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sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

EVANGELHO SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR – ANO B

Continuação dos comentários ao Evangelho da Epifania  Mt 2, 1-12
Uma adoração fruto da fé
11 Quando entraram na casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe. Ajoelharam-se diante d’Ele, e O adoraram. Depois abriram seus cofres e Lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra.
Quando os Reis Magos chegaram, a Sagrada Família havia já saído da Gruta e ocupava uma casa em Belém. Ali viram só Nossa Senhora e o Menino Jesus, para se tornar patente que Ela, de fato, é única e foi constituída Medianeira necessária por vontade d’Ele. Sendo Maria Rainha dos Anjos e dos homens, é provável que, por uma inspiração do Espírito Santo, seu Divino Esposo, Ela tenha conhecido os Magos à distância, desde o momento em que começaram a ser tocados pela graça e os acompanhasse pelos caminhos, rezando para que fossem flexíveis e dóceis, e se entregassem à Providência que os chamava. Nossa Senhora, então, sustentou a fidelidade deles, e não seria de estranhar que São José, enquanto Patriarca da Igreja, se unisse a Ela nessa intenção e, inclusive, que ambos conversassem sobre isso.

Bem podemos imaginar que os Reis tenham adorado o Menino nos braços da Santíssima Virgem. Contudo, lemos no Evangelho de São Lucas que os pastores, ao entrar na Gruta, se depararam com Maria, José e o Menino deitado numa manjedoura (cf. Lc 2, 16). Qual o sentido desta diferença? Como se tratava de pessoas muito simples, era mister tomar cuidado para eles não confundirem o Filho com a Mãe e, de repente, A adorarem também. Por isso assumiu Nossa Senhora esta atitude humilde de deixar o Menino reclinado para os pastores Lhe renderem homenagem, seguindo o exemplo de silêncio e oração que Ela lhes dava. Agora, entretanto, não se trata de pastores rudes, mas de pessoas cultas e delicadas. Os Reis não entenderiam que Maria apontasse para um berço, indicando onde estava o recém-nascido, quando seria melhor venerar o Menino nos braços da Mãe.
Por certo, a casa da Sagrada Família não tinha qualquer ar palaciano e, obviamente os Magos encontraram Maria e o Menino sem nenhuma insígnia real. Não obstante, depois da longa viagem, penetraram nesse ambiente modesto e, diz-nos o Evangelista, “ajoelhara 5 diante d’Ele, e O adoraram”. Ou seja, em seu íntimo reconheceram a divindade do Menino! Tiveram, portanto, um movimento de alma íntegro. “Se tivessem partido em busca de um rei terreno e o tivessem encontrado, teriam mais motivos de confusão que de alegria, por terem empreendido tão dura viagem esperando outra coisa. Como, porém, procuravam o Rei do Céu, sentiam-se felizes, embora o que estivessem vendo não apresentasse um rei. [...] Teriam, acaso, adorado um Menino incapaz de compreender a honra da adoração senão tivessem visto n’Ele algo divino? Logo, não adoraram um Menino que nada entendia: adoraram sua divindade, que tudo conhece. Até a qualidade especial dos presentes a Ele oferecidos dá testemunho de que tinham algum vislumbre ou indício da divindade do Menino”.7
Eles, Reis, já talvez avançados em idade, se ajoelhavam para adorar uma criança. No fundo, desejavam ser escravos de Nosso Senhor Jesus Cristo e dar-se a Ele completamente, com todos os seus bens. Esta era a razão de Lhe ofertarem magníficos presentes: ouro por reconhecerem n’Ele a realeza, o Rei dos reis; incenso por sua divindade, é Deus e merece ser incensado; e mirra, pois querem oferecer-Lhe seus sacrifícios e, com isso, serem beneficiados por suas graças. Exorta-nos, a este propósito, Santo Elredo: “como não convém chegar a Cristo ou adorá-Lo com as mãos vazias, preparai-Lhe vossos presentes. Oferecei-Lhe ouro, ou seja, um amor verdadeiro; incenso, uma oração pura; e mirra, a mortificação de vosso corpo. Com estes dons, Deus Se aplacará convosco, para alvorecer sobre vós e manifestar-se sua glória em vós. Ele será glorificado em vós e vos fará participar de sua glória”.8
O caminho dos Magos e o de Herodes
12 Avisados em sonho para não voltarem a Herodes retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho.
O autor da Obra Imperfeita 9 comenta que os Reis trilharam o caminho de Herodes até Jesus, mas não o de Jesus a Herodes, pois quem fez o caminho do mal para o bem não pode voltar à vida anterior. Ademais, em contato com o Menino Jesus e com Nossa Senhora, devem ter sentido uma consolação enorme e, decerto andavam por permanecer junto a Eles para sempre. Perceberam, todavia, não ser esta a vontade de Deus, e retornaram às suas terras para serem lá os arautos do Messias. Nós, igualmente, uma vez descoberta a finalidade para a qual somos criados, temos de fazer apostolado e procurar que todos gozem da mesma felicidade.
Tremendo contraste entre os Magos vindos do Oriente e aqueles que são os principais beneficiados por Nosso Senhor: os de sua pátria! Os primeiros recebem uma graça de discernimento dos espíritos, uma intuição profética por onde veem a santidade de Maria e de José, e a divindade de Jesus Cristo, a ponto de caírem de joelhos, honrandoO como Rei, Deus e Senhor, a despeito das exterioridades. Os outros não O reconhecem e não O aceitam. E Herodes fará de tudo para matá-Lo, como finalmente o conseguirão os príncipes dos sacerdotes, ao rejeitar e crucificar o Messias, que não Se coadunava com sua mentalidade e seus anseios mundanos.
III - TAMBÉM PARA NÓS BRILHA UMA ESTRELA
A história dos Reis Magos é um extraordinário exemplo de correspondência ao chamado de Deus. Viram eles uma estrela rutilante dentro da qual — segundo uma bela tradição — se encontrava um Menino que tinha por trás uma luz mais intensa formando uma Cruz 10 e a seguiram sem hesitação. Esta estrela é um símbolo muito expressivo da Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Assim como a luz da estrela guiou os Magos, a Igreja é a luz que cintila incessantemente, sem nunca bruxulear nem diminuir seu fulgor, para guiar os povos rumo ao Reino de Deus. E, ao longo dos tempos, todos quantos se converterem é porque de alguma maneira viram esta estrela e resolveram adorar a Jesus Cristo. Ela continua a brilhar e brilhará até o último dia da História, como prometeu Nosso Senhor: “as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16, 18).
O Salmo Responsorial da Solenidade da Epifania (cf. Sl 71, 11) traz esta magnífica profecia: “As nações de toda a Terra hão de adorar-Vos, ó Senhor!”. Fica patente, nesta sentença inspirada pelo Paráclito, não apenas que Jesus veio para todos, mas que, em determinado momento, a humanidade inteira deverá adorá-Lo. Para que isso se verifique, é indispensável que haja apóstolos, Os primeiros cristãos eram tão poucos! Contudo — como o grão de mostarda, que se desenvolve até tornar-se uma grande árvore —, se espalharam pelo mundo. Hoje, nossa responsabilidade não é menor que a dos Apóstolos, porque a palavra enunciada no Salmo Responsorial ainda não se cumpriu. Há, quiçá, uma obrigação mais grave no presente, já que muitos abandonaram a verdadeira Religião e deram as costas a Deus.
Neste dia manifestamos nossa fé de que, cedo ou tarde, a Religião Católica será admitida e louvada por todos os povos, pois não é possível Nosso Senhor Jesus Cristo ter Se encarnado, ter redimido os homens e ser por eles ignorado.
Somos fiéis ao brilho desta estrela?
Cabe, aqui, uma aplicação pessoal: luziu diante de nossos olhos esta estrela por ocasião do Batismo, quando infundiu Deus em nossa alma um cortejo de virtudes — as teologais: fé, esperança e caridade; e as cardeais: prudência, justiça, temperança e fortaleza, em torno das quais se agrupam todas as outras — e os dons do Espírito Santo, e passamos a participar da natureza divina. Pertencemos ao Corpo Místico de Cristo e o Céu se abre diante de nós. Tornou-se mais resplandecente esta estrela no dia de nossa Primeira Comunhão, ao recebermos o Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Cristo glorioso, para Ele nos assumir e santificar. A todo instante ela nos convida à santidade, a rejeitar nossas más tendências e a estar totalmente prontos para ouvir a voz da graça que diz em nosso interior “Vem, segue-me!”, e nos chama a sermos generosos, de forma a cada um de nós também constituir para os outros uma estrela, atraindo-os para a Igreja.
Se, por miséria ou por provação, perdermos de vista esta luz, precisamos ir a Jerusalém, ou seja, à Santa Igreja, a qual, em seus templos sagrados, se mantém sempre à nossa espera para nos indicar onde está Jesus. Ali haverá um sacerdote, estará exposto o Santíssimo Sacramento ou se encontrará uma imagem piedosa, instrumentos para reacender a estrela existente em nosso coração.
Incumbe-nos, ademais, tomar cuidado com o “Herodes” instalado dentro de nós: nosso orgulho, nosso materialismo, nosso egoísmo. Ele almeja apagar esta estrela, pelo pecado mortal, e colocar-nos nas vias dos prazeres ilícitos; quer levar-nos a matar Jesus Cristo que está em nossa alma como um luzeiro cintilante. Seremos do mundo e do demônio se tivermos uma vida dupla, limitando-nos a frequentar a igreja aos domingos e comportando-nos, depois, como se desconhecêssemos a estrela. Devemos, portanto, estar sempre junto a Nosso Senhor, oferecendo-Lhe o ouro do nosso amor, o incenso da nossa adoração e a mirra das nossas misérias e contingências, pedindo constantemente o auxilio de sua graça.
Compreendamos, nesta Solenidade da Epifania, que os Magos nos dão o exemplo de como alcançar a plena felicidade. Com os olhos fixos em Maria, imploremos: “Minha Mãe, vede como sou fraco, inconstante, miserável, e quanto preciso, ó Mãe, da vossa súplica e da vossa proteção. Acolhei-me, minha Mãe, eu me entrego em vossas mãos para que Vós me entregueis a vosso Filho”. E dirigindo-nos a São José, digamos: “Meu Patriarca, senhor meu, aqui estou, tende pena de mim, ajudai-me a pedir a vossa esposa, Maria Santíssima, para Ela ter sempre os olhos postos em mim”. Roguemos aos Reis Magos que intercedam junto ao Santo Casal e ao Menino Jesus, para nos obter a graça de não procurarmos luzes mentirosas, mas seguirmos a verdadeira estrela, ou seja, a da prática da virtude e do horror ao pecado.
1) Outros comentários acerca desta Solenidade em: CLA DIAS, EP, João Scognamiglio. O Espírito Santo e noSsos maravilhamentos? In: Arautos do Evangelho. São Paulo. N.145 (Jan., 2014); p.10-16; Diante do Rei, os bons reis e o mau. In:Arautos do Evangelho. São Paulo. N.85 (Jan., 2009); p.10-19;
2) Cf. TUYA, OP, Manuel de. Biblia Comentada. Evangelios. Madrid: BAC, 1964, v.V, p.36-37.
3) Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. II-JI, q.52, al; ad 1.
4) SÃO JOÃO CRISÓSTOMO Homilía VII, n.3. In: Obras. Homilías sobre el Evangelio de San Mateo (1-45). 2.ed. Madrid: BAC, 2007, v.1, p.133.
5) AUTOR INCERTO Opus imperfectum in Matthæum. Homilia II, c.2, n.8: MC 56, 641.
6) Cf. SÃO REMÍGIO, apud SÃO TOMÁS DE AQUINO. Catena Aurea. In Matthæum, cII, v.7-9.
7) AUTOR INCERTO, op. cit., n.1l, 642.
8) SANTO ELREDO DE RIEVAL. Sermón IV En la manifestación dei Señor, n.36. In: Sennones Litórgicos Sennones 1-14. Burgos: Monte Carmelo, 2008, tI, p.96-97.
9) Cf. AUTOR INCERTO, op. cit., n.12, 643.

10) Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. III, q.36, a.5, ad 4.

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