CONTINUAÇÃO DOS COMENTÁRIOS AO EVANGELHO – 10º DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO C 2013 Lc 7, 11-17
O efeito
causado na multidão
16 “Todos ficaram com muito medo e glorificavam a Deus,
dizendo: ‘Um grande profeta apareceu entre nós e Deus veio visitar o seu
povo’”.
Diante de tamanho prodígio, a estupefação
e o medo tomaram conta de todos. Haviam constatado no Mestre a presença de uma
virtude absoluta e totalmente sobre-humana, prova irrefutável de que Ele era
profeta. Com efeito, era costume o profeta demonstrar, por meio de algum sinal,
a autenticidade de sua missão (cf. I Sm 2, 34; II Rs 19, 29; 20, 8-9; Ez 24,
24). Nosso Senhor, nesse caso, não recebeu o título de profeta, mas o de grande
Profeta, pois, como vimos, revelou ter poder sobre a vida e a morte. “Essa
estupefação respeitosa” — comenta Lagrange — “não é senão o prelúdio dos
louvores dados a Deus. As multidões chamam profeta a Jesus, e não filho de
Deus, como os demônios (cf. Lc 4, 41), já que estes têm as vistas sobre o mundo
invisível, enquanto os homens procuram analogias no passado, em que alguns
profetas haviam ressuscitado mortos. Nenhum deles, entretanto, o fizera com uma
palavra; por isso consideram Jesus como um grande profeta, o esperado para o
tempo da salvação”.16 Ora, a função fundamental do profeta não é a de prever o
futuro, mas sim a de ser guia do povo e apontar-lhe o rumo de sua trajetória.
Portanto, nesse episódio da vida pública do Homem-Deus, vemo-Lo manifestar-Se
enquanto caminho e vida, como mais tarde Ele mesmo afirmará: “Eu sou o caminho,
a verdade e a vida” (Jo 14, 6).
Por que
sentiram medo?
Foram também dominados pelo
medo os que ali estavam ao tomar contato com o sobrenatural e concluir que, de
fato, Deus visitara o seu povo. Porque, embora sabendo da existência de Deus
pela Revelação, muitos viviam submergidos no ateísmo prático, tendo-O
inteiramente ausente de suas cogitações e obras. Eram capazes de falar d’Ele,
no entanto moldavam a vida como se n’Ele não acreditassem. Naquele momento, porém,
sentindo sua proximidade, é muito provável que a consciência se tenha
despertado no interior de cada um, apontando as próprias misérias e censurando
as faltas cometidas no passado.
Aqui podemos nos perguntar: e
nós, em nossa vida concreta, cremos em Deus? Ou adotamos uma forma de vida
materialista, pela qual acreditamos apenas teoricamente e, na prática, vivemos
como se Ele não existisse?
Uma projeção
fulgurante da figura de Nosso Senhor
17 “E a notícia do fato espalhou-se pela Judeia inteira
e por toda a redondeza”.
Naqueles remotos tempos, não
havendo os meios de comunicação atuais — rádio, telefone, televisão, internet e
nem sequer jornal —, a transmissão das notícias era feita oralmente. As novidades
se espalhavam de maneira mais natural e mais autêntica, ao contrário de nossos
dias em que, devido à velocidade dos novos inventos, vão perdendo elas, pouco a
pouco, a penetração nas mentes, tal o excesso de informação. Dessa forma, o
relato desse extraordinário milagre se espalhou por toda a Judeia, e é bem
provável que por toda a Palestina, ultrapassando até os limites da região. O
nome do grande Taumaturgo da Galileia adquiria, assim, uma fama crescente.
O SIGNIFICADO MÍSTICO DO MILAGRE
O episódio da ressurreição do
filho da viúva de Naim encerra um profundo significado místico. Depois da queda
do homem, no Paraíso, o pecado transmitiu-se, de pai para filho, a toda a sua
posteridade. Manchada pela culpa original, a humanidade jazia como morta, merecedora
da eterna condenação, tendo as portas do Céu fechadas diante de si. Para os
descendentes de Adão e Eva, a justificação apenas podia ser alcançada por meio
da fé (cf. Rm 4, 9; Hb 11, 7); e, todavia, se viessem a cair em alguma falta
grave, perdendo a graça por humana fraqueza, só lhes seria possível restaurá-la
através de grandes e prolongadas penitências. Ainda assim, nada, nem mesmo a
prática da Lei, lhes dava a garantia da reconciliação com Deus e da recuperação
da vida sobrenatural. Com efeito, São Paulo, em sua carta aos Gálatas, escreve:
“Pela prática da Lei, nenhum homem será
justificado” (Gal 2, 16). E o Doutor Angélico nos explica que “o fim da lei
antiga era também a justificação dos homens. A qual, certamente, a Lei antiga não
podia fazer, mas figurava com alguns atos cerimoniais, e prometia por
palavras”.18 Como, pois, ressuscitar alguém espiritualmente, após haver transposto
os umbrais da morte do pecado grave? Era isso impossível se não houvesse um
Redentor.
Nosso Senhor Jesus Cristo,
Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, compadeceu-Se dos que permaneciam
envoltos nas trevas e na sombra da morte (cf. Lc 1, 79) e tomou a iniciativa de
encarnar-Se, sofrer a Paixão e a morte de Cruz, para triunfar na Ressurreição,
a fim de ressuscitar o corpo inerte da humanidade pecadora. Ele, o Verbo
Eterno, traz a vida da graça, que é infundida nos corações dos fiéis, como Ele
mesmo dirá: “Eu vim para que vós tenhais vida e a tenhais em abundância” (Jo
10, 10). Ao assumir a natureza humana e tornar-Se nosso irmão, Jesus coloca os
homens em uma condição superior à de nossos primeiros pais, pois no Paraíso,
antes do pecado, não tinham eles o Salvador, que nos proporciona caudais de
graças atuais, deixa-Se ficar entre nós como alimento e nos lega o precioso dom
dos Sacramentos, para manter a vida sobrenatural por Ele instaurada. “O felix culpa, quæ talem ac tantum meruit habere
Redemptorem!19 — Ó feliz culpa, que nos fez merecer um tão grande Redentor!”.
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