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quarta-feira, 30 de julho de 2014

EVANGELHO – XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21

CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 18º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21
Significado místico do milagre
Deus podia criar o homem com uma natureza diferente, apta para sustentar-se, por exemplo, só com ar ou com água. Mas preferiu criá-lo com a necessidade da nutrição, porque estava em seus divinos designios dar-lhe, a seu tempo, o supremo alimento espiritual: o Sacramento da Eucaristia. Por conseguinte, é cabível dizer que Ele, ao idealizar o trigo e a uva como duas criaturas vegetais possíveis, desde todo o sempre, não teve em vista apenas proporcionar ao homem os recursos para elaborar um bom champanhe ou preparar um magnífico pão. Na mente do Criador estava em primeiro lugar a Eucaristia, o Corpo, Sangue, Alma e Divindade do Filho d’Ele, sob as espécies do pão e do vinho que, num extremo de bondade inimaginável, ofereceria aos homens em alimento.
Explica Santo Alberto Magno11 que ao unirem-se duas substâncias, de maneira a uma mudar-se na outra, a superior assimila a inferior, por ser esta mais débil e imperfeita. Ora, o Santíssimo Sacramento é um alimento tão infinita e substancialmente superior a toda a ordem da criação, que Ele assume quem o recebe, aprimorando e santificando a alma. Podemos ilustrar este efeito com um sugestivo exemplo: ao se adicionar a um tonel cheio de álcool uma gotinha de essência de requintado perfume, todo o álcool se transforma em perfume. Referindo-se a este tema, conclui São Tomás’2 ser isto o que ocorre na Eucaristia. Quando se trata do alimento comum, o organismo extrai dele as substâncias adequadas para o seu sustento e as assimila. Na Eucaristia, ao contrário, é Cristo quem assume e diviniza a pessoa que O recebe. Por isso Ele afirmou de modo categórico: “Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a Carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu Sangue, não tereis a vida em vós mesmos. Quem come a minha Carne e bebe o meu Sangue tem a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6, 53-54).
Neste sentido, que inapreciável dádiva é a de dispor diariamente da Eucaristia! Houve tempo em que as pessoas comungavam uma vez ao ano, e a Primeira Comunhão era feita somente na idade adulta. Nos dias atuais, a partir do uso da razão é permitido receber a Jesus-Hóstia e, de acordo com as normas canônicas vigentes, admite-se a frequência ao Sagrado Banquete até duas vezes ao dia.
II - O ILIMITADO AMOR DE DEUS NOS ENCHE DE CONFIANÇA
Liturgia do 18 Domingo do Tempo Comum deve nos estimular a uma confiança extraordinária na Providência, pois, uma vez unidos a Jesus, podemos dizer com São Paulo, na segunda leitura deste dia: “Quem nos separará do amor de Cristo? Tribulação? Angústia? Perseguição? Fome? Nudez? Perigo? Espada? Em tudo isso, somos mais que vencedores, graças Aquele que nos amou! Tenho a certeza de que nem a morte, nem a vida, nem os Anjos, nem os poderes celestiais, nem o presente nem o futuro, nem as forças cósmicas, nem a altura, nem a profundeza, nem outra criatura qualquer, será capaz de nos separar do amor de Deus por nós, manifestado em Cristo Jesus, Nosso Senhor” (Rm 8, 35.37-39). 0 Apóstolo, que já passara por todas essas provações, conservava a força de alma, o zelo apostólico e o fogo para desejar conquistar o mundo porque sentia o amor de Deus incidir sobre ele. Se considerarmos que o Pai promoveu a Encarnação de seu Unigênito, igual a Ele, em nossa miserável natureza, para sofrer indizivelmente e nos obter a salvação, teremos uma ideia da magnitude desse amor.
Ensina São Tomás de Aquino 13 que o amor de Deus é tão eficaz que infunde a bondade na criatura por Ele amada. Assim, quando encontramos alguém muito bom, tenhamos certeza: Deus o ama especialmente. Devemos pedir a graça de sentir esta dileção divina por nós, tal como a experimentaram as multidões no deserto ao serem curadas de suas enfermidades e alimentadas com o pão mais delicioso que se conheceu. Ele quer nos dar tudo, mas, muitas vezes, somos nós que o impedimos. Dizia Santa Maravilhas de Jesus: “Se tu O deixas...”.14 Se nos deixássemos santificar por Deus...
A santidade das gerações atuais e futuras haverá de resplandecer em homens que, reconhecendo suas insuficiências e debilidades, serão fiéis apesar de fracos e não oporão obstáculos ao amor que Deus prodigaliza a cada um, pois terão degustado a superabundância da generosidade divina e por isso, mesmo nas maiores dificuldades, confiarão incondicionalmente na inesgotável Bondade Absoluta, que é Deus!
1) SÃO JOÃO CRISÓSTOMO Homilía XLIX, n.1. In: Obras. Homilías sobre el Evangelio de San Mateo (46-90). 2.ed. Madrid: BAC, 2007, v.11, p.53.
2) Idem, p.54.
3) Idem, ibidem.
4) SAINT LAURENT, Thomas de. El libro de la Confianza. 2.ed. Bogotá: Corporación SOS Familia, 2000, p.25.
5) MALDONADO, SJ, Juan de. Comentarios a los Cuatro Evangelios. Evangelio de San Mateo. Madrid: BAC, 1956, v.1, p.532.
6) Cf. TUYA, OP, Manuel de. Biblia Comentada. Evangelios. Madrid: BAC, 1964, v.V p.340.
7) SÃO JOÃO CRISÓSTOMO, op. cit., n.2, p.58.
8) Cf. TUYA, op. cit., p.341.
9) Cf. BONSIRVEN, SJ, Joseph. Le judaïsme palestinien au temps de Jésus-Christ. Paris: Beauchesne, 1950, p.193-194.
10) Cf. SANTO AGOSTINHO. Confessionum. LI, cl, n.l. In: Obras. 7.ed. Madrid: BAC, 1979, v.11, p.73.
11) Cf. SANTO ALBERTO MAGNO. Super Sent. LIV, d.IX, A, a.2, ad quest. ad 1.
12) Cf. SAO TOMAS DE AQUINO. Super Sent. L.IV, d.12, q.2, a.1, qc.1.
13) Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I, q.20, a.2.

14) GRANERO, Jesús María. Madre Maravillas de Jesús. Biografia espiritual. Madrid: Fareso, 1979, p.139.

terça-feira, 29 de julho de 2014

EVANGELHO – XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21

COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21
Os discípulos manifestam fé fraca
16 Jesus porém lhes disse: “Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer” 17 Os discípulos responderam: ‘Só temos aqui cinco pães e dois peixes”.
A resposta do Senhor é taxativa: aqueles milhares de homens “não precisam ir embora” para comprar víveres. Uma vez que os recursos materiais se mostravam de todo insuficientes, chegara o momento de Deus agir, pois Ele “escolhe, para intervir, a hora das situações desesperadoras”.4 Queria também o Redentor facilitar aos discípulos a prática da virtude da humildade, pois ao constatar que a quantidade de gente não significava uma dificuldade para o Senhor, deveriam declarar a própria incapacidade de resolver o impasse e se colocar à disposição do Divino Taumaturgo, para servi-Lo no milagre que Ele, sendo a Bondade em essência, haveria de operar em favor daquela multidão.
A resposta permite supor a reação dos discípulos perante as palavras de Jesus: “Este homem pede coisas impossíveis... Como vamos alimentar toda essa gente com cinco pães e dois peixes? Terá Ele noção de quantas pessoas estão aqui?”. Sua objeção demonstra o quanto estavam longe de viver segundo a convicção de que tudo é de Deus, tudo está n’Ele e por Ele é dirigido, ou seja, nada acontece sem sua permissão.
Cabe aqui uma consideração a este respeito. Existe um corte que divide drasticamente os homens em duas categorias bem definidas: os que têm fé e os que não a têm; os que se orientam conforme o prisma sobrenatural da fé e aqueles que pautam sua existência em função do concreto, do material, do palpável e sensível. Estes constituem uma grande fatia da humanidade, talvez avassaladoramente maior do que a dos homens de fé, os quais, por sua vez, sabem encontrar o dedo de Deus em tudo, inclusive na dor, mas sobretudo quando Ele resolve as situações de modo maravilhoso.
A multiplicação dos pães e dos peixes
18 Jesus disse: “Trazei-os aqui”. Jesus mandou que as multidões se sentassem na grama. Então pegou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos para o Céu e pronunciou a bênção. Em seguida, partiu os pães e os deu aos discípulos. Os discípulos os distribuíram às multidões.
Ao contrário do que queriam os Apóstolos, Nosso Senhor não despede as multidões, mas assume a responsabilidade de alimentá-las; não abandona aqueles milhares de homens, mulheres e crianças que se puseram sob sua proteção com tanta confiança e entusiasmo. O cuidado em distribuí-las ordenadamente pela relva, que era abundante por ser primavera, facilitava o cálculo do número de presentes e estava de acordo com o costume oriental de fazer as refeições em grupo.
Jesus toma os pães e os peixes, eleva os olhos ao Céu — Ele que é o Dono do Céu, da Terra e do universo inteiro —, abençoa os alimentos e entrega-os aos discípulos para serem distribuídos a todos os circunstantes. Maldonado comenta — segundo São João Crisóstomo e Leôncio — que Jesus manda trazer os pães para demonstrar que “quem dá de comer a todo o orbe terrestreé o Senhor, e Ele não depende de hora nem de tempo algum, pois em qualquer ocasião e conjuntura pode fazer de qualquer matéria quantos pães quiser”.5
O padre Manuel de Tuya 6 propõe uma interessante questão: esses pães se multiplicaram nas mãos de Cristo ou nas dos Apóstolos, quando estes os distribuíam? E responde que não se sabe ao certo, dada a concisão do relato evangélico. São João Crisóstomo, por sua vez, observa que, ao entregá-los aos discípulos para eles fazerem a distribuição e comprovarem pessoalmente a grandeza do milagre, o Divino Mestre “não pretendia apenas honrá-los com isso. Queria também que, ao realizar-se o milagre, eles lhe dessem fé e não o relegassem depois ao esquecimento, pois suas próprias mãos haveriam de atestá-lo. [...] Enfim, toma os pães de suas mãos para que haja muitas testemunhas do fato e tenham muitas recordações do milagre”7 .
A superabundância de um milagre
20 Todos comeram e ficaram satisfeitos, e dos pedaços que sobraram, recolheram ainda doze cestos cheios, 21 E os que haviam comido eram mais ou menos cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças.
Concluída a miraculosa refeição, ainda sobrou abundante quantidade de pães que foram recolhidos, segundo os usos do tempo, e cada um dos Apóstolos precisou carregar um cesto na volta. Curioso contraste com o início da distribuição, quando tinham pouco peso nas mãos. Por isso não pode ter sido pequena a impressão dos discípulos e da multidão ante a magnitude do prodígio.
De acordo com uma crença difundida nos meios judaicos, o Messias faria cair do céu maná, mais do que o fizera Moisés no deserto,8 e com isso haveria grande fartura de víveres na terra de Israel.9 Depois de verem Nosso Senhor curar numerosos doentes e de comerem um pão de incomparável sabor, fruto de mais um grande milagre, compreende-se que aqueles homens não quisessem mais deixar a companhia de quem operava tantas maravilhas, pois julgavam tratar-se do tão esperado Messias. “Este é verdadeiramente o Profeta que há de vir ao mundo” (Jo 6, 14), afirmavam, constatando como Ele resolvia todos os problemas.
Atende às necessidades e sana as miserias
O Evangelho nos apresenta Nosso Senhor Jesus Cristo enquanto sendo Aquele que atende a todas as nossas necessidades e nos fortalece nas debilidades. Ora, estão entre estas, mais do que as deficiências físicas, sobretudo as inclinações para o mal, as paixões desordenadas que não conseguimos dominar sem o auxílio permanente da graça. Estas misérias, no entanto, nos ajudam a reconhecer nossa total dependência da verdadeira seiva que provém d’Ele.
Disto dá-nos claro ensinamento a primeira leitura (Is 55, 1-3),do Livro do Profeta Isaías: “O vós todos que estais com sede, vinde às águas; vós que não tendes dinheiro, apressai-vos, vinde e comei, vinde comprar sem dinheiro, tomar vinho e leite, sem nenhuma paga” (55, 1). Como tantas vezes nas Escrituras, é utilizada aqui uma linguagem simbólica. A sede à qual se refere o profeta é principalmente espiritual. Com efeito, temos em nossa alma uma apetência insaciável de felicidade, porque somos criados para o infinito. Como escreveu Santo Agostinho,10 fomos feitos para Deus e o nosso coração não estará tranquilo enquanto não repousar n’Ele. Quando virmos a Deus face a face, todo o resto se tornará nada para nós, porque comprovaremos quanto só Ele satisfaz inteiramente essa sede das águas límpidas da graça.
Uma bela pré-figura da Eucaristia
Com tão só cinco pães e dois peixes Nosso Senhor alimentou uma multidão de cinco mil homens, sem contar as mulheres e as crianças. Numa época em que as famílias eram, em geral, numerosas, é possível supor que a quantidade de gente fosse muito maior. Talvez o dobro, o triplo, ou até mais. Mede-se a importância desse milagre pelo fato de ser o único relatado pelos quatro evangelistas. Teve ele grande repercussão, também, por se encontrarem na região caravanas vindas das mais variadas partes a caminho de Jerusalém, para a festa da Páscoa que se aproximava.
Ao realizá-lo, Jesus tinha em vista não só alimentar os corpos, mas, sobretudo, preparar as almas para aceitarem a Eucaristia.

Multiplicando pães e peixes, manifestou seu poder sobre a matéria. Caminhando sobre as águas, poucas horas depois, tornou patente o domínio sobre seu próprio Corpo (cf. Mt 14, 22-27). Desta maneira, ia o Divino Mestre predispondo os Apóstolos a crerem, mais tarde, na Eucaristia, pois quem é capaz de operar tais prodígios pode perfeitamente instituir um Sacramento no qual a substância do pão cede lugar à do seu sagrado Corpo. Este milagre é, pois, uma esplêndida pré-figura da Eucaristia. Temos hoje o Santíssimo Sacramento à nossa disposição nas Missas diariamente celebradas pelo mundo inteiro: é a multiplicação dos Pães Consagrados, o Pão da Vida, até o fim dos séculos.
Continua no próximo post

segunda-feira, 28 de julho de 2014

EVANGELHO – XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21

COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO A – Mt 14, 13-21
Cinco pães, dois peixes, mais Jesus...
Ao realizar o milagre da multiplicação dos pães, Jesus tinha em vista não só alimentar aquela grande multidão, mas também —finalidade muito mais elevada — preparar as almas para aceitarem a Eucaristia.
Naquele tempo, 13 quando soube da morte de João Batista, Jesus partiu e foi de barco para um lugar deserto e afastado. Mas, quando as multidões souberam disso, saíram das cidades e O seguiram a pé.
14Ao sair do barco, Jesus viu uma grande multidão. Encheu-Se de compaixão por eles e curou os que estavam doentes. 15Ao entardecer, os discípulos aproximaram-se de Jesus e disseram: “Este lugar é deserto e a hora já está adiantada. Despede as multidões, para que possam ir aos povoados comprar comida!” 16 Jesus, porém, lhes disse:
“Eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos de comer!” 17 Os discípulos responderam: “Só temos aqui cinco pães e dois peixes”. 18 Jesus dissTrazei-os aqui”.
19 Jesus mandou que as multidões se sentassem na grama. Então pegou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos para o Céu e pronunciou a bênção. Em seguida, partiu os pães e os deu aos discípulos. Os discípulos os distribuíram às multidões.
20 Todos comeram e ficaram satisfeitos, e dos pedaços que sobraram, recolheram ainda doze cestos cheios. ‚ E os que haviam comido eram mais ou menos cinco mil homens sem contar mulheres e crianças (Mt 14, 13-21).

I - A COMPAIXÃO DO HOMEM-DEUS
Ao tratar dos atributos divinos costumamos utilizar uma linguagem com a qual “humanizamos” a ideia de Deus, de modo a facilitar nossa compreensão. Por isso, é habitual que Deus seja apresentado manifestando sua cólera ou misericórdia, quando na realidade Ele não apenas possui as virtudes, mas é cada uma delas. Assim, Deus não só é bom, como é a Bondade e, sucessivamente, a essência de todas as virtudes. Neste sentido, para entendermos que Deus é a Bondade não basta uma noção teórica, é indispensável experimentar a sua ação na alma, conforme nos aconselha o salmista: “Gustate et videte quoniam suavis est Dominus — Provai e vede quão suave é o Senhor” (Sl 33, 9). Como veremos, o Evangelho e as demais leituras do 18° Domingo do Tempo Comum preparam os fiéis a se abrirem para a contemplação dessa Bondade infinita que é Deus.
Jesus-Homem Se compraz em rezar a Deus
Naquele tempo 13a quando soube da morte de João Batista, Jesus partiu e foi de barco para um lugar deserto e afastado.
Após a morte do Precursor, Jesus Se dirigiu a uma região situada fora da jurisdição de Herodes — que começava a se sentir incomodado com a atuação d’Ele e poderia vir a persegui-Lo também (cf. Mt 14, 1-2; Mc 6, 14-16; Le 9, 7-9) —, não por temê-lo, mas porque “ainda não era chegada sua hora” (Jo 7, 30). Movia-O também o desejo de recolher-Se com seus discípulos para algumas horas de oração, terminada a primeira missão evangelizadora que lhes confiara (cf. Mc 6, 7.30-32). Em relação aos Apóstolos, bem se explica a conveniência ou até a necessidade de um retiro depois de um período de intensa atuação. No tocante ao Divino Redentor, porém, essa decisão surpreende, pois Ele é Deus. Acaso iria rezar a Si mesmo? Precisaria dedicar parte de seu tempo à oração? Sim, pois é também Homem. E Jesus, com sua inteligência, vontade e sensibilidade humana, reza a Si mesmo enquanto Deus; em sua humanidade, recorre à sua divindade. Há nisto um mistério que excede os nossos horizontes. Mostra-nos Ele, assim, o extraordinário valor da oração para obter favores do Céu, como, por exemplo, o de proporcionar àquelas multidões mais graças para que elas O compreendessem melhor.
Esquecido de Si, Cristo Se preocupava com os outros
13b Mas, quando as multidões souberam disso, saíram das cidades e O seguiram a pé. 14Ao sair do barco, jesus viu uma grande multidão. Encheu-Se de compaixão por eles e curou os que estavam doentes.
Tomadas de admiração pela verdade, bondade e beleza que emanavam do Mestre, as pessoas O seguiam sem preocupações triviais, motivadas pelo anseio de conviver com Ele, de ouvir seus ensinamentos e presenciar seus milagres. Recebiam inefáveis graças de consolação e de fervor, de modo que não mediam distâncias nem sacrifícios. Nessa ocasião, deslocaram-se apressadamente a pé, pelas margens do Mar da Galileia, enquanto Jesus fazia o percurso em um barco para poder Se isolar algum tanto.
Não é difícil imaginar a cena: quando Se dispunha a sair da embarcação, prestes a entrar em recthimento, Nosso Senhor encontra uma multidão à sua espera na margem. Um homem egoísta e, portanto, pouco desejoso de fazer bem aos outros, logo ficaria desapontado por ver o planejado retiro se desvanecer. Outra foi a reação do Salvador: “encheu-Se de compaixão por eles”. Renunciou de bom grado a seu projeto e de imediato começou a curar todos os doentes e a ensinar muitas coisas sobre o Reino de Deus, até o entardecer. Não houve ninguém que saísse desatendido ou sem receber algum benefício. Eis o prêmio daqueles que mantêm aceso o senso da verdade, do bem e do belo e se deixam guiar por ele. “Grande era a adesão daquelas multidões, mas o que faz Jesus ultrapassa a recompensa devida ao mais ardente fervor”.1 Como o superior perfeito, sabe Ele cuidar dos subalternos e tem com paixão, ou seja, sofre com eles.
Os discípulos preocupavam-se consigo mesmos
15 Ao entardecer, os discípulos aproximaram-se de Jesus e disseram: “Este lugar é deserto e a hora já está adiantada. Despede as multidões, para que possam ir aos povoados comprar comida!”
Cada vez mais encantadas com o Divino Mestre, aquelas pessoas não se preocupavam com a alimentação, porque “o desejo de estar a seu lado não os deixava sentir fome”.2
Os discípulos, pelo contrário, percebendo aproximar-se o fim do dia, receavam ter o trabalho de providenciar alimento para tanta gente. Ora, eles já haviam visto Jesus converter água em vinho, em Caná, e operar todo tipo de milagres que comprovavam ser Ele realmente Deus ou, pelo menos, um grande profeta com um poder taumatúrgico incomum. “Entretanto, nem assim puderam prever o milagre da multiplicação dos pães, tão imperfeitos eram nessa ocasião”.3

São João acrescenta em seu Evangelho um detalhe: Jesus pergunta a Filipe onde comprar alimento para tão grande número de pessoas, e este responde serem necessários mais de duzentos denários de pão (cf. Jo 6, 5-7). Era evidente que não pretendia o Divino Mestre mandá-los adquirir tal quantidade de pão, que, aliás, eles não encontrariam nas redondezas e, talvez, nem dispusessem do dinheiro necessário para tal. Desde toda a eternidade, contudo, já sabia o Verbo de Deus o que faria, e tencionava apenas experimentar a fé dos discípulos no seu ilimitado poder de realizar prodígios.
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