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sábado, 12 de outubro de 2013

Evangelho XIX Domingo Tempo Comum - Ano C - 2013

 Evangelho 29º Domingo do Tempo Comum – Ano C – 2013 (Lc, 18, 1-8)

1Disse-lhes também uma parábola, para mostrar que importa orar sempre e não cessar de o fazer: 2 “Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. 3 Havia também na mesma cidade uma viúva, que ia ter com ele, dizendo: Faze-me justiça contra o meu adversário. 4 Ele, durante muito tempo não a quis atender. Mas, depois disse consigo: Ainda que eu não tema a Deus nem respeite os homens, 5 todavia, visto que esta viúva me importuna, farlhe-ei justiça, para que não venha continuamente importunar-me.”
6 Então o Senhor acrescentou: “Ouvi o que diz este juiz iníquo. 7 E Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que a Ele clamam dia e noite, e tardará em socorrê-los? 8 Digo-vos que depressa lhes fará justiça. Mas, quando vier o Filho do Homem, porventura encontrará fé sobre a terra?” (Lc 18, 1-8)
 
Comentário ao Evangelho 29º Domingo do Tempo Comum – Ano C – 2013 (Lc, 18, 1-8)
Mons João Clá Dias

 Com divina didática, Jesus contrapõe à iniquidade de um juiz a obstinada insistência da fragilidade feminina, para nos mostrar a necessidade de sermos incessantes na oração.
A alma humana tem sede do infinito. Por Deus, assim fomos criados e essa é a razão de vivermos em contínua busca da felicidade total, sem dores nem obstáculos, num relacionamento social perfeito e harmonioso. A apetência do ilimitado marca profundamente todas as nossas ações. Esta é, aliás, a principal causa do sentimentalismo romântico e de tantos outros desequilíbrios do convívio humano, no qual buscamos satisfazer entre puras criaturas esse anseio de infinito só saciável por Deus.
O querer obter, a qualquer preço ou esforço, algum bem necessário, ou livrar-se de um incômodo insuportável, não poucas vezes vem penetrado por essa aspiração de plenitude. A viúva implora sem cessar, o juiz usa de subterfúgios e evasivas para dela escapar. Por fim vence a insistência da fragilidade sobre um duro coração amante do bem-estar.
Analisemos a parábola em seus detalhes para, ao final, aproveitarmos as conclusões daí provenientes.

O juiz iníquo

Havia em certa cidade um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens.
De que juiz se trata e qual a cidade em que ele vivia? Não se sabe. A descrição começa como se fosse um conto para crianças: “Havia em certa cidade...” O episódio é propositadamente anônimo. O Divino Mestre deseja com esse procedimento, fixar a atenção de seus ouvintes nos aspectos morais e psicológicos da parábola e por isso apresenta-a desprovida de seus eventuais dados históricos.
O juiz era sem dúvida um judeu de raça e religião, caso contrário, Jesus o caracterizaria como sendo um homem que não acreditava no Deus Verdadeiro.
Na realidade, em seu modo de agir ele representa uma clara personificação do ateísmo prático já comum naqueles tempos, se bem que não tão difuso como nos dias atuais. Provavelmente ele praticava a religião com exclusão do Primeiro Mandamento da Lei de Deus. Era, portanto, um mau judeu.
Ora, devendo ser Deus o centro de nossos pensamentos, desejos e ações, ao ignorá-Lo, ou d’Ele se afastar, as próprias relações humanas se tornam defectivas e viciadas, ou seja, deterioram- se todos os princípios do saudável respeito.
Nesse juiz, vê-se retratado um dos grandes males de nossos tempos: o desaparecimento da douceur de vivre, da benquerença e da admiração no trato social, seja entre iguais, ou entre inferiores e superiores. Ao se considerar o único ponto de referência para atender a seus semelhantes, pouco lhe importam estas ou aquelas qualidades dos mesmos. Ele se move de acordo com a volubilidade do sopro de seus caprichos e não se inclina a dar ouvidos aos respectivos pleiteantes, pois lhe falta o necessário estímulo para conduzir a bom termo suas causas. O egoísmo é sua lei.

A viúva importuna

3 Havia também na mesma cidade uma viúva, que ia ter com ele, dizendo: "Faze-me justiça contra o meu adversário".
Nessa mesma cidade havia uma viúva. Como em todas as épocas, a esposa que se vê desprotegida pela morte de seu marido, torna-se uma figura digna de pena. Recairá sobre ela, a parte mais frágil, o ônus da educação dos filhos, sobretudo dos pequenos, e da administração dos bens e da casa. Se ela não tiver o amparo de amigos verdadeiros, seu isolamento bem poderá se tornar dramático, e os interesses egoístas desses ou daqueles se concentrarão sobre a herança dos menores. Restar-lhe-á o intransigente vigor de seu instinto materno, acompanhado de suas amargas lágrimas. Por nada deste mundo ela abandonará as crianças alimentadas e crescidas em seus braços. Será um modelo insuperável de obstinação nesse particular. Esse é, bem provavelmente, o caso da presente parábola.
A viúva deve ter saturado o juiz com suas inúmeras visitas, implorando-lhe, a cada vez, justiça contra seu adversário.
Este último, quiçá, fosse um israelita constituído na fraude e na maldade que — tirando proveito da existência de um árbitro nada temente da cólera divina — havia dado largas à sua ganância e, assim, procurava extorquir os bens, no todo ou em parte, da desamparada e aflita senhora.
A apropriação indébita sempre existiu ao longo dos tempos. Sobretudo nos casos onde predomina o absolutismo do mais forte, ao excitarem-se as paixões, se estabelece a lei da selva.
E o que poderia fazer uma pobre mulher, nessa crítica situação, senão recorrer aos tribunais? Por outro lado, o mau israelita terá grande interesse em manter o status quo e, não havendo outra solução, se empenhará, na medida do possível, em retardar ao máximo qualquer pronunciamento legal.
Ora, as delongas só poderiam agravar o drama da triste senhora. Daí a grande insistência: “Faze-me justiça contra o meu adversário”.

A atitude do juiz

4a Ele, durante muito tempo não a quis atender.
Não nos são desconhecidas as demoras processuais em nosso Ocidente latino. Mas, nos povos orientais, naqueles tempos, as intérminas esperas faziam guerra às mais robustas paciências. Pelas próprias Escrituras Sagradas temos ciência da existência do suborno na época e, portanto, pode-se levantar a questão: terá o juiz recebido propostas, ou presentes, da parte contrária? Por outra, esperava ele alguma oferta da viúva para solucionar sua causa? O certo é que, por certa razão, talvez até por puro desleixo, capricho ou preguiça, o julgador se recusava a ouvir os rogos da autora do processo em curso.
Ainda uma outra hipótese se poderia levantar para buscar uma explicação de tal atitude. É do conhecimento geral que a demora muitas vezes resolve inextricáveis problemas. Não teria sido, o magistrado em questão, partidário de tomar o tempo como seu conselheiro? Nada leva a crer que assim fosse, pois ele “não temia a Deus, nem respeitava os homens”, e, portanto, a virtude não era a lei de seu habitual procedimento.



Continua no próximo post

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