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sábado, 24 de maio de 2014

SOLENIDADE DA ASCENSÃO DO SENHOR - Ano A - Mt 28, 16- 20



Naquele tempo, 16 os Onze discípulos foram para a Galileia, ao monte que Jesus lhes tinha indicado. 17 Quando viram Jesus, prostraram-se diante d’Ele. Ainda assim alguns duvidaram.
18 Então Jesus aproximou-Se e falou: “Toda a autoridade Me foi dada no Céu e sobre a Terra. 19 Portanto, ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, 20 e ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei! Eis que estarei convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 16- 20)



O penhor da nossa vitória
Ao assumir nossa carne, quis o Filho de Deus viver entre nós para nos dar o exemplo da plenitude da perfeiçõo a que deseja nos elevar A subida do Senhor aos Céus é também um ponto de imitação. Como será, então, a nossa?
I - A HORA DA PARTIDA DE JESUS CRISTO
Igreja celebra na Quinta-feira da 6ª Semana do Tempo Pascal a Solenidade da Ascensão do Senhor, transferida no Brasil para o 7 Domingo da Páscoa, por razões pastorais. Houve épocas em que esta festividade era realizadacom grande brilho. Assim como se comemora à meia-noite do dia 24 de dezembro o nascimento do Menino Jesus e às três horas da tarde da Sexta-Feira Santa a sua Morte, a Ascensão o era ao meio-dia. Na Idade Média costumava-se realizar uma procissão para representar o trajeto feito por Nosso Senhor, acompanhado pelos Apóstolos e discípulos, de Jerusalém ao Monte das Oliveiras, de onde Ele ascendeu para junto do Pai (cf. At 1, 12). Durante a Missa, o diácono apagava o Círio Pascal logo após o
cântico do Evangelho, simbolizando o último episódio da existência visível do Redentor na Terra.
Hoje, ao contemplarmos sua subida aos Céus, tenhamos presente que Jesus não nos abandonou, mas, pelo contrário, continua conosco, conforme a promessa feita no Evangelho: “Eis que estarei convosco todos os dias, até o fim do mundo”. E nós, enquanto filhos, também desejamos permanecer com Ele, uma vez que veio a este mundo trazer-nos a participação na sua natureza divina.
II - QUANDO SERÁ RESTAURADO O REINO?
Ao longo de seus escritos, os evangelistas procuram expor os acontecimentos centrais da vida terrena de Nosso Senhor, na maior parte da qual Ele assumiu um corpo padecente como o nosso. No entanto, com exceção de São Lucas, quase nada dizem a respeito da Ascensão (cf. Mc 16, 19), evento de suma importância. Apenas no terceiro Evangelho encontramos alguns versículos dedicados a este mistério (cf. Lc 24, 50-51), além de um relato mais pormenorizado, no início dos Atos dos Apóstolos, em que, dando sequência a seu primeiro livro, o mesmo autor descreve a ação mística de Jesus após sua partida para os Céus, ou seja, o desenvolvimento e expansão da Igreja em seu nascedouro.
Por tal razão, e por ter sido o término do Evangelho de São Mateus objeto de outros comentários,’ será ele analisado à luz da narrativa da Ascensão feita por São Lucas — primeira leitura desta Solenidade (At 1, 1-11) —, já que o texto evangélico não se refere propriamente ao fato histórico da despedida de Nosso Senhor, mas sim a uma de suas aparições ocorrida durante os quarenta dias em que, ressuscitado, conviveu com os Apóstolos e lhes transmitiu seus últimos ensinamentos.
Errônea concepção a respeito do Messias
Naquele tempo, 16 os Onze discípulos foram para a Galileia, ao monte que Jesus lhes tinha indicado. 17 Quando viram Jesus, prostraram-se diante d’Ele. Ainda assim alguns duvidaram.
Várias destas manifestações de Nosso Senhor nesse período deram-se na Galileia. Ao escolher uma região afastada de Jerusalém tornava-se patente que o verdadeiro culto a Deus não se prendia mais ao Templo, mas à sua Pessoa Divina. O primeiro versículo do Evangelho recorda também sua predileção pelos lugares elevados, tantas vezes demonstrada durante sua vida pública. Alguns acreditam que este episódio tenha ocorrido no Tabor, outros em um dos montes situados nas proximidades do Lago de Genesaré.2 O certo é que o local foi determinado pelo próprio Jesus por razões sapienciais, como comenta São Rábano Mauro: “O Senhor apareceu-lhes num monte para dar a entender que o Corpo que havia tomado da terra ao nascer — como sucede a todos os homens — já estava elevado acima de todas as coisas terrenas quando ressuscitou, e ensinava aos fiéis que, se desejassem ver como Ele a magnificência da ressurreição, deviam esforçar-se por passar das mais baixas paixões às mais elevadas aspirações”.3
Ao reconhecerem Jesus, os Onze prostraram-se diante d’Ele para adorá-Lo. Bem podemos cogitar que nesses encontros durante sua permanência visível entre nós antes de subir aos Céus, os Apóstolos sentiam no fundo da alma que algo grandioso estava para acontecer. Entretanto, apesar de O haverem acompanhado em sua pregação, de terem passado pelo terrível trauma de vê-Lo preso, flagelado, coroado de espinhos, morto na Cruz e sepultado, tendo inclusive constatado o milagre da Ressurreição e presenciado suas aparições já em Corpo glorioso ao longo de quarenta dias, não souberam interpretar bem aquela promessa imponderável feita pela graça em seu interior, porque lhes faltava a descida do Espírito Santo. Deduziram eles, equivocadamente, ter chegado a hora do triunfo social de Cristo.
Conforme crença comum entre os judeus, aguardavam eles a restauração da soberania política de Israel, levada a uma nova plenitude em que, finalmente, o povo eleito estivesse acima de todas as nações, sem precisar pagar impostos aos romanos. E imaginavam Jesus como o rei ideal segundo essa perspectiva. Em consequência, a divulgação do Evangelho, como Ele havia recomendado que fizessem, seria feita ao mesmo tempo com a palavra nos lábios, a espada na mão direita e uma bolsa na esquerda.
Embora eles, enquanto membros do povo judeu, estivessem já por vários anos sofrendo a perseguição e o ostracismo, não entendiam o motivo pelo qual Deus permitia esses infortúnios, o que na verdade visava instruí-los a não depositar a esperança no poder, na política ou no dinheiro, e sim no sobrenatural, na Religião verdadeira, na Redenção operada por Cristo e na Revelação feita por Ele. Surpreende-nos comprovar que essa errônea concepção tenha perdurado por tanto tempo entre os Apóstolos, mas a realidade é que nas aparições de Nosso Senhor ressuscitado, e até no momento da Ascensão, eles ainda pensavam numa glória humana, a ponto de chegarem a indagar: “Senhor, é agora que vais restaurar o reino em Israel?” (At 1, 6). A explicação mais corrente dos exegetas a essa passagem centra-se na mentalidade deformada dos que a formularam, e poucos se detêm na significativa resposta do Divino Mestre.
Cristo reina por meio da Igreja
Com efeito, é de se notar como, nessa ocasião, Ele não contradiz os discípulos, não refuta de forma violenta seu anseio de um poderio ostensivo na face da Terra. Ao invés disso, lhes diz: “Não vos cabe saber os tempos e os momentos que o Pai determinou com a sua própria autoridade” (At 1, 7). E uma clara alusão a que algo na linha do que desejavam de fato se realizaria, mas no tempo estabelecido pela vontade divina. Momentos, portanto, em que a onipotência de Deus tem de se manifestar com todo o seu vigor na obra d’Ele chamada Santa Igreja Católica Apostólica Romana, verificando-se os efeitos do preciosíssimo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, de valor infinito, derramado no Calvário. Haverá então um só rebanho, sob a égide de um só pastor, e a autoridade de Cristo se exercerá de modo refulgente, inclusive com reflexos na vida social.
Essa mesma perspectiva, descortinada pelo Senhor no dia de sua Ascensão, nós a encontramos nos subsequentes versículos deste Evangelho:
18 Então Jesus aproximou-Se e falou: “Toda a autoridade Me foi dada no Céu e sobre a Terra”.
Tal autoridade “no Céu e sobre a Terra” Nosso Senhor a possui desde todos os séculos, enquanto Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, Filho Unigênito de Deus. Porém, enquanto Homem Ele a recebeu por direito de conquista através do sacrifício de sua Paixão e Morte, como observa São Jerônimo: “Foi dado o poder Aquele que pouco antes havia sido crucificado, sepultado num túmulo, que jazia morto e depois ressuscitou. Foi-Lhe dado o poder no Céu e na Terra para que o que antes reinava no Céu agora reine em toda a Terra, por meio da fé dos que creem”.4
Muitas vezes, contudo, a Igreja enfrenta terríveis tribulações nas quais seus inimigos empreendem todos os esforços para arrebatar a sua autoridade. A análise da História nos leva a comprovar que Deus permite, em certas circunstâncias, até mesmo um triunfo aparente do mal. E quando este está prestes a atingir o seu auge e a ponto de cravar o estandarte da vitória absoluta, Deus reverte o curso dos acontecimentos. Assim, dado que nunca houve uma crise tão grave como a de nossos dias, em que o progresso do mal se encontra num estágio avançado e vislumbra seu êxito total, é necessário que, em determinado momento, este mesmo mal seja acuado, aterrorizado, humilhado e jugulado, e a Igreja brilhe com novo fulgor. Esta vitória, como acima dissemos, não se limita à santidade no campo das almas, que ela sempre suscitou desde que foi fundada, mas abarca inclusive a sacralização da ordem temporal.
Ensina São Paulo que a própria criação, com a “esperança de ser também ela libertada do cativeiro da corrupção, [...] geme e sofre como que dores de parto” (Rm 8, 21-22), pois, se foi “sujeita à vaidade” (Rm 8, 20), também deve ser beneficiada pela Redenção. Da mesma maneira, pode-se afirmar que a sociedade civil, a qual está na base da espiritual e lhe oferece elementos, foi fortemente atingida pelo pecado e precisa receber neste mundo — pois ela não passará para a eternidade — a sua glória, pelos méritos do Salvador. A assembleia celeste, todavia, formada pelos Santos, é perpétua e seu prêmio consiste no convívio com Deus, na visão beatífica.
A nós, como outrora aos discípulos, não nos “cabe saber os tempos e os momentos”, mas temos certeza de que essa glorificação virá, pois Nosso Senhor possui pleno domínio sobre todas as coisas e, por mais que os homens queiram impedir o cumprimento de seus desígnios, Ele os realizará quando for de sua vontade.
A necessidade de evangelizar
19 “Portanto, Ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, 20a e ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei!”

Abandonando o futuro nas mãos de Deus, o que deveriam fazer os Apóstolos? Pôr em prática a recomendação de Jesus neste versículo, sem pensar em qualquer restauração segundo seus critérios deturpados, preparando-se para serem testemunhas da Boa-nova em todo o orbe, sem contar com qualquer recurso militar, político ou financeiro, e sim com a força do Espírito Santo, como Ele lhes garantiu antes de deixá-los: “descerá sobre vós, para serdes minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e na Samaria, e até os confins da Terra” (At 1, 8). Com este irresistível poder eles começariam a divulgar os ensinamentos do Divino Mestre e o Reino de Deus se implantaria de forma impalpável, muito mais através da fé do que pelos meios concretos, tal como o grão de mostarda que, ao ser semeado, vai se desenvolvendo quase imperceptivelmente até alcançar vigorosa expansão (cf. Mt 13, 3 1-32).
Continua no próximo post

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