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quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Comentário ao Evangelho – XXV Domingo do Tempo Comum Ano B Mc 9, 30-37

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32“Mas não entendiam estas palavras; e tinham medo de Lhe perguntar”.
Não era a primeira vez que o Messias anunciava Sua Paixão e Ressurreição aos Apóstolos. Estes, porém, tão distantes estavam de tais cogitações, que nem sequer Pedro, Tiago e João, testemunhas privilegiadas da Transfiguração, entenderam o que Ele lhes quis dizer.
Ao descer do Monte Tabor, o Senhor já os havia alertado para nada contarem “até que o Filho do homem tivesse ressurgido dos mortos” (Mc 9, 9). Entretanto, ignoravam o sentido dessas palavras, pois discutiam entre si o que significaria “ser ressuscitado dentre os mortos” (Mc 9, 10).
Bem aponta o Crisóstomo “quão pouco compreendiam os discípulos o sentido da clara predição da morte do Senhor. Inclusive depois de todos esses milagres reveladores, após essa singular revelação de identidade de Jesus por parte da voz celeste, e depois da predição explícita de Sua morte e Ressurreição, continuavam eles sem entender o mais importante e estavam preocupados por sua própria ansiedade”.6
De sua parte, o padre Lagrange assim analisa esta passagem: “Os discípulos continuam não compreendendo. O que menos convinha ao Messias era a Paixão; o que menos se entendia da doutrina de Jesus ainda era a necessidade do sofrimento. Quando o Mestre disto falou pela primeira vez, Pedro protestou, mas foi vivamente repreendido (cf. Mc 8, 31); na segunda, eles mudaram de assunto (cf. Mc 9, 11); agora eles não ousam sequer perguntar”.7
Sua mentalidade estava em choque com Nosso Senhor
Ora, se os discípulos não compreendiam o que o Mestre lhes dizia, qual a razão de terem medo de perguntar? Jesus sempre os tratara com uma bondade inefável e a ocasião não podia ser mais propícia, estando eles a sós com o Mestre. Era tão fácil, sobretudo naquele momento de intimidade, pedir-Lhe um esclarecimento!
Havia para isso uma profunda razão psicológica. A perspectiva da morte do seu Mestre ia contra todos os planos de projeção social, de solução política e econômica que eles almejavam. Significava a destruição do castelo de ilusões que os israelitas montaram a respeito do Messias: o de um homem capacíssimo, cheio de dons para libertar do domínio romano o Povo Eleito e projetá-lo acima dos outros povos.
Os Apóstolos percebiam que a mentalidade deles estava em choque com a de Nosso Senhor. O Mestre ensinava uma doutrina que eles, no fundo dos seus corações, não desejavam ouvir. A resposta de Jesus podia tornar clara demais essa dissonância, colocando-os na obrigação de mudar de mentalidade, o que de todo eles não queriam.
Bem observa o padre Tuya a este propósito: “Eles sabem que as predições do Mestre se cumprem. Têm um pressentimento em relação àquele programa sombrio — para Jesus e para eles — e evitam insistir sobre ele”.8
O homem, segundo nos ensina a filosofia tomista, nunca pratica o mal enquanto mal; sempre procura justificá-lo, dando-lhe uma aparência de bem.9 E no espírito dos discípulos, duas ideias contraditórias entravam em conflito: a do autêntico Messias, que lhes falava de perseguições, morte e Ressurreição, e a de um Messias meramente humano, restaurador do poder temporal de Israel. Eles então racionalizavam para justificar a ideia errada na qual insistiam em acreditar.
O receio de romper os alicerces dessa mentalidade política e terrena os fazia ter medo de perguntar.
33“Em seguida, voltaram para Cafarnaum. Quando já estava em casa, Jesus perguntou-lhes: ‘De que faláveis pelo caminho?’. 34 Mas eles calaram-se, porque pelo caminho haviam discutido entre si qual deles seria o maior”.
Sabia Cristo perfeitamente de qual assunto os Apóstolos trataram ao longo do percurso. À incômoda indagação, porém, eles ficaram calados, envergonhados de dizer ao Mestre que o tema de sua conversa havia sido uma egoística disputa de primazia pessoal.
O seu silêncio já era um meio reconhecimento da falta cometida, da qual eles tinham certa consciência, como afirma o Cardeal Gomá: “Sua conduta está em flagrante oposição com o sentir do Mestre, e estão confusos diante dEle”.10
No mesmo sentido se pronunciam comentaristas da Companhia de Jesus: “O silêncio dos discípulos perante a pergunta do Mestre é muito psicológico. Sentem-se, sem dúvida, conscientes de que suas aspirações não encontrariam aprovação”.11
Continua no próximo post

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