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sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Evangelho 21º Domingo do Tempo Comum - Ano B - Jo 6, 60-69

Continuação dos posts anteriores-  Fim

65 Depois acrescentou: “Por isso Eu vos disse que ninguém pode vir a Mim se não lhe for concedido por meu Pai”. 66 Desde então, muitos dos seus discípulos retiraram-se e já não andavam com Ele.
Quem, com precisão e síntese, comenta estes dois versículos é Frei Manuel de Tuya, OP: “Mas esses ensinamentos de Cristo não encontraram em ‘muitos’ de seus discípulos a atitude de fé e submissão requeridas. E as palavras que eles qualificaram de ‘duras’ lhes endureceram a vida. E não ‘creram’ n’Ele. Abandonaram Cristo ‘desde então’ — seja no sentido causal (Jo 19, 12), seja no temporal (Jo 19, 27), embora ambos os sentidos aqui se unam, porque, sendo ‘então’ ou ‘desde então’, foi precisamente ‘por causa disto’. Num instante romperam com Ele, retrocederam, e já ‘não O seguiam’” (19).
Jesus põe à prova os Apóstolos
67 Por isso Jesus disse aos doze: “Também vós quereis retirar-vos?”
Há um determinado momento da caminhada para o Reino em que se torna necessário, de nossa parte, uma adesão consciente e explícita.
Jesus, com uma delicadeza divina, coloca ante seus Apóstolos o problema. Compreendia Ele o quanto agrada ao homem o apoio de suas amizades, mas discernia, de outro lado, a firme decisão previamente tomada por eles de O seguirem, o que Lhe permitia fazer essa pergunta para lhes tornar explícita a adesão à sua Pessoa.
A resposta de Pedro
68 Simão Pedro respondeu-Lhe: “Senhor, para quem havemos nós de ir? Tu tens palavras de vida eterna”.
Uma vez mais, São Pedro toma a palavra para, interpretando o desejo de todos, responder ao Divino Mestre. Tertuliano afirmará mais tarde: “Anima humana naturaliter christiana”. De fato, consciente ou inconscientemente, quando procuramos obter bens que nos trarão felicidade, é a Cristo que nós buscamos. Ninguém, como Ele, tem palavras de vida eterna. A esse propósito comenta Santo Agostinho que, de forma implícita, Pedro pede a Jesus para lhes conceder outro Ele mesmo, no caso de mandá-los embora.
Belo exemplo para nós, segundo São João Crisóstomo, ao vermos nossos irmãos abandonarem a Fé. Ainda que restemos poucos ou fiquemos até mesmo sozinhos, devemos permanecer na plena fidelidade, pois quem ou o que nos dará felicidade fora de Cristo?
69 E nós acreditamos e sabemos que Tu és o Santo de Deus.
Santo Agostinho ressalta que Pedro, primeiramente, manifesta sua crença (“acredita”), para, em seguida, dizer que, por causa dela, entende (“sabe”). Segundo o Bispo de Hipona, se fosse ao contrário, não conheceria e nem acreditaria (20).
Essa declaração de Pedro é uma síntese de nossa Fé: “Jesus Cristo é o Filho de Deus vivo” e, evidentemente, aceitando-se o que Ele ensina, chega-se à plenitude dessa virtude.
A virtude da obediência
Sendo Deus o Senhor de toda a Criação, os seres inteligentes — anjos e homens — têm a obrigação de reconhecer, amar e servir esse senhorio. Os inanimados assim procedem fisicamente, e os irracionais, de forma instintiva. Ele é Senhor de todas as nossas faculdades e, sobretudo, de nosso entendimento e vontade. Daí ter afirmado São João da Cruz que no entardecer desta vida seremos julgados segundo o amor, pois estamos obrigados a querer o que Deus deseja que queiramos (21).
Ora, na ordem do universo está incluída a vontade do homem a qual, livremente, deve estar em harmonia com a de Deus através da virtude da obediência (22). Esta última não é uma virtude superior às teologais: Fé, Esperança e Caridade. Entretanto, é um meio veloz para unirmo-nos a Deus e sermos agradabilíssimos a Ele. Através dela fazemos uma entrega em suas adoráveis mãos com mais valor do que se fizéssemos qualquer sacrifício (23): “Aquele que diz conhecê-Lo e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso (...) Mas quem guarda sua palavra, neste o amor de Deus é verdadeiramente perfeito. Nem sofrer o martírio, nem distribuir aos pobres todos os bens, têm mérito algum, se não se ordenam ao cumprimento da vontade divina” (24).
Aí está bem focalizado o convite à prática da obediência que nos é feito na Liturgia deste 21º Domingo do Tempo Comum: na primeira Leitura, com as palavras de Josué: “Quanto a mim e à minha família, nós serviremos ao Senhor” (Js 24, 15), obtendo do povo a resposta: “Nós também serviremos ao Senhor, porque Ele é nosso Deus” (24,18); também na epístola de Paulo: “Submetei-vos uns aos outros, no temor de Cristo (...) Cristo também é a cabeça da Igreja, seu Corpo (...) como a Igreja se submete a Cristo (...) como Cristo também amou a Igreja e Se entregou por ela” (Ef 5, 21-25); e, sobretudo, no Evangelho, a propósito da fé, causando-nos perplexidade aquela apostasia de “muitos discípulos”, que se recusaram a crer e, em conseqüência, a obedecer.
Excelente ocasião de um exame de consciência para quem vive em nossa época, que deve se perguntar: qual o grau de fé e de submissão a Deus, à Igreja e ao Evangelho, do homem dos tempos presentes? ²

1) Suma Teológica III, q. 75, a. 1.
2) Idem, a. 4.
3 ) Id. ibid.
4 ) Cfr. Suma Teológica III, q. 76, a. 4.
5 ) Id., a. 1.
6 ) Apud São Tomás de Aquino, Catena Áurea.
7 ) Evangelho de São João comentado por Santo Agostinho, Gráfica de Coimbra, Coimbra, 1954, pp. 266267.
8) Suma Teológica III, q. 73 a.3 ad 2.
9 ) CIC, n. 2.837.
10 ) Serm. 58, en la oct. del Corp., in Obras del Beato Avila, BAC, Madrid, t. 2, p. 921.
11) Id. p. 922.
12) “O cristão é um outro Cristo”.
13 ) Cfr. Suma Teológica, III, q. 79, art. 1 a 6.
14 ) “Operando por si mesmo”.
15 ) Suma Teológica, II-II, q. 123.
16 ) S. João Crisóstomo, apud S. Tomás de Aquino, Catena Aurea.
17 ) Cfr. Evangelho de São João comentado por Santo Agostinho, Coimbra, Gráfica de Coimbra, 1954, vol. II, p. 269.
18) Op. cit. p. 449.
19) Bíblia Comentada, BAC, Madrid, 1964, v. II, pp. 1.116-1.117.
20 ) Cfr. op. cit. p. 272.
21 ) Cfr. Suma Teológica II-II, q. 104 a.4 ad 3.
22 ) Id. a. 1 e 4.
23 ) Id. a. 3 ad 1.
24 ) Id.. a. 3.

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