Continuação dos comentários ao Evangelho Batismo do Senhor Mt 3, 13-17 - Ano A - 2014
A submissão completa do Precursor
15b E João concordou.
Expressa
a suprema vontade do Divino Mestre, João concorda e, fiel à ordem recebida, obedece,
ignorando todas as aparências. Não se preocupa com a desproporção entre a
estreiteza e simplicidade do rio Jordão e a grandeza de Nosso Senhor Jesus
Cristo, que mereceria ser acolhido com mais dignidade, transportado quiçá numa
sede gestatória. Ele só considera o que a fé lhe mostra: que ali está o Messias
prometido, o Salvador de Israel, o Redentor do gênero humano, que ali está o
Filho de Deus feito Homem (cf. Jo 1, 34).
As portas do Céu foram abertas
6 Depois de ser batizado, Jesus saiu logo
da égua. Então o Céu se abriu e Jesus viu o Espírito de Deus, descendo como
pomba e vindo pousar sobre Ele.
Ao
mesmo tempo que a vida de Nosso Senhor transcorre no apagamento, há situações de
marcante esplendor, formando um belíssimo contraste. Porque se, de um lado, Ele
nasce numa pobre Gruta, por outro, do Oriente vêm os Reis Magos para visitá-Lo,
trazendo ricos presentes. Algo parecido ocorre no episódio contemplado hoje.
Jesus, após um curto diálogo com o Precursor, entra no Jordão, é batizado como
os outros e sai das águas. E então que se dá um acontecimento grandioso: o Céu se
abriu, significando que o acesso à bem-aventurança, antes fechado à humanidade
decaída em virtude do pecado de Adão, fora aberto pelo poder e pela Redenção de
Cristo. Ademais, era apropriado, como afirma São Tomás, que o Céu se tivesse
aberto quando o Filho de Deus recebeu o Batismo, para indicar “que o caminho do
Céu está aberto para os batizados”.6
Também
era conveniente que se visse o Espírito Santo, porque sendo a Redenção obra da
Santíssima Trindade, devia tornar-se patente, em certo momento, que as três
Pessoas Divinas estavam unidas para conceder o perdão dos pecados e franquear o
Céu aos homens.7 E apareceu sob a forma de pomba porque era preciso um elemento
concreto que exprimisse inequivocamente a descida do Espírito Santo sobre Nosso
Senhor e sobre todos os batizados.8 Estava o Filho, manifestou-Se o Espírito
Santo e se ouviu a voz do Pai.
O primeiro entre muitos filhos
17E do Céu veio uma voz que dizia: “Este é
o meu Filho amado, no qual Eu pus o meu agrado”.
A
conclusão da cena nos abre os olhos para um dos ensinamentos mais importantes
desta Liturgia. Ao constituir o universo, Deus teve como modelo Nosso Senhor
Jesus Cristo, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade Encamada, em quem está
representado, numa síntese perfeitíssima, o conjunto das criaturas. Ele é, no
dizer de São Paulo, “o primogênito de toda a criação. N’Ele foram criadas todas
as coisas nos Céus e na Terra, as criaturas visíveis e as invisíveis. Tronos,
Dominações, Principados, Potestades: tudo foi criado por Ele e para Ele”
(Col,
15-16). Ele é, pois, a causa efetiva e exemplar de tudo quanto foi feito.
Desde
toda a eternidade, Deus concebeu a criação — os minerais, os astros, a vegetação,
os animais, segundo as suas espécies, os homens, na sua variedade de
inteligência e temperamento, os Anjos, na sua incalculável diversidade — com o projeto,
por assim dizer, de engendrar filhos para Si. No entanto, que meio encontrou
Ele para fazer com que simples criaturas contingentes transpusessem o abismo
que separa a natureza divina das demais naturezas, o infinito do finito, e participassem
de sua natureza, adquirindo a filiação divina? Isso se fez possível com a
maravilha sobrenatural da graça — sexto plano da criação —, pela qual as
criaturas racionais participam da própria vida de Deus e se tornam seus filhos.
Uma só “gota” de graça vale mais do que todo o universo, já que — explica São
Tomás9 — pertence ela à ordem divina, infinitamente superior a qualquer
natureza criada. Ora, o supremo arquétipo desta filiação divina autêntica é
Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho por excelência, inimaginável, insuperável, conforme
o Pai revela na teofania posterior ao Batismo: “Este é o meu Filho amado, no
qual Eu pus o meu agrado”.
Tanto
amou Deus esta filiação realizada por Jesus com a maior perfeição, que colocou
bem junto a Ele sua Mãe Virginal, com quem o Espírito Santo gera
sobrenaturalmente uma multidão inumerável de filhos, que Deus “predestinou para
serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que este seja o primogênito
entre uma multidão de irmãos” (Rm 8, 29). São as águas do Batismo que nos elevam
da condição de simples criatura, amaldiçoada pelo pecado, para fazer parte da
família divina.
O
Batismo de Jesus, que a Igreja comemora neste dia, abre as portas para a
instituição do Batismo sacramental, pelo qual se reproduzem os filhos adotivos
de Deus através do Filho Unigênito “muito amado”, conforme comenta São Tomás:
“Para que algo seja aquecido, deve sê-lo pelo fogo, pois só se obtém a participação
em algo através daquilo que tem a mesma natureza; assim
também a adoção filial deve ser feita por meio do Filho, que o é por natureza”.10
Continua no próximo post
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