAMANDO ELIAS!” E logo um deles, correndo, pegou uma esponja, ensopou-a em vinagre, colocou-a na ponta de uma vara, e lhe deu para beber. Outros, porém, disseram: “DEIXA, VAMOS VER SE ELIAS VEM SALVÁ-LO!” Então Jesus deu outra vez um forte grito e entregou o espírito. E eis que a cortina do santuário rasgou-se de alto a baixo, em duas partes, a terra tremeu e as pedras se partiram. Os túmulos se abriram e muitos corpos dos santos falecidos ressussitaram! Saindo dos túmulos, depois da ressurreição de Jesus, apareceram na Cidade Santa e foram vistos por muitas pessoas. O oficial e os soldados que estavam com ele guardando Jesus, ao notarem o terremoto e tudo que havia acontecido, ficaram com muito medo e disseram: “ELE ERA MESMO FILHO DE DEUS!”
O triunfo, a cruz e a glória
A conjunção da entrada triunfal do Divino Redentor em Jerusalém e dos sofrimentos de sua dolorosa Paixão nos lembram que a perspectiva da cruz está sempre nimbada pela certeza da glória futura.
TRIUNFO PRENUNCIATIVO DA GLÓRIA DA RESSURREIÇÃO
Ao considerar no Domingo de Ramos a entrada triunfal de Nosso Senhor Jesus Cristo em Jerusalém, devemos ter presente que a Liturgia não é apenas uma rememoração de fatos históricos, mas, sobretudo, uma ocasião para receber as mesmas graças criadas por Deus naquele momento, e distribuídas ao povo judeu que lá se encontrava. Por isso a Igreja Católica estimula os fiéis a repetir simbolicamente essa cerimônia, a fim de se iniciar a Semana Santa com a alma bem preparada.
Na Antiguidade, os grandes heróis militares e os atletas vencedores eram saudados com ramos de palma, para honrá-los pelo triunfo alcançado. Portanto, Jesus quis que sua Paixão, cujo ápice se deu no Calvário, fosse marcada pelo triunfo já na abertura, antecipando a glória da Ressurreição que viria depois.
À vista deste contraste podemos ficar surpresos: como a Igreja combina ambos os aspectos nesta circunstância? Entretanto, isto não nos deve causar estranheza, já que, no extremo oposto, ela contempla a Ressurreição de um modo semelhante.Quando, dentro de poucos dias, estivermos celebrando o magnífico rito da Vigília Pascal , no qual tudo será júbilo, ouviremos no cântico do Precônio notas relativas aos tormentos e à Morte de Cristo: “Foi Ele quem pagou do outro a culpa, quando por nós à morte Se entregou: para apagar o antigo documento, na Cruz todo o seu Sangue derramou. Pois eis agora a Páscoa, nossa festa, em que o Real Cordeiro Se imolou: marcando nossas portas, nossas almas, com seu divino Sangue nos salvou. [...] Ó Deus, quão estupenda caridade vemos no vosso gesto fulgurar: não hesitais em dar o próprio Filho, para a culpa dos servos resgatar. O pecado de Adão indispensável, pois o Cristo o dissolve em seu amor; ó culpa tão feliz que há merecido a graça de um tão grande Redentor!”. Também na lindíssima Sequência Victimæ Paschali laudes, correspondente à Missa do Dia da Páscoa, será dito: “Duelam forte e mais forte: é a vida que enfrenta a morte. O rei da vida, cativo, é morto, mas reina vivo!”.2 Assim, o Domingo de Ramos da Paixão do Senhor, pórtico da Semana Santa, contém também o triunfo.
Este primeiro aspecto da celebração de hoje nos ensina o quanto é uma falha conceber a Redenção operada por Nosso Senhor centrando-se só na dor.
Também, e talvez principalmente, ela comporta o gáudio da Ressurreição, pois, se os padecimentos de Jesus se estenderam da noite de Quinta-Feira até a hora nona de Sexta-Feira, e sua Alma tenha se separado do Corpo por cerca de trinta e nove horas — como se pode deduzir das narrações evangélicas —, o período de glória prolongou-se por quarenta dias, aqui na Terra, e permanece por toda a eternidade no Céu.
Foi esta a noção que faltou aos Apóstolos ao verem o Divino Mestre entristecer-Se, suar Sangue e deixar-Se prender por vis soldados; em consequência, O abandonaram. Na verdade, já não mais se lembravam dos reiterados anúncios que Ele lhes fizera a propósito de sua Morte e Ressurreição ao terceiro dia (cf. Mt 17, 21-22; 20, 18-19). Nossa Senhora, pelo contrário, embora cheia de dor e com o coração transpassado por uma espada (cf. Lc 2, 35), não desfaleceu, porque guardava no fundo da alma a certeza de que seu Filho ressuscitaria. E quando Ele saiu do túmulo, na plenitude de sua majestade, seguramente foi Ela a primeira pessoa a quem Jesus apareceu, como já tivemos oportunidade de comentar.3
Uma clave para considerar a Paixão do Senhor
Contemplemos a Liturgia de hoje com esta perspectiva, revivendo aqueles momentos de gozo em que Jesus entra na Cidade Santa, com vistas a passarmos depois pelas angústias da Paixão e pelas alegrias da Ressurreição. Que as graças derramadas sobre todos os participantes dessa primeira procissão, na qual estava presente o Redentor, desçam sobre nós e cumulem nossas almas, fazendo-nos compreender bem o papel do sofrimento em nossa vida de católicos apostólicos romanos, enquanto meio indispensável para chegar à glória final e definitiva. Dor e triunfo encontram-se aqui magnificamente entrelaçados. Per crucem ad lucem! — E pela cruz que alcançamos a luz!

Sendo impossível, no reduzido espaço de um artigo, tecer um comentário detalhado sobre cada um dos Evangelhos que a Igreja propõe para este dia, comporemos uma reflexão, tendo em mente ambos os textos.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA - Jo 11, 1-45 - Ano A

CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA - ANO A - Jo 11, 1-45
Ressurreição de Lázaro (vv. 38-45)
Diferentemente de outros túmulos, este de Lázaro era escavado em rocha não no sentido horizontal, mas sim, no chão e verticalmente. Para se chegar ao local onde haviam depositado o corpo de Lázaro, precisava-se descer um bom número de degraus. Ao redor do sepulcro, estavam todos em forte expectativa, pois os antecedentes prognosticavam um portentoso acontecimento.
Com magna autoridade, Jesus ordena, para espanto dos circunstantes: “Tirai a pedra” . Marta, sempre criteriosa, não resiste em ponderar que o cadáver já estaria em decomposição depois de quatro dias. “Senhor, ele já cheira mal...” (v. 39). Magistral a resposta de Jesus: “Não te disse que, se creres, verás a glória de Deus?” (v. 40).
Belíssima oração de Nosso Senhor, com o túmulo já aberto, o mau odor ferindo as narinas dos presentes, a atenção não poderia ser mais intensa. Ele reza não por necessidade, “mas falei assim por causa do povo que está em volta de Mim, para que acreditem que Tu me enviaste” (vv. 41-42).
Por um simples desejo seu, a lápide teria voltado ao nada e Lázaro surgiria à porta do sepulcro, rejuvenescido, limpíssimo e perfumado. Era, porém, conveniente constar aos olhos de todos a potência de suas ordens: “bradou em voz forte: “Lázaro, sai para fora!”
Dois portentosos milagres se operam, não só o da pura ressurreição. Lázaro estava atado da cabeça aos pés, impedido de caminhar; entretanto, subiu pela escada que dava acesso à entrada do túmulo, estando até mesmo com um sudário ao rosto. Imaginemos a impressionante cena de um defunto subindo degrau por degrau, sem liberdade de movimentos e sem enxergar, mas já respirando com visíveis sinais de vida.
“Desligai-o e deixai-o ir” (v. 44) é a última voz de comando do Divino Taumaturgo.
Nada mais relata o Evangelista; nenhuma palavra a respeito de Lázaro ou das manifestações de alegria de suas irmãs; somente a conversão de “muitos dos judeus que tinham ido visitar Maria e Marta” (v. 45).
Escapa à Liturgia de hoje a traição de alguns que, certamente indignados, “foram ter com os fariseus” (v. 46) levando o Sinédrio a decretar sua morte (v. 53), matéria esta considerada com quanta profundidade ao longo da Semana Santa.
CONCLUSÃO: UM CONVITE À CONFIANÇA
Aí está o poder de Cristo manifestado em pleno esplendor para alimentar-nos em nossa fé. Esta Liturgia nos convida a uma confiança maior que a do centurião romano; ou seja, é preciso crer em Jesus com um ardor Marial. Se a Santíssima Virgem estivesse ao lado das irmãs, certamente — além de lhes aconselhar a aguardarem com paz de alma a chegada de seu Divino Filho — recomendaria a ambas que procurassem fazer “tudo o que Ele vos disser” (Jo 2, 5). Por maior que sejam os dramas ou aflições em nossa existência, sigamos o exemplo e a orientação de Maria, crendo na onipotência de Jesus, compenetrados das palavras de São Paulo: “Todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que, segundo o seu desígnio, foram chamados” (Rm 8, 28).
1) Suma Teológica III, q 43 a 1.
2 ) Suma Teológica, III q 43, a 4.
3 ) Cf. Lc 7, 37-50.


terça-feira, 1 de abril de 2014

EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA - Jo 11, 1-45 - Ano A

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA
Porém, ao acrescentar: “Nosso amigo, Lázaro, dorme; mas vou despertá-lo” (v. 11), deu aos Apóstolos nova esperança de não ser necessário retornar à Judéia pois, segundo a forte experiência da época, a retomada do sono ao longo de uma enfermidade grave era indício de boa convalescença, e por isso exclamam: “Senhor, se ele dorme, também se há-de levantar” (v. 12).
Diante dessa situação era indispensável falar-lhes às claras, revelando-lhes a morte de Lázaro. Só este particular já seria suficiente para melhor crerem nas propostas de Jesus, pois, até aquele instante, ninguém ali sabia do falecimento de Lázaro, que Ele lhes comunica com toda segurança. E ademais, aproveita para estimular a confiança dos Apóstolos, manifestando sua alegria pelo fato de eles não terem estado em Betânia durante a enfermidade de Lázaro, pois, nesse caso, Jesus se veria na contingência de curá-lo antes de sua morte, diminuindo, assim, a grandeza do milagre da ressurreição que iria operar.
Vê-se pela narração o quanto os próprios Apóstolos estavam sendo formados na fé, passo a passo, através dos milagres, conforme Ele mesmo afirma: “para que acrediteis” (v. 15). Jesus iria selar o término de sua vida pública — os últimos momentos das doze horas do dia — com o mais portentoso milagre. Ele a iniciara com a transformação da água no melhor dos vinhos, em Caná, e agora, antes do anoitecer, traria à vida um morto já em franca decomposição. Nessa ocasião, o mais débil — São Tomé — solta o gemido que estava no fundo da alma de todos: “Vamos nós também, para morrer com Ele” (v. 16). O Espírito Santo ainda não os confirmara na vocação e o instinto de conservação disputava com as virtudes no interior de cada um.
Encontro com Marta e Maria (vv. 17-37)
Betânia, segundo a própria narração (v. 18), ficava a menos de 3 km de distância de Jerusalém. Essa propriedade pertencente à família de Lázaro havia sido utilizada por Jesus com freqüência, quase todas as vezes que devia ir a Jerusalém, não só por sua proximidade, mas até mesmo pelo conforto. Essa é também a razão de ali se encontrarem muitos judeus (v. 19). O luto era observado ao longo de sete dias, sendo os três primeiros reservados para o pranto e os quatro outros para receber as visitas de pêsames. O costume rabínico era estrito e rigoroso, comportando até mesmo o jejum (I Sam 31, 13), em meio às lágrimas (Gen 50, 10). Em essência, ao retornar do enterro — que, aliás, devia ser no próprio dia do falecimento — o ritual ordenava cobrir a cabeça e sentar-se ao chão com os pés descalços. As visitas não pronunciavam nenhuma palavra, pois essa iniciativa cabia somente aos parentes dos falecidos. O convívio, nessas circunstâncias, era silencioso.
Assim permaneceu Maria, por não ter ideia da chegada de Jesus à aldeia, enquanto Marta foi ao seu encontro (v. 20) a fim de Lhe noticiar todo o ocorrido. Uma vez mais os fatos nos revelam as características próprias a cada uma das duas irmãs. Marta é mais dada à administração, às relações sociais, etc., e Maria mais ao fervor amoroso. Por isso Marta não avisa sua irmã, pois seria impossível retê-la junto às visitas enquanto se desenrolasse seu diálogo com o Mestre. Aliás, esse diálogo não poderia ter transcorrido com maior ternura e delicadeza. Não há a menor sombra de queixa da parte de Marta ao afirmar: “Senhor, se estivesses cá, meu irmão não teria morrido” (v. 21), pelo contrário, trata-se da manifestação de um pesaroso sentimento feito de confiança no poder de Jesus.
Maria, por sua vez, repetirá exatamente essa mesma frase (v. 32), permitindo-nos perceber o teor das conversas havidas entre ambas naqueles últimos dias.
Entretanto, a fé de uma e outra ainda não havia atingido sua plenitude, pois não podiam imaginar o grande milagre que iria ser operado por Jesus. Marta não tem noção do poder absoluto de Jesus, e daí o condicionar as ações do Divino Mestre aos pedidos que Ele faça a Deus (v. 22): “Tudo o que pedires a Deus, Deus to concederá”.
Marta externa sua firme crença na ressurreição final e nessa ocasião espera rever seu irmão em corpo e alma (v. 24), sem jamais imaginar a possibilidade de reencontrá-lo naquele mesmo dia. Jesus, o Divino Didata, vê chegado o momento de proferir uma das mais belas afirmações do Evangelho. Em outros trechos Ele terá revelado: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6); “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8, 12); “Eu sou o pão da vida” (Jo 6, 35), mas nenhuma atinge a altura teológica desta, em questão: “Eu sou a Ressurreição e a Vida; aquele que crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; 26 e todo aquele que vive e crê em Mim, não morrerá eternamente” (vv. 25-26). E com uma paternalidade comovedora pergunta a Marta: “Crês nisto?”, para movê-la a um ato explícito de fé e fazê-la crescer em méritos.

O diálogo dera seus melhores frutos, era necessário consolar a outra irmã. Marta a avisa “em segredo” (v. 28) que o Mestre chegara. Conforme seu temperamento arrojado, saiu a toda pressa para encontrá-Lo. Seu gesto levou todos os visitantes a imitá-la; imaginando que ela iria chorar junto ao túmulo, seguiram-na (vv. 29-31). 
Especialmente digna de nota é a cena de seu encontro com Jesus. Marta era mais controlada em suas emoções, determinada em seus objetivos e, portanto, capaz de expor em palavras todos os seus sentimentos. Maria, bem diferente de sua irmã, tem arroubos de fervor sensível pelo Mestre, seu amor não conhece fronteiras e nem permite ser freado em suas manifestações, sua alma realmente seráfica a leva a lançar-se aos pés de Jesus, e o máximo que consegue exprimir é sua dor, em breves termos. De resto era chorar, soluçar, e com tal substância que todos se viram tocados por sua reação, acompanhando-a no pranto (vv. 32-33).
Maria era tão carismática em sua fé, no ardor de seus desejos e na comunicação de sua benquerença por Jesus, que Ele próprio “comoveu-Se profundamente e perturbou-Se” (v. 33). Bem dizia Lacordaire: “L´intelligence ne fait que parler; c´est l´amour qui chante!” Nossas palavras podem convencer, mas nosso amor poderá até mesmo tocar o Sagrado Coração de Jesus. Quão humano, sem deixar de ser divino, Ele se mostra nessa ocasião, sobretudo ao derramar, também Ele, suas preciosíssimas lágrimas, santificando, assim, as lágrimas roladas de todos os corações sofredores por amor a Deus, ou arrependidos de suas faltas.
Era essa a maior prova de amor externada pelo Salvador, até aquele instante, em relação ao seu amigo Lázaro. 
Sempre “pedra de escândalo”, os campos se dividem em vista de suas lágrimas. Alguns são tomados de admiração, outros O recriminam por ter deixado morrer Lázaro. Hipocrisia pura, segundo autores clássicos, pois se põem a julgar Jesus antes mesmo de qualquer ação sua. Esse é o efeito de uma antipatia preconcebida, radicada, talvez, no vício da inveja (vv. 36-37).
Continua no próximo post

segunda-feira, 31 de março de 2014

EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA - Jo 11, 1-45 - Ano A

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA
O retorno de Jesus a Betânia (vv. 1-16)
Para tornar bem claro quem era o enfermo em questão, São João o apresenta como sendo o irmão de Marta e Maria. Ressalta a figura desta última por se tratar de uma pessoa muito conhecida e comentada em toda Israel, devido à sua impressionante conversão e seu belíssimo ato de arrependimento em casa de Simão, o fariseu (3). É interessante notar o acerto do nome “Lázaro” que significa: “ajudado”, ou, “Deus socorreu”.
Fazia muito que Jesus pregava na região da Peréia, à distância de uma jornada de Betânia. Com enorme solicitude e carinho por Lázaro, tal qual costumam ser as irmãs quando de boa índole, Marta e Maria enviam um mensageiro para avisá-lo do estado de saúde do irmão.
Transparece na atitude de ambas um profundo espírito de fé na onipotência do Salvador e, ao mesmo tempo, uma nobre e fraternal dedicação. Tanto mais que a mensagem não era só informativa mas, com enorme polidez, ela continha uma súplica. A fórmula empregada nada tem a ver com a lógica argumentação do centurião romano para obter a cura de seu servo; mais se aproxima ela, em sua essência, da atitude da Virgem Maria nas Bodas de Caná: “Senhor, aquele que amas está doente” (v. 3). Segundo Santo Agostinho, esta simples frase contém uma profunda verdade de fé: Deus jamais abandona aquele a quem ama. Elas não imploram nem pedem explicitamente a cura, quer pudesse ser ela operada de perto, ou de longe; era-Lhe suficiente conhecer o estado de seu amado para, por um simples desejo seu, tornar efetivo o milagre.
E realmente assim teria sido se Jesus não tivesse querido se aproveitar do pretexto da morte de seu amigo “para a glória de Deus, a fim de que o Filho do Homem seja glorificado” (v. 4), conforme Ele próprio o afirma.
Grande perplexidade devem ter tido ambas, ao receberem a resposta do Senhor, dois dias depois do falecimento de Lázaro: “Esta doença não é de morte...” (v. 4). Maior aflição ainda deveuse ao fato de Jesus não se ter movido para se encontrar com o amigo nem com suas irmãs.
Essa é bem a provação pela qual passam as almas aflitas que imploram a intervenção de Deus e julgam não serem atendidas, devido à demora ou a uma aparente inércia da parte do Céu. Quão benfazeja é esta passagem para nos convencer a jamais descrermos da onipotência da oração perfeita! Quando Deus tarda em intervir é por razões mais altas e porque certamente nos dará com superabundância. E aí está o procedimento de Jesus para com aqueles aos quais ama: “Jesus amava Marta, sua irmã Maria e Lázaro” (v. 5). O grande amor de Jesus àquela família tornava ainda mais incompreensível sua como que indiferença, pois, “tendo ouvido que Lázaro estava doente, ficou ainda dois dias no lugar onde se encontrava” (v. 6).
Que grande vôo de espírito era necessário para seguir o Divino Mestre diante da incompreensibilidade de suas atitudes! Nenhum dos dois lados chegava a atinar com o alcance da meta política do Salvador. As irmãs deviam estar desmontadas em suas esperanças, acompanhando do lado de fora do sepulcro a lenta mas progressiva decomposição do corpo de seu irmão. Os Apóstolos, por sua vez, não podiam entender o porquê da ida de Nosso Senhor à Judéia. Já havia curado tantos necessitados à distância, qual a razão de penetrar numa terra onde era perseguido de morte? E só por causa de um enfermo? “Mestre, ainda há pouco os judeus Te quiseram apedrejar, e Tu vais novamente para lá?” (v. 8), diziam eles. Não seria melhor operar o milagre à distância?
A perspectiva psicossocial na qual os discípulos procuravam delinear a figura do Messias era essencialmente diferente da realidade que se desenrolava diante dos olhos de todos. Neles se encontrava uma constante do espírito humano, a de querer reduzir as ações de Deus às proporções de nossa mentalidade e até mesmo de nossos desejos, sentimentos e emoções. Ora, os princípios pelos quais Deus se move sempre são infinitamente superiores aos atinentes às meras criaturas, por isso nada melhor do que nos abandonarmos aos desígnios e ao beneplácito de sua vontade, nunc et semper.

Segundo nossos critérios, talvez fosse preferível que Jesus expusesse seu plano com total clareza aos Apóstolos para assim retornarem à Judéia com maior confiança, paz e decisão. Pelo contrário, Jesus lhes responde com uma parábola: durante as doze horas do dia, pode-se caminhar sem tropeço, diz Nosso Senhor, bem ao contrário das outras doze da noite. Tratava-se de uma afirmação óbvia, mas trazendo em suas entrelinhas algum significado mais profundo, ou seja, não havia chegado ainda o momento de sua Paixão, portanto não era de se temer nenhum mal. Assim, de forma didática e suave, ia instruindo os Apóstolos sobre os passos a serem dados, exercitando-os na plena confiança que deveriam devotar a seu Divino Mestre. 
Continua no próximo post