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terça-feira, 1 de abril de 2014

EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA - Jo 11, 1-45 - Ano A

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO V DOMINGO DA QUARESMA
Porém, ao acrescentar: “Nosso amigo, Lázaro, dorme; mas vou despertá-lo” (v. 11), deu aos Apóstolos nova esperança de não ser necessário retornar à Judéia pois, segundo a forte experiência da época, a retomada do sono ao longo de uma enfermidade grave era indício de boa convalescença, e por isso exclamam: “Senhor, se ele dorme, também se há-de levantar” (v. 12).
Diante dessa situação era indispensável falar-lhes às claras, revelando-lhes a morte de Lázaro. Só este particular já seria suficiente para melhor crerem nas propostas de Jesus, pois, até aquele instante, ninguém ali sabia do falecimento de Lázaro, que Ele lhes comunica com toda segurança. E ademais, aproveita para estimular a confiança dos Apóstolos, manifestando sua alegria pelo fato de eles não terem estado em Betânia durante a enfermidade de Lázaro, pois, nesse caso, Jesus se veria na contingência de curá-lo antes de sua morte, diminuindo, assim, a grandeza do milagre da ressurreição que iria operar.
Vê-se pela narração o quanto os próprios Apóstolos estavam sendo formados na fé, passo a passo, através dos milagres, conforme Ele mesmo afirma: “para que acrediteis” (v. 15). Jesus iria selar o término de sua vida pública — os últimos momentos das doze horas do dia — com o mais portentoso milagre. Ele a iniciara com a transformação da água no melhor dos vinhos, em Caná, e agora, antes do anoitecer, traria à vida um morto já em franca decomposição. Nessa ocasião, o mais débil — São Tomé — solta o gemido que estava no fundo da alma de todos: “Vamos nós também, para morrer com Ele” (v. 16). O Espírito Santo ainda não os confirmara na vocação e o instinto de conservação disputava com as virtudes no interior de cada um.
Encontro com Marta e Maria (vv. 17-37)
Betânia, segundo a própria narração (v. 18), ficava a menos de 3 km de distância de Jerusalém. Essa propriedade pertencente à família de Lázaro havia sido utilizada por Jesus com freqüência, quase todas as vezes que devia ir a Jerusalém, não só por sua proximidade, mas até mesmo pelo conforto. Essa é também a razão de ali se encontrarem muitos judeus (v. 19). O luto era observado ao longo de sete dias, sendo os três primeiros reservados para o pranto e os quatro outros para receber as visitas de pêsames. O costume rabínico era estrito e rigoroso, comportando até mesmo o jejum (I Sam 31, 13), em meio às lágrimas (Gen 50, 10). Em essência, ao retornar do enterro — que, aliás, devia ser no próprio dia do falecimento — o ritual ordenava cobrir a cabeça e sentar-se ao chão com os pés descalços. As visitas não pronunciavam nenhuma palavra, pois essa iniciativa cabia somente aos parentes dos falecidos. O convívio, nessas circunstâncias, era silencioso.
Assim permaneceu Maria, por não ter ideia da chegada de Jesus à aldeia, enquanto Marta foi ao seu encontro (v. 20) a fim de Lhe noticiar todo o ocorrido. Uma vez mais os fatos nos revelam as características próprias a cada uma das duas irmãs. Marta é mais dada à administração, às relações sociais, etc., e Maria mais ao fervor amoroso. Por isso Marta não avisa sua irmã, pois seria impossível retê-la junto às visitas enquanto se desenrolasse seu diálogo com o Mestre. Aliás, esse diálogo não poderia ter transcorrido com maior ternura e delicadeza. Não há a menor sombra de queixa da parte de Marta ao afirmar: “Senhor, se estivesses cá, meu irmão não teria morrido” (v. 21), pelo contrário, trata-se da manifestação de um pesaroso sentimento feito de confiança no poder de Jesus.
Maria, por sua vez, repetirá exatamente essa mesma frase (v. 32), permitindo-nos perceber o teor das conversas havidas entre ambas naqueles últimos dias.
Entretanto, a fé de uma e outra ainda não havia atingido sua plenitude, pois não podiam imaginar o grande milagre que iria ser operado por Jesus. Marta não tem noção do poder absoluto de Jesus, e daí o condicionar as ações do Divino Mestre aos pedidos que Ele faça a Deus (v. 22): “Tudo o que pedires a Deus, Deus to concederá”.
Marta externa sua firme crença na ressurreição final e nessa ocasião espera rever seu irmão em corpo e alma (v. 24), sem jamais imaginar a possibilidade de reencontrá-lo naquele mesmo dia. Jesus, o Divino Didata, vê chegado o momento de proferir uma das mais belas afirmações do Evangelho. Em outros trechos Ele terá revelado: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6); “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8, 12); “Eu sou o pão da vida” (Jo 6, 35), mas nenhuma atinge a altura teológica desta, em questão: “Eu sou a Ressurreição e a Vida; aquele que crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; 26 e todo aquele que vive e crê em Mim, não morrerá eternamente” (vv. 25-26). E com uma paternalidade comovedora pergunta a Marta: “Crês nisto?”, para movê-la a um ato explícito de fé e fazê-la crescer em méritos.

O diálogo dera seus melhores frutos, era necessário consolar a outra irmã. Marta a avisa “em segredo” (v. 28) que o Mestre chegara. Conforme seu temperamento arrojado, saiu a toda pressa para encontrá-Lo. Seu gesto levou todos os visitantes a imitá-la; imaginando que ela iria chorar junto ao túmulo, seguiram-na (vv. 29-31). 
Especialmente digna de nota é a cena de seu encontro com Jesus. Marta era mais controlada em suas emoções, determinada em seus objetivos e, portanto, capaz de expor em palavras todos os seus sentimentos. Maria, bem diferente de sua irmã, tem arroubos de fervor sensível pelo Mestre, seu amor não conhece fronteiras e nem permite ser freado em suas manifestações, sua alma realmente seráfica a leva a lançar-se aos pés de Jesus, e o máximo que consegue exprimir é sua dor, em breves termos. De resto era chorar, soluçar, e com tal substância que todos se viram tocados por sua reação, acompanhando-a no pranto (vv. 32-33).
Maria era tão carismática em sua fé, no ardor de seus desejos e na comunicação de sua benquerença por Jesus, que Ele próprio “comoveu-Se profundamente e perturbou-Se” (v. 33). Bem dizia Lacordaire: “L´intelligence ne fait que parler; c´est l´amour qui chante!” Nossas palavras podem convencer, mas nosso amor poderá até mesmo tocar o Sagrado Coração de Jesus. Quão humano, sem deixar de ser divino, Ele se mostra nessa ocasião, sobretudo ao derramar, também Ele, suas preciosíssimas lágrimas, santificando, assim, as lágrimas roladas de todos os corações sofredores por amor a Deus, ou arrependidos de suas faltas.
Era essa a maior prova de amor externada pelo Salvador, até aquele instante, em relação ao seu amigo Lázaro. 
Sempre “pedra de escândalo”, os campos se dividem em vista de suas lágrimas. Alguns são tomados de admiração, outros O recriminam por ter deixado morrer Lázaro. Hipocrisia pura, segundo autores clássicos, pois se põem a julgar Jesus antes mesmo de qualquer ação sua. Esse é o efeito de uma antipatia preconcebida, radicada, talvez, no vício da inveja (vv. 36-37).
Continua no próximo post

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