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segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Evangelho 3º Domingo do Advento ( Domingo Gaudete) Ano A - 2013

Comentários ao Evangelho III Domingo do Advento  Mt 11, 2-11 ( Domingo Gaudete) Ano A – 2013
 Mons João Clá Dias
“Naquele tempo, 2 João estava na prisão. Quando ouviu falar das obras de Cristo, enviou-Lhe alguns discípulos, 3 para Lhe perguntarem: ‘És Tu, Aquele que há de vir, ou devemos esperar um outro?’.
4 Jesus respondeu-lhes: ‘Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo: 5 os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados. 6 Feliz aquele que não se escandaliza por causa de Mim!’.
7 Os discípulos de João partiram, e Jesus começou a falar às multidões sobre João: ‘O que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? 8 O que fostes ver? Um homem vestido com roupas finas? Mas os que vestem roupas finas estão nos palácios dos reis.
9 Então, o que fostes ver? Um profeta? Sim, Eu vos afirmo, e alguém que é mais do que profeta. 10 É dele que está escrito: ‘Eis que envio o meu mensageiro à tua frente; ele vai preparar o teu caminho diante de Ti’. 11 Em verdade vos digo, de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele’” (Mt 11, 2-11).


Uma lufada de ânimo para chegar até o fim
Dizia o célebre teórico de guerra Karl von Clausewitz1 que a melhor forma de vencer um adversário é fazê-lo perder o ânimo de combater, pois a quebra de sua força moral é a causa principal de seu aniquilamento físico. Assim, quando empreendemos uma ação com desânimo, não atingimos a meta. Pelo contrário, quem tem uma confiança sólida, baseada numa fé vigorosa, desenvolve energias e entusiasmo para perseverar até o fim com galhardia. Se, por acaso, na realização de um árduo esforço, sentimos faltar o fôlego, basta uma lufada de esperança para redobrar as boas disposições e garantir o sucesso.
A Igreja, no 3º Domingo do Advento — chamado Domingo Gaudete —, tem em vista este propósito: fazer uma pausa nas admoestações do período de penitência e amenizar a tristeza causada pela lembrança dos pecados cometidos, para considerar com alegria a perspectiva do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. Em breve seremos libertados de nossa miséria, se soubermos ouvir os seus ensinamentos e nos abrirmos às graças que Ele nos traz, e poderemos seguir adiante com entusiasmo, confortados pela certeza de que nos será dada a salvação. Esse verdadeiro gáudio pela próxima vinda do Redentor é a nota tônica desta Missa, simbolizada pela cor rósea dos paramentos e expressa nos textos litúrgicos, sem, todavia, excluir totalmente o caráter penitencial. Depois do pecado original, a cruz tornou-se indispensável para obtermos a glória no cumprimento da finalidade para a qual fomos criados.
A sede de felicidade da criatura humana
Se voltarmos nossa atenção para cada criatura humana, encontraremos em todas elas o desejo de alcançar a felicidade. Quando Adão, belíssimo boneco de barro, saiu das mãos divinas e lhe foi infundido um sopro de vida, já possuía ele essa aspiração que era atendida com largueza por sua participação na própria natureza de Deus, a Felicidade Absoluta. Tão elevada era a figura deste varão que o Senhor ia visitá-lo no Paraíso, à hora da brisa da tarde (cf. Gn 3, 8). Eram felizes nossos primeiros pais! Porém, expulsos daquele local de delícias em consequência do pecado, Adão e Eva viram-se obrigados a habitar este mundo repleto de dificuldades, sem perder, entretanto, aquele anseio de felicidade. Ardiam de desejo de retornar ao estado de outrora, de gozar das maravilhas que tinham conhecido no Éden. Mais tarde, constituído o povo de Israel, especialmente amado pela Providência, esperava ele o advento de um Salvador que o tirasse dessa desditosa situação.
Com o transcurso dos séculos e dos milênios, os hebreus ― sempre numa tremenda instabilidade e submetidos à escravidão por diversas vezes ― foram alimentando a ideia de  que o Messias seria um homem aquinhoado por dons meramente naturais, portador de soluções humanas e políticas para todos os problemas. Sua grande incógnita era acerca da vinda deste enviado que traria a felicidade, a qual já não concebiam como uma condição semelhante à do Paraíso, mas segundo padrões terrenos. Algo parecido ocorre conosco, pois sabemos que o centro de nossa vida e a fonte da alegria é Nosso Senhor Jesus Cristo; contudo, as ilusões do mundo apontam para uma pseudofelicidade baseada em boa carreira, na aquisição de um valioso patrimônio, numa posição de prestígio, num vantajoso casamento ou, talvez, em negócios lucrativos. Numa palavra, a felicidade para os que assim pensam está na matéria, e não em Deus. Eis aí o lamentável equívoco.
Para desfazer esta falácia, a Liturgia do Domingo da Alegria nos indica o verdadeiro caminho da felicidade e oferece um exemplo seguro a seguir.
A alegria de cumprir a própria missão
O episódio narrado na sequência evangélica do 3º Domingo do Advento dá-se em circunstâncias muito especiais. Nosso Senhor estava adentrando o segundo ano de sua vida pública e já realizara inúmeros milagres, encontrando-Se de regresso da pequenina cidade de Naim, onde por sua iniciativa ressuscitara o filho de uma viúva (cf. Lc 7, 11-15). Ao passar pelas estradas tortuosas da região entrou no vilarejo e deparou-Se com alguns homens transportando um morto. Mandou parar o cortejo e restituiu a vida ao defunto, entregando-o em seguida à sua mãe. Este fato teve enorme repercussão que, somada à de muitos outros, moveu Israel inteiro a falar do grande Profeta que havia surgido.
O Precursor pagou sua fidelidade à verdade com a prisão
“Naquele tempo, 2a João estava na prisão”.
João Batista, varão íntegro que recentemente abalara Israel com sua pregação e exemplo de vida, havia sido preso. Em sua retidão, o Precursor dissera algumas verdades ao rei Herodes Antipas ― que, escravo das próprias paixões, era dominado por uma concubina, a esposa de seu irmão Filipe ― e, por isso, o tirano resolvera prendê-lo. Pungente contraste: as paixões desregradas e soltas de Herodes dão-lhe uma liberdade de ação ilegítima, e a honestidade de João leva-o à prisão.
Na perspectiva do Domingo Gaudete surge uma pergunta: qual dos dois goza de autêntica alegria, Antipas, o adúltero, ou São João, encarcerado por sua fidelidade? Devemos nos compenetrar de que Deus criou o homem para um destino eterno, no gáudio ou no sofrimento. Portanto, a verdadeira alegria é a que nos conduz à felicidade do Céu, e não aquela que nos acarreta a desgraça sem fim. No entanto, a humanidade bem gostaria de criar uma terceira via: um limbo onde não houvesse sofrimento nem possibilidade de visão beatífica, mas apenas uma vida natural, puramente sensitiva, pela eternidade inteira.
Lembremo-nos da importante máxima: “non datur tertius ― não há uma terceira posição”. Esta foi inventada por satanás ao cair do Céu e é feita de fumaça, é ilusória, pois na realidade não existe: ou violamos a moral e damos vazão às nossas más inclinações, reproduzindo em nós a pseudoalegria de Herodes Antipas, ou somos íntegros, a exemplo de João, e também nós estamos a todo instante na “prisão”, ou seja, subjugando e acorrentando nossas tendências e paixões desordenadas.
Preocupação exclusiva com a glória de Cristo
2b “Quando ouviu falar das obras de Cristo, enviou-Lhe alguns discípulos, 3 para Lhe perguntarem: ‘És Tu, Aquele que há de vir ou devemos esperar um outro?’”.
Que acontecimentos teriam levado o Precursor, já no cárcere, a mandar seus discípulos fazerem esta pergunta ao Divino Mestre? Antes de aventar qualquer hipótese, tenhamos presente que ele é um Santo, considerado por Nosso Senhor como o maior homem nascido até aquele momento. Logo, não se trata de uma incerteza sobre a identidade de Cristo, que já fora apresentado por ele em termos claríssimos:
“Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1, 29); “Depois de mim vem outro mais poderoso do que eu, ante o qual não sou digno de me prostrar para desatar-Lhe a correia do calçado. Eu vos batizei com água; Ele, porém, vos batizará no Espírito Santo” (Mc 1, 7-8). João Batista sabia perfeitamente quem era Jesus, e não precisava de qualquer explicação.
Então, por que os envia com a incumbência de indagar a respeito do caráter messiânico de Nosso Senhor? Fiel à sua missão de apontar o Filho de Deus, arde de desejo que todos reconheçam o Salvador que está entre eles e quer transmitir aos outros a sua felicidade de tê-Lo visto e ser seu contemporâneo. São João Batista encontrava-se preso na torre de Maqueronte ― inacessível fortaleza de Herodes, localizada nas proximidades do Mar Morto, a 1158 metros de altitude sobre o nível deste2 ―, sem qualquer possibilidade de atuação.
Em dado momento, chegaram-lhe aos ouvidos, por meio de seus seguidores, as repercussões dos grandes e numerosos milagres operados por Jesus. Esta pareceria ser a hora propícia para mandar um recado Àquele que é o Criador do universo, o Onipotente: “Senhor, estou preso, libertai-me!ˮ. Por um simples ato de vontade de Deus Nosso Senhor, as correntes se desfariam, as algemas se abririam e ele sairia da prisão. Mas o Precursor não pensava em si ou nos infortúnios padecidos naquele estado e nem sequer lhe ocorreu a ideia de pedir um alívio. Para ele era indiferente morrer ou viver: sua preocupação voltava-se exclusivamente para a glória do Redentor.
Conceito messiânico desviado
Por isso, João Batista se empenhava em criar condições para que Nosso Senhor Se manifestasse cada vez mais. Ele já estava extenuado pelas vãs tentativas de convencer seus discípulos, que insistiam numa concepção política a respeito do Messias. Anelavam um rei humano que ascendesse ao trono de Israel e desse força ao seu povo. Conforme iam acompanhando o ministério de Nosso Senhor Jesus Cristo tomavam-se de insegurança, porque Ele era um Homem capaz de fazer milagres estrondosos, embora não Se pronunciasse em matéria de política e pregava o advento de um misterioso Reino de Deus que não parecia ser deste mundo. Instigados pela inveja, custava-lhes acreditar que Aquele fosse o Cristo, por não corresponder às suas expectativas e ao modelo por eles idealizado. Considerações como estas pululavam em suas mentes: “É nascido em Nazaré...ˮ; “O pai d’Ele era carpinteiro!ˮ; “Mas será, de fato, o Messias?ˮ (cf. Mt 13, 54-57). Aliás, algo análogo se passava em relação ao próprio Precursor, o qual não havia preenchido as esperanças nele depositadas quando começaram a segui-lo.
Esta cegueira, sem dúvida, deixava São João indignado, até que percebeu restar apenas uma saída para quebrar aquela frieza: que eles tivessem contato direto com Jesus, o único que poderia transformá-los a fim de compreenderem quem Ele era. Tudo o que estava ao seu alcance havia feito por eles, não poupando esforços para comunicar-lhes a extraordinária alegria na qual se sentia imerso por exercer sua missão de Precursor. Enviou-os, pois, confiante em que Nosso Senhor fizesse por eles o que pessoalmente ele não conseguira, e de que a conversa com o Mestre fosse ocasião para receberem uma graça que agisse no fundo de suas almas e viessem a se converter. Essa persistência em querer mais para os outros do que para si e em procurar torná-los felizes, de uma felicidade sobrenatural, era característica do Precursor.
O Evangelista frisa: “Quando ouviu falar das obras de Cristo”, indicando que São João discernira ser a hora apropriada para enviá-los, dada a forte impressão causada pelos milagres de Jesus. É no teor da pergunta que fica consignado o fato de ansiarem por um Messias segundo outros padrões: “És Tu, Aquele que há de vir ou devemos esperar um outro?”.
Em contraste com a despretensão de seu mestre, que vivia completamente esquecido de si e preocupado com eles, os discípulos de São João não pediram a Nosso Senhor por aquele que os formara. Tinham-lhe tão pouco amor que não se interessaram em tirá-lo do cárcere e livrá-lo daquela penosa situação. Esses somos nós, sempre que nos fechamos e só atendemos às solicitações do egoísmo e às nossas vantagens pessoais, mais dedicados a nós mesmos do que a Deus e ao próximo. Em consequência, a felicidade foge de nós e cresce o egocentrismo.
Os milagres provavam que Ele era o Messias
4 “Jesus respondeu-lhes: ‘Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo: 5 os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados’”.
A resposta de Nosso Senhor, cheia de sabedoria, não foi: “Eu sou o Messias”. Provavelmente, dado o estado de espírito de quem o interrogava, uma declaração nesses termos não seria bem recebida. Sua afirmação oferecia elementos para que eles compreendessem a verdade por si, como se dissesse: “Analisem o que acontece, vejam as minhas obras e as suas consequências, e em função disso tirem conclusões.
Quem vê todos os prodígios que Eu faço e não acredita que sou o Messias, não tem inteligência”. E recorre aos vaticínios de Isaías, bastante conhecidos por todos os israelitas (cf. Is 26, 19; 29, 18; 35, 5; 42, 7; 62, 1), como uma confirmação.

De fato, qualquer cego que gritasse à distância pedindo a cura saía de sua presença enxergando e dando graças a Deus. Havia também devolvido a saúde a inúmeros paralíticos, como o da piscina de Betesda (cf. Jo 5, 1-9) ou aquele que fora descido pelo teto (cf. Mc 2, 3-12). Bastava tocar nos leprosos que as chagas desapareciam, ou nos surdos e mudos, que eram sanados. Ele acabara de ressuscitar um morto com grande estrépito no país, como acima foi recordado, e estava levando a Boa-nova a todos. Por meio dela, muitos adquiriam ― é este o maior milagre! ― a noção de que eram deficientes, não conseguiam caminhar por si nas vias da virtude, e tomavam consciência de necessitarem do auxílio de Deus. Estes eram evangelizados e acolhiam a doutrina com entusiasmo. Entretanto, se escandalizaram...

Continua no próximo post.

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