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quarta-feira, 29 de julho de 2015

Evangelho XVIII Domingo do Tempo Comum – Ano B - Jo 6, 24-35

Continuação dos comentários ao Evangelho – XVIII Domingo do Tempo Comum – Ano B

Deus os preparava para o verdadeiro Maná


Mais uma vez, entretanto, o dom de Deus lhes serve para manifestar quão apoucados eram na fé, pois: “Vendo aquilo os filhos de Israel disseram entre si: ‘Que é isto?’. Porque não sabiam o que era. Moisés respondeu-lhes: ‘Isto é o pão que o Senhor vos deu como alimento’” (Ex 16, 15). Apesar disso, durante quarenta anos sem falhar nunca, eles receberam um alimento que continha todos os sabores, ou seja, o maná adquiria no paladar o sabor desejado por quem o consumia (cf. Sb 16, 20-21).
Deus usa esse procedimento durante toda a perambulação do povo no deserto, para acostumá-lo a viver na dependência do Céu, para retificar sua mentalidade excessivamente calculista e pragmática.
E assim, por meio do maná, alimento material, Ele os preparava para o verdadeiro Maná, alimento espiritual descido do Céu que nos proporciona a vida eterna e que nos é anunciado pelo próprio Jesus no Evangelho de hoje. É desta maneira que com uma didática verdadeiramente divina a liturgia vai preparando os espíritos para tratar a respeito da Eucaristia.
“Estais Me procurando porque comestes pão”
“Naquele tempo, 24 quando a multidão viu que Jesus não estava ali, nem os seus discípulos, subiram às barcas e foram à procura de Jesus, em Cafarnaum”.
No dia seguinte, tomado por essas cogitações, a multidão não pensou em outra coisa senão em seguir o Mestre, ávida de saborear mais uma vez aquele pão. Imaginava talvez que Nosso Senhor multiplicaria sempre os pães e os peixes, na esperança de não precisar mais trabalhar para o sustento diário, esquecendo-se da sentença divina: “Comerás o pão com o suor do teu rosto” (Gn 3, 19).
Ora, fora informada de que ao entardecer os discípulos haviam partido de barco rumo a Cafarnaum e depois o Mestre saíra na mesma direção. Desconheciam, entretanto, que Jesus caminhara sobre as águas e Se unira a eles de madrugada (cf. Jo 6, 17-21).
25 “Quando O encontraram no outro lado do mar, perguntaram-Lhe: ‘Rabi, quando chegaste aqui?’. 26 Jesus respondeu: ‘Em verdade, em verdade, Eu vos digo: estais Me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos’”.
Quando se depararam com Jesus, ficaram surpresos: Ele não havia subido na barca com os discípulos, como então chegara ali?
Mas Cristo não lhes revelou o milagre de caminhar sobre as águas, porque ainda não estavam preparados para a perspectiva de Ele ter um domínio sobre o próprio corpo; aos seus discípulos, sim, quis mostrar esse poder. O milagre da multiplicação dos pães os ajudaria na compreensão do que mais adiante lhes seria revelado.
E Jesus, com sua divina sabedoria, respondeu não à pergunta, mas à intenção de seus autores, aproveitando ao mesmo tempo para repreendê-los por sua preocupação meramente material: “Estais Me procurando não porque vistes sinais...”. Em concreto, a multiplicação dos pães fora uma demonstração retumbante e inequívoca do seu poder sobre a matéria, mas o povo parecia não compreender o seu significado.
Ficaram nos efeitos sem remontar à Causa
Só esse sinal espetacular teria bastado para aquelas pessoas concluírem que estavam na presença de Deus. Elas, porém, preocupadas mais com o sustento material do que com a revelação do sobrenatural, não tiraram essa conclusão. Estavam ali movidas por puro interesse pragmático. Restringiram-se ao pão, recusando admirar Quem Se lhes manifestara de forma tão extraordinária. Em outras palavras, ficaram nos efeitos, não remontaram à Causa. Por isso, Nosso Senhor os censura.
Eis um importante ensinamento a tirar deste versículo, para não cometermos o mesmo erro em nossa vida espiritual: muitas vezes, podemos nos apegar às consolações, como aquele povo ao pão, esquecendo-nos de olhar para o Autor delas. Quem assim procede perde um fruto espiritual extraordinário por não estar sempre remontando à Fonte das graças e restituindo devidamente tudo quanto recebe. Convém frisar mais uma vez a  sabedoria do Mestre ao educar as multidões: primeiro, Ele a todos agradou, oferecendo-lhes aquele extraordinário pão; depois, apesar de O procurarem movidos por mero interesse, aproveita-Se disso para prepará-los a aceitar uma revelação muito mais importante.
Alimento que permanece até a vida eterna
27 “Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará. Pois este é Quem o Pai marcou com seu selo”.
Outrora o Senhor proporcionara a seu povo cebolas, carne e pão com fartura, nas margens fertilíssimas do rio Nilo. Depois o libertou de longa escravidão e ofereceu-lhe no deserto o maná do céu, codornizes em abundância e água tirada das pedras. Por fim, presente entre os homens na Divina Pessoa de Jesus, multiplica os pães. Assim agindo, Ele educava aqueles homens para a dependência contínua da Divina Providência, mas todos esses alimentos, afinal, são perecíveis e dizem respeito à vida terrena.
Agora, esse mesmo Deus deseja dar um passo a mais na manifestação do seu amor pela humanidade: desvendar o mistério da Eucaristia, o verdadeiro Pão dos Anjos, que é o próprio Corpo, Sangue, Alma e Divindade d’Ele, Jesus Cristo. Procurava chamar a atenção do povo para essa iminente revelação. Ouvindo falar de um alimento que “permanece até a vida eterna”, as pessoas logo O julgaram capaz de operar esse milagre, pois, entre tantos outros prodígios, havia já feito um pão inigualável.
Assim, partindo da figura material para chegar à realidade espiritual, Ele relaciona o milagre da multiplicação dos pães com um outro pão que iria dar.
E numa crescente manifestação de sua divindade, Ele afirma ser o varão “marcado com o selo do Pai”. Entretanto, mesmo assim, também não será aceito: aquelas pessoas tinham já presenciado numerosos milagres — como cegos recuperarem as vistas, coxos andarem e até defuntos voltarem da região dos mortos —, mas percebem que lhes será exigido algo difícil. E procuram tergiversar.
Do que necessitavam ainda para crer?
28 “Então perguntaram: ‘Que devemos fazer para realizar as obras de Deus?’. 29 Jesus respondeu: ‘A obra de Deus é que acrediteis n’Aquele que Ele enviou’”.
Para quem naquele momento estava diante da revelação da divindade de Nosso Senhor, não era apropriada tal indagação, pois ela desviava do cerne do misterioso tema tratado. A um Homem que se diz Deus, trata-se de segui-Lo. Pelo contrário, a pergunta revelava um desejo de praticar obras divorciadas do Messias, como se seus autores julgassem poder viver bem sem Ele.
Em sua resposta, Nosso Senhor retoma o assunto do qual estava tratando, e dá uma orientação ao mesmo tempo tão fácil e tão difícil: era preciso acreditarem na sua palavra. Nisso consistia a realização da obra divina.
30 “Eles perguntaram: ‘Que sinal realizas, para que possamos ver e crer em Ti? Que obra fazes? 31 Nossos pais comeram o maná no deserto, como está na Escritura: Pão do céu deu-lhes a comer’”.
Procurando pretexto para não aceitar a revelação que acabava de lhes ser feita, eles desejam um sinal para crer em Jesus, como outrora seus antepassados exigiam dos profetas a realização de algum prodígio para comprovar a veracidade do oráculo. Pedido despropositado em vista dos inúmeros milagres operados por Nosso Senhor nas diversas regiões onde pregara. Do que necessitavam ainda para crer?

Segundo a concepção vigente, o Messias deveria ter o poder de restaurar o domínio político de Israel. Compreende-se bem, pois, a referência ao maná, considerado não uma dádiva de Deus, mas sim a solução de um problema temporal, proveniente de um grande caudilho como Moisés. De acordo com essa ideia, era o profeta, e não o próprio Deus, quem dava ao povo o maná. Da mesma forma, consideravam a multiplicação dos pães e peixes a saída para uma dificuldade material, vendo em Jesus um líder meramente humano, qual outro Moisés.
Continua

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