-->

terça-feira, 25 de outubro de 2011

O pobre e o rico IV

Invertendo os papéis na Parábola
Pode-se perguntar: vai-se para o inferno pelo simples fato de ser rico? No Céu, só entram os mendigos? Toda riqueza é um mal e toda miséria, um bem?
Neste trecho de Lucas, encontramos a descrição de uma condenação e de uma salvação. As penas eternas aplicadas ao avarento são devidas ao mau uso das riquezas, pois estas, de si, são neutras, nem boas, nem más. Depende do uso que delas se faça. O mesmo se deve dizer da pobreza, não é ela boa, nem má. Para qualificá-la é necessário saber com que disposição interior foi aceita.
Assim, para maior clareza de análise, invertamos os papéis das duas figuras principais da Parábola. Imaginemos o rico cheio de compaixão por Lázaro, a ponto de contratar um médico para curar-lhe as chagas, comprar-lhe os remédios, conseguir-lhe um bom abrigo e proporcionar-lhe deliciosos alimentos. Ademais, procurando cercá-lo de afectuosas atenções, chegando a rezar várias vezes ao dia por sua saúde, como também por sua eterna salvação.
Por outro lado, suponhamos um Lázaro que teria a alma mais ulcerada do que seu corpo, pois se consumiria de inveja dos bens do rico e, revoltado contra tudo, contra todos e contra o próprio Deus, cobriria de injúrias o seu benfeitor, desejando-lhe a desgraça e até a morte. A cada ato de comiseração e estima da parte do rico, corresponderia uma reação mal-educada e ressentida de Lázaro. Este só se acalmaria quando obtivesse toda a fortuna daquele, e, para isto, estaria disposto a instigar seu ódio em muitos outros.
Se, nesse estado de alma, morressem ambos, qual seria o destino eterno de cada um?
Não há a menor dúvida: Lázaro iria para os “tormentos do inferno” e o rico seria “levado pelos Anjos ao seio de Abraão”.
Confirmando esta suposição, ouçamos o comentário feito por São João Crisóstomo: “Os Anjos serviram e levaram o pobre e o colocaram no seio de Abraão, porque ele, apesar de ter vivido desprezado, não havia se desesperado, nem blasfemou dizendo: ‘Este rico goza vivendo na opulência e não padece tribulação, e eu não posso alcançar o alimento necessário’”6.
Quanto precisamos ter sempre presente diante dos nossos olhos esta Parábola, a fim de bem sabermos nos servir, sem apego, das riquezas e aceitarmos com paciente resignação as dores, provações e contingências da vida!
Essa é a fundamental lição para todos os tempos: o bom relacionamento entre ricos e pobres, e de ambos com Deus, no uso dos bens ou na aceitação das situações constrangedoras pelas quais passem.
Como andará o mundo de hoje nessa matéria? Haverá ainda Lázaros de alma? Existirão ainda os ricos de espírito? E qual será o destino eterno de uns e de outros?
“PREGAI TODA A VERDADE SOBRE O INFERNO”
O texto evangélico narra-nos a seguir um tal tormento do rico entre as chamas eternas, que uma simples gota de água seria suficiente para lhe refrescar a língua. Um abismo separa os dois mundos, o Céu do inferno. Será real essa tragédia?
A Revelação é abundante nessa matéria: “Qual de nós poderá habitar no fogo devorador, nas chamas eternas?” (Is 33, 14). O Evangelho nos fala quatorze vezes sobre o inferno com expressões categóricas como estas: “fogo inextinguível” (Mc 9, 43), “... o seu verme não morre e o fogo não se apaga...” (idem, 48); “...e lança-los-ão na fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes” (Mt 13, 42). E o Apocalipse: “Serão lançados vivos no abismo abrasado de fogo e enxofre para ser atormentados noite e dia por todos os séculos dos séculos” (20, 10).
Por isso, o condenado da parábola roga a Abraão mandar Lázaro à sua casa paterna para convencer os cinco irmãos sobre o “lugar de tormentos”, no qual ele se encontra para todo o sempre. Segundo seu critério, o ideal seria que “alguém do mundo dos mortos fosse ter com eles” para adverti-los sobre os horrores do castigo eterno, pois só assim se converteriam.
Abraão é muito incisivo em sua resposta, declarando que também os outros cinco irmãos acabariam por ser lançados no inferno, se não acreditassem em Moisés e nos profetas.
Segundo pode-se deduzir desses versículos, até o precito da Parábola julga indispensável explicar a existência do inferno. E, de fato, esse é o empenho dos Santos e do próprio Magistério infalível da Igreja, como declarou em certa ocasião o Bem-Aventurado Papa Pio IX: “Pregai muito as grandes verdades da salvação, pregai sobretudo o inferno; nada de meias palavras, dizei, clara e altamente, toda a verdade sobre o inferno. Nada é mais capaz de fazer refletir e de conduzir a Deus os pobres pecadores”.
Bem clara é também a linguagem de nosso catecismo atual: “O ensinamento da Igreja afirma a existência e a eternidade do inferno. As almas dos que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente após a morte aos infernos, onde sofrem as penas do inferno, ‘o fogo eterno’. A pena principal do inferno consiste na separação eterna de Deus, o Único em quem o homem pode ter a vida e a felicidade para as quais foi criado e às quais aspira”.
Sobre a eficácia da crença nos fogos eternos, um dos grandes escritores do séc. XIX, o Pe. Frederick W.Faber, afirmava: “A mais fatal preparação do demónio para a vinda do anticristo é o esmorecimento da crença dos homens no castigo eterno. Se fossem estas as derradeiras palavras por mim a vós dirigidas, lembrai-vos de que nada eu quereria imprimir tão profundamente em vossas almas, nenhum pensamento de fé — após o do Preciosíssimo Sangue — vos seria mais útil e proveitoso do que sobre o castigo eterno.”
Lembremo-nos sempre de como nossa morte pode ser súbita e quão necessário é vivermos nas disposições de alma de Lázaro, na maior resignação face aos infortúnios, desapegados dos bens deste mundo, fortes na oração, na prática da Religião e da virtude, ardorosos devotos da Mãe de Deus, para assim gozarmos da felicidade eterna.

Nenhum comentário: