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sábado, 19 de janeiro de 2013

COMENTÁRIO AO EVANGELHO DO III DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO C 2013 Lc 1, 1-4; 4, 14-21


COMENTÁRIO AO EVANGELHO DO 3º DOMINGO DO TEMPO COMUM  Lc 1, 1-4; 4, 14-21
 1Visto que muitos já empreenderam pôr em ordem a narração das coisas que entre nós se verificaram, 2 como no-las referiram os que desde o princípio foram testemunhas oculares e vieram a ser ministros da palavra, 3 pareceu-me também a mim, depois de ter investigado tudo cuidadosamente desde o princípio, escrever-te por ordem a sua narração, excelentíssimo Teófilo, 4 para que reconheças a firmeza dos ensinamentos que recebeste.
14Voltou Jesus, sob o impulso do Espírito, para a Galiléia, e a sua fama divulgou-se por toda a região circunvizinha. 15Ensinava nas suas sinagogas e era aclamado por todos. 16 Foi a Nazaré, onde se tinha criado, entrou na sinagoga, segundo o seu costume, em dia de sábado, e levantou-Se para fazer a leitura. 17Foi Lhe dado o livro do profeta Isaías. Quando desenrolou o livro, encontrou o lugar onde estava escrito: 18 ‘O Espírito do Senhor repousou sobre Mim; pelo que Me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres; 19 Me enviou para anunciar a redenção dos cativos, e a recuperação da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a pregar um ano de graça da parte do Senhor.’ 20 Tendo enrolado o livro, deu-o ao encarregado, e sentou-Se. Os olhos de todos os que se encontravam na sinagoga estavam fixos n’Ele. 21 Começou a dizer-lhes: ‘Hoje cumpriu-se esta passagem da Escritura que acabais de ouvir’. (Lc 1, 1-4; 4, 14-21).
  Jesus prega em Nazaré
Durante sua vida pública, Nosso Senhor serviu-se da palavra como essencial instrumento de apostolado. Hoje, vinte séculos depois, apesar dos numerosos avanços da ciência e da técnica, continua ela sendo eficiente e insubstituível meio de evangelização.
 SÃO LUCAS, EVANGELISTA E HISTORIADOR EXÍMIO
Queiram ou não os homens, em se tratando de Deus, jamais conseguirá o silêncio encobrir os acontecimentos ou a própria verdade; sobretudo quando Ele próprio deseja a divulgação de seus atos ou intervenções na História. Tal seria que, encarnando-se o Verbo para redimir o gênero humano, ficassem Ele e sua obra relegados ao esquecimento. Assim, apesar de Jesus não nos ter deixado uma só obra escrita, não houve homem algum que tenha sido objeto de tantos comentários, cuja biografia tenha sido tão conhecida e divulgada.
Desde o início de sua vida pública, as palavras, ações e milagres do Messias prometido e esperado convulsionaram o cenário político, social e religioso já bastante movimentado daqueles tempos. As multidões ansiavam e até pressentiam que algo novo e grandioso estava para realizar-se naqueles dias. Como sucedeu isto?
Antigo Testamento, Jesus e Igreja
Reconstituir o fio cronológico dos acontecimentos e, a partir daí, reestruturar ordenadamente as circunstâncias que cercaram a vida do Salvador, mesmo antes de seu nascimento como também depois de sua morte, tem sido uma tarefa de grande alcance e levada a cabo com êxito por numerosos autores, ao longo dos séculos. Mas, quem seria capaz de revelar as sábias e especialíssimas intervenções de Deus no curso da História, para criar o clima psicológico e preparar os espíritos com vistas à magna obra redentora? Quiçá somente no dia do Juízo possamos ter uma visão global e minuciosa desse mais belo agir da Providência.
Lucas, o médico querido” (Col 4, 14), sob esse ponto de vista, foi o escritor sagrado mais bem-sucedido. A tal respeito, encontramos interessantes considerações na obra Comentários a la Bíblia Litúrgica (1):
“A atitude de Lucas é diferente. Não é como Marcos e Mateus, um simples pastor que recolhe o ensinamento da Igreja e o transmite num outro contexto. Sendo pastor, Lucas é também um erudito que conhece as leis da história de seu tempo; vive ancorado na tradição cultural do helenismo e pensa que os fatos da vida de Jesus e o Cristianismo podem ser apresentados dentro das exigências próprias à cultura grega, e por isso escreve seu Evangelho e o livro dos Atos.
“Por mover-se na confluência destas duas tradições (helenista e judeu-cristã), Lucas foi capaz de formular uma visão nova e esplêndida do significado de Jesus e de sua obra. A característica fundamental dessa visão é o sentido ou ritmo da História, com seu passado (Antigo Testamento), seu centro (vida de Jesus) e seu futuro (tempo da Igreja). (...)
“Lucas é o evangelista do Espírito. O laço de união do Velho Testamento, de Jesus e da Igreja, é o Espírito de Deus que realiza sua ação entre os homens. O Espírito agia sobre os profetas da Antiga Aliança e se mostrou de uma forma decisiva no surgimento de Jesus; no tempo de sua vida, Jesus realizou a missão escatológica do Espírito de Deus sobre a terra e o deixou à Igreja como herança. Tal é a tríplice epifania do Espírito na História (Antigo Testamento, Jesus e Igreja).”
Dentre as testemunhas oculares, a própria Virgem Maria!
É fácil compreender que muitos tentassem “pôr em ordem a narração das coisas” (v. 1). Porém, nem sempre atingiram esse objetivo com pleno acerto. São Lucas, com polidez, insinua isso ao afirmar: “muitos já empreenderam”, ou seja, numerosos autores não haviam conseguido lograr o necessário êxito. Por isso conclui Beda (2):
“Cita outros muitos, não tanto pelo número, quanto pela multidão de heresias que encerram; porque, como seus autores não estavam inspirados pelo Espírito Santo, fizeram um trabalho inútil, uma vez que teceram a narração a seu gosto, sem preocupar-se com a unidade histórica.”
Numa época muito distante da máquina fotográfica e do vídeo, nada poderia melhor comprovar a veracidade de um acontecimento do que a presença de observadores. O relato feito por estes, sobretudo quando coincidentes em seu cerne e também nos seus detalhes, indicava altíssimo grau de credibilidade. Assim, Lucas se reporta às “coisas (...)como no-las referiram os que desde o princípio foram testemunhas oculares e vieram a ser ministros da palavra” (v. 2). Como bom historiador e escritor, Lucas demonstra especial zelo em deixar claro tratarem-se de testemunhas que presenciaram os acontecimentos “desde o princípio”, e levanta a ponta de um véu que nos coloca diante de bela perspectiva: quem teria sido “testemunha ocular” da Anunciação, do Nascimento e da Infância de Jesus? Realmente, não poderia ser outra pessoa senão a própria Santíssima Virgem. De onde se conclui ter ele ouvido santas e maternais narrações feitas por Maria, com base nas quais redigiu os primeiros capítulos de seu Evangelho.
Lucas atesta sua objetividade enquanto historiador: “depois de ter investigado tudo cuidadosamente desde o princípio”, decide escrever “por ordem a sua narração”, compilando os relatos orais e escritos, frutos de sua escrupulosa investigação. Ele deseja fazer uma obra que sirva de referência a outros tantos arautos da vida de Jesus, incluindo o período da infância, levando em conta, porém, o ambiente cultural daqueles tempos. Ou seja, mesclando a cronologia histórica com algo da psicologia humana.
Dedica o livro ao “excelentíssimo Teófilo”, certamente alta personalidade de sua época, pois dessa forma conferiria maior valor a sua obra. Esse era, aliás, um costume muito em voga naqueles tempos: oferecer a pessoas de escol, os trabalhos intelectuais.
Continua no próximo post.

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