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sábado, 3 de dezembro de 2011

Evangelho: discípulos de Emaús final

Continuação dos comentários do Evangelho: discípulos de Emaús.
Então Jesus disse-lhes: “Ó estultos e lentos do coração para crer tudo o que anunciaram os profetas! 26 Porventura não era necessário que o Cristo sofresse tais coisas, para entrar na sua glória?”
Sim, era-lhes necessário crer na Escritura, como São Pedro diria mais tarde: “Atendei antes de tudo a isto: que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação particular. Com efeito, a profecia nunca foi proferida por vontade humana, mas, movidos pelo Espírito Santo, certos homens falaram da parte de Deus” (II Ped 1, 20-21). Por isso, mais vale crer no testemunho dos profetas do que em nossos sentidos. Aqueles não falham, estes porém, não raras vezes nos enganam. Para crer, não lhes era indispensável ter acompanhado ao túmulo as santas mulheres, nem Pedro e João, bastava-lhes recordarem as assertivas das Escrituras sobre a Ressurreição, tanto mais que as da Paixão já se haviam cumprido tais quais. E, sobretudo, não podia pairar a menor fímbria de dúvida na palavra do Salvador. “Verbum Domini manet in aeternum” (I Pd 1, 24), a palavra de Deus permanece eternamente.
Em seguida, começando por Moisés e discorrendo por todos os profetas, explicava-lhes o que d’Ele se encontrava dito em todas as Escrituras.
Pode-se, às vezes, conhecer as Escrituras todas de cor, mas, nem por isso, saber conjugar seus trechos a fim de melhor entender sua aplicação aos casos concretos. Quanto às citações, nada era novo aos dois discípulos. Quanto à interpretação das mesmas, porém, as explicações de Jesus constituíram certamente uma atraentíssima e magistral aula de exegese. Quem não desejaria assistir a ela? Que grande privilégio o daqueles dois! Certamente, o Divino Mestre deve ter-lhes mostrado, através de luminosas palavras e de especiais graças, o quanto era errôneo o conceito unânime no povo eleito a respeito de um Messias triunfante, restaurador de seu poder político-social e instaurador de uma influente e prestigiosa supremacia sobre as outras nações. A Escritura Lhe serviu de argumento irrefutável para os objetivos da formação que desejava dar-lhes.
Aproximaram-se da aldeia para onde caminhavam. Jesus fez menção de ir para mais longe. 29 Mas os outros insistiram com Ele, dizendo: “Fica conosco, porque faz-se tarde e o dia já declina”. Entrou para ficar com eles.
A delicadeza e a didática em substância se unem nesse gesto do Salvador ao “fazer menção” de ir adiante. Assim, incentiva-os não só a convidá-Lo a permanecer com eles, como também a conferir à sua companhia o devido valor. Eles O convidam e até insistem, apresentando como argumento a hora tardia. Exemplo para nós: quando rezamos, trata-se de usar de pertinácia, pois, dessa forma, “Jesus entrará para ficar conosco”. Caso contrário, Ele seguirá adiante.
Estando com eles à mesa, tomou o pão, abençoou-o, partiu e lho deu. 31 Abriram-se os seus olhos e reconheceram-No; mas Ele desapareceu da vista deles.
Terá Jesus, nessa hora, operado a transubstanciação? Eis uma questão muito debatida nos séculos XVI e XVII entre duas correntes teológicas. Uma conclusão clara a esse respeito ainda está por fazer-se, entretanto, por mais que não se tivesse dado a consagração eucarística, estava ela ali figurada. E é indiscutível ser esse Sacramento fundamental para nos fortalecer na fé e fazê-la crescer, sobretudo no tocante ao mysterium fidei que enfeixa a Paixão e a Ressurreição do Redentor. A Eucaristia nos dá a vida sobrenatural que tem seu fundamento na fé. Crer na ressurreição de Cristo é absolutamente necessário para nossa salvação e, sem essa crença, é impossível nosso próprio progresso na vida espiritual. Quanto mais se torne efetiva e robusta nossa fé em Cristo ressurrecto, maior será nosso afervoramento e união com o Redentor, como também mais superabundantes serão os frutos dessa belíssima festa instituída pela Santa Igreja.
Disseram então um para o outro: “Não é verdade que nós sentíamos abrasar-se-nos o coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” 33 Levantando-se no mesmo instante, voltaram para Jerusalém. Encontraram juntos os onze e os que estavam com eles, 34 que diziam: “Na verdade o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão”. 35 E eles contaram também o que lhes tinha acontecido no caminho, e como O tinham reconhecido ao partir o pão.
Os versículos finais nos retratam com muita viveza e piedade os efeitos dessa primeira aparição de Jesus a dois fiéis da Igreja nascente, sendo especialmente digno de nota o testemunho da ação da graça mística nas almas de ambos, enquanto Jesus lhes discorria sobre as Escrituras (v. 32).
É tal o apreço de Deus por sua própria Palavra que Ele sempre faz acompanhar de generosos auxílios o estudo, interesse e piedade aplicados ao conhecimento amoroso dos textos sagrados.

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