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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A conversa noturna com Nicodemos VI

Continuação do post anterior
Porque Deus não enviou seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele.
Algumas traduções usam o verbo “julgar” e não “condenar”. Realmente, no latim encontramos ut iudicet mundum. Ora, para os judeus — conforme nos explica Maldonado — os dois verbos têm o mesmo significado de “castigar”. Dada a manifestação do grande poder de Jesus através de seus numerosos milagres (10), Nicodemos se aproxima d’Ele tomado de forte temor reverencial. De fato, Jesus devia produzir em seus circunstantes um misto de atração e de temor. Por ser a Grandeza, Ele arrebata e ao mesmo tempo impõe respeito. Para um espírito culto e inteligente como Nicodemos, a compreensão da magna figura do Mestre — sobretudo depois das revelações que Ele fez, sintetizadas nos versículos anteriores — fê-lo imaginar o castigo de que um tal Profeta seria portador. Daí essas afirmações de Nosso Senhor contidas nos versículos 16 a 21, tornando claro quanto Ele traz a salvação, sob a condição da fé e das boas obras.
O versículo em questão levanta uma dificuldade, se comparado com outras passagens, como por exemplo:
• “Jesus disse: Eu vim a este mundo para exercer um justo juízo” (Jo 9, 39).
• “Então verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens, com grande poder e glória” (Mc 13, 26). • “Quando, pois, vier o Filho do Homem na sua majestade” (Mt 25, 31).
Como entender, então, que Jesus afirme não ter sido enviado para condenar o mundo? Quem nos responde é São João Crisóstomo:
“Mas é preciso levar em conta que há duas vindas de Jesus: a que já se realizou, e a que deverá realizar-se. A primeira não foi para julgar o que nós tínhamos feito, mas para perdoar; entretanto, a segunda será, não para perdoar, mas para julgar. A propósito da primeira, diz: ‘Não vim para julgar o mundo’, porque é compassivo, não julga, mas perdoa os pecados por meio do Batismo, e depois pela penitência; porque, se não tivesse agido assim, todos estariam perdidos, pois todos pecaram e necessitam da graça de Deus” (11).

Quem n’Ele acredita, não é condenado, mas quem não acredita, já está condenado porque não acredita no nome do Filho Unigênito de Deus.
É bem claro o ensinamento de São João Crisóstomo sobre este versículo:
“[Jesus] disse isso também porque não acreditar n’Ele é o suplício do impenitente. Estar fora da luz é, em si mesmo, o maior castigo, além de ser anúncio do que ainda virá. Porque assim como quem mata um homem, ainda mesmo quando não tenha sido condenado por sentença do juiz, já está condenado pela própria natureza do crime, assim também ocorre com o incrédulo. Do mesmo modo, Adão morreu no dia em que comeu o fruto proibido” (12).
19A condenação é por isto: a luz veio ao mundo e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más.
Deixemos a palavra com Santo Agostinho:
“Importa que odieis em vós a vossa obra, e ameis em vós a obra de Deus. Quando começar a aborrecer-vos o que fizestes, começam imediatamente as vossas boas obras, porque acusais as vossas más obras. “A confissão das obras más é o início das obras boas. Praticais então a verdade e vindes para a luz. (...) Quando o que foi advertido ama os seus pecados, tem ódio àquele que o adverte, tem ódio à luz, e foge da luz para que lhe não sejam imputadas as más obras a que tem amor. Aquele que pratica a verdade acusa em si as suas más obras, não se poupa, não perdoa a si mesmo, para que Deus lhe perdoe.
“Quer que Deus lhe perdoe, e por isso reconhece-se pecador, e vem para a luz. Dá graças a Deus por lhe ter mostrado aquilo que deve odiar. Diz a Deus: ‘Apartai o vosso rosto dos meus pecados’ (Sl 50, 11). Mas só diz estas palavras depois de ter dito: ‘Eu conheço a minha maldade, e o meu pecado está sempre diante de mim’ (Ibid. 5). “
Conservai na vossa memória os pecados que não quereis que Deus recorde. Se ocultardes o vosso pecado, o Senhor fará que ele apareça diante dos vossos olhos quando já não for possível produzir fruto de penitência” (13).
Continua próximo post.

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