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terça-feira, 21 de julho de 2015

EVANGELHO XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B - ANO B - Jo 6, 1-15

CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO DO XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM - ANO B
Nosso Senhor ama a ordem
10 Jesus disse: “Fazei sentar as pessoas”. Havia muita relva naquele lugar, e lá se sentaram, aproximadamente, cinco mil homens.
É belíssima a delicadeza de Jesus. Como bom anfitrião, faz todos se sentarem sobre a relva por Ele criada. Além do mais, assim o exigia um princípio de boa disciplina. Imaginemos qual não teria sido a balbúrdia produzida por uma multidão faminta a tentar conquistar seu alimento, sem haver quem a harmonizasse. Sentando-se ordenadamente em grupos de cinquenta ou cem, a distribuição dos pães e dos peixes tornava-se fácil.
11Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes.
A narração deste fato, ao ser completada em detalhes pelos outros Evangelistas, adquire um elevado simbolismo prenunciativo da instituição da Eucaristia. Tomando em suas mãos os cinco pães e os dois peixes, Jesus ergueu seus olhos para o céu, partiu-os e entregou-os aos seus discípulos, os quais, por sua vez, os distribuíram às pessoas agrupadas e sentadas pela relva. O milagre da multiplicação saído das mãos de Jesus, continuava a realizar-se nas dos discípulos, evitando assim um contínuo ir e vir destes. Não pequeno deve ter sido o trabalho dos Apóstolos, percorrendo um a um para oferecer pão e peixe. Jamais aquela gente tinha comido tão delicioso manjar. Ele deveria ser extremamente superior ao próprio maná do deserto, pois este não passara pelas divinas mãos de Jesus.
Não houve quem dele não comesse até saciar-se.

12Quando todos ficaram satisfeitos, Jesus disse aos discípulos: “Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca!”
Além de tratar-se de um costume próprio aos hebreus, o fato de Jesus ordenar aos discípulos o recolhimento de todos os restos demonstra uma especial didática para prepará-los ao trato futuro com as espécies eucarísticas. Visava Ele também tornar ainda mais patente seu absoluto poder taumatúrgico, evitando assim a tentação de que tudo não fora senão uma simples ilusão.
13Recolheram os pedaços e encheram doze cestos com as sobras dos cinco pães, deixadas pelos que haviam comido.
 Mais um elemento essencial no divino ensinamento: o ter feito sobrar um cesto para cada Apóstolo. Ao transportá-lo, cada um deles deve ter sentido o peso desses restos. “Que portentoso milagre realizou hoje nosso Mestre!” — deveriam eles pensar.
14Vendo o sinal que Jesus tinha realizado, aqueles homens exclamavam: “Este é verdadeiramente o Profeta, aquele que deve vir ao mundo”.
Este versículo poderia dar a impressão de que, afinal, o povo creu tratar-se do Messias, mas um pouco adiante São João mostrará o quanto era fraca a fé de toda aquela gente (9).
15Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte.
Nos outros Evangelhos nos deparamos com uma vigorosa atitude de Nosso Senhor: força os Apóstolos a se separarem logo da multidão exaltada, enquanto Ele se despedia de todos.
Ouçamos o famoso Fillion, (10) com seu fino discernimento exegético, comentar estes dois últimos versículos:
“Sua admiração, infelizmente muito humana, crescia a cada instante. Tão ardorosa era sua exaltação que já não pensavam senão em apoderar-se de Nosso Senhor e proclamá-lo Rei de Israel, mesmo contra a sua vontade! Mas este conceito do messianismo — como já tivemos ocasião de ver muitas vezes — era inteiramente incompatível com o de Jesus. E essa incompatibilidade não poderia fazer outra coisa do que cavar um profundíssimo abismo entre Ele e as multidões.
“Precisamente neste ponto começará uma gravíssima crise que afastará de Cristo muitos de seus discípulos. O milagre da multiplicação dos pães os havia contentado pelo que teve de brilhante. O que aqueles exaltados esperavam de seu Messias glorioso era justamente prodígios dessa natureza. Não se davam conta de que, pondo n’Ele suas esperanças terrenas, O rebaixavam a seu próprio nível moral e O reduziam a simples instrumento de seu orgulho nacional, que os levava a todo momento a sonhar com a libertação do jugo romano, com a conquista do mundo inteiro e com uma felicidade temporal sem sombra alguma.
“Nunca havíamos visto no povo judeu uma tão ardente manifestação de fé messiânica. Mas a oposição de Jesus a esse favor popular — além de indiscreto, superficial — fará com que logo diminua, e em grande parte se apague, essa admiração.
“Os próprios Apóstolos compartilhavam, neste ponto, as ideias e impressões de seus compatriotas, e era de recear-se que, se permanecessem algum tempo em contato com a turba, aderissem a seus estranhos projetos e fossem para seu Mestre um estorvo a mais, naquela hora decisiva. Para livrá-los desta perigosa tentação, resolveu Jesus afastá-los da multidão. Ordenou-lhes, pois, embarcar de novo e partir sem demora para a margem ocidental do lago, onde iria reunir-se a eles logo após despedir o povo. Obedeceram, porém, de má vontade. E até opuseram alguma resistência, pois São Mateus e São Marcos dizem expressamente que Jesus teve de ‘obrigá-los’ a voltar para a barca.”
APLICAÇÃO
“Nada de grandioso se faz repentinamente”, diz um provérbio latino. O mais excelso de todos os sacramentos, a Eucaristia, deveria ser precedido por belas pré-figuras, numa longa preparação da humanidade através dos séculos. No Antigo Testamento, uma das mais expressivas foi o maná caído do céu para os hebreus, durante os quarenta anos de travessia do deserto, em busca da Terra da Promissão.
No Evangelho de hoje, vemos o Divino Mestre multiplicar os pães para tornar patente seu império sobre esse alimento. Logo a seguir, Ele andará sobre as águas num mar encapelado (11), com o intuito de deixar evidente o quanto dominava seu próprio corpo. Assim, as premissas para a instituição da Eucaristia iam se fixando nos que o seguiam, sobretudo nas almas dos Apóstolos.
Por outro lado, o rico sabor e a alta qualidade dos pães e peixes distribuídos por Jesus, deixaram a multidão ansiosa por comê-los novamente (12). E quando Jesus disse aos que foram beneficiados pelo milagre: “Moisés não vos deu o pão do Céu (...) o pão que desce do Céu e dá vida ao mundo”, eles logo Lhe pediram: “Senhor, dá-nos sempre deste pão!” (13).
É insuperável a didática de Jesus ao iluminar assim a inteligência de seus discípulos, tocar seus corações e mover suas vontades rumo a um ardente desejo da Eucaristia. Método perfeito, tal qual o recomenda São Tomás de Aquino (14).
Após isso, com soberana autoridade e divina unção, Ele declara: “Eu sou o Pão da Vida. Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o Pão que desceu do Céu para que aquele que dele comer, não morra. Eu sou o Pão Vivo descido do Céu. Quem comer deste Pão viverá eternamente; e o Pão que eu darei é a minha carne para a salvação do mundo” (15).
Quem mais poderia unir a autoridade grandiosa à total simplicidade? Com muita propriedade, assim se expressa Bossuet sobre este aspecto de Jesus: “Quem não admiraria a condescendência com que tempera a elevação de sua doutrina? É leite para os meninos e, ao mesmo tempo, pão para os fortes. Vemo-Lo cheio dos mistérios de Deus, mas se percebe que não está possuído como os outros mortais aos quais Deus se comunica: fala disso naturalmente, como tendo nascido nesse segredo e nessa glória; e o que Ele tem sem medida (Jo III, 34), Ele o dá com medida, a fim de que nossa debilidade possa suportá-lo” (16).
Por isso, importa convencermo-nos em nos deixar conduzir pelos ensinamentos de Jesus, pois não quer Ele senão a nossa felicidade eterna e com prodigalidade: “Eu vim para que tenham vida, e a tenham abundante.” (17) !

1) Mc 6, 30. 2) Mc 6, 31. 3) Mc 6, 33. 4) Jo 3, 1-21. 5) Jo 4, 7-42. 6) Jo 1, 35-51. 7) Jo, 13. 8) Vide 1ª leitura deste domingo (2Rs 4, 42-44). 9) Jo 6, 26 e seguintes. 10) Vida de Nuestro Señor Jesucristo, Editorial Voluntad, Madrid, 1926, t. III, pp. 238-239. 11) Jo 6, 17 a 21. 12) Jo 6, 26. 13) Jo 6, 32-34. 14) Summa Theologica, II-II, q. 177, a.1. 15) Jo 6, 48-51. 16) Discours sur l’Histoire Universelle, P. II, c XIX 17) Jo 10, 10.

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