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sábado, 16 de março de 2013

EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49 Ano C 2013

COMENTÁRIOS AO  EVANGELHO DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR Lc 23, 1-49  Ano C 2013


Evangelho da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas [versão mais breve]

Naquele tempo, toda a multidão se levantou e levou Jesus a Pilatos. 2 Começaram então a acusá-Lo, dizendo: Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo, proibindo pagar impostos a César e afirmando ser ele mesmo Cristo, o Rei”. Pilatos o interrogou: “Tu és o rei dos judeus?” Jesus respondeu, declarando: “Tu o dizes!”  Então Pilatos disse aos sumos sacerdotes e à multidão: “Não encontro neste homem nenhum crime”. Eles, porém, insistiam: “Ele agita o povo, ensinando por toda a Judeia, desde a Galileia, onde começou, até aqui”. 6 Quando ouviu isto, Pilatos perguntou: “Este homem é galileu?”
7Ao saber que Jesus estava sob a autoridade de Herodes, Pilatos enviou-o a este, pois também Herodes estava em Jerusalém naqueles dias. 8Herodes ficou muito contente ao ver Jesus, pois havia muito tempo desejava vê-lo. Já ouvira falar a seu respeito e esperava vê-lo fazer algum milagre. 9Ele interrogou-o com muitas perguntas. Jesus, porém, nada lhe respondeu.
10 Os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e o acusavam com insistência. 11Herodes, com seus soldados, tratou Jesus com desprezo, zombou dele, vestiu-o com uma roupa vistosa e mandou-o de volta a Pilatos. 12Naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos.
13Então Pilatos convocou os sumos sacerdotes, os chefes e o povo, e lhes disse: 14“Vós me trouxestes este homem como se fosse um agitador do povo. Pois bem! Já o interroguei diante de vós e não encontrei nele nenhum dos crimes de que o acusais; 15nem Herodes, pois o mandou de volta para nós. Como podeis ver, ele nada fez para merecer a morte. 16Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”. 18Toda a multidão começou a gritar: “Fora com ele! Solta-nos Barrabás!”
18Barrabás tinha sido preso por causa de uma revolta na cidade e por homicídio. 20Pilatos falou outra vez à multidão, pois queria libertar Jesus. 21Mas eles gritaram: “Crucifica-o! Crucifica-o!” 22E Pilatos falou pela terceira vez: “Que mal fez este homem? Não encontrei nele nenhum crime que mereça a morte. Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”. 23Eles, porém, continuaram a gritar com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais. 24Então Pilatos decidiu que fosse feito o que eles pediam. 25Soltou o homem que eles queriam — aquele que fora preso por revolta e homicídio — e entregou Jesus à vontade deles.
26Enquanto levavam Jesus, pegaram um certo Simão, de Cirene, que voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus. 27Seguia-o uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por ele. 28Jesus, porém, voltou-se e disse: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos! 29Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’.
30Então começarão a pedir às montanhas: ‘Cai sobre nós! e às colinas: ‘Escondei-nos!’ 31Porque, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?” 32Levavam também outros dois malfeitores para serem mortos junto com Jesus. 33Quando chegaram ao lugar chamado “Calvário”, ali crucificaram Jesus e os malfeitores: um à sua direita e outro à sua esquerda.
34Jesus dizia: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” Depois fizeram um sorteio, repartindo entre si as roupas de Jesus. 35O povo permanecia lá, olhando. E até os chefes zombavam, dizendo: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!”
36Os soldados também caçoavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre, 37e diziam:“Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!” 38Acima dele havia um letreiro: “Este é o Rei dos Judeus”. 39Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!”40Mas o outro o repreendeu, dizendo: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? 41Para nós, é justo, porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal”. 42E acrescentou: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado”. 43Jesus lhe respondeu: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso”.
44Já era mais ou menos meio-dia e uma escuridão cobriu toda a terra até as três horas da tarde, 45pois o sol parou de brilhar. A cortina do santuário rasgou-se pelo meio, 46e Jesus deu um forte grito: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Dizendo isso, expirou.
47O oficial do exército romano viu o que acontecera e glorificou a Deus, dizendo: “De fato! Este homem era justo!” 48E as multidões, que tinham acorrido para assistir, viram o que havia acontecido e voltaram para casa, batendo no peito. 49Todos os conhecidos de Jesus, bem como as mulheres que o acompanhavam desde a Galileia, ficaram a distância, olhando essas coisas. ( Lc 23, 1-49)


Até na hora a aparente derrota, o Sumo Bem sempre vence

Aos louvores da entrada triunfal de Nosso Senhor em Jerusalém logo se sucederam as dores da Paixão. Como explicar este paradoxo?

 A inexorável luta entre o bem e o mal


Reportemos a imaginação à eternidade, quando ainda não existia o tempo, pois Deus não havia criado o universo. Ele tinha diante de Si a possibilidade de criar infinitos mundos diferentes deste em que vivemos, mas, por uma livre escolha de sua vontade, não quis fazê-lo.’ Muitos dentre eles, aos nossos olhos de meras criaturas, poderiam ter sido melhores do que o existente, quiçá algum sem pecado e sem lutas...

Entretanto, o que Deus criou? Um universo cujas criaturas são boas e o conjunto delas é “muito bom” (Gn 1, 31). Logo no seu início, porém, todo esse bem criado passou a coexistir com o mal, a partir do momento em que a terça parte dos espíritos angélicos se uniu a Lúcifer numa revolta contra Deus (cf. Ap 12, 4). Ao brado de São Miguel, os Anjos fiéis se levantaram em oposição aos rebeldes e “factum est prælium magnum in Cælo — uma grande batalha se travou no Céu” (Ap 12, 7). Precipitado nas trevas eternas, o demônio tentou, como forma de manifestar sua obstinada oposição a Deus, desfigurar a beleza do plano da criação.

Invejando a criatura humana, que ainda se conservava inocente e desfrutava das delícias do Paraíso e da amizade com Deus, satanás se empenhou “em enganar os homens, para que não fossem exaltados e elevados ao lugar de onde ele caíra”.2 Tomando o aspecto de uma encantadora serpente, astuta e habilidosa para exacerbar as paixões humanas, entrou ele em contato com Eva e lhe propôs a desobediência a Deus. Eva cedeu e levou Adão a segui-la no mesmo caminho.

Por que a serpente entrou no Paraíso?

Ora, por que Deus deixou entrar a serpente no Paraíso e permitiu que o mal se estabelecesse na face da Terra? Entre outras razões, ressaltemos três: em primeiro lugar, a fim de nos enviar um Salvador que operasse a Redenção. Por isso, na Liturgia da Vigília Pascal se canta “ó culpa tão feliz que há merecido a graça de um tão grande Redentor!”.3 Em segundo lugar, para evitar o amolecimento e a tibieza dos justos. A existência dos maus é o melhor adestramento para os bons, que podem, na defesa do bem, praticar o heroísmo da virtude para a glória de Deus e seu próprio mérito. Por último, porque permitindo o mal, Deus quer um bem superior que dele resulta acidentalmente.4 Depois do pecado, por exemplo, o inferno foi criado para os anjos que ofenderam a Deus e para os homens pecadores que, permanecendo impenitentes, após a morte também para lá iriam. Brilha assim no universo a justiça infinita do Criador, premiando os bons e castigando os maus. Sem isto Ele não manifestaria sua justiça punitiva 5 nem transferiria ao universo o poder de castigar o mal que é praticado.

Uma luta estabelecida por Deus

Portanto, a partir do momento em que anjos e homens desobedeceram aos preceitos divinos, uma luta se iniciou entre o bem e o mal, entre os que procuram servir a Deus e os que se revoltam contra Ele, entre os que querem satisfazer suas paixões desregradas e aqueles que anelam viver do influxo da graça. Essa luta não tem trégua, pois foi estabelecida pelo próprio Criador: “Porei inimizades entre ti e a mulher, entre tua descendência e a dela” (Gn 3, 15). Luta tremenda, que atravessa os séculos com o enfrentamento constante de duas raças: a bendita estirpe de Jesus e Maria e a maldita linhagem de satanás.

Desde a expulsão do homem do Paraíso, vemos, então, como o filão dos maus parecia triunfar, pois o império do pecado na face da Terra, ao longo do Antigo Testamento, era quase universal. Através dos fios que tecem a História Sagrada, torna-se patente, mesmo entre o povo eleito, a ação deletéria deste filão de maus que, como denuncia sem véus Nosso Senhor, está involucrada nos crimes cometidos desde a morte de Abel até a chegada d’Ele (cf. Lc 11, 47-51). Ora, este aparente domínio do poder infernal teria fim com o cumprimento da promessa que Deus fizera aos nossos primeiros pais: “Ela te esmagará a cabeça” (Gn 3, 15).

Domingo de Ramos, início das dores

Com a Encarnação do Verbo a obra das trevas conheceu sua ruína. E o confronto entre o bem e o mal encontrará sua arquetipia, até o fim dos tempos, na luta implacável de Nosso Senhor contra os escribas e os fariseus, narrada longamente por todos os evangelistas. O maldito filão do mal encontrou diante de si um Varão que fundou uma Instituição para combatê-lo, o Homem-Deus diante do qual foi obrigado a ouvir as verdades mais contundentes e penetrantes, a ponto de ser-lhe arrancada a máscara da hipocrisia, aos olhos de todo o povo.

Na Liturgia do Domingo de Ramos vamos assistir ao desfecho dessa luta. Nesse dia a Igreja comemora, ao mesmo tempo, as alegrias da entrada triunfal de Nosso Senhor Jesus Cristo em Jerusalém e o início de sua Via Sacra, com a proclamação da Paixão no Evangelho da Missa. Abre-se, assim, a Semana Santa, talvez o período do Ano Litúrgico mais cogente, durante o qual as principais celebrações se sucedem, convidando-nos a considerar com especial fervor os acontecimentos que constituem o cerne de nossa Redenção.

Entrada triunfal em Jerusalém

Entre os numerosos milagres realizados pelo Divino Mestre, nenhum produzira tanta comoção em Israel quanto a ressurreição de Lázaro (cf. Jo 11, 1-44). A uma simples ordem, o morto de quatro dias saíra do túmulo andando, em perfeita saúde. Por evidenciar de forma tão grandiosa o poder divino de Jesus, o prodígio ocasionou um forte surto de fervor popular e muitos judeus passaram a crer n’Ele. Em contrapartida, tal fato acirrou ao extremo o ódio dos pontífices e fariseus. Reunido o Sinédrio, deliberou este acerca dos meios para fazer cessar a crescente fama de Nosso Senhor e, “desde aquele momento, resolveram tirar-Lhe a vida” (Jo 11, 53).

O Redentor, que tudo sabia, já tinha conhecimento desta decisão oficial do Sinédrio quando começou a viagem de volta à Cidade Santa, nas vésperas das comemorações da Páscoa. No caminho Ele advertira os discípulos a esse respeito, ao anunciar-lhes pela terceira vez a Paixão: “Eis que subimos a Jerusalém e o Filho do Homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas; condená-Lo-ão à morte e entregá-Lo-ão aos gentios” (Mc 10, 33). Contudo, nada fez para impedir a afluência das pessoas que acorriam ao seu encontro e passavam a segui-Lo durante o percurso. Eram israelitas em sua maior parte, os quais também se dirigiam ao Templo para celebrar a Páscoa, de modo que, quanto mais se aproximava da cidade, maior se tornava o número dos que O acompanhavam. Saindo de Jericó, por exemplo, registra São Mateus que “uma grande multidão O seguiu” (20, 29), e São João menciona outra “grande multidão de judeus” (12, 9) que se concentrou em Betânia ao saber que Jesus ali havia chegado. Toda essa gente foi com Ele a Jerusalém, pelo que “bem se pode supor que formavam o cortejo várias centenas, e até mesmo milhares de pessoas”,6 diz Filhon. É precisamente a essa altura do percurso, nas proximidades de Betânia e Betfagé, que se inicia o trecho de São Lucas recolhido para o Evangelho da Procissão do Domingo de Ramos do Ano C.

Os louvores começaram logo que Nosso Senhor montou o jumentinho, ainda na estrada. A sua passagem o povo ia estendendo os mantos no chão e completava esse improvisa do tapete com ramos colhidos das árvores (cf. Mt 21, 8; Mc 11, 8). Quando já se podia divisar o Templo — o que, segundo indicação precisa de São Lucas, corresponde a “perto da descida do Monte das Oliveiras” —, a multitudinária procissão irrompeu em exclamações e brados de alegria: “Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor! Paz no Céu e glória nas alturas!”. Tal movimentação pôs em alvoroço a cidade, que regurgitava de peregrinos vindos de todas as regiões da Palestina, os quais, saindo ao encontro de Jesus com ramos de palmas nas mãos, uniram-se à caravana, para também aclamá-Lo (cf. Jo 12, 12-13).

Esse cortejo triunfal mas quão modesto para Aquele que é Rei e Criador do universo! — realizava literalmente a profecia messiânica de Zacarias  “Dança de alegria, cidade de Sião; grita de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o teu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho de uma jumenta” (9, 9).

Continua no próximo post.

1) Cf. ROYO MARÍN, OP, Antonio.Diosysu obra. Madrid: BAC, 1963, p.143.
2) SANTO AGOSTINHO. Enarratio in psalmum LVIII, sermo II, n.5. In: Obras. Madrid: BAC, 1965, v.XX, p.489.
3) VIGILIA PASCAL. Proclamação da Páscoa. In: MISSAL ROMANO. Trad. Portuguesa da 2a. edição típica para o Brasil realizada e publicada pela CNBB com acréscimos aprovados pela Sé Apostólica. 9.ed. São Paulo: Paulus, 2004, p.275.
4) Cf. SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. I, q.19, a.9.
5) Cf. Idem, J-II, q.79, a.4, ad 1.
6) FILLION, Louis-Claude. Vida de Nuestro Señor Jesucisío Pasión, Mueev Resurrección. Madrid: Rialp, 2000. vIII. p.15.

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