-->

sábado, 20 de setembro de 2014

Evangelho XXVI Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 21, 28-32

Comentário ao Evangelho – 26º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Mt 21, 28-32
“Mas que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Aproximando-se do primeiro, disse-lhe: Filho, vai trabalhar hoje na minha vinha. 29 Ele respondeu: Não quero — mas, depois, arrependeu-se e foi. 30 Dirigindo-se em seguida ao outro, falou-lhe do mesmo modo. E ele respondeu: Eu vou, senhor — mas não foi. 31 Qual dos dois fez a vontade do pai?” Eles responderam: “O primeiro”. Disse-lhes Jesus: “Na verdade vos digo que os publicanos e as meretrizes vos precederão no Reino de Deus. 32 Porque veio a vós João pelo caminho da justiça, e não crestes nele; e os publicanos e as meretrizes creram nele. E vós, vendo isto, nem assim fizestes penitência depois, crendo nele” (Mt 21, 28-32).

Os dois filhos da Parábola, e os dois outros
Atuando de forma muito pior que a dos dois filhos da parábola, os sacerdotes e os anciãos do povo não só se negaram a trabalhar na vinha do Senhor, como de fato, não o fizeram. Esta seria a atitude de um terceiro filho, extremo do mau comportamento em relação ao Pai! Mas há também um quarto filho: aquele que ouve com entusiasmo o convite do Pai e entrega sua vida por Ele!
I – Introdução: inocência e inerrância
Como aparece bela a vida reta, em todos os seus estágios, quando se é capaz de analisá-la com olhos límpidos, desinteressados e inocentes! Na ancianidade, ela se apresenta penetrada de fragilidade, mas robusta e enriquecida de experiência. Forte, decidida e ousada é ela na juventude, ao passo que, ao ingressar pelas portas da maturidade, vai florescendo em reflexão, explicitações e prudência. Porém, nada atrai tanto a atenção de nosso olhar, nesse curso da existência humana, quanto o desenvolvimento dos instintos primordiais numa criança, desde seus primeiros vagidos até chegar à idade da razão. Percebe-se como a alma infantil, ao efetuar pouco a pouco os atos da inteligência ou da vontade, vai-se tornando possuidora de um substancioso tesouro de experiências com base nos primeiros princípios inatos.
A alma humana está à procura da verdade
Encanta-nos ver a certeza com a qual os animais — e até os próprios insetos — buscam os alimentos que lhes convêm. Não é difícil discernir a mão de Deus por trás dessas atividades, mesmo sabendo que Ele, evidentemente, não as está orquestrando de forma direta a todo momento. Deus cria os seres viventes com instintos próprios de acordo com as necessidades e conveniências de cada um. Também o homem, ser racional, nasce com estímulos iniciais e espontâneos que vão lhe dar segurança na procura dos objetivos para os quais foi destinado. A esse propósito, explica-nos o Tomismo, com sua invariável clareza, que a alma, ao ser criada e infundida no momento da concepção, já está enriquecida pelo senso do ser.
Aproximemo-nos do berço de uma criança e lhe apresentemos algumas belas bolas de diferentes cores. Suas reações demonstrarão a maravilha desses instintos humanos, agindo muito antes do uso da razão. Ela escolherá uma bola da coloração que mais lhe agrada; depois de certo tempo passará a brincar com uma outra, e assim sucessivamente. Trata-se da busca instintiva do bem, do belo e do verdadeiro que acabará por levar à eleição de uma das bolas como a principal dentro daquele conjunto. Esses são reflexos que antecedem a constituição da capacidade de julgar de forma claramente racional, conforme princípios bem estabelecidos.
O pecado faz perder a capacidade de bem julgar
Excelente nessa matéria é a afirmação de um grande teólogo do século passado, Frei Santiago Ramírez OP, segundo o qual a alma humana é essencialmente aristocrática, pois sempre está à busca do melhor.
Se os homens têm esses instintos, como explicar a existência do erro, da maldade e da feiúra? Talvez em um futuro artigo se possa desenvolver mais a fundo essa tão essencial questão. Por hoje basta dizer que a inerrância desses instintos só se mantém pela conservação da inocência, ou seja, é o pecado a causa da perda da capacidade de bem julgar. É o próprio São Tomás de Aquino quem nos ensina ser o senso da verdade, do belo e da bondade um instinto aristocrático, porque só os inocentes o possuem de modo tão robusto. Ora — conclui o Doutor Angélico — poucos são os inocentes no mundo, portanto poucos são os que gozam dele de modo integral.
É em torno dessa maravilhosa problemática que gira o presente Evangelho.
II - Acirramento dos Sinedritas contra Jesus
Uma civilização atraída por enigmas e parábolas
Para melhor entendermos a Liturgia, devemos remontar aos hábitos do tempo do Divino Mestre. Encontraremos uma civilização mais campesina, pastoril e orgânica do que a nossa, sem os progressos da tecnologia atual. Ademais, a prática da reflexão não fora substituída pela máquina. Naquele tempo sem rádio, TV, telefone, computador e outros aparelhos do gênero, uma das mais fortes atrações do relacionamento humano era a conversa, e nesta o uso de enigmas e parábolas. Era corrente então valer-se de axiomas éticos para a resolução dessas ou daquelas questões concretas da vida de todos os dias. Lançar mão de metáforas para fins didáticos não era, portanto, uma inovação implantada pelo Messias. Ele não fez senão servir-se dos costumes vigentes.

As Sagradas Escrituras estão embebidas de casos nos quais as disputas se realizavam tomando como base enigmas (1). Assim se aprimorava a inteligência, como também o senso moral, racional e estético.
Inveja e arrogância dos sinedritas
A parábola dos dois filhos, que surge de dentro de um quadro de acirramento contra Jesus, deu-se logo após o Domingo de Ramos. Na lembrança dos escribas, anciãos do povo, príncipes dos sacerdotes e outros, estava toda a fama angariada pelo Divino Mestre ao longo de sua vida pública, incluindo o recentíssimo episódio da entrada triunfal em Jerusalém. Quando viram “Jesus Cristo entrar no Templo com grande pompa, agitaram-se por inveja; e assim, não podendo sofrer em seu coração o ardor da inveja que os acossava, levantaram a voz” (2) e com grande arrogância resolveram interromper a pregação, perguntando-Lhe: “Com que autoridade fazes estas coisas? E quem Te deu tal direito?” (Mt 21, 23).
A seguir se estabelece um diálogo entre Jesus e as autoridades religiosas. Recordá-lo nos será útil para penetrarmos a fundo em todo o significado da parábola da qual nos ocupamos aqui.
À procura de uma ocasião para desacreditá-Lo
Como comenta Frei Manuel de Tuya OP (3), grande exegeta de Salamanca, os sinedritas agiam com má intenção, uma vez que secretamente já haviam condenado Jesus à morte. Apenas andavam à procura de uma ocasião oportuna para executar essa sentença. Queriam comprometê-Lo e desacreditá-Lo ante o público, o que facilitaria seu intento. Era idéia aceita no ambiente rabínico que seria preciso pedir sinais ao Messias, a fim de que este fosse reconhecido como tal. Era verdade que ninguém podia ensinar no Templo sem antes haver recebido a imposição de mãos de outro rabino. Entretanto, ao indagarem a Jesus sobre quem Lhe havia dado autoridade para pregar, a intenção deles era pedir satisfação também pelos eventos do Domingo de Ramos, pelas aclamações messiânicas com as quais fora recebido no próprio Templo e até pelos milagres realizados ali. A pergunta era, portanto, sobre seus poderes messiânicos.
Continua no próximo post

Nenhum comentário: