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domingo, 19 de julho de 2015

COMENTÁRIO AO EVANGELHO XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B - Jo 6, 1-15

COMENTÁRIO AO EVANGELHO XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B
Mons. João Scognamiglio Clá Dias
Naquele tempo, 1Jesus foi para o outro lado do mar da Galileia, também chamado de Tiberíades. 2Uma grande multidão o seguia, porque via os sinais que ele operava a favor dos doentes. 3Jesus subiu ao monte e sentou-se aí, com os seus discípulos. 4Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus. 5Levantando os olhos e vendo que uma grande multidão estava vindo ao seu encontro, Jesus disse a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?” 6Disse isso para pô-lo à prova, pois ele mesmo sabia muito bem o que ia fazer. 7Filipe respondeu: “Nem duzentas moedas de prata bastariam para dar um pedaço de pão a cada um”. 8Um dos discípulos, André, o irmão de Simão Pedro, disse: 9“Está aqui um menino com cinco pães de cevada e dois peixes. Mas o que é isto para tanta gente?” 10Jesus disse: “Fazei sentar as pessoas”. Havia muita relva naquele lugar, e lá se sentaram, aproximadamente, cinco mil homens.
11Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes. 12Quando todos ficaram satisfeitos, Jesus disse aos discípulos: “Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca!” 13Recolheram os pedaços e encheram doze cestos com as sobras dos cinco pães, deixadas pelos que haviam comido. 14Vendo o sinal que Jesus tinha realizado, aqueles homens exclamavam: “Este é verdadeiramente o Profeta, aquele que deve vir ao mundo”. 15Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte. (Jo 6, 1-15).
Os mais excelentes pães da História
A Providência Divina age sem pressa, com esmerada preparação, sobretudo quando visa obras grandiosas. Qual terá sido a didática empregada pela Sabedoria Eterna para anunciar a instituição da Eucaristia? O Evangelho do 17º domingo do Tempo Comum nos fornece matéria para uma reflexão a este respeito.
I - ANTECEDENTES
Retornavam os Apóstolos para junto do Divino Mestre, vindos de grandes atividades e pregações coroadas de êxito, apesar de alguns prováveis percalços. À alegria do reencontro se acrescentou o desejo de narrar a Jesus “tudo o que haviam feito e ensinado”, (1) certamente numa atmosfera de muito ânimo, devido à insuperável e paternal acolhida de Quem os ouvia. Era a primeira vez que se afastavam de Jesus para exercer missões apostólicas, a partir das quais já não mais iriam à busca de peixes, debatendo-se contra ventos e tempestades, mas à conquista de almas para o Reino de Deus. Não pequena deve ter sido sua emoção ao se sentirem capazes de expulsar numerosos demônios, convidar todos à penitência e curar muitos enfermos. As impressões e lembranças tornaram os Apóstolos ainda mais expansivos.
Jesus ouviu-os, felicitou-os pelo sucesso e alimentou em suas almas a esperança de um futuro brilhante e promissor. O fervor de noviço alentava com gáudio e consolações aqueles corações recém-convertidos, sobretudo pela satisfação de haverem cumprido com zelo a missão que lhes coubera. Jesus notou, entretanto, o quanto estavam necessitados de um bom repouso (2).
II - O EVANGELHO ANÁLISE E COMENTÁRIOS

Naquele tempo, 1 Jesus foi para o outro lado do mar da Galileia, também chamado de Tiberíades
Jesus e os Apóstolos tomaram uma barca, atravessaram o Tiberíades em busca de um lugar desértico em Bethsaida.
2 Uma grande multidão o seguia, porque via os sinais que ele operava a favor dos doentes.
O percurso a pé era o dobro do que se realizava de barco. Apesar disso, intuindo para onde iam Jesus e seus discípulos, muitos “acorreram lá de todas as cidades, e chegaram primeiro que eles” (3).
Esse grande atraso havido no deslocamento do Divino Mestre faz supor uma atraente conversa entre eles, tornando, assim, menos intenso o desempenho dos remadores.
Duas lições podemos recolher neste versículo.
Ao buscarmos Jesus, devemos imitar essa multidão, ou seja, jamais medir distâncias ou esforços, e nosso entusiasmo deve ser tal que cheguemos com antecipação. Se nossa vida nos impõe a ação, lancemo-nos aos afazeres necessários com a atenção fixa no reencontro com Jesus. Ao estarmos com Ele “na barca”, saibamos tirar proveito de sua divina companhia, saboreando as palavras de sabedoria, por Ele comunicadas em nosso interior.

O verdadeiro repouso
3 Jesus subiu ao monte e sentou-se aí, com os seus discípulos.
Aprendamos neste versículo a descansar com Jesus. Certo conceito de repouso em nossos dias leva as pessoas a julgarem erroneamente consistir este no completo relaxamento físico e espiritual. Apesar de estarem os Apóstolos tomados pela fadiga, Jesus os fez subir o monte, pois era necessário contemplarem o panorama das atividades já realizadas e das que ainda estavam por vir. Sentados no alto desse mirante, seus olhos desvendaram um belo horizonte geográfico. É indispensável trabalhar em Deus como também descansar em Deus.
Nossa vida em sociedade — sobretudo quando apostólica — deve ser conduzida numa mescla de ação e recolhimento. É na oração que o homem de fé recupera suas energias e adquire novas forças para empreendimentos mais ousados.
Por isso, a propósito deste versículo, São Tomás de Aquino transcreve em sua obra Catena Áurea o seguinte trecho de São João Crisóstomo: “Subiu também ao monte para ensinar-nos a aquietar o ânimo, fugindo dos tumultos e da agitação das coisas mundanas; porque a solidão é muito própria à contemplação (ou para o conhecimento das coisas sublimes, e a meditação das coisas divinas)”.
A caminho da Páscoa verdadeira
4 Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus.
Dois motivos levaram São João a fazer notar a cercania da Páscoa.
1. Incontáveis grupos de judeus, oriundos do norte da Palestina, se concentravam em Cafarnaum e desta localidade rumavam para Jerusalém. O elevado número de peregrinos proporcionava ótima ocasião para conferir ainda mais destaque ao milagre que seria realizado.
2. Ressaltando que o milagre se realiza por ocasião da Páscoa, indica que, afinal, essa festa estaria chegando à plenitude de seu simbolismo, a Páscoa Cristã.
Talvez haja ainda uma terceira razão, pois, conforme comenta Beda o Venerável, São João Batista teria sido degolado por ocasião da mesma festividade na qual Jesus sofreu a Paixão.
Por amor Jesus abandona seu descanso
5 Levantando os olhos e vendo que uma grande multidão estava vindo ao seu encontro, Jesus disse a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?”
São João omite a narração de certas peculiaridades abordadas pelos outros evangelistas, pois tem um especial encanto pelos diálogos, como se pode comprovar ao longo de sua escrita — Nicodemos (4), a Samaritana (5), a vocação dos primeiros discípulos (6), as conversas no Cenáculo (7) — não se preocupando com certos detalhes circunstanciais, por julgá-los desnecessários. Neste caso concreto, seu maior empenho concentrou-se em atrair a atenção do leitor para a essência do milagre preparatório à instituição da Eucaristia.
Em face da apetência daquela multidão, o Divino Mestre abandonou imediatamente o propósito de repouso e pôs-Se a receber a todos, pregando-lhes com pulcritude sobre o Reino de Deus, não só com a palavra, mas também com os milagres. São as incansáveis manifestações do Sagrado Coração de Jesus revelando-nos sua divina bondade, preciosíssima parcela da herança deixada por Ele à Santa Igreja. A Igreja tem compaixão, palavras de vida eterna, ampara os necessitados, tal qual o fazia seu Fundador.
Jesus prova a fé de seus mais próximos
6 Disse isso para pô-lo à prova, pois ele mesmo sabia muito bem o que ia fazer.
Os discípulos de Jesus já haviam presenciado inúmeras maravilhas por Ele operadas, comprovando seu inteiro domínio sobre a natureza. Entretanto, em sua divina didática, desejava fortalecer a fé ainda tímida de seus seguidores. Por isso obriga Filipe a comprovar a total impossibilidade de alimentar aquela gente toda, a fim de fazê-los crer mais facilmente na magnitude do milagre.
7 Filipe respondeu: “Nem duzentas moedas de prata bastariam para dar um pedaço de pão a cada um”.
Jesus prova a fé dos Apóstolos na pessoa de Filipe, pelo fato de ser este oriundo da região em que todos se encontravam naquele momento. A resposta dele foi a mais precisa possível. Nenhum depoimento poderia ser mais seguro para comprovar o absoluto poder taumatúrgico do Messias.
Nada leva a crer que a bolsa dos Apóstolos possuísse a quantia necessária para alimentar cinco mil pessoas.
8 Um dos discípulos, André, o irmão de Simão Pedro, disse: 9“Está aqui um menino com cinco pães de cevada e dois peixes. Mas o que é isto para tanta gente?”
Antes desta intervenção de André, os sinópticos narram a aflição dos discípulos a propósito da dramática situação daqueles milhares de pessoas: já se fazia tarde, o sol estava para se pôr, o lugar era deserto e por isso, levados pelo bom senso, aconselharam Jesus a despedir a multidão.
André manifesta sua fé em Jesus ao introduzir um pequenino vendedor ambulante com seus cinco pães e dois peixes. Entretanto, erroneamente teria julgado ser necessário haver uma certa proporção entre os pães existentes e os multiplicados pelo milagre. Segundo afirma São João Crisóstomo, André conhecia o episódio havido com Eliseu, o qual alimentou cem pessoas com vinte pães (8).
Com o acréscimo desta intervenção de André, estavam assentados os pressupostos para se avaliar o divino poder de Jesus sobre o universo.

Apenas por curiosidade, convém notar que o pão de cevada era alimento dos pobres, e os peixes deveriam ser secos e salgados, conforme os costumes do sul do lago de Tiberíades. Alguns antigos autores atribuem um pequeno simbolismo aos números cinco (pães) e dois (peixes). Quanto ao primeiro, dizem relacionar-se com o Pentateuco de Moisés, ou seja com a antiga Lei. Os peixes, segundo eles, eram dois para representarem os poderes governativos dos hebreus — o real e o religioso — duas prerrogativas de Nosso Senhor.
Continua no próximo post

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