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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

EVANGELHO VII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - 2014 - Mt 5, 38-48

CONCLUSÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO VII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO A - 2014 - Mt 5, 38-48

A munificência infinita de Deus
45  Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos Céus, porque Ele faz nascer o Sol sobre os maus e os bons e faz cair a chuva sobre os justos e injustos”.
Assim como o Pai que está nos Céus “faz cair a chuva sobre os justos e injustos”, também derrama as suas graças sobre todos, inclusive sobre os miseráveis e os malfeitores. Deus criou os Anjos e os homens com o intuito de terem parte em sua felicidade absoluta. Tão grande é seu amor por nós e seu desejo de salvar-nos, que enviou seu Filho Unigênito e eterno a fim de Se encarnar e suportar os tormentos da Paixão para redimir o gênero humano e lhe abrir as portas do Céu.
Sendo esta a vontade do Pai, cabe-nos trabalhar com ardor, não apenas pela salvação de todos os que lutam neste vale de lágrimas, mas ainda acelerar, com nossas preces e sacrifícios, a libertação das almas que padecem no Purgatório.
O amor e o sinal distintivo dos cristãos
46 “Porque se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os cobradores de impostos não fazem a mesma coisa? E se saudais somente os vossos irmãos, o que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa?”
Para podermos calcular a indignação dos fariseus por serem comparados aos pagãos e cobradores de impostos, considerados tão desprezíveis, basta recordar a oração de um deles no Templo: “Graças Te dou, ó Deus, que não sou como os demais homens: ladrões, injustos e adúlteros; nem como o publicano que está ali” (Lc 18, 11).
A insuperável didática do Divino Mestre nos leva a compreender facilmente através destas duas confrontações que amar os amigos e benfeitores nada tem de extraordinário, O mérito está em querer o bem até dos que nos atacam, roubam ou injuriam.
A esse respeito, esclarece Santo Agostinho: “Só a caridade distingue os filhos de Deus dos do demônio. Persignem-se todos com o sinal da Cruz de Cristo; respondam todos: Amém; cantem todos: Aleluia; batizem-se todos; frequentem a igreja, apinhem-se nas basílicas; não se distinguirão os filhos de Deus dos do demônio a não ser pela caridade. [...] Tens tudo o que quiseres; se te falta só a caridade, de nada te aproveita tudo o que tiveres” 2
Desta forma, ao notarmos a antipatia de alguém por nós, deveríamos pensar: “E por este que vou rezar, para que Nossa Senhora lhe obtenha a graça da salvação eterna. Na aparência, ele é meu inimigo; na realidade, faz um bem enorme à minha alma, pois me ajuda a perceber que, de fato, por causa dos meus defeitos, eu teria de me olhar e de me tratar como ele me olha e me trata. Assim, eu me conheço melhor”.
O heroísmo do perdão
Jesus nos convida a segui-Lo pelas vias heroicas da caridade, da paciência e do perdão máximo, rápido e total. Por este motivo não podemos guardar ressentimento contra ninguém, mas devemos esquecer a priori qualquer ofensa pessoal. Nós, cristãos, precisamos ser um verdadeiro mar de perdão, como ensina o Apóstolo: “Toda amargura, ira, indignação, gritaria e calúnia sejam desterradas do meio de vós, bem como toda malícia. Antes, sede uns com os outros bondosos e compassivos. Perdoai-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou, em Cristo” (Ef 4, 3 1-32).
Essa disposição interior que torna agradável o convívio entre os cristãos, chamava a atenção dos pagãos, nos primórdios da Igreja: “Vede como eles se amam e como estão dispostos a morrer um pelo outro”.3 Ora, passados dois mil anos de Cristandade, seria de se esperar que os ensinamentos do Divino Mestre houvessem penetrado nas instituições, nos costumes e no relacionamento humano, a ponto de ser a sociedade de hoje mais marcada pela caridade e benquerença do que foi outrora, como um vinho cujo sabor se requinta com o correr do tempo.
A meta mais ousada da História
48 “Portanto, sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito!”
Jesus formula, com uma clareza insofismável, a meta e o objetivo de nossa vida: imitar o Pai celeste, modelo absoluto de santidade, adequando a Ele nossa mentalidade, inclinações e desejos. Mas como seremos perfeitos como Deus é perfeito? Por que meio chegaremos até essa suprema perfeição, impossível para nossa débil natureza? Nosso Senhor teria, então, dado um conselho impraticável? Ou seria um exagero didático? Ele poderia ter dito: “Sede perfeitos como Moisés foi perfeito, como Abraão, como Isaac, como Jacó”... Porque reportar a tão elevado modelo? Ocorre que o Filho, a Segunda Pessoa da Trindade, o Verbo incriado, igual ao Pai, assumiu nossa natureza, e, sendo Homem, como Arquétipo da humanidade, reproduziu em Si a perfeição do Pai, instando-nos a fazer o mesmo.
Com o Batismo nos é infundida a graça santificante — participação na vida divina —, acompanhada das virtudes e dos dons, permitindo-nos realizar ao modo divino aquilo que, pelas meras forças humanas, seria totalmente inatingível. Portanto, não nos contentemos em cumprir só os Mandamentos. Muito mais que isso, devemos querer assemelhar-nos a Nosso Senhor, procurando ser perfeitos como Ele, para atender ao altíssimo convite feito no Sermão da Montanha. Este é o sentido da jaculatória que encontramos na Ladainha do Sagrado Coração: “Jesus, manso e humilde de Coração, fazei nosso coração semelhante ao vosso!”.4
CHAMADOS AO VERDADEIRO HEROÍSMO
A vida sobrenatural em nós é passível de crescimento, na medida em que rezemos, nos esforcemos na prática da virtude evitando as ocasiões de pecado e frequentemos os Sacramentos. Mais que em outras épocas históricas, vivemos cercados de perigos que ameaçam nossa perseverança. Para resistir a todas essas solicitações do demônio, do mundo e da carne, é indispensável alimentar um grande desejo de alcançar o heroísmo da perfeição.
No Céu nos está reservado um lugar que poderemos ocupar com mais ou menos brilho, dependendo da fidelidade com que busquemos ser “perfeitos como o nosso Pai celeste é perfeito”. A conhecida máxima de Paul Claudel, “a juventude não foi feita para o prazer, mas sim para o heroísmo”,5 na realidade está incompleta, pois o heroísmo em matéria de virtude não é uma obrigação exclusiva dos jovens, mas de todos os homens, sem exceção.
Edificantes exemplos
Estas disposições, nós as encontramos em abundância na vida dos Santos. Certa vez, São Francisco de Sales, já sendo Bispo de Genebra, se deparou com um nobre que o cumulou das maiores ofensas, às quais ele nada respondeu, guardando um silêncio cheio de doçura e serenidade. Após a saída do visitante, um sacerdote que presenciara a cena perguntou a São Francisco por que não reprimira o insolente com firmeza. “Meu padre” — respondeu o Santo — “fiz um pacto com a minha língua, pelo qual ela se calará enquanto meu coração estiver tomado e não replicará jamais a nenhuma palavra capaz de me provocar cólera” .6 Como era a sua pessoa que estava em jogo, ele jugulou o amor-próprio e conservou-se impassível. Dias depois, o culpado, comovido com a caridade do Bispo, veio em lágrimas pedir-lhe perdão. 7 E assim que devemos ser!
Disso deu exemplo também o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira — aliás, grande admirador de São Francisco de Sales —, com quem o Autor deste artigo conviveu durante quase quarenta anos. Ele se mantinha permanentemente no espírito do Evangelho, mesmo diante de sofrimentos causados por pessoas próximas. Devido à restrição de alguns de seus movimentos, em consequência de um acidente automobilístico, precisava ele de auxílio para alguns atos da vida cotidiana. Seu inteiro desapego levava-o a nem sequer escolher as roupas a serem usadas, deixando a outros tal tarefa. Por vezes a escolha inadequada o levava a usar um terno leve em um dia frio ou um terno de inverno em tempo de calor, o que ele aceitava, enfrentando os incômodos sem jamais deles se queixar.
Não era raro, quando alguém lhe pedia um encontro, que ele não determinasse o lugar da reunião, mas mandasse indagar à pessoa onde gostaria de ser atendida. Em certa ocasião, Dr. Plinio recebeu em sua residência, às seis horas da tarde, alguns visitantes chegados do exterior, e estes ficaram tão entretidos e encantados na conversa com o anfitrião que às onze horas da noite ainda não se haviam retirado. Em nenhum momento Dr. Plinio lhes dava a entender o avançado da hora, pois, se não estava comprometida a Causa Católica, ele, com grande mansidão e cordura, procurava se adaptar aos outros, fazendo-lhes a vontade.
Ao admirar tais fatos, não podemos nos esquecer de que o verdadeiro heroísmo da virtude é inseparável da entrega completa nas mãos de Deus, tendo consciência de que qualquer ato bom vem da graça, e não da natureza humana. Nós também somos chamados a seguir este caminho: ser perfeitos como o deseja o Pai celeste, cujo auxilio para tal não nos há de faltar!
1 Cf CLÁ DIAS, EP, João Scognamiglio. In: Revista Arautos. Fev 2011. n.110. p.10-17.
2) SANTO AGOSTINHO. In Epistolam bannis ad Parthos tractatus decem. Tractatus g n.7. In: Obras. Madrid: BAC, 1959, v.XVIII, p.269.
3) TERTULIANO. Apologeticum, XXXIX: ML 1,471.
4) CONGREGATIO DE CULTU DIVINO ET DISCIPLINA SACRAMENTORUM. Compendium Eucharisticum. Città dei Vaticano: LEV 2009, p.411.
5) CLAUDEL, Paul; RIVIERE, Jacques. Correspondance. 1907-1 91 4. Paris: Pion, Nourrit et Cie, 1926, p.13.
 6)HAMON, André-Jean-Marie. Vie de Saint Fran çois de Sales, Evêque et prince deGenève. Paris: Jacques Lecoffre et Cie, 1858, t.II, p.161.
7) Cf. Idem, p.295-296.



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