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sábado, 31 de agosto de 2013

Evangelho XXIII Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 14, 25-33

Continuação dos comentários ao Evangelho XXIII Domingo do Tempo Comum - Ano C - 2013 - Lc 14, 25-33
Jesus deve ser amado com um amor perfeitíssimo
São inestimáveis, e a certo título insuperáveis, o estímulo
e o apoio da família para a santificação
26 “Se alguém vem a Mim, mas não se desapega de seu pai e de sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs, e até da sua própria vida, não pode ser Meu discípulo”.
Embora algumas versões da Escritura interpretem nesta passagem o sentido do verbo grego μισεω como “desapegar-se”, a Vulgata prefere traduzir o termo μισεῖ por odit (odeia). Daí a formulação clássica deste versículo: “Se alguém vem a Mim e não odeia seu pai, sua mãe, sua mulher, seus filhos, seus irmãos, suas irmãs e até a sua vida, não pode ser Meu discípulo”.3
Ora, como explicar, à luz dos Mandamentos da Lei de Deus, essa prescrição de odiar os parentes mais próximos e até a própria vida? Tirar dela todas as consequências às quais uma consideração superficial pode induzir, não levaria este versículo ao parricídio, ao fratricídio e mesmo ao suicídio? Não terá sido, então, incorreta, por hiperbólica, a tradução de São Jerônimo?
Não parece. Pelo contrário, o uso do verbo odiar sublinha com ênfase didática, neste contexto, o sentido mais profundo das palavras do Mestre: a necessidade de amarmos a Deus acima de tudo, portanto, de nos desapegarmos radicalmente até mesmo do que nos for mais caro, se isto representar um obstáculo para seguirmos a Cristo. Pois Jesus é digno de ser amado com um amor perfeitíssimo, e jamais chegará a ser Seu verdadeiro discípulo quem não estiver disposto a, por causa d’Ele, levar aos últimos extremos o desprendimento: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais que a Mim, não é digno de Mim” (Mt 10, 37).
Explica São Tomás, na Suma Teológica, que cabe à virtude da piedade “prestar aos pais culto e serviços, mas dentro das devidas medidas. Ora, não existe devida medida quando se tende a prestar ao homem um culto maior do que aquele que se presta a Deus. [...] Se, por conseguinte, o culto devido aos pais viesse a nos afastar do culto a Deus, já não seria mais piedade filial ficar insistindo num culto que é contra Deus”.4
Deve ser interpretado no mesmo sentido o convite a desapegar-se “até da própria vida”, como bem apontam Balz e Scheider: “A dupla exigência de Jesus — necessidade de odiar os pais e até a si mesmo, por causa d’Ele (Lc 14, 26), e de não amar os pais mais do que a Ele (Mt 10, 37) — tem na realidade este significado: para seguir a Jesus, é preciso pôr tudo de lado”.5
Os inimigos serão os próprios familiares
Ora, como podem pai e mãe, irmão e irmã representarem obstáculos para a nossa salvação?
Para melhor responder a esta pergunta, é útil lembrar outra passagem do Evangelho, correlata à que agora comentamos: “Não penseis que vim trazer paz à terra. Não vim trazer paz, mas sim, a espada. De fato, Eu vim pôr oposição entre o filho e seu pai, a filha e sua mãe, a nora e sua sogra; e os inimigos do homem serão seus próprios familiares” (Mt 10, 34-36).

Sobre estes versículos de São Mateus — mais incisivos ainda, sob certo sentido, que os de São Lucas —, comenta Romano Guardini: “A mensagem de Jesus é mensagem de salvação. Anuncia o amor do Pai e o advento do Reino. Chama os homens para a paz e para a concórdia, na vontade santa. Contudo, Sua palavra não começa por produzir a união, mas a divisão. Quanto mais um homem se torna profundamente cristão, mais a sua vida se distingue da vida dos outros que não querem tornar-se cristãos, ou na medida em que se recusam a sê-lo. [...] Eis porque pode assim haver uma cisão entre pai e filho, amigo e amigo, ou entre os moradores de uma mesma casa”.6
Continua no próximo post

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